Arquivos Karen Gimenez - Canal MyNews – Jornalismo Independente https://canalmynews.com.br/post_autor/karen-gimenez/ Nosso papel como veículo de jornalismo é ampliar o debate, dar contexto e informação de qualidade para você tomar sempre a melhor decisão. MyNews, jornalismo independente. Fri, 13 Jan 2023 13:54:52 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 O Fetiche da Maçonaria https://canalmynews.com.br/voce-colunista/o-fetiche-da-maconaria/ Fri, 13 Jan 2023 13:54:52 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=35395 A sugerida ligação de Bolsonaro com a tradição que data do século XV não é uma estratégia aleatória de comunicação

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Dada a largada da campanha eleitoral para o segundo turno federal e em alguns estados, além da dança das cadeiras habitual em relação aos apoios, um dos destaques das redes sociais é a suposta adesão do presidente e candidato Jair Bolsonaro (PL) à Maçonaria. A sugerida ligação de Bolsonaro com a tradição que data do século XV não é uma estratégia aleatória de comunicação.

Se vai dar certo ou não no resultado das urnas é difícil dizer e não é o foco desta reflexão. A proposta aqui é analisar por que diante de tantos temas ligados à pandemia, compra de imóveis, orçamento secreto e afins que poderiam ser utilizados como tentativa de virar voto no segundo turno, foi escolhida a Maçonaria.

Quem explica é Umberto Eco, o popularmente conhecido autor do romance “O Nome da Rosa” e um dos maiores estudiosos das teorias da conspiração de toda a Europa. Para Eco, um dos principais nutrientes de uma teoria da conspiração é o segredo, principalmente aquele segredo que nunca é totalmente revelado, mas que vez por outra dá sinal da sua existência e, que some tão rapidamente quanto aparece. É aquela moça supostamente envergonhada que, na busca de atrair um parceiro sexual, deixa levemente o decote mostrar um pouco mais do que deveria, mas rapidamente se ocupa de cobrir o que não poderia ter sido revelado. E, com isso, deixa o tal parceiro almejado ainda mais curioso e excitado.

Eco coloca esse poder de atração do segredo dentro de um conceito que ele denomina de semiose hermética. Mas vamos deixar os termos técnicos para lá e nos concentrar no que mais interessa. Por que a Maçonaria pode trazer impacto? Pelas suas características de ser uma sociedade fechada e de ter seu nome associado a acontecimentos históricos que envolvem poder, como a Revolução Francesa e a Independência dos Estados Unidos.

A combinação entre mistério e poder forma um caldo perfeito para conduzir as teorias da conspiração. Ainda mais quando embrulhadas em uma teia ambígua de sinais que ligariam o mundo real ao espiritual. Essa, inclusive é a receita para o roteiro de muitos best sellers da literatura e de filmes de grande bilheteria.

A tradição de ser uma sociedade fechada e poderosa gera a sensação de medo. O que pode acontecer lá que ninguém pode saber? Se ninguém pode saber deve ser algo perigoso e possivelmente maligno. Em uma comparação simplista, despertaria o mesmo sentimento de curiosidade e receio que aquele vizinho que mora sozinho, praticamente não fala com ninguém e não recebe visitas. Transformar esse vizinho que pode ser apenas alguém que gosta de privacidade em um perigo para a rua toda pode ser feito praticamente em um passe de mágica.
Daí o fato de a Maçonaria ser alimento para tantas teorias da conspiração.

Não podemos minimizar a importância secular que ela tem na sociedade, mas no caso atual, é muito mais uma questão de imagem. Os terraplanistas, por exemplo, acreditam que a Maçonaria estaria mancomunada com a Nasa, com Barak Obama e Hillary Clinton para dominar o mundo. Esse é só um exemplo de diversas outras teorias da conspiração ligadas a um suposto domínio maléfico da sociedade que colocam a Maçonaria como protagonista. Poderia ser a Maçonaria ou qualquer outro grupo que no imaginário coletivo tivesse sua imagem relacionada a segredo e poder.

Ainda mais quando temperada por uma pitada de suposta ameaça espiritual. Poderia ser o Governo da China, os Extraterrestres, qualquer um. A questão aqui não é o protagonista, mas o conjunto de elementos que ele representa. E a Maçonaria se tornou a bola da vez, talvez até por ter sido mais fácil encontrar imagens de Bolsonaro nesse ambiente do que conversando com Xi Jinping em uma sala fechada em uma reunião fora da agenda oficial, por exemplo.

Vou concluir com algumas frases de Eco em relação ao poder do segredo, do mistério, descrito em seu livro “Os limites da interpretação”: … “O segredo confere a quem o possui uma posição de exceção e opera como uma forma de atração determinada por puras razões sociais…. (A importância do segredo) é fundamentalmente independente de seu conteúdo, mas será, certamente, tanto mais eficaz quanto mais vasta e significativa for a sua posse exclusiva… Do segredo, (aquele) que envolve em sombra tudo o que é profundo e significativo, nasce o erro típico de considerarmos como importante e essencial tudo o que for misterioso” (Umberto Eco).

