Ícone buscar Ícone abrir menu

jornalismo independente

Economia

Análise – gestão e produtividade

Qual a origem e como enfrentar a questão da baixa competitividade no Brasil?

Há uma desconexão entre o potencial do pais, considerando seus recursos (naturais, humanos), e a sua capacidade produtiva

por Marco Tulio Zanini em 16/01/21 09:28

Há uma grande interrogação sobre o Brasil: temos abundantes riquezas naturais, uma grande quantidade de pessoas com excelente qualificação, mas amargamos posições ruins nos rankings globais de competitividade, produtividade e inovação. Como isso é possível?

Buscando responder a essa questão, no início de 2021 lançamos o livro O Elo Perdido (FGV Editora). Trata-se de uma síntese de 16 anos de pesquisas e consultorias em gestão da cultura e produtividade em grandes empresas no Brasil. O livro é o resultado da busca por compreender e desvendar o enigma da baixa competitividade do Brasil no cenário global e a dificuldade de resolver problemas internos às nossas organizações que se apresentam como entraves à prosperidade. É a busca pelo “elo perdido” que possa conectar nosso potencial como nação à nossa capacidade de produzir riquezas.

A grande contribuição da obra é identificar os elementos da cultura que explicam as dificuldades históricas do Brasil em ocupar um lugar dentre as economias mais desenvolvidas. Há uma desconexão entre o potencial do pais, considerando seus recursos (naturais, humanos), e a sua capacidade produtiva. Falamos muito em inovação e geração de valor, mas temos uma grande dificuldade para coordenar ações coletivas e promover o associativismo, quando nos comparamos com outros países desenvolvidos.

Baixa produtividade e competitividade

Temos um desafio como nação: Nossa cultura nacional traz em si elementos com forte relação negativa com a produtividade, e sabemos que, no Brasil, comparativamente, temos uma baixa produtividade do trabalho. Há elementos que a apoiariam, mas não conseguimos enxerga-los presos aos fatores negativos. Ao contrário das afirmações oriundas do senso comum, esta baixa produtividade está mais relacionada ao modelo de gestão e suas consequências em termos organizacionais do que ao baixo nível de escolaridade da mão-de-obra.

Certamente, temos uma elite muito bem formada em detrimento a uma base carente de formação técnica adequada, mas a causa principal da nossa baixa produtividade encontra-se mais relacionada à baixa capacidade de gerarmos coordenação eficiente na organização do trabalho do que promover educação formal. Taylor provou isso quando, utilizando-se de uma mão-de-obra com baixíssima especialização, aumentou cerca de 300 vezes a produtividade atuando essencialmente na organização do trabalho.

Um bom time em uma empresa deve ser formado por pessoas de habilidades técnicas, pessoais e origens diferentes
Capacidade organizacional é um dos desafios diante do Brasil para melhorar sua competitividade perante o mundo.
(Foto: Pixabay)

O modelo de gestão que prevalece no Brasil possui três características marcantes: alta concentração e uso discricionário do poder, baixa confiança interpessoal e institucional e foco excessivo no curto prazo. As três principais consequências desse modelo são:

1) uma baixa capacidade de agregar valor ao processo produtivo e criar qualidade;
2) baixa captura da inteligência coletiva e altos custos de transação
3) alto risco para fazer a coisa certa em termos de produção de valor de médio e longo prazos.

Em geral, por traços de cultura, somos autoritários, distantes da execução, fazemos planejamento reativo e controlamos resultados apenas por retornos financeiros de curto prazo. A distância entre a tarefa prescrita e a tarefa real é enorme. Isso mata a qualidade da operação e gera a percepção, nos níveis hierárquicos inferiores, que seus superiores, os gestores de nível médio, são inimigos e dificultam o seu trabalho.

Na pratica, essa resistência legítima acaba por romper os vínculos de cooperação espontânea e confiança, abrindo espaços para as resistências não legítimas: aquelas derivadas da vaidade, da complacência com baixos padrões de qualidade e da falta de disciplina operacional e pessoal. Olhar para esse processo de forma fragmentada é fonte de resistência à mudança e propensão ao conflito. Há que se olhar de forma integrada e trabalhar o senso de missão, a visão e os valores organizacionais de forma concreta (não cênica). Sem isso, o planejamento estratégico é uma peça de ficção e, a missão, a visão e os valores, quadros decorativos das paredes.

Superando paradigmas

Por essas razões, o contexto organizacional brasileiro é extremamente árido para a inovação e diferenciação. A tentação de produzir produtos de menor preço para aumentar a competitividade no mercado de commodities e/ou para ampliar as vendas para as classes C e D somam-se a essas dificuldades históricas, criando círculos viciosos que nos mantêm preços à posição de provedores de produtos e serviços de baixo valor. Poucas empresas brasileiras estão descobrindo, por meio de casos de erros e acertos, ainda de forma errática, como atingir a excelência operacional e aumentar a oferta de valor para o cliente final, movendo-se para um novo modelo baseado na consciência da interdependência e da necessidade da soma de inteligências para promover inovações incrementais e outras. Para muitas empresas, esse permanece ainda como um discurso absolutamente descolado da prática da gestão.

O passo inicial para enfrentar esse desafio é expandir a consciência sobre esses fatores e desenvolver as lideranças no topo das organizações, aumentando a capacidade de produzir cooperação em jogos ganha-ganha, de médio e longo prazos. Isso se faz pela gestão da cultura da organização. O foco em comando e controle e na visão de curto prazo destrói ou impede o desenvolvimento dos ativos intangíveis.

O Elo Perdido traz essa reflexão essencial para ocuparmos uma posição melhor nos rankings de competitividade, produtividade e inovação. Está nas empresas e na atividade empreendedora a capacidade de promovermos uma mudança sustentável em direção a maior competitividade e produtividade.


Marco Tulio Zanini é Professor Pesquisador da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Sócio fundador da Symbállein, consultoria especializada em Cultura, Liderança e Fatores Humanos na Gestão de Riscos.

últimos vídeos

Inscreva-se no Canal MyNews

Vire membro do site MyNews

Comentários ( 0 )

Comentar

MyNews é um canal de jornalismo independente. Nossa missão é levar informação bem apurada, análise de qualidade e diversidade de opiniões para você tomar a melhor decisão.

Copyright © 2022 – Canal MyNews – Todos os direitos reservados. Desenvolvido por Ideia74

Entre no grupo e fique por dentro das noticias!

Grupo do WhatsApp

Utilizamos cookies para oferecer melhor experiência, melhorar o desempenho, analisar como você interage em nosso site e personalizar conteúdo.

ACEITAR