Por que ajuda a estados e municípios agrava o endividamento da União Foto: Arte MyNews

Por que ajuda a estados e municípios agrava o endividamento da União

O Brasil enfrenta um desafio econômico que o Diretor-Executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Marcus Pestana, define como o “maior problema do país hoje”.

O centro da questão é o “progressivo estrangulamento fiscal e a deterioração do equilíbrio das finanças públicas” na perspectiva de médio e longo prazos, marcado por déficits primários recorrentes e endividamento público crescente. Essa situação inibe o crescimento, causa altas taxas reais de juros e comprime o investimento público, essencial para a produtividade do país. Essa é a conclusão do último relatório da Instituição Fiscal Independente.  A avaliação é de Marcus Pestana, diretor da Instituição Fiscal Independente – IFI.

A urgência em reverter essa dinâmica é amplificada pelo esgotamento das duas fontes fundamentais de financiamento das políticas públicas: a tributação e o endividamento.

Dívida em trajetória ascendente e carga tributária no teto

As projeções da IFI, detalhadas em sua Nota Técnica Nº 60, indicam uma trajetória preocupante para a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG). O principal indicador da saúde fiscal de um país deve alcançar 77,6% do PIB ao final de 2025 e 82,4% em 2026, descrevendo uma curva ascendente até 2035. Para estabilizar a dívida bruta nessas condições, seria necessário um superávit primário de 2,1% do PIB.

O endividamento já é considerado “muito grande” entre os países emergentes, prejudicando a capacidade de investimento. Já a carga tributária brasileira, que foi de 34,24% do PIB em 2024 , coincide com a média da OCDE, mas lidera o ranking entre os países emergentes e latino-americanos. O Congresso Nacional tem sinalizado que não admite o aumento da carga tributária, o que significa que o reequilíbrio fiscal “não encontrará ambiente político-institucional favorável para serem feitos via aumento significativo do nível de tributação”.

União cansada, entes subnacionais em melhor situação

A crise fiscal, antes vista apenas como um problema da União, é um desafio federativo complexo, já que estados, Distrito Federal e os 5.569 municípios gozam de autonomia.

O relatório da IFI e as análises subsequentes mostram que a situação da maioria dos municípios e estados é, na verdade, “muito melhor que a da União”. Dados de 2024 demonstram que estados e municípios têm assumido um papel cada vez maior nos gastos, respondendo por 58,97% do investimento público total (R$ 262,0 bilhões), enquanto a esfera federal investiu 19,38% (R$ 86,1 bilhões, sem estatais).

Apesar do enfraquecimento fiscal da União, consolidou-se a tradição de o governo central socorrer os entes subnacionais. Essa tendência levou à aprovação de duas medidas recentes de alívio fiscal: a Lei Complementar 212/2025 (PROPAG) e a Emenda Constitucional 136/2025 (EC 136/2025).

Segundo Pestana, a nota técnica da IFI procurou mostrar que esses movimentos “aliviam as finanças dos estados e dos municípios às custas da União”.

O Preço do alívio: aumento da dívida federal

As duas iniciativas legais fornecem um alívio no fluxo orçamentário-financeiro no curto prazo para estados e municípios, mas resultam em um crescimento do endividamento de médio e longo prazos.

PROPAG (LC 212/2025): Instituiu a renegociação das dívidas estaduais com a União, permitindo que os estados usufruam de taxas de juros reais entre 0% a.a. e 2% a.a.. Esse formato configura um subsídio implícito da União para os estados”. O exercício preliminar da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) indica que, ao fim de cinco anos, o impacto líquido pode variar de R$ 5,48 bilhões em favor da União a R$ 105,96 bilhões de incremento no déficit nominal da União.

EC 136/2025 (Municípios): Limitou o pagamento anual de precatórios para municípios e estados e ofereceu parcelamento de débitos previdenciários (RPPS e RGPS/INSS) em condições muito favoráveis, inclusive em até 300 prestações. O represamento dos precatórios “vai empilhar pro futuro, a cada ano vai avolumando essa dívida”. Além disso, o parcelamento de débitos com o RGPS/INSS fará com que os municípios ganhem espaço fiscal “em prejuízo da União”, reduzindo a receita potencial do Orçamento Geral da União (OGU).

O compromisso intergeracional em risco

A estratégia contínua de repassar os custos para o futuro tem graves implicações morais e econômicas, conforme alertado no relatório. O endividamento, no setor público, trata-se da “estratégia de trocar gasto presente por dívida futura”, um conceito que deve levar em conta o pacto intergeracional.

A postura de adiar soluções, criando soluções no curto prazo e “comprometendo o futuro o horizonte das novas gerações,” configura um autoengano que não é justo do ponto de vista do pacto intergeracional.

A caminho de um ajuste estrutural inevitável

Diante do esgotamento das fontes de financiamento, a União não possui mais as “condições futuras de permanecer no papel de provedora de soluções fiscais para estados e municípios”.

A expectativa dos analistas é que a LC 212/2025 e a EC 136/2025 marquem o “ponto terminal de um ciclo onde o governo central socorria… os entes subnacionais”. A única saída é que o governo federal realize um “profundo ajuste fiscal” para estancar o crescimento da dívida pública e recuperar sua capacidade de investimento, inaugurando um novo quadro de responsabilidade fiscal e cooperação federativa.

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