Karen Gimenez é mestre em Comunicação, jornalista com pós-graduação em Estratégia Empresarial e geógrafa. É professora de pós-graduação da Universidade Paulista, pesquisadora associada do Núcleo de Apoio à Cultura e Extensão – Escola do Futuro da Universidade de São Paulo; facilitadora convidada do Sebrae-SP e consultora em Comunicação, Gerenciamento de Crises e Programas de Desenvolvimento. Ativista na luta contra a desinformação, mantém dois perfis nas redes sociais orientando como não cair em fake news ou teorias da conspiração (instagram @ecos.conspiratorios e twitter @conspiratorios) O conteúdo deste artigo é de cunho pessoal e não representa qualquer posicionamento das instituições para as quais a autora trabalha.

 

 

 

 

 

 

 

 

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A educação financeira e o machismo https://canalmynews.com.br/voce-colunista/a-educacao-financeira-e-o-machismo/ Wed, 07 Dec 2022 20:05:07 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=34829 Questão do machismo não é abordada com frequência em discussões sobre educação financeira

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Cada vez mais o tema educação financeira se torna pauta das redes sociais. Influenciadores ganham espaço mostrando que aprender a lidar com o dinheiro vai bem além da conta básica de gastar menos do que se ganha. A chamada economia comportamental – que atrela questões emocionais à gestão do dinheiro ganha força e com razão, pois muito da nossa gestão financeira vem da gestão das emoções. Quando digo “nossa” falo do grupo que ganha o suficiente ou mais do que o suficiente para manter suas necessidades básicas, pois temos uma parcela considerável do país que não sabe se terá condições de comer amanhã.

Mesmo dentre esses influenciadores que trazem a questão comportamental para as finanças – e tem muita gente boa fazendo isso – vejo que um tema específico não aparece com relevância (pode até ser que apareça e que eu tenha pesquisado menos do que deveria). Esse tema é o machismo e seus impactos na vida financeira de uma família. 

Vou contar um caso que ilustra a relevância de trazer esse tema à tona.  Não sou educadora financeira (inclusive aprendi a gerir bem meu dinheiro há poucos anos), mas como já fiz alguns cursos de economia comportamental, há cerca de dois anos um cliente me pediu ajuda para lidar com um funcionário. A história é real, só vou trocar os nomes. Vamos chamá-lo de Marcelo. Aos 40 anos, Marcelo trabalha em uma empresa de médio porte em um cargo de coordenação na área operacional. Casado, dois filhos e renda mensal de quase cinco salários-mínimos. Não paga aluguel, pois construiu uma casinha nos fundos da casa dos pais.

Marcelo tem um sedan médio com alguns anos de uso, valendo por volta de 80 mil reais. A esposa não trabalha e os colegas de trabalho de Marcelo se referem a ela como “madame” pois toda semana vai ao cabeleireiro, frequenta o shopping e faz questão de viajar nas férias e “ganhou” um carro do marido. Marcelo está endividado. E muito. Já “pediu para ser mandado embora”, gastou a indenização e o FGTS, foi recontratado em outro CNPJ do mesmo grupo e está pedindo o segundo empréstimo para a empresa.  Uma situação recorrente nos quase 20 anos em que trabalhei nesse meu cliente.

Foi na segunda solicitação de empréstimo – com o primeiro ainda não totalmente pago – que meu cliente pediu para eu entrar em ação e aplicar os meus poucos conhecimentos de economia comportamental para que Marcelo fosse “mais firme com a madame” que “exige” tanto. Vamos chamar a suposta “madame” de Soraia. Na primeira conversa com Marcelo, vi que Soraia não tinha nada de “madame”.  Ela simplesmente não sabia da situação financeira do marido porque Marcelo escondia dela até o quanto ganhava. Para Soraia, o estilo de vida da família era totalmente compatível com o salário de Marcelo.

Foram várias conversas até convencer Marcelo que ele não deixaria de ser “homem” se Soraia soubesse o quanto ele ganhava de verdade e que todas as semanas o casal se sentasse para analisar uma planilha de gastos. Que Soraia continuaria bela mesmo com uma visita mais espaçada ao cabeleireiro. E que os meninos já não eram tão pequenos assim, então Soraia poderia trabalhar, já que eles moravam no mesmo terreno dos pais de Marcelo e os filhos poderiam ficar com a avó ao voltarem da escola.

Marcelo foi bem resistente, pois além de ter de assumir sua real condição dentro de casa, como nos encontros de família ele poderia dizer que naquele ano eles não passariam férias no Nordeste? Afinal ele era o irmão mais velho então deveria ser o mais bem sucedido. Como encarar que a irmã dois anos mais nova poderia ter um salário maior que o dele? Se fosse um irmão mais novo ainda vai, mas a irmã?

Conversa daqui, conversa dali, Marcelo resolveu abrir o jogo com Soraia. Ela, além de acolher imediatamente o marido, arrumou um emprego em uma movimentada loja menos de um mês depois. Acabei conhecendo Soraia por acaso, já que é uma loja que eventualmente frequento. Ela me contou que estava feliz com o emprego e parecia mesmo. Menos de um ano depois não vi mais Soraia na loja. Pode ter arrumado outro emprego, pensei.

