Centrão é parte estrutural da democracia brasileira – um guardião contraditório que garante o equilíbrio do jogo político
Se existe uma palavra na política brasileira que provoca calafrios em muitos dos seus cidadãos, essa palavra é Centrão.
O Centrão se refere a uma junção de políticos de diferentes partidos dentro do Congresso Nacional que representam o fisiologismo típico da política do maior país dos trópicos. Sua lógica não se baseia em convicções ideológicas e nem em planos programáticos: funciona de maneira própria, sustentada pela troca de favores em busca de apoio – essa é a definição do fisiologismo. Portanto, o Centrão pode se alinhar tanto à direita quanto à esquerda dependendo de quem ocupa o governo. O Centrão é heterogêneo, mas age como bloco para aumentar seu poder de barganha com o governo de turno.
Ele é a expressão mais pura da dinâmica de poder de Brasília, cidade construída para concentrar e sustentar esse jogo. A lógica política que emana do Congresso muitas vezes aprova projetos ruins e danosos ao povo brasileiro, mas, em outras ocasiões, atua como contrapeso e incorpora moderação em cenários caóticos.
Essa é a contradição do Centrão. Ele desperta raiva, aversão, e pode representar todos os vícios negativos da política brasileira, mas, paradoxalmente, pode ser considerado uma espécie de guardião da ordem, conhecido na expressão em inglês como o Gatekeeper da democracia.
Leia mais: PGR denuncia Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo
Na ciência política, a teoria dos Gatekeepers mostra que o jogo político não é um campo totalmente aberto: existem “guardiões” (partidos, elites e instituições) que filtram quais projetos e ideias circulam e até onde vão os limites do jogo democrático. No livro Como as Democracias Morrem, Levitsky & Ziblatt argumentam que a sobrevivência da democracia depende dos gatekeepers.
Atualmente, a democracia brasileira vive um contexto de polarização hostil e sem precedentes. O clima é tão raivoso e intolerante que transformou opositores ideológicos em inimigos mortais. Hoje, vivemos com duas visões divergentes de Brasis que nunca irão conversar entre si.
No contexto de polarização hostil, é o Centrão que equilibra o jogo!
Odeie-o, pois perpetua os vícios políticos e de poder através da lógica do “toma lá dá cá”. Aprova projetos ruins para a população, como a recém aprovada PEC da Blindagem na Câmara Federal. Na dinâmica do Centrão não é a esquerda nem à direita que vencem e sim o Corporativismo e a defesa da própria classe.
Ame-o, pois o nível de violência e intolerância política que o Brasil vive hoje é nojento e insuportável. As pessoas estão emburrecidas pela paixão e pelo ódio, e o Centrão resguarda as regras do jogo político e relembra quem manda nessa história: o fisiologismo e o presidencialismo de coalizão. Afinal, sem o Centrão, estaríamos passando projetos ideológicos como: uma anistia irrestrita, projetos que trazem o retrocesso em pautas de costumes, ou projetos que são displicentes com o crime.
Ame-o ou odeie-o, o Centrão é parte do patrimônio político brasileiro: um produto tropical da nossa democracia, que serve não só banana, mas uma verdadeira salada de frutas. Na verdade, o mais correto não parece ser nem ame-o ou odeie-o, mas tolere-o.