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“O excesso de habilidade provoca uma ilusão nos investidores, e é uma cultura arraigada no mundo do mercado financeiro”. Quem joga essa verdade na roda não é um qualquer, mas Daniel Kahneman, referência mundial em economia comportamental. Quanto mais qualificado, mais o investidor que opera day trade — ou seja, compra e venda de ativos no mesmo dia — , acredita que vai conseguir vencer o mercado ao longo do tempo. Mas poucos conseguem.

Mais precisamente 3%, segundo uma pesquisa da Fundação Getulio Vargas (FGV) em parceria com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), cada vez mais atenta à atividade que promete ganhos graúdos sem pegar no batente. Promessa que quase sempre passa longe de se concretizar.

Adotar a “profissão day trader” trabalhando da praia ou de qualquer lugar do mundo, no que agora se cunha como ser um “nômade digital”, é uma tendência notável: em comparação com 2019, houve um crescimento de 50% no número de pessoas que realizaram pelo menos uma operação dessa natureza em 2020. Segundo a CVM, somente no Brasil hoje são cerca de 300 mil traders.

Essa prometida liberdade de ir e vir, não bater ponto e ainda ter uma atividade que pague muito melhor do que empregos formais foi o que impulsionou o cientista de dados José Carlos Bezerra Filho, 31, a embarcar no day trading. E ele não é exatamente um aventureiro: ainda adolescente, aos 16 anos, começou a ler e pesquisar sobre o assunto (sem nenhum incentivo em casa, apenas curiosidade pelo mundo de Wall Street, que via nos filmes). Aos 18, abriu conta em uma corretora de valores quando o assunto ainda era muito mais restrito. “Com 19 anos, já na faculdade, fiz a prova da CVM, passei e comecei a trabalhar como assessor de investimentos”. Atuou em grandes corretoras e chegou a ser sócio em uma, no ramo de seguros.

Com 26 anos, começou a idealizar um estilo de vida diferente, de poder viver em vários lugares num mesmo ano e, pela experiência no setor financeiro, veio à cabeça virar trader.

Começou a empreitada em 2016 operando contratos de dólar (feitos por meio dos contratos “cheios” ou minicontratos). Operava três por mês, e tirava cerca de R$ 6 mil — valor bem considerável se levarmos em conta o rendimento do brasileiro, que foi de R$ 2.308 em média no ano de 2019, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Ao seu lado, José viu pessoas chegarem a cifras de R$ 40 mil mensais. Sentiu-se seguro para “aumentar a mão”. “Você ganha a confiança, vem a ganância” sentencia. Foi aí que ele começou a perder dinheiro e a entrar no que ele define como uma “bola de neve”.

“Você perde R$ 5 mil num dia, no outro se sente um lixo. No desespero de recuperar, perde mais. Eu saí dessa aventura com uma dívida que eu achei que nunca conseguiria quitar na minha vida”. O montante chegou a R$ 250 mil. E o patrimônio que ele tinha conquistado lá atrás, começando a investir cedo, se esvaiu.

Day trade promete ganhos que quase nunca se concretizam: José Bezerra, que perdeu dinheiro como trader
José Bezerra, que perdeu dinheiro como trader.
(Foto: arquivo pessoal)

Fora as perdas econômicas, vieram também as emocionais: em depressão, ele precisou fazer tratamento psiquiátrico e psicológico, e retornou ao mercado formal de trabalho. “Mas aprendi tanto que valeu a pena”, fala o cientista de dados. Tanto que não ficaram traumas: ele pretende, um dia, voltar a ser trader.

“A primeira coisa se, eu pudesse voltar lá atrás, era ter acompanhamento psicológico sempre, para evitar o looping da perda e saber quando parar. Na época, eu fui com 100% do meu patrimônio. Hoje, eu iria com 30%”, pondera.

Atividade arriscada

O objetivo da prática de day trade é que o investidor obtenha lucro pela oscilação intradiária de preço de um ativo financeiro: o lucro é proveniente da venda por um preço maior do que o da compra. As operações ocorrem no mercado à vista (ações) ou derivativos (contratos futuro de dólar e índices da bolsa de valores). O maior desafio é acertar o timing do mercado, ter consistência de lucro no longo prazo e estudar muito as teorias de análise técnica (que se baseia na análise gráfica), e na fundamentalista (que analisa os aspectos econômicos e financeiros da empresa, o valuation).