Passados quase dois anos desse caso, há cerca de dois meses meu cliente me chamou novamente para falar sobre Marcelo. Ele fora promovido na empresa – com salário agora um pouco maior do que seis salários-mínimos – e mesmo assim estava mais endividado que nunca. O dono da empresa se recusava a dar mais um empréstimo já que novamente havia sido feita a “jogada da demissão” para o recebimento do FGTS e do auxílio-desemprego e que novamente já havia um empréstimo em dívida. Soraia – que tem o ensino médio e nenhuma capacitação profissional – havia parado de trabalhar porque “o marido considerou que ela ganhava pouco” então era melhor “ficar em casa, pois ele poderia dar conta”. 

A conversa semanal do casal com a planilha de gastos em mãos não durou seis meses. O patrão de Marcelo passou a temer que ele recorresse a um agiota, o que é bem provável que aconteça. Sugeri ao patrão de Marcelo que desta vez não focasse na educação financeira, mas custeasse um psicólogo ou grupo de apoio, pois não há educação financeira que derreta o machismo arraigado. Pode não derreter, mas a economia comportamental precisa aprender a detectar e trazer esse assunto para o debate.

*Karen Gimenez é mestre em Comunicação, jornalista com pós-graduação em Estratégia Empresarial e geógrafa. É professora de pós-graduação da Universidade Paulista, pesquisadora associada do Núcleo de Apoio à Cultura e Extensão – Escola do Futuro da Universidade de São Paulo; facilitadora convidada do Sebrae-SP e consultora em Comunicação, Gerenciamento de Crises e Programas de Desenvolvimento para empresas e instituições. O conteúdo deste artigo é de cunho pessoal e não representa qualquer posicionamento das instituições para as quais a autora trabalha.

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Perguntas nada inocentes https://canalmynews.com.br/voce-colunista/perguntas-nada-inocentes/ Tue, 13 Sep 2022 11:19:44 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=33679 Semana passada, vi em diversos perfis o lançamento de uma enquete sobre se a tentativa de assassinato da vice-presidente da Argentina, Cristina Kischner teria sido real ou armação.

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De uns tempos para cá venho notado, principalmente no twitter – a rede social com a qual mantenho a relação mais ambígua de amor e ódio – um número crescente de enquetes. Enquetes essas com pedidos de opinião relacionadas a assuntos sobre os quais opinião é a última coisa que faria algum sentido. Semana passada, vi em diversos perfis o lançamento de uma enquete sobre se a tentativa de assassinato da vice-presidente da Argentina, Cristina Kischner teria sido real ou armação.

O lançamento de dúvidas sobre acontecimentos semelhantes não é novidade. A facada que atingiu o presidente Jair Bolsonaro durante a campanha de 2018 foi motivo até de um documentário dizendo que ali poderia haver uma armação. Na época do atentado (setembro2018), uma série de postagens alegava uma suposta inveracidade no acontecimento, pela ausência de sangue aos borbotões. As postagens em relação à facada, além de serem mais explicitas sobre uma suposta encenação eram claramente feitas por militantes – robôs ou não – de opositores do atual presidente. Diferentemente das tais “enquetes”, as postagens deixavam claro o que pensava quem postava.

No caso de Cristina e outros mais recentes, vejo uma mudança na estratégia discursiva que pode ser mais perigosa e ter consequências mais graves, pela sutileza com a qual se apresenta. São as supostas postagens isentas, “eu só fiz uma pergunta”. Enquanto a negação da facada no presidente vinha claramente da oposição e de maneira quase sempre explícita – ou ao menos sugerida -, a estratégia de manipulação mais recente se utiliza do próprio interlocutor, daquele que recebe a mensagem, como instrumento do processo manipulatório.

Com a sofisticação do modus operandi, o processo de manipulação se torna mais sutil e, justamente por isso, tende a ser mais eficaz, pois é absorvido de maneira menos perceptível. Afinal, aquele que foi manipulado acredita que formou sua opinião pensando por si só.

Vou tomar aqui novamente como exemplo o caso da vice-presidente da Argentina, mas é possível encontrar essa mesma estratégia de comunicação em outros assuntos tão complexos quanto este. Ao percorrer a timeline do twitter deparei com uma “inocente enquete”: Você acha que o atentado contra a vice-presidente da Argentina foi real ou fake? Votação aberta.

Uma pergunta dessas para a população em geral – que de perita criminal não tem nada – é quase como questionar se é melhor usar liga de aço, alumínio ou titânio para soldar um foguete na atmosfera de Marte. Ou seja, uma pergunta que implica em conhecimento técnico para poder responder, e que a “opinião” aqui de nada vale. Quem investiga e diz se houve ou não uma tentativa real de assassinato e por que motivo – felizmente – não foi bem-sucedida são os peritos da polícia. Gente técnica e preparada para isso.

Seriam então inofensivas tais enquetes nas redes sociais e devemos simplesmente não dar a mínima atenção para a sua existência?  Quando olhamos para essas questões sob a óptica da estratégia discursiva e da manipulação, elas não são tão aleatórias. Muito menos inocentes e menos ainda querem saber a “opinião” das pessoas. Essa não é uma estratégia para saber a opinião das pessoas. É para formar a opinião das pessoas.

