Ex-presidente do partido, o deputado federal vai para a disputa contra Edinho Silva, o candidato oficial, e faz vaquinha para enfrentar a “máquina”.
A entrada de Rui Falcão na disputa pela presidência do PT é, por si só, um gesto político relevante — e talvez um sinal silencioso de que algo começa a se mover na esquerda brasileira. Até pouco tempo atrás, o nome de Edinho Silva era dado como certo. A presidência do PT parecia um jogo jogado, com resultado já acertado nos bastidores.
Ex-presidente do partido e figura histórica na legenda, Rui Falcão decidiu se colocar como alternativa. Não se trata somente de um movimento pessoal ou interno, é uma mensagem política. A esquerda, em especial o PT, que por muitos anos se enxergou (sendo enxergado) como força hegemônica desse campo ideológico, parece estar buscando reencontrar seu ímpeto de transformação.
“Transformar” era justamente o verbo central no slogan de propósito do partido, como o próprio Rui lembrou em entrevista recente ao Canal MyNews. E talvez não seja coincidência que tenha sido esse verbo que acabou sendo retirado. Nos últimos anos, o PT tem oscilado entre a autodefesa e o pragmatismo eleitoral, muitas vezes em detrimento daquilo que um dia foi sua principal força: a capacidade de sonhar e propor rupturas com o status quo.
Independentemente do desfecho da eleição interna, a simples existência de uma disputa já é um alívio para quem acompanha a política com um olhar mais generoso sobre a democracia interna dos partidos. E no caso do PT, isso ganha contornos ainda mais importantes, porque o partido não é apenas um instrumento eleitoral — ele carrega, para muitos de seus militantes e simpatizantes, uma memória afetiva, uma ideia de projeto de país, uma promessa de mudança.
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Rui não é um nome novo. Ao contrário: ele representa o passado do partido e agora também o futuro. E é isso justamente que torna sua candidatura relevante independentemente do resultado das urnas. Porque mais do que nostalgia, o que está em jogo é a tentativa de reconectar o presente com o fio histórico de um projeto que nasceu para transformar — e não apenas para sobreviver.
A disputa pela presidência do PT não é apenas sobre quem vai comandar a sigla. É sobre o que o partido quer ser daqui pra frente. Um gestor do que existe ou um catalisador do que ainda precisa nascer? Essa pergunta, que Rui Falcão ajuda a recolocar no centro da discussão, talvez seja a mais importante de todas.
Vaquinha virtual
A decisão de Rui Falcão de financiar sua campanha à presidência do PT por meio de um crowdfunding entre militantes não é apenas uma solução prática. É um gesto político com forte carga simbólica. Em tempos em que as estruturas partidárias muitas vezes se fecham sobre si mesmas, a escolha de Rui, acredita seu grupo político, joga luz sobre a possibilidade de reconstruir um vínculo direto com a base.
Ao abrir sua campanha para contribuições voluntárias, ele sinaliza que sua candidatura nasce de um lugar diferente: não da força da máquina, mas da disposição de mobilizar quem ainda acredita que o partido pode — e deve — voltar a ser instrumento de transformação.
Enquanto Edinho conta com o apoio visível da estrutura partidária, Rui aposta na militância, e o faz com um estilo que lhe é próprio: gestos silenciosos, mas carregados de sentido. É a maneira que ele encontrou de dizer, sem palavras, que a disputa não é apenas entre nomes, mas entre modos de fazer política. E talvez esse seja o primeiro passo concreto de uma virada que muita gente dentro e fora do PT esperava ver — um reencontro com a raiz popular do partido, onde as decisões nascem de baixo para cima, e onde transformar é verbo de ação, não de marketing.