Arquivos Marcus Vinícius De Freitas - Canal MyNews – Jornalismo Independente https://canalmynews.com.br/post_autor/marcus-vinicius-de-freitas/ Nosso papel como veículo de jornalismo é ampliar o debate, dar contexto e informação de qualidade para você tomar sempre a melhor decisão. MyNews, jornalismo independente. Fri, 22 Jul 2022 12:05:53 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 China, a parceira indispensável https://canalmynews.com.br/internacional/china-a-parceira-indispensavel/ Fri, 22 Jul 2022 12:05:53 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=31971 À medida que o Brasil aprofunda seu relacionamento com a China, o País deveria também estabelecer quais serão seus objetivos de longo prazo com o país asiático.

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Em 2019, a Comissão Europeia publicou o Relatório “União Europeia-China: Uma perspectiva estratégica”, no qual se detalhava como a União Europeia (UE) administraria o relacionamento bilateral. A China foi triplamente rotulada como: (i) parceira de negociação e cooperação na busca por um equilíbrio de interesses; (ii) concorrente econômica na disputa pela liderança tecnológica, e (iii) rival sistêmica quanto à promoção de modelos alternativos de governança global.

À medida que o Brasil aprofunda seu relacionamento com a China, o País deveria também estabelecer quais serão seus objetivos de longo prazo com o país asiático. Felizmente, o Brasil não precisa adotar nem imitar a postura europeia ou norte-americana. Os interesses nacionais são muito diferentes e o relacionamento bilateral deverá ser cada vez mais profícuo, uma vez que a China não é concorrente ou rival sistêmica, mas sim um parceiro indispensável para os rumos econômicos do Brasil nas próximas décadas. Apesar da distância geográfica, os interesses são altamente complementares. O maior desafio do Brasil, no entanto, é sobrepujar a subserviência política, econômica, ideológica e cultural que tem em relação aos Estados Unidos e Europa para buscar seus interesses assertivamente na parceria.

O ano de 2009 foi transformador nas relações comerciais do Brasil. O mundo ainda ressentia o forte impacto econômico das crises financeiras de 2007 e 2008 e o País, para sua sorte, encontrou na China uma parceria essencial. Desbancando a posição centenária dos Estados Unidos como principal parceiro comercial do Brasil, a China garantiu uma navegação mais tranquila naquele turbulento período da economia global. O Brasil encontrou na parceria oportunidades exponenciais, diante do crescimento pujante do gigante asiático.

O predomínio anglo-saxônico global, consolidado após o fim das guerras napoleônicas, no caso britânico, e da Segunda Guerra Mundial, no caso norte-americano, tem, paulatinamente, declinado nas últimas duas décadas, com o retorno da China à posição histórica de maior potência econômica global. Esta será a primeira vez que uma potência em desenvolvimento, advinda do Sul Global e não Ocidental, assumirá as rédeas da economia global. A atuação chinesa será diferente do Ocidente até porque o país repudia o conceito de hegemonia prevalecente na Realpolitik que orienta as chancelarias e governos ocidentais. O termo utilizado em chinês para representar o conceito de hegemonia – 霸权 (Bàquán) – retrata um conceito mais próximo à tirania e supremacia, o que a China repudia totalmente como forma de atuação global.

Assim, o rumo a ser trilhado pela China nos próximos anos e décadas já parece muito claro: (i) consolidar a unidade nacional e política; (ii) fortalecer a economia e o bem-estar doméstico, além de expandir as fronteiras comerciais e econômicas, avançando em setores de tecnologia de ponta, com a melhoria das condições ambientais locais e globais; e (iii) estabelecer e consolidar um relacionamento benigno em nível regional e global, enfrentando, quando necessário, eventuais concorrentes que lhe prejudiquem o desenvolvimento econômico.

Ao transformar-se no parceiro indispensável de vários países no mundo, a China assegura uma preponderância mundial sem a necessidade de uso de qualquer armamento, guerra ou derramamento de sangue. Trata-se de uma dinâmica distinta daquela praticada pelos países ocidentais, cujo histórico de ascensão foi muito mais violento, por meio da dominação e submissão dos povos conquistados. A China não pretende recorrer à guerra para assegurar sua preeminência, uma vez que o comércio é um instrumento muito mais efetivo.