A hipótese mais inocente que se pode cogitar ao encontrar esse tipo de pergunta lançada ao vento seria uma tentativa de o influenciador não ser “cancelado”. Ele teria sua versão da história, mas quer testar a aceitação de levá-la a público. Pode acontecer, mas tende a ser incomum. A probabilidade maior é que esse que lança a pergunta tem sim uma intenção clara de levar seu interlocutor a uma resposta específica. Ele não quer saber o que o seu interlocutor pensa. Quer incentivá-lo a pensar de determinada maneira.

Voltemos ao caso Cristina Kischner e a pergunta lançada no twitter se o atentado teria sido real ou forjado. Vamos analisar por que essa construção discursiva pode ter mais força no poder de manipulação do que o lançamento de uma suspeita, como foi feito a partir da ausência de sangue no atentado a Bolsonaro.

O elemento fundamental na estratégia discursiva da pergunta supostamente isenta é o empoderamento de quem a responde. Quando uma postagem insinua que há indícios de uma simulação no atentado à Bolsonaro, aquele que profere a mensagem já coloca uma opinião mesmo em forma de suspeita e convida o interlocutor a aderir a ela. Traduzindo, seria algo como: siga-me, eu comando essa narrativa e você me segue. Quando a pergunta é simplesmente lançada como se aquele que posta estivesse em dúvida, a relação de poder se inverte. Quem recebe a mensagem vai dar o tom da conversa ao responder.

Mas e aqueles que respondem que o atentado foi real? Esses não importam para quem faz a pergunta. São os mesmos que não deram atenção às insinuações sobre a falta de sangue na facada. Ou seja, gente que não vai cair no processo manipulatório com facilidade. Não é essa parcela que aquele que lançou a “enquete” está buscando.

A posição de suposta humildade – “eu não sei, estou apenas perguntando” – por parte de quem lança a ideia funciona como um imã para aqueles que facilmente aderem a uma teoria da conspiração. Aquele que responde “foi fake” não percebe que até então havia apenas uma versão da história: o atentado à vice-presidente da Argentina realmente aconteceu e foi devidamente documentado.

Quem criou a “outra possibilidade” foi aquele aparentemente isento que lançou a pergunta. E quem responde acredita que a sua opinião pessoal e leiga tem mais valor do que realmente tem. Que ele pensou por si próprio, pois não lhe foi lançada uma ideia, lhe foi feita apenas uma pergunta. Ele foi consultado e com isso se sente valorizado.

Sentindo-se empoderado – e não manipulado – aquele que responde “foi fake” tem grande possibilidade de levar o assunto para a sua própria rede, assinando em baixo com a sua opinião e isentando aquele que verdadeiramente plantou a ideia, caso haja futuras polêmicas ou desdobramentos. Aquele que lançou a pergunta fica só olhando a “briga” acontecer nos comentários, vendo seu intuito de lançar a teoria da conspiração se concretizar, sem qualquer comprometimento da sua parte.

E por que cada vez mais queremos dar opinião sobre tudo? Estudiosos de diversas áreas apontam as razões. Vamos tratar disso em um outro texto.

 

*Karen Gimenez é mestre em Comunicação, jornalista com pós-graduação em Estratégia Empresarial e geógrafa. É professora de pós-graduação da Universidade Paulista, pesquisadora associada do Núcleo de Apoio à Cultura e Extensão – Escola do Futuro da Universidade de São Paulo; facilitadora convidada do Sebrae-SP e consultora em Comunicação, Gerenciamento de Crises e Programas de Desenvolvimento. Ativista na luta contra a desinformação, mantém dois perfis nas redes sociais orientando como não cair em fake news ou teorias da conspiração (instagram @ecos.conspiratorios e twitter @conspiratorios) O conteúdo deste artigo é de cunho pessoal e não representa qualquer posicionamento das instituições para as quais a autora trabalha.

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Como reconhecer um discurso negacionista https://canalmynews.com.br/voce-colunista/como-reconhecer-um-discurso-negacionista/ Wed, 27 Jul 2022 10:49:51 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=32143 Uma das “artimanhas” utilizadas pelos negacionistas da ciência é tentar fazer com que seus discursos tenham cara de ciência. Apresentam números, comparativos e citam experiências.

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O nome é complicado e até parece “chique”: camuflagem objetivante. Expressão criada pelo linguista lituano erradicado na França, Algirdas Julius Greimas, essa tal de “camuflagem objetivante” é um dos elementos que mais engana o cidadão comum quando este se depara com um discurso negacionista. Usada exaustivamente durante a pandemia da Covid-19 para tentar justificar medidas que a CPI revelou como bem mais políticas do que científicas, busca dar uma aparência de ciência algo que não tem qualquer relação com ela. E, na correria do dia a dia, vez por outra acabamos caindo na armadilha.

