Trabalho em excesso: estudo mostra os prejuízos da escala 6×1 no Brasil Foto: Letycia Bond/Agência Brasil

Trabalho em excesso: estudo mostra os prejuízos da escala 6×1 no Brasil

Pesquisa demonstra que atuais leis de trabalhos e dias prejudicam o trabalhador e mudança segue em debate no país

No Dia do Trabalhador, o debate sobre a mudança nas escalas de trabalho e suas jornadas volta à tona. Assim, o MyNews conversou com Márcio Ayer, presidente do Sindicato dos Comerciários do Rio de Janeiro. Eles realizaram uma pesquisa inédita que mostra o impacto brutal da jornada 6×1 na vida dos trabalhadores brasileiros.

Aqui, Márcio explica como foi feita a pesquisa

R: “A pesquisa surgiu a partir do interesse público sobre a escala 6×1, que explodiu nas redes sociais ao final de 2023. Essa demanda dos trabalhadores e sindicatos, porém, enfrenta resistências, principalmente devido a uma arraigada cultura do trabalho, que faz com que os patrões, seus representantes no parlamento e até muitos trabalhadores ainda enxerguem uma relação direta entre produtividade e horas trabalhadas. Para enfrentar essas resistências, precisamos de dados e argumentos concretos.

Diversos estudos internacionais comprovam que a redução da jornada de trabalho, sem corte de salários, favorece não somente os trabalhadores, mas também as empresas, com ganhos de produtividade, e a economia na totalidade, com o aumento da massa salarial e do consumo. Não havia, contudo, um estudo mais amplo aplicado à realidade dos trabalhadores brasileiros. Essa é a importância da pesquisa: evidenciar de forma inédita e empírica os impactos reais desse regime de trabalho sobre a vida da classe trabalhadora no Brasil.
Encontramos poucos dados específicos sobre os trabalhadores brasileiros que estão sob essa jornada. Isso coincidiu com o interesse do Observatório do Estado Social Brasileiro em realizar uma pesquisa nesse sentido. Fomos procurados por eles, que já tinham um desenho metodológico bem consolidado para a realização da pesquisa, e entramos como correalizadores.

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A pesquisa traz uma dimensão nacional e robustez metodológica, com quase quatro mil entrevistados em 400 municípios brasileiros, focando em setores com alta incidência da escala 6×1, como comércio, varejo e call center. O objetivo vai além do diagnóstico: a ideia é instrumentalizar a classe trabalhadora com dados para combater a escala 6×1, além de incentivar a mobilização sindical, política e institucional para rever a legislação e as práticas trabalhistas. Essa pesquisa é, portanto, crucial para desnaturalizar uma escala de trabalho profundamente excludente, além de oferecer base empírica para mobilizações, campanhas e políticas públicas que promovam trabalho digno.

Nas ruas, há debates sobre as escalas 5×2 e, em alguns grupos, sobre a 4×3. Márcio explica se alguma delas pode avançar

Debate da escala nas ruas sobre final da escala 6×1

R: A questão de fundo é a luta histórica da classe trabalhadora pela redução da jornada de trabalho sem corte de salários. A adoção da escala 5×2 ou da escala 4×3 vai refletir diferentes necessidades e realidades econômicas. Mais próxima do que atualmente é praticado em diversos setores da economia e da administração pública, a escala 5×2 no comércio já seria um avanço importante para equilibrar produtividade e descanso sem mudanças radicais. Já a jornada 4×3 representa um futuro possível para os setores que conseguirem se adaptar. Embora esse modelo com três descansos semanais remunerados seja mais avançado, ele já está sendo testado com êxito em vários países, por priorizar a saúde mental e a qualidade de vida dos trabalhadores, podendo, porém, exigir adaptações mais profundas. Não existe um modelo ideal, mas sim a necessidade de preservar os direitos e garantir descanso digno para os trabalhadores.

Márcio, é o presidente do Sindicato dos Comerciários – Foto: Divulgação/

Sobre os professores, há uma curiosidade na pesquisa relacionada à carga horária dessa categoria. Apesar de, em teoria, trabalharem sob a escala 5×2, enfrentam problemas como as condições de trabalho e a gestão do tempo. O presidente do sindicato analisa esse contexto.

R: Qualquer debate onde a variável seja o trabalho necessita de amplitude e intersecção com outras variáveis, que vão além dos dias trabalhados. Apesar do recorte específico da escala 6×1 – que atinge sobretudo os jovens, os negros e as mulheres – nossa pesquisa busca estruturar essa amplitude ao aprofundar questões como mobilidade, saúde mental, assédios, renda mensal e outros. Esse debate precisa considerar o “uso social do tempo”, não apenas a carga horária contratual. A noção de “roubo de tempo”, que aparece com força no estudo, também se aplica em realidades como a dos professores.

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Ela aponta para a degradação do cotidiano pela sobrecarga, ausência de lazer, dificuldades no cuidado com a saúde e impacto na vida familiar – todos elementos presentes também na realidade dos professores. A lógica do tempo, tal como vivida pelos educadores, está marcada por sobrecarga, invisibilidade e adoecimento. O real problema não está somente na estrutura da jornada semanal, mas na gestão exaustiva do tempo cotidiano. O que está em jogo é um roubo sistemático do tempo de viver, de conviver e de cuidar. Esse diagnóstico, embora aplicado ao setor do varejo e serviços, ecoa com clareza em outras experiências laborais. O problema é estrutural e exige políticas públicas que reconheçam o tempo como dimensão essencial da dignidade do trabalho. A luta contra a escala 6×1 não passa somente pelo debate sobre a quantidade de dias trabalhados, mas pela qualidade do tempo de vida.

Final da escala 6×1 e o debate na imprensa e na política

Por fim, Márcio comenta como enxerga o debate sobre o fim da escala 6×1 na imprensa e no Congresso Nacional

R: O debate tem ganhado espaço, mas ainda é desequilibrado na imprensa, no Congresso e mesmo entre os trabalhadores. Na imprensa, os grandes veículos só abordam o tema quando ocorrem grandes movimentos dos trabalhadores, como a greve dos metroviários de São Paulo, ou quando há a apresentação de projetos de lei. Não é, porém, uma pauta cotidiana nos jornais e emissoras de TV. Mesmo quando o foco é o esgotamento dos trabalhadores, as reportagens em geral enfatizam um suposto aumento dos custos para as empresas.

Em Brasília, embora seja quase uma unanimidade entre os parlamentares progressistas, a pauta esbarra no lobby patronal e não é tratada como prioridade. Nas ruas, é uma luta ainda fragmentada, que não envolve os trabalhadores informais e que ainda não é levada a sério por grande parte da população. Muitos desconhecem os impactos da escala 6×1 na saúde, os mais velhos estão impregnados pela tóxica cultura do trabalho e há ainda o medo de represálias dos patrões. A partir dos sindicatos e centrais sindicais, temos nos esforçado para traduzir essas questões para os trabalhadores, ampliar a mobilização em torno da pauta e aumentar a pressão política sobre o Congresso e o governo”, concluiu Márcio ao MyNews.

Lula promete debate e fim da escala

Na semana do dia do trabalhador, o presidente Lula fez um pronunciadamente em toda cadeia nacional e afirmou que vai aprofundar o debate sobre o final da escala 6/1 e também as ações para proteger os aposentados no INSS.

Veja todo o estudo aqui = https://secrj.org.br/pesquisa-fim-da-escala-6×1/

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