Alerj livra presidente da prisão e expõe abismo entre o rigor da lei e o privilégio político (Foto: Tiago Lontra/Alerj). CRIME ORGANIZADO

Alerj livra presidente da prisão e expõe abismo entre o rigor da lei e o privilégio político

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Temor de cassação no TSE sela trégua entre Castro e Bacellar, garantindo placar amplo para derrubar prisão e blindar cúpula do poder no Rio

Por 42 votos a 21, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) decidiu revogar a prisão de seu presidente, Rodrigo Bacellar, em uma manobra que desafia a justiça e choca a opinião pública.

A decisão, tomada em plenário, protege o parlamentar de acusações gravíssimas. Bacellar é investigado por obstrução de justiça. Especificamente, o caso envolve a troca de mensagens com o deputado TH Joias, figura apontada pelas autoridades como um elo orgânico com facções criminosas. Além disso, esse contato teria ocorrido no exato momento em que provas de ilícitos eram destruídas. Consequentemente, o episódio reforça, de forma dolorosa, a percepção de que existe um sistema de blindagem exclusivo para o “colarinho branco”.

Por outro lado, a votação expôs uma profunda hipocrisia no discurso oficial. Enquanto o governo estadual intensifica operações policiais letais em comunidades, justificando centenas de mortes como combate ao crime, o parlamento age em direção oposta. Ou seja, a mesma base aliada que prega “lei e ordem” se mobilizou para livrar um líder político acusado de conluio com o crime organizado. Dessa forma, fica evidente que a infiltração de interesses criminosos no legislativo é tratada com leniência quando o objetivo é a manutenção do poder.

Nos bastidores, contudo, a união surpreendente entre rivais chamou a atenção. Embora o governador Cláudio Castro e Rodrigo Bacellar travem uma batalha velada pela sucessão estadual, o instinto de sobrevivência falou mais alto. Imediatamente, ambos mobilizaram suas bases para garantir a soltura. O motivo? O temor real de que a manutenção da prisão agravasse a situação de ambos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Assim, a avaliação pragmática foi a de que a queda do presidente da Alerj poderia causar um “efeito dominó”, desestabilizando todo o “condomínio de interesses” que sustenta a atual gestão.

Para garantir o resultado, o governo atuou intensamente. Primeiramente, pressionou os parlamentares. Em seguida, conseguiu a fidelidade até mesmo de legendas fora do núcleo ideológico, como o PSD. Simultaneamente, a estratégia de defesa foi calculada: usou-se deputados do “baixo clero”, de perfil agressivo, para o embate no plenário. Com isso, as lideranças mais respeitadas foram poupadas do desgaste de defender o indefensável. Tudo isso, vale ressaltar, ocorreu enquanto se buscava dar a menor publicidade possível ao trâmite.

Por fim, o desfecho consolida uma sensação de desesperança. Infelizmente, a certeza da impunidade se amplia no Rio de Janeiro. Ao normalizar a presença de figuras com laços criminosos na estrutura de poder, a Alerj envia uma mensagem clara à sociedade: a autoproteção tem precedência sobre a justiça. Portanto, enfraquece-se ainda mais a credibilidade das instituições que deveriam combater o crime, e não se aliar a ele.

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