Uma das “artimanhas” utilizadas pelos negacionistas da ciência ao estruturar seus argumentos é justamente tentar fazer com que seus eles tenham cara de ciência. Alguns discursos negacionistas apresentam números, comparativos, citam experiências, trazem até nomes de instituições a tiracolo para dar legitimidade, aproveitando que a maioria da população não é versada em temas muito técnicos. É a tal “camuflagem objetivante”, que Greimas detectou em seus estudos linguísticos. Disfarçar de ciência algo que não é científico pode parecer um contrassenso, mas funciona quando a ideia é confundir.

E muitas vezes eles conseguem o intento porque o resultado à primeira vista parece confiável. E agora? Como aquele que não é cientista ou pesquisador consegue separar o joio do trigo sem precisar entrar em uma maratona acadêmica?

Se por um lado alguns negacionistas se portam como bufões ou personagens de histórias apocalípticas claramente improváveis, outros são bons no que fazem e levam mais tempo para ser descobertos. Tomar alguns cuidados nem sempre garante que vamos escapar de todas as armadilhas, mas ajuda a fazer um bom filtro.

Como vimos há pouco o fato de ser um texto objetivo, racional, impessoal, com dados elencados de maneira lógica (a tal camuflagem objetivante) não é garantia de nada. A primeira providência que podemos tomar para evitarmos cair no conto negacionista, é tentar checar se há algum desmentido sobre o que é apresentado. É uma tarefa relativamente fácil, mas dá um pouco de trabalho.

Ou procura-se diretamente um serviço gratuito de checagem – Agência Lupa, Aos Fatos, Fato ou Fake, Boatos.org são alguns exemplos – ou uma simples busca no Google com os termos corretos já ajuda.  Exemplo: cloroquina + covid + mentira ou cloroquina + covid + informação falsa ou ainda cloroquina + covid + checagem, dentre outras combinações que podem ajudá-lo a encontrar o contraponto da informação que chegou até você pelo grupo de whatsapp da família.

Fazer uma busca pelo nome do autor da afirmação, pela instituição que ampara a informação, bem como a credibilidade do veículo que a publicou é outra medida que ajuda a detectar fraudes ou conteúdo negacionista. Ter um doutorado não é garantia de conhecimento sobre um determinado assunto. Vimos muito isso na CPI da pandemia com médicos de especialidades bem distantes da infectologia apoiando indicações comprovadamente não eficazes e se agarrando ao título de médico, como garantia técnica. Antes de dar aval para a fonte veja o que ela fez antes daquela publicação: se essa fonte tem um histórico profissional que possa colocá-la na posição de especialista especificamente no assunto em questão

Não se deixe impressionar por aval de associações. Algumas são criadas especificamente para tentar dar importância para algum conteúdo. Qualquer pessoa pode abrir um CNPJ com o nome de Associação Internacional de alguma coisa, sem que isso tenha qualquer chancela técnica. Até os terraplanistas criaram, há alguns anos, uma “associação de técnicos e pesquisadores” que tenta se apresentar como um instituto de pesquisa. Por isso, checar a idoneidade da associação que supostamente banca a informação ajuda também. Dá para fazer pelo Google.

Outra dica é desconfiar de quem publica, principalmente quando é algum veículo do qual você nunca ouviu falar. Será que se fosse uma descoberta científica tão relevante assim, ela não estaria presente em pelo menos alguns veículos de grande alcance, que tem equipes de reportagens espalhadas pelo mundo, correndo 24 horas por dia atrás de notícias?

Outro alerta que pode indicar um texto negacionista é quando encontramos termos muito genéricos. Pesquisas dizem, cientistas afirmam sem mostrar exatamente que cientista e de onde ele é são sinais muito claros de que se deve ficar com um, ou até com os dois pés atrás.

Afirmações muito impactantes vindas de alguma fonte não convencional também podem ser consideradas sinais de alerta. São os chamados clickbaits. Frases como: “tudo o que o seu professor escondeu de você” ou “o tratamento que a indústria farmacêutica não quer que você saiba”. Sabemos que a ciência é dinâmica e eventualmente surgem descobertas que alteram os rumos, mas isso dificilmente é feito por um cidadão comum. A ciência tem método e checagem. Qualquer possível descoberta precisa ser testada, analisada por pares, revisada várias vezes antes de ser validada. E mesmo assim ainda acontecem erros. Não é porque a dor de cabeça do seu vizinho foi embora depois que ele comeu um matinho estranho, que os analgésicos perderam a validade.  O mais provável é que a dor de cabeça se dissiparia por si só com ou sem a degustação do tal matinho.

Uma outra armadilha perigosa é o que eu chamo de “apelo à concretude”. São aqueles argumentos ou associações simplórias que em um primeiro olhar parecem tão lógicos, do estilo porque não pensei nisso antes, mas que, na verdade, estão tentando desestruturar pensamentos complexos, compostos de muitas camadas além da superfície.

No auge da Covid-19 esses apelos apareceram, por exemplo, por aqueles que se posicionavam contra o uso das máscaras. Um dos argumentos mais comuns era o de supostos malefícios causados pelo uso de máscara, devido a parte do ar ficar retida no equipamento gerando uma certa umidade após muito tempo de uso.

