Cresce a fila do SUS e o sistema padece de recursos. Filhas de militares estão sendo expulsas do plano de saúde
Elas nasceram sob a promessa de proteção. Filhas de homens que serviram ao Brasil na Aeronáutica, cresceram acreditando que teriam, ao longo da vida, o mesmo amparo que seus pais ajudaram a construir. Agora, com mais de 70, 80 e até 90 anos, descobrem que essa promessa foi rasgada. Elas estão sendo desligadas do sistema de saúde da Aeronáutica. E, o pior, muitas em meio a tratamentos delicados, com doenças crônicas ou graves. Elas engrossam o contingente de brasileiros que na velhice estão descobrindo que a única opção que podem contar é com o Sistema Único de Saúde. Sim, o SUS, que acolheu na pandemia, está acolhendo os 50 mais, cuidando dos casos de intoxicação por metanol, é quem vai acolher essas senhoras. Cresce a fila do SUS e o sistema padece de recursos.
A pensão vitalícia para filhas de militares sempre foi alvo de polêmica. Durante anos, foi vista por parte da sociedade como um privilégio e o mais agravante por representar um peso injustificado nas contas da previdência . Por isso, a legislação mudou: novas filhas de militares já não têm mais direito ao benefício. Mas o grupo que hoje sofre as consequências dessas mudanças viveu e envelheceu sob outras regras, quando a lei ainda assegurava o amparo médico e financeiro.
Essas mulheres planejaram suas vidas dentro dessa realidade. Não se prepararam para custear planos privados de saúde. Muito menos para enfrentar o peso da velhice sem o sistema que sempre as acolheu. O pai delas pagou por esse direito quando estava na ativa. E, ao longo das décadas, elas também contribuíram mensalmente, em regime de coparticipação. Nada foi dado de presente. Tudo foi conquistado e sustentado com contribuições.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Tema 1.080, decidiu que a assistência médico-hospitalar da Força Aérea não é direito adquirido nem vitalício. Trata-se de um benefício condicional. Se a filha pensionista recebe qualquer renda igual ou superior a um salário mínimo, inclusive a pensão deixada pelo pai militar, ela perde o atendimento.
Em outras palavras: a mesma pensão que deveria garantir segurança virou o motivo da exclusão.
Aos 70, 80 ou 90 anos, encontrar um plano de saúde no mercado privado é quase impossível. As mensalidades são altíssimas e as operadoras preferem recusar o risco. Assim, mulheres que sempre estiveram protegidas pelo sistema militar acabam empurradas para o SUS. E justamente no momento da vida em que mais precisam de cuidados e estabilidade. O SUS, por sua vez, está sobrecarregado e com parcos recursos.
O drama dessas pensionistas é mais do que uma questão militar. É um alerta social. Estamos vivendo mais, porém os sistemas, públicos e privados, parecem despreparados para sustentar a longevidade.
Planos privados fogem dos idosos. O sistema militar fecha as portas. E, no fim, é o SUS que vai precisar segurar a barra de uma população que envelhece rapidamente.
Em suma, se até as filhas de militares, que viveram acreditando estar amparadas, foram deixadas à própria sorte, o que esperar do futuro de quem nunca teve essa proteção?