“De partida, já é uma atividade desfavorável para uma pessoa física operando de casa, da praia. O timing é uma questão de segundos. Há os chamados high traders, que têm a informação mais rápido, e os grandes bancos, que pagam algoritmos de negociação. As pessoas estão disputando em um jogo muito desigual” salienta o economista Fernando Chague, da Fundação Getúlio Vargas. Junto com Bruno Giovanetti, ele é autor do estudo que que analisou os resultados de day trade em ações de 93.378 pessoas no Brasil, que começaram entre 2013 e 2016, e operaram até 2018. Deste montante, apenas 127 indivíduos apresentaram lucro bruto diário médio acima de R$ 100 por mais de 300 pregões.

A pesquisa dos economistas aponta ainda que 99% das pessoas não persistiram na atividade, com menos de 300 pregões em day trading. Logo, a prática, neste caso, não leva à perfeição (ao contrário de outros trabalhos onde, via de regra, se evolui com o tempo). A sorte costuma ser a maior aliada nos casos bem-sucedidos, pela natureza da atividade,

“No primeiro dia você ganha R$ 100 em uma hora, e a euforia te faz achar que vai ganhar dinheiro rápido. Mas o mercado é volátil, sobe e desce muito rápido. O patrimônio pode virar pó em um dia”, diz a especialista em investimentos da Magnetis, Rafaela Silveira.

Expectativa de grandes ganhos sem sair de casa a partir do day trade quase nunca se confirma
Expectativa de grandes ganhos sem sair de casa a partir do day trade quase nunca se confirma.
(Foto: Pixabay)

Vida fácil?

O fenômeno dos traders não é específico do Brasil: a ilusão de que basta esforço e estudo sobre o tema e que irá se ganhar muito dinheiro em pouco tempo é atraente – e vendável. A profusão de youtubers que começaram a falar de educação financeira trouxe também influenciadores focados especificamente em day trade, que começaram a vender cursos e apresentar promessas de lucro muito acima do que se consegue em um perfil de investidor que diversifica a sua carteira entre renda fixa e variável.

Recentemente, ficou famoso o caso do investidor Vinicius Loureiro Ibraim, que negociava títulos ao-vivo em lives transmitidas durante o pregão da Bolsa de Valores Brasileira (B3), e vendia rentabilidade de até 10% ao mês. Tudo isso sem nenhum registro na CVM. Em situações como essa, a Comissão costuma soltar alertas ao mercado, o chamado “stop order”, como uma medida de cautela quando uma pessoa está operando por outros sem certificação ou autorização, ou de empresas não autorizadas a funcionar no mercado.

“Acima de 10% ao mês é muito alto. Se o Warren Buffett, que é o maior investidor do mundo, tem uma carteira que rende 20% ao ano, como vou ter isso em um mês? Isso não existe” adverte a especialista em finanças Carol Dias, fundadora do canal Riqueza em Dias, no YouTube.

“A pergunta que mais escuto é: o que preciso fazer para ter R$ 1 milhão? O que enriquece a gente é trabalhar e potencializar os investimentos para, em um momento da vida, ficar confortável e viver de renda. Não existe enriquecer em poucos dias. São promessas inadmissíveis. Ninguém aprende a mexer na bolsa de valores em três dias”, completa.

Carol crê ainda que a abordagem desses influenciadores vêm em um péssimo momento, em que as pessoas estão mais vulneráveis e apreensivas para ganhar dinheiro. “É uma hora importante de falar de educação financeira, para o brasileiro ter reserva de emergência nesse momento delicado que estamos passando. E tem pessoas ensinando a perder dinheiro, infelizmente”. Investidora há 10 anos, ela não indica nem faz day trade. “Acho difícil acertar o timing. Enriquecer é uma jornada. Sempre alerto, cuidado. Dinheiro não é parque de diversão”.

E quem quer arriscar?

Para quem deseja experimentar este mercado, a CVM orienta, primeiramente, que o investidor estude muito sobre as teorias de análise técnica. Em resumo, o day trade funciona da seguinte forma: escolher uma corretora de valores, abrir uma conta, efetuar depósito de margem operacional, escolher o mercado que quer operar (à vista ou derivativos), abrir o home broker, seguir uma metodologia, efetuar a operação e realizar o lucro ou prejuízo.