Depois do uso da máscara por um certo período conseguimos sim notar concretamente uma tendência à umidade nela. Essa percepção pode levar a um receio imediato porque aquela possível umidade é algo concreto, conseguimos ver. Mas daí a afirmar que a máscara não deve ser usada ou que traz algum malefício, há toda uma complexidade técnica que a grande maioria de nós não consegue compreender. Até mesmo porque o processo de transmissão de uma doença conta com uma série de elementos não visíveis e dos quais nunca ouvimos falar e que não sabemos como se relacionam. Só que a umidade na máscara é visível, é concreta, e por isso torna o argumento dos negacionistas atrativo (acredito no que eu vejo)

Nesse conjunto estão também as exceções tomadas pelo todo.  São associações como: uma pessoa pegou covid e foi hospitalizada mesmo depois de ter tomado três doses de vacina, então isso seria uma prova que a vacina não tem efeito.

Eu classificaria o “apelo à concretude” e as exceções tomadas pelo todo dentre os elementos mais poderosos do discurso negacionista. Porque eles nos dão a irreal sensação de poder, de sapiência, de que conseguimos enxergar algo, de que temos domínio sobre temas dos quais não temos a mínima noção, mas que pela superficialidade das associações nos parecem luminosos. Quando lhe vier à mente uma conclusão rápida sobre algo que muita gente estuda há anos e não conseguiu chegar a um resultado, desconfie de si mesmo.  A história tem mentes brilhantes que enxergaram coisas que ninguém viu. Mas mesmo esses iluminados antes de saírem gritando “eureca” pesquisaram, utilizaram métodos e colocaram suas conclusões a severas avaliações por pares.  E a maioria absoluta de nós, é composta por cidadãos comuns.

Se tudo isso pareceu dar muito trabalho, tem uma opção mais simples para fugir do negacionismo: não compartilhe e desconfie sempre.

 

*Karen Gimenez é mestre em Comunicação, jornalista com pós-graduação em Estratégia Empresarial e geógrafa. É professora de pós-graduação da Universidade Paulista, pesquisadora associada do Núcleo de Apoio à Cultura e Extensão – Escola do Futuro da Universidade de São Paulo; facilitadora convidada do Sebrae-SP e consultora em Comunicação, Gerenciamento de Crises e Programas de Desenvolvimento para empresas e instituições. O conteúdo deste artigo é de cunho pessoal e não representa qualquer posicionamento das instituições para as quais a autora trabalha.

 

Para saber mais:

DA EMPOLI, Giulliano. Os engenheiros do caos. 1ª ed. São Paulo: Vestígio 2019. Edição do Kindle.

D’ANCONA, Mattew. Pós-verdade – A nova guerra contra os fatos em tempos de fake news. 1ª ed. Barueri: Faro Editorial, 2018.

GIMENEZ, Karen. A DESCRENÇA NO DISCURSO DA CIÊNCIA: A teoria da conspiração no discurso da Terra plana. Dissertação de Mestrado – Universidade Paulista (Unip). Fevereiro 2022. Disponível em: https://www.slideshare.net/KarenGimenez2/a-descrena-no-discurso-da-cincia-a-teoria-da-conspirao-no-discurso-da-terra-plana

FAUSTINO,Marco, PACHECO, Priscilla. Ao defender ‘tratamento precoce’, Heinze falseia fatos e distorce dados na CPI da Covid-19. Aos Fatos agência de checagem. 2/06/2021. Disponível em: https://www.aosfatos.org/noticias/ao-defender-tratamento-precoce-heinze-falseia-fatos-e-distorce-dados-na-cpi-da-covid-19/. Acesso: 10/08/2021

FIORIN, José Luiz. As astúcias da Enunciação, 3a. ed. São Paulo: Ed. Contexto, 2016

FIORIN, José Luiz. Elementos da Análise do Discurso. 15a ed.São Paulo: Contexto, 1989

GREIMAS, Algridas Julien. Sobre o Sentido II. 1ª ed. São Paulo: Edusp, 2014

GREIMAS, Algridas Julien. COURTES, J. Dicionário de Semiótica. 2a ed. São Paulo: Contexto, 2014

 

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A conspiração nossa de cada dia https://canalmynews.com.br/voce-colunista/a-conspiracao-nossa-de-cada-dia/ Fri, 22 Jul 2022 16:21:37 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=31992 Além dos aspectos discursivos, há questões sociopolíticas, comportamentais e educacionais que tornam uma teoria da conspiração tão atraente. Até mesmo para quem busca comprovar antes de curtir ou compartilhar.

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Eu tenho. Você tem. Nossas mães têm. Nossos amigos também. Cada um tem a sua teoria da conspiração preferida. Aquela história que parece mal contada… que desconfiamos da versão oficial. Até porque conspirações existem e muitas levam anos até serem descobertas. Então, o que difere as conspirações reais das tais teorias da conspiração cada vez mais propagadas nas redes sociais? A diferença à primeira vista é sutil, mas coloca um limite importante em uma trincheira altamente perigosa. De maneira bastante simples podemos dizer que conspirações se resumem a dados e fatos emaranhados de forma complexa, descobertos a partir da conclusão de investigações, enquanto as teorias da conspiração são articulações criadas a partir da inclusão forçada de elementos fantasiosos em algo que é real.

