MyNews conversar com Luiz Antonio Simas, historiador e professor, sobre os resultados do Carnaval de 2025, polêmicas e futuro
Os assuntos do Carnaval de 2025 seguem em pauta, principalmente pelas polêmicas sobre as notas, a jurada que esqueceu de assinar suas anotações, o rebaixamento da Unidos de Padre Miguel e a tentativa da Grande Rio de dividir o título com a Beija-Flor. Diante disso, o MyNews, em parceria com o jornalista Igor Santana, conversou com o historiador, professor, escritor, compositor e palestrante Luiz Antonio Simas sobre o Carnaval. Ele iniciou destacando o debate sobre as notas aplicadas na Sapucaí.
R: “A questão do jurado já é debatida há muito tempo. Isso é um problema, ao existir um corpo de jurados no qual alguns são altamente qualificados, com conhecimento e vivência de Carnaval. No entanto, muitos jurados possuem formação e inserção em perspectivas de mundo muito amplas, abrangendo estéticas e filosofias desvinculadas do sofisticado e específico saber das escolas de samba.
Essa discussão é recorrente. Como é feito o critério de escolha dos jurados? Um currículo acadêmico é suficiente para capacitá-los? Pressupostos da dança clássica legitimam alguém para julgar o bailado do mestre-sala e da porta-bandeira? Essa questão precisa ser enfrentada, e talvez isso tenha ficado mais evidente na avaliação do samba da Unidos de Padre Miguel.”
Pela primeira vez, sob a liderança de Gabriel David, a Sapucaí alterou o formato tradicional de desfiles. Antes, eram dois dias com seis escolas cada. Agora, são três dias com quatro agremiações por noite. O público que acompanhou pela TV aprovou, mas quem esteve presencialmente enfrentou problemas, principalmente com insegurança e transporte. Simas opinou sobre isso.
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R: “Não há muito o que discutir sobre isso. São três dias, e ponto. Essa mudança veio para ficar, pois gerou mais circulação de capital. Apesar disso, sou adepto dos dois dias. Mas o debate hoje é outro. A discussão gira em torno do número de escolas por dia. Há um certo consenso de que quatro escolas é pouco. Cinco por noite seria mais razoável. Essa questão está diretamente ligada à financeirização do Carnaval e do Sambódromo. Precisamos debater isso com cuidado, mas de maneira contundente.
A camarotização é ainda mais preocupante. Muitos camarotes estão completamente desvinculados da cultura do espetáculo que ocorre na pista. Alguns estão integrados aos desfiles, o que é positivo, mas a maioria não. Popularizar o Sambódromo e debater a camarotização é francamente a questão mais urgente.”
Com o anúncio da aposentadoria de Neguinho, percebe-se que os grandes nomes do Carnaval dos anos 70, 80 e 90 estão cada vez menos presentes. Este ano, no Grupo Especial, Renato e Márcia Lage, além de Alexandre Lousada, eram os carnavalescos mais ligados à velha guarda. Simas destacou quem pode ocupar esses espaços.
Beija Flor fez homenagem para Laíla e venceu o Carnaval de 2025 / Foto: Leonardo Cardoso/MyNews
R: “Sobre quem virá depois do Neguinho, é difícil saber. Não dá para apostar numa futurologia. Mas o Carnaval se renova. Isso é da natureza da festa. Tivemos um grande Jamelão, um grande Neguinho, casais emblemáticos como Vilma Nascimento e Benício, Neide Delegado na Mangueira, Maria Helena e Chiquinho na Imperatriz Leopoldinense.
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Novos talentos estão chegando, e o fundamental é que tenham consciência de que pisam num terreno marcado por figuras históricas. O samba é ancestralidade viva. Ele constrói o presente e aponta o futuro, sem estar preso a uma ideia estática de passado.”
Antes dos desfiles na Sapucaí, o carnavalesco Paulo Barros, atualmente na Vila Isabel, declarou que não gosta de abordar temas relacionados às religiões de matriz africana, gerando debate. Simas analisou o contexto e a repercussão da declaração.
R: “Não houve grande discussão sobre isso. No meio do samba, a fala dele foi considerada equivocada de forma quase unânime. Paulo é um carnavalesco importantíssimo, tem legitimidade para fazer os enredos que quiser, mas sua fala foi infeliz, sobre principalmente a suposta homogeneidade dos enredos não brancos.
O Carnaval deste ano apresentou uma variedade simbólica rica, abordando desde encantarias do Pará até macumbas do Sudeste e catimbós do Nordeste. As escolas de samba são constituídas e constituem universos não brancos, conectados ao Brasil africano e indígena.”
Fora da Avenida, o Carnaval do Rio passa por uma transição. A antiga cúpula caminha para seus últimos anos. A morte de Piruinha, além da idade avançada de Capitão e Anísio, sinaliza essa mudança. Herdeiros começam a assumir o papel de patronos, como o filho de Luizinho Drummond na Liesa, Gabriel David na Liesa, Lara na UPM, que no caso é filha é neta de um ex-traficante famoso da cidade maravilhosa e o filho de Capitão Guimarães na Vila Isabel. Simas analisou essa mudança.
R: “Você mencionou pessoas ligadas e não ligadas ao jogo do bicho. Não sei como isso irá repercutir na história do jogo do bicho. Como loteria popular, ele está fadado a acabar se continuar nesse ritmo. Hoje, o jogo do bicho representa menos de 10% do faturamento dos chamados bicheiros. Como historiador, não sou apontador de tendências para o futuro. Nossa função é interpretar o passado. Essa transição é uma realidade, mas como ela afetará o Carnaval ainda é incerto.”
Por fim, perguntamos a Simas se esses novos patronos podem influenciar os campeonatos e se o fim da cúpula traria diferenças para as disputas na Sapucaí.
R: “As escolas de samba estão em disputa. Essa disputa envolve duas perspectivas: uma que prioriza a financeirização e outra que valoriza a cultura. O ideal seria equilibrar ambas. Mas, se a financeirização engolir a cultura, esse será o grande embate do Carnaval nos próximos anos.”