A aproximação com o Brasil é importante na consolidação da China como potência global. Também é essencial ao Brasil para amealhar maior influência global, algo que o País – o famoso anão diplomático – tem sido incapaz de fazer. Fundamentados nas regras estabelecidas pelo Direito Internacional, o Brasil e China poderiam atuar mais intensamente nas organizações multilaterais com o intuito de aprimorar a governança global que, desde 1945, tem-se restringido a um punhado de países cuja relevância é cada vez menor. A reforma dessas instituições é essencial à sua própria existência. Caso não queiram reformar, Brasil e China deveriam, em conjunto, propor e implementar alternativas que reflitam a nova realidade global.

O Brasil deveria atuar intensamente para maximizar o engajamento econômico com a China. As possibilidades de acesso privilegiado a um mercado de 1.4 bilhão de pessoas, com renda per capita em ascensão, deveriam ser exploradas exaustivamente pelo Brasil até para sair da cesta básica de exportações brasileiras – soja, açúcar, carne e minério de ferro – para outros produtos agrícolas e fontes de proteína de maior valor agregado. A diversificação e agregação de valor podem contribuir a um efetivo incremento da renda per capita brasileira, estagnada há muito tempo e sem perspectiva de melhoria. Neste processo de diversificação e adição de valor, o Brasil deveria atrair mais empresas chinesas – particularmente as tecnológicas – para utilizar o País como plataforma de exportação.

Brasil e China têm muita sinergia. À China interessa um parceiro forte nas Américas em sua estratégia de ascensão global. Ao Brasil interessa dar um salto qualitativo em sua competitividade, produtividade e relevância global. Como bem afirmou Confúcio, “Transportai um punhado de terra todos os dias e fareis uma montanha”. É hora de Brasil e China trabalharem juntos para fazer várias montanhas.

 

*Marcus Vinícius De Freitas é professor visitante na China Foreign Affairs University, Senior Fellow, Policy Center for the New South.

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O dia seguinte da Guerra da Ucrânia https://canalmynews.com.br/internacional/o-dia-seguinte-da-guerra-da-ucrania/ Fri, 10 Jun 2022 11:53:23 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=29643 À medida que a guerra da Ucrânia prossegue, a relevância do assunto vai diluindo. Mas este conflito é, sem dúvida, o de maior impacto geopolítico nas próximas décadas.

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À medida que a guerra da Ucrânia prossegue, com mais de cem dias já ultrapassados, a relevância do assunto vai, paulatinamente, diluindo. No entanto, não podemos esquecer que este conflito é, sem dúvida, o de maior impacto geopolítico nas próximas décadas.

Algumas questões derivam desta guerra e determinarão os rumos da governança global. Uma das dúvidas principais é relativa à capacidade da manutenção hegemônica dos Estados Unidos no sistema global e a sua capacidade de combater duas Guerras Frias – China e Rússia – ao mesmo tempo. A resposta parece negativa e os Estados Unidos provavelmente não conseguirão. Sob a perspectiva militar, a Rússia, mesmo após a tentativa de estrangulamento dos Estados Unidos por meio de sanções e isolamento completo do país, parece manter a sua capacidade de atuação militar. Apesar dos erros incorridos inicialmente na Guerra da Ucrânia, a Rússia tem mantido os seus objetivos no conflito, conseguiu reajustar-se e ainda retém poderio suficiente para contender com os Estados Unidos.

Do ponto de vista econômico, apesar da pandemia e das restrições temporárias ocorridas em várias cidades da China, o desenvolvimento contínuo e estável da economia chinesa se contrapõe a um cenário de inflação ascendente, reduzido poder político do atual ocupante da Casa Branca, e provável recessão nos Estados Unidos nos próximos anos. Tal deterioração econômica, por certo, não permitirá aos Estados Unidos prosseguirem num embate contínuo contra Rússia e China. As concessões que, eventualmente, os Estados Unidos terão de fazer nos próximos anos, não permitirão ao país lograr a dissociação entre China e Rússia, particularmente em suas ações de alcance global, o que dificultará aos Estados Unidos manter a sua posição dominante, militar e economicamente.