As teorias da conspiração partem de algo real, o que ajuda a confundir tanta gente e acaba até mesmo enganando quem é bem-informado. Um acontecimento que pode ser comprovado ganha “acessórios” que, se olhados de maneira lógica, jamais se conectariam, mas que resultam em um emaranhado complexo e cheio de mistério. E por isso tão atrativo

O que faz tanta gente acreditar nas teorias da conspiração foi a pergunta que busquei responder ao longo do meu Mestrado, quando estudei o movimento terraplanista. Sim, eu fiquei dois anos consumindo (e analisando, claro) conteúdo terraplanista (imaginem o estrago que o algoritmo do Google fez na minha vida digital com isso…). A ideia inicial era estudar a estrutura discursiva das teorias da conspiração negacionistas da ciência (sim, há uma arquitetura específica das palavras para persuadir os incautos) mas, com o passar do tempo, a pesquisa foi além. Não dá para olhar essa estrutura do discurso sem entender o grande ecossistema ao redor dele. Eu poderia falar sobre o passo a passo de como se organizar um texto conspiratório, mas não é só isso que faz as teorias da conspiração terem tanto sucesso.

Além dos aspectos discursivos, há questões sociopolíticas, comportamentais e educacionais que tornam uma teoria da conspiração tão atraente. Até mesmo para quem busca comprovar antes de curtir ou compartilhar. A diferença é que pensamos dois minutos no que está ali, sentimos uma certa atração, depois colocamos o assunto de lado e tocamos a vida. Enquanto tem gente que vive em função das teorias da conspiração. Dentre os terraplanistas, por exemplo, há até uma economia paralela, como o próprio documentário A Terra é Plana, da Netflix, mostra. Algo como terraplanista compra de terraplanista.

Dos mais de 50 elementos que levantei ao longo da pesquisa que podem compor um ecossistema conspiracionista, trago aqui quatro deles dentre os que considero muito relevantes para entendermos o contexto atual.  Hoje não vou falar sobre o discurso em si, mas sobre o ambiente que propicia a aceitação de teorias conspiratórias, a partir dos estudos do psicólogo holandês Jan-Willen Von Prooijen e do semioticista Umberto Eco, mais conhecido no Brasil por seus romances do que por seus estudos acadêmicos.

Um dos elementos comportamentais mais fortes que leva muita gente a acreditar numa teoria conspiratória é o desejo de pertencimento. A necessidade ardente de fazer parte de um grupo, de criar vínculos que pareçam indestrutíveis, de se sentir envolvido em algo importante é uma porta de entrada para as teorias da conspiração. Isso porque, tais teorias são formadas por narrativas cheias de segredos que aqueles que se deixam seduzir por elas são induzidos a tentar descobrir. E para isso se unem criado fortes elos. É quase como um videogame em que o time se junta para tentar vencer a próxima etapa. E a próxima. E a próxima. E a próxima, sempre em busca de um segredo que nunca tem fim. Quanto mais se “joga”, mais se quer jogar.  Quanto mais se joga, maior é a sensação de fazer parte de algo importante, de se sentir incluído. E o vínculo criado com o grupo conspiratório ajuda no isolamento social, pois ninguém fora do grupo o entende mais. Nasce aí o medo de discordar, de questionar e, com isso, ser expulso, ser jogado novamente no mundo real. Algo semelhante ao visto em seitas religiosas.  Aqui, inclusive, ouso arriscar que o conteúdo não importa. Pode ser terraplanismo, antivacina, globalismo, ou o que for. Até mesmo porque acompanhado grupos conspiracionistas ao longo de mais de dois anos, notei que o que menos importa ali é o assunto sobre o qual se está falando, ou melhor, conspirando.

A transferência de responsabilidade – olhar para a própria vida e compreender tanto o contexto geral quanto a nossa quota de responsabilidade sobre os prejuízos que tivemos não é fácil para muita gente. É importante ressaltar que não estou falando da população vulnerável que sofre com desgovernos e tantas injustiças sociais. Foco da classe média para cima, que foi onde encontrei o maior número de teóricos da conspiração. Porque quem não sabe o que vai ou se vai comer amanhã provavelmente não “tem tempo” para pensar em conspirações.

É bem mais simples, dá menos trabalho e dói muito menos quando achamos alguém em quem colocar a culpa. Os teóricos da conspiração sabem disso. E esse é um outro elemento bastante atrativo nas teorias da conspiração. Afinal estamos em um mundo em que “há perigo em cada esquina”, em que há “muita gente poderosa tramando”. Daí, se algo dá errado, é muito mais fácil mostrar as maldades do globalismo, do Foro de São Paulo, do “fica em casa”, ou seja, lá o que for, do que parar, pensar e entender a conjuntura e qual é a nossa responsabilidade naquilo que não saiu como prevíamos. Ou até considerar que algumas coisas dão errado, simplesmente porque dão errado. A tentadora possibilidade de encontrar alguém a quem culpar e a sensação de alívio que isso traz faz com que a lógica fique em último plano e a teoria da conspiração venha para a superfície.

