As tarifas de Trump e o futuro do bolsonarismo Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump | Foto: Molly Riley/Official White House Photo

As tarifas de Trump e o futuro do bolsonarismo

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Reverbera, com força, aqui e alhures, a carta enviada por Donald Trump, presidente dos EUA, ao Presidente Lula. Como muitos já sabem, trata-se de uma intervenção – inédita e direta – na justiça brasileira, nas instituições nacionais e, no limite, em nossa soberania. Vejamos.

Trump alinha-se, ideológica e valorativamente, aos postulados do bolsonarismo, às teses da extrema direita. Há, portanto, uma ameaça de Trump ao Brasil: ou cessam as investigações e o julgamento em curso no Supremo Tribunal Federal (STF), ou os EUA taxarão em 50% produtos brasileiros destinados à exportação. Um duro golpe ao agronegócio, à indústria brasileira e, em última instância, à economia do país. Há, evidentemente, nessa ação governamental de Trump não apenas uma defesa descabida de Bolsonaro – sem sentido e sem respaldo nos fatos -, mas também um claro incômodo dos norte-americanos com os BRICS, findado há pouco no Rio de Janeiro. Assim, em sua política econômica e internacional beligerante, Trump busca, numa só jogada, acenar aos extremistas brasileiros e usar o Brasil como exemplo de um “menino que não se comporta bem” em relação aos EUA, mesmo que os números demonstrem que o Brasil é deficitário em relação ao comércio com os norte-americanos. Não nos esqueçamos, também, de que a Trump Media acionou judicialmente o Ministro Alexandre de Moraes nos EUA, sob alegação –fantasiosa – de que há uma censura e restrição à liberdade de expressão no Brasil e em relação às empresas norte-americanas. Agora, outro aspecto: dentro dos EUA há muitos críticos da conduta de Trump (sugerindo até impeachment do presidente) em relação ao Brasil e, mundo afora, muitos países apresentam-se como solidários aos brasileiros.

Como ficam, então, as narrativas internas, doravante? Desde ontem (10/07), os bolsonaristas sentem o impacto do desgaste promovido pela carta ameaçadora de Trump e buscam blindar Bolsonaro. Obviamente, não querendo perder o domínio da narrativa, o bolsonarismo quer colar, nas redes sociais, que o tarifaço é “culpa do Lula” e, além de Eduardo Bolsonaro, que, nos EUA, atua contra os interesses do Brasil; temos, por aqui, o Governador Tarcísio de Freitas, Romeu Zema, deputados bolsonaristas que até aprovaram uma moção de louvor a Trump. Como sustentar um patriotismo bolsonarista que  defende os interesses de uma potência estrangeira? Respondo: para o núcleo duro da militância bolsonarista, ocorrerá o fenômeno do viés de confirmação, do fortalecimento da ética da convicção e da permanência na realidade paralela causada pela dissonância cognitiva. Por mais surreal que possa parecer, há, inclusive, na hipótese de Trump recuar uma narrativa pronta: foram Bolsonaro e seu filho Eduardo que intercederam junto aos EUA para salvar nosso país. Surreal? Sim! Mas, os anos de fake news, pós-verdade e teorias da conspiração ajudam a criar, fortalecer e comunicar narrativas fantasiosas que passam ao largo da racionalidade.

Já Lula e seu governo que, até aqui, não tem uma marca positiva para chamar de sua nesse terceiro mandato e que, ademais, está em situação ruim nas pesquisas de avaliação, ganha, de presente, ideias mobilizadoras para a militância e para comunicar à sociedade brasileira. Ainda tímida no uso das redes sociais, a  esquerda conseguiu, não faz muito, abalar o domínio da direita e da extrema direita. Repaginando o “nos x eles”, num novo BBB (bilionários, bancos e bets), Lula já conseguiu um “inimigo” interno e, com ajuda de Inteligência Artificial operada pela militância, assustou atores políticos no Congresso, como, por exemplo, “Congresso inimigo do povo” ou “Hugo Motta inimigo do povo”. Com Trump, o melhor dos mundos para os petistas: o velho inimigo externo, o imperialismo arrogante dos EUA. A carta de Trump foi devolvida e a resposta da diplomacia brasileira e de Lula foram: reciprocidade e que não se aceita interferência em nossa soberania. Se, concretizado o tarifaço trumpista, está pronta a narrativa da esquerda: será a “taxa Bolsonaro”. Os setores do agronegócio e da indústria que, de simpáticos apoiadores até financiadores ideologicamente alinhados do bolsonarismo, terão que se posicionar se, de fato, acreditam que a culpa é do Lula ou a responsabilidade é da família Bolsonaro que tanto defenderam e defendem!

Novamente, no Brasil, uma guerra de narrativas: bolsonarismo x Governo Lula. Veremos quem melhor se comunicará com a sociedade e quem terá efetivos apoios e votos. O deslocamento do discurso nacionalista e patriótico, antes monopolizado pela extrema direita, para o campo progressista, pode gerar desdobramentos relevantes nas estratégias eleitorais objetivando 2026. Qual o futuro do bolsonarismo com essa ação de Trump? Está morto? Certamente, não. Mas, está bastante ferido e acuado nesse momento. Trump conseguirá interferir nas instituições brasileiras e cessar com o julgado de Bolsonaro no STF?

[1] Professor e Pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Graduado em Ciências Sociais, Mestre e Doutor em Sociologia, pela Unesp.

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