Além disso, existem dois possíveis resultados da Guerra (ou Operação Militar Especial, segundo Moscou) na Ucrânia. O primeiro cenário, sem dúvida, seria o de uma vitória da Rússia no conflito. Se isto viesse a ocorrer, estaríamos diante do fim da hegemonia norte-americana e o surgimento e consolidação de novos grupos políticos e econômicos regionais, o que elevaria a competição global pelo poder a níveis jamais observados. A Guerra da Ucrânia poderá significar para os Estados Unidos aquilo que a Crise de Suez significou para o Império Britânico: o declínio inevitável.

A competição entre as potências desafiadoras e os Estados Unidos poderia gerar alguns benefícios globais, mas Washington, DC, parece mais inclinada à ressurreição da Guerra Fria como estratégia de retenção de poder. Para a Europa, a vitória russa seria um desastre, porque na ausência de um comando central, o continente seria obrigado a permanecer atrelado a uma potência global, como os Estados Unidos, agora com menor relevância e poderio, e com interesses domésticos de maior preocupação do que a parceria transatlântica, que já enfrenta desafios há anos.

No cenário em que a Rússia perde a guerra, certamente a posição norte-americana seria altamente fortalecida e o mundo retornaria a um contexto unipolar, com os Estados Unidos e seus aliados moldando a ordem internacional, conforme seus interesses, por décadas. Por certo, a China ficará no polo passivo desta reorganização global e sofrerá com o incremento da agressividade norte-americana, maior pressão sobre o comércio internacional chinês, além do possível aumento em ações diretas e intervenções, em outras partes do globo, com o uso do poderio militar, direta ou indiretamente. No caso da atuação contra a China – e eventuais opositores a esta ordem internacional – os Estados Unidos deverão incitar, particularmente, Japão e União Europeia a adotarem políticas econômicas mais hostis, para conter qualquer avanço no ritmo de desenvolvimento ou eventual tentativa de desafio ao poderio hegemônico norte-americano. Além disso, deveremos assistir a mais guerras limitadas contra os “inimigos”, baseados no discurso da defesa dos direitos humanos, soberania e valores democráticos.

O fato é que a Guerra da Ucrânia é um conflito regional que se transformou numa questão global de enorme divisão e escala entre Ocidente e Oriente. Se o conflito prosseguir por muito tempo, com enorme impacto sobre a economia global, talvez ainda assistamos a um conflito militar direto entre Rússia e OTAN. Se a Rússia perder o conflito – e esta é a esperança e desejo do Ocidente – veremos o país sofre a sua pior derrota econômica e política. Para a China também significará um sinal vermelho quanto a qualquer movimentação política relativa a Taiwan. É importante, por fim, ressaltar que esta Guerra da Ucrânia também prejudica a China substancialmente, pois representa a importação de inflação, em razão do aumento no preço das commodities, flutuação nas taxas de câmbio e disfunções políticas, dentre outros.

A mídia russa tem comparado a guerra atual ao conflito franco-russo do início do século XIX e ao dos Aliados contra os fascistas na Segunda Guerra Mundial. Se a Rússia perder, o entendimento é que o país, como conhecemos, deixará de existir. Se vencer, no entanto, Putin eliminará o confronto representado pelo Ocidente e os últimos cinco séculos de hegemonia global ocidental. É o temor da derrota que faz com que Putin siga – com apoio popular – no conflito, porque o país não suportaria as consequências de uma derrota.

Talvez um cessar-fogo – e não uma rendição como foi o desastroso Tratado de Versalhes – fosse o cenário mais interessante neste momento, sob a percepção de que os dois lados garantiram algum tipo de benefício. “Salvar a cara” seria a melhor forma de alcançar algum resultado positivo deste conflito para os dois lados.

 

*Marcus Vinícius De Freitas é professor Visitante, China Foreign Affairs University, Senior Fellow, Policy Center for the New South

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