A necessidade de mostrar inteligência – o psicólogo Von Prooijen (2016-2017) defende fortemente a relação entre baixo nível de escolaridade e atração por teorias da conspiração. Eu acrescentaria a educação de baixa qualidade. A perigosa “educação bancária” cujos riscos foram alertados por Paulo Freire, voltada para o decorar em vez do pensar. Mergulhando nos grupos conspiratórios e analisando o dia a dia pessoas que são suscetíveis a teorias conspiratórias, dá para perceber que a simplificação do discurso promovida pelas teorias da conspiração é atrativa como um imã. Pessoas que, por baixo nível de escolaridade ou por escolaridade de baixa qualidade, sentem-se de alguma maneira inferiores diante da comunidade acadêmica, por exemplo, de especialistas ou de pessoas que se dedicam à leitura, à ciência ou a cultura em todas as suas formas.

As teorias da conspiração, por mais complexas que queriam parecer ser, costumam fazer associações simples, superficiais que fazem com que qualquer pessoa tenha a sensação de que compreendeu algo muito complexo (“se você olha para o mar na beira da praia e vê um horizonte reto, essa é uma prova que a Terra é plana…, olha só como você é esperto”), promovendo uma sensação de “revanche” por parte daquele que nunca se sentiu muito à vontade diante de grupos com pensamento mais crítico. Esse suposto “sentimento de inferioridade”, que também pode ser traduzido por algum tipo de desprezo ou revolta contra as instituições é um pavio curto diante de uma teoria da conspiração.

A concentração de todos os males em um problema único. Para os teóricos da conspiração, todos os problemas do mundo serão resolvidos se as vacinas forem abolidas, quando todas as pessoas se conscientizarem de que a Terra é plana ou quando o globalismo for derrotado. A concentração de todos os males em um problema único é uma maneira de projetar um futuro ideal para quem não consegue suportar um presente que considera catastrófico. Daí a forte emersão de teorias conspiratórias em momentos de instabilidade social, econômica ou política. É confortável – e às vezes um único fio de esperança – pensar que se um determinado inimigo for vencido, a vida passará a ser cor de rosa. É bem parecido com a tão frequente projeção da felicidade futura – vou ser feliz quando me formar, quando mudar de emprego etc. – nesses casos elevada à potência máxima.

Há diversos elementos além desses quatro que propiciam um ambiente conspiratório e eles não costumam agir isoladamente. A crença nas teorias da conspiração é algo que dificilmente será eliminado, mas quando conseguirmos compreender todos os nós desse emaranhado, talvez seja possível evitar que eles continuem se espalhando como um vírus mortal. Sim porque teoria da conspiração também mata.

 

*Karen Gimenez é mestre em Comunicação, jornalista com pós-graduação em Estratégia Empresarial e geógrafa. É professora de pós-graduação da Universidade Paulista, pesquisadora associada do Núcleo de Apoio à Cultura e Extensão – Escola do Futuro da Universidade de São Paulo; facilitadora convidada do Sebrae-SP e consultora em Comunicação, Gerenciamento de Crises e Programas de Desenvolvimento para empresas e instituições. O conteúdo deste artigo é de cunho pessoal e não representa qualquer posicionamento das instituições para as quais a autora trabalha.

Para saber mais:

DEMURU, Paolo. Caos, Teoria da conspiração e Pandemia. Acta Semiotica 1, 2021 Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/actasemiotica/article/view/54178/35278.

ECO, Umberto, Apocalipticos e Integrados. Madri: Editorial Lumen, 1984

ECO, Umberto. Os limites da interpretação 2ª. Ed. São Paulo: Perspectiva, 2015. Edição do Kindle

GIMENEZ, Karen. A DESCRENÇA NO DISCURSO DA CIÊNCIA: A teoria da conspiração no discurso da Terra plana. Dissertação de Mestrado – Universidade Paulista (Unip). Fevereiro 2022. Disponível em: https://www.slideshare.net/KarenGimenez2/a-descrena-no-discurso-da-cincia-a-teoria-da-conspirao-no-discurso-da-terra-plana

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 4. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

PROOIJEN, Jan-Willen., VUGT, Mark, Conspiracy Theories: Evolved Functions and Psychological Mechanisms in Perspectives on Psychological Science, 2018, Vol. 13(6) 770–788 Disponível em: http://dx.doi.org/10.1177/1745691618774270

PROOIJEN, Jan Willem – Why Education Predicts Decreased Belief in Conspiracy Theories – Appl Cogn Psychol. 2017 Jan-Feb; 31(1): p. 50–58. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1002/acp.3301

PROOIJEN, Jan Willem. DOUGLAS, Karen M. – Belief in conspiracy theories: Basic principles of an emerging research domain  – European Journal Social Psychology. 2018 Dec; 48(7): p. 897–908. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1002/ejsp.2530.

PROOIJEN, Jan Willem. DOUGLAS, Karen M. Conspiracy theories as part of history: The role of societal crisis situations – Memory Studies – 2017, Vol. 10(3) p. 323–333 – Acessível em http://dx.doi.org/10.1177/1750698017701615.

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