Foto: arquivo pessoal
Onde estratégia, percepção e interesse se encontram antes do xeque-mate eleitoral
As peças se movimentam no tabuleiro da política com a precisão de quem sabe que 2026 já começou. Cada operação, cada declaração, cada pesquisa de opinião é parte de uma partida silenciosa, em que o poder se constrói menos por ideias e mais por percepções. No Brasil, o jogo segue ritmado, e após a turbulenta semana passada a segurança pública tornou-se sua nova dama.
Na última semana, o governador do Rio de Janeiro atingiu o maior índice de aprovação desde o início de seu mandato, segundo o Datafolha. O salto coincide com a operação mais letal da história do país, realizada na Penha, que reacendeu o debate sobre a política de segurança. O dado é emblemático: quanto mais violenta a ação estatal, maior a percepção de eficácia. É a legitimidade institucional e recompensado nas urnas.
Mas o que está realmente em jogo é a disputa por uma narrativa. A guerra às drogas, como política oficial de Estado, ressurge agora como ativo eleitoral: uma fórmula eficiente de capital político para tempos de descrença. A retórica da força, ao contrário do que muitos imaginam, não nasce da ignorância popular, mas da manipulação do medo.
O Datafolha, ao medir a popularidade de Castro, mede também o pulso de um país exausto, que prefere a ilusão da ordem à incerteza da democracia. No tabuleiro, cada lado joga com o mesmo cálculo: quem dominar a narrativa da segurança dominará o centro do jogo em 2026. A direita se apresenta como guardiã da autoridade; a esquerda, acuada, hesita entre reafirmar princípios humanitários e adotar uma linguagem mais “pragmática”. No meio, o eleitor, que, entre o medo e a desesperança, escolhe quem promete controle.
A violência, no entanto, é um jogo de soma negativa. O Estado que mata para afirmar sua força se enfraquece como guardião da vida. O aplauso fácil que não traduz convicção, mas anestesia coletiva. A cada operação pretensamente “bem-sucedida”, o país se afasta um pouco mais da racionalidade e se aproxima do abismo moral que transforma corpos em estatísticas e governantes em heróis de ocasião.
O tabuleiro de 2026 começa, portanto, manchado de sangue e estratégia. Não há inocentes: apenas jogadores movendo peças em busca de poder. Resta saber se o país seguirá repetindo as mesmas aberturas previsíveis, ou se haverá coragem de reinventar o jogo antes que o próximo xeque-mate custe mais vidas do que o necessário para vencer uma eleição.
Dra. Fernanda Macedo é especialista em ciências criminais pela UERJ, advogada da Gestão Kairós e professora no MBA do IBMEC.
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