Rafaela Silveira, da Magnetis Investimentos, explica que esse último ponto é um dos mais importantes: o stop game e stop loss. “Anote todos os dias em suas operações”.

Ela exemplifica. “Se você compro uma ação a R$ 5, esse é o ponto de entrada. Se acredito que ela vá subir a R$ 7,20, esse é o momento que eu devo parar, executar a ordem e não ficar esperando mais um pouco para ver se vai subir. Nesta hipótese, a perda seria de R$ 4. Se ela bater esse valor, tenho que sair e aceitar a perda”.

Outra medida é limitar um porcentual do patrimônio para a atividade. “Para nossos clientes, indicamos que seja no máximo de 5%”, aponta a especialista.

A dedicação é outro aspecto fundamental. O ex-trader José Bezerra fala que é impossível operar enquanto trabalha em um emprego formal, por exemplo. E, mesmo com todos os conhecimentos, técnicas, análises e tempo, a propensão de perder, alerta Rafaela, é maior do que ganhar.

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Pressão por produtividade extrema leva a uso indevido de remédios e coloca saúde em risco https://canalmynews.com.br/mais/pressao-por-produtividade-extrema-leva-a-uso-indevido-de-remedios-e-coloca-saude-em-risco/ Tue, 12 Jan 2021 13:50:11 +0000 http://localhost/wpcanal/sem-categoria/pressao-por-produtividade-extrema-leva-a-uso-indevido-de-remedios-e-coloca-saude-em-risco/ Dependência física e química e risco maior de doenças cardíacas e vasculares estão entre as consequências

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produtividade acarreta uma série de riscos à saúde
Uso de remédios para aumento de produtividade acarreta uma série de riscos à saúde.
(Foto: Marcos Santos/USP Imagens)

É fato que vivemos em uma sociedade do desempenho: a alta produtividade é a regra. Pipocam por aí autores, youtubers e influencers que ensinam o “segredo” para trabalhar muito e dar conta de mil outras atividades e projetos, tudo isso acordando às cinco horas da manhã. A pressão, tanto a social quanto a imposta pelo próprio ambiente de trabalho, leva muita gente a privações de sono e descanso, que recorrem a substâncias que as ajudam a melhorar o rendimento, seja mental ou físico.

Um dos remédios mais populares para esse fim é o metilfenidato – vendido sob o nome comercial Ritalina, que tem boa indicação na infância e adolescência para crianças com Transtorno de Déficit de Atenção (TDAH).  Segundo a médica neurologista do Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Kristel Back Merida, o fármaco é utilizado desde a década de 1940 e é bem fundamentada na literatura a eficiência na infância e adolescência em pessoas diagnosticadas com o transtorno neurológico, caracterizado sobretudo pela desatenção, hiperatividade e dificuldade na aprendizagem.

Além da Ritalina, pessoas que buscam mais foco e concentração também partem para psicoestimulantes da classe de anfetamínicos. “São medicações que aumentam a disponibilidade de dopamina e noradrenalina e agem na parte frontal do cérebro, ativando mais concentração e a memória. Esse aumento vai se dar em outras áreas como a ínsula e a amígdala, associadas ao sistema de recompensa e prazer. Por isso, quando são usados de maneira indiscriminada e sem indicação correta, a pessoa pode ficar dependente”, explica a neurologista.

Psiquiatra do Sistema Único de Saúde (SUS) e membro da Associação Brasileira de Médicas e Médicos pela Democracia (AMB), Vera Prates conta que é comum adultos chegarem em seu consultório pedindo receita de Ritalina. “São pessoas com sobrecarga de tarefas, que trabalham durante o dia, estudam à noite, querem dar conta de tudo e não dormir. E elas queixam que não conseguem concentrar. O cérebro tem um limite que não condiz com essa sociedade que exige muito além do que a gente pode dar. De concorrência, de acumular empregos, tudo isso às custas da saúde da pessoa. O tratamento no caso da pessoa cansada é descansar, e não tomar ritalina”, salienta.

Assim como Kristel, a psiquiatra também afirma que há uma boa indicação do remédio na infância se realizado com acompanhamento e psicoterapia associada. “Proporciona uma melhora muito importante. A criança ou adolescente com TDAH que são tratados  terão muitos ganhos e costumam se restabelecer em um curto período de tempo”. Apesar de o DSM-4  prever recentemente que o TDAH também pode acometer adultos, a condição é raríssima, diz Vera. “Geralmente a pessoa tem uma patologia subjacente ou um padrão de vida que gera sintomas. Eu nunca fiz esse diagnóstico em idade adulta”.

O remédio como problema

Foi o que aconteceu com a empresária Paula Valadares Miranda Donato, 34 anos, diagnosticada erroneamente com TDAH já na idade adulta. Na época, o psiquiatra que a acompanhava receitou lisdexanfetamina, vendido comercialmente como Venvanse, geralmente utilizado como segunda escolha depois da Ritalina para o tratamento do transtorno. No início, conta Paula, o medicamento “a tirava da cama” e lhe dava foco e energia. Mas não demoraram a surgir outros sintomas como agitação e irritabilidade extrema. “Eu surtava, chegava até a querer bater nos outros. E custei a provar que o meu problema era o remédio”.

Mesmo com as queixas, o psiquiatra aumentou as doses, e ela chegou a tomar 140mg/dia (quando a dose máxima preconizada é de 70 mg). “Por conta própria fui procurar outos médicos, comecei a fazer terapia e parei. Minha vida melhorou muito, consegui voltar a conviver com o meu pai, o que era impossível antes por causa dos surtos e do nervosismo”, relata. 

Quando se fala do aumento do rendimento físico, os esteróides anabolizantes (derivados sintéticos da testosterona) e os termogênicos, são os mais utilizados. Outra substância da moda é o GH, hormônio de crescimento que diminui consideravelmente na idade adulta, mas vem sendo usado de maneira frequente por pessoas que procuram ganhos sobretudo estéticos com a prática de atividade física.

“Nosso corpo é uma atualização constante de morte e reconstrução celular, eliminadas pelo sistema imunológico. Quando se usa o GH você potencializa essa reconstrução celular, mas a descarga hormonal multiplica muito rápido também as células cancerígenas. Por isso, o uso do  hormônio é uma balança delicada entre ser terapêutico e tornar nocivo”, diz Felipe Kutianski, educador físico e especialista em bioquímica do exercício.

Danos físicos e mentais

Entre as consequências que essas medicações, se usadas indiscriminadamente ou com indicação incorreta podem causar, o principal é a dependência química, justamente pela sensação de bem-estar proporcionada. “É uma medicação segura, então não é esperado que aconteça um dano cerebral. O efeito mais temido é a dependência. A pessoa usa como droga mesmo e busca doses cada vez maiores, o que causa irritabilidade, insônia, perda de apetite e alterações de pressão arterial” , frisa a neurologista Kristel Merida. 

Dependência é um dos riscos que o uso indiscriminado de remédios pode provocar em um pessoa
Dependência é um dos riscos que o uso indiscriminado de remédios pode provocar em um pessoa.
(Foto: USP Imagens)

O psicólogo Leonardo Morelli, um dos profissionais que ajudou a implementar um setor de assistência a pacientes suicidas no serviço de toxicologia do Hospital João XXIII, em Belo Horizonte, conta que é comum esse perfil entrar em uma roda viva com remédios. “A pessoa vai aumentando a dose para ter os mesmos efeitos agradáveis. Mas fica super eufórica e não consegue dormir. Aí toma Rivotril [nome comercial do clonazepam] para conseguir descansar . E entra naquela de um remédio para acordar e outro para dormir”. 

Em 2020, logo após o início da pandemia de coronavírus no Brasil, houve um aumento de 22% na venda do fármaco, segundo o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma). O volume de mais de 5 milhões de caixas vendidas por mês em média faz do ansiolítico um dos remédios mais populares no país, mesmo com venda controlada. 

A psiquiatra Vera Prates lembra que, nos Estados Unidos, já se fala em uma epidemia no uso de fosfato de codeína, um opiáceo indicado para tratamento de dor. “Um remédio que é muito bom para uma doença passa a ser uma doença com dados físicos e sociais quando há abuso. Na maioria dos casos é muito importante um acompanhamento psicoterápico e mudanças de hábitos de vida. Não podemos medicalizar o que é de ordem social”, completa.

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