Coluna de Rodrigo Augusto Prando no MyNews
Ontem, 09/06/2025, houve a primeira sessão no Supremo Tribunal Federal (STF) dedicada ao interrogatório dos réus acusados de golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado. Esse é o chamado “núcleo 1”, núcleo do bolsonarismo crucial, por conta da posição de poder na hierarquia da arquitetura golpista.
A imprensa noticiou, com expectativas, o encontro, frente a frente, de Bolsonaro, Mauro Cid e o Ministro Alexandre de Moraes. Nesta sessão, praticamente, a fala de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, monopolizou a atenção. Não houve, para quem leu a peça jurídica de acusação ofertada pelo Procurador Geral da República ao STF, muita novidade. Cid reafirmou aquilo que havia informado na sua delação premiada. Juridicamente, sendo réu colaborador, Mauro Cid não tinha, como os demais acusados, o direito de permanecer em silêncio. Assim, o colaborador foi inquerido por Moraes, por outros ministros e, ainda, pelos advogados. Muitos jornalistas, em suas análises, afirmaram que a fala de Cid complica (implica ainda mais) Bolsonaro, Braga Netto e foi boa (ou ao menos não tão ruim) para Augusto Heleno e Anderson Torres.
Há, obviamente, muitas visadas que poderiam ser analisadas acerca do primeiro dia de interrogatório. Quero, aqui, trazer à dona a dimensão individual, a de Mauro Cid, mas com desdobramentos sociológicos. Em uma de suas primeiras intervenções, Cid asseverou que sua vida mudou completamente: perdeu a promoção que teria no Exército, acabando com sua carreira; perdas financeiras; angústia no bojo familiar e uma depressão que seguiu aos episódios narrados. Os cronistas da cena política nacional publicaram perfis de Cid nos quais indicavam que este nutria por Bolsonaro verdadeira adoração, tendo uma crença quase inabalável no “mito”. Assim, um problema que se apresenta é quando, segundo Weber, a ética da convicção se assenhora do comportamento dos indivíduos, levando-os a se afastar da racionalidade e agindo alicerçados em suas convicções, em seus valores, não se importando com o resultado de suas ações. Ademais, Cid, como muitos bolsonaristas, tinham a certeza da reeleição de Bolsonaro e, por isso, certeza que suas condutas eram corretas e que defendiam o Brasil de uma fraude nas urnas e não só avalizada como incentivada pelo STF.
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Neste caso em tela, além da ética da convicção, pode-se asseverar mais dois outros fenômenos concomitantes: o viés de confirmação e a dissonância cognitiva. O viés de confirmação dá-se, especialmente, numa configuração social “bolhificada”, na qual indivíduos e grupos vivem em bolhas que concentram aqueles que compartilham os mesmos valores e a mesma visão de mundo, no campo ideológico e político. Desta forma, as bolhas ganham impulsionamento pelos algoritmos das redes sociais e as mensagens que chegam até os indivíduos, na bolha, costumam confirmar as crenças compartilhadas, logo, reforçam emocionalmente as convicções sendo enviadas aos demais membros daquela comunidade. Já a dissonância cognitiva é, de modo geral, uma posição na qual quando algum fato da realidade contrapõe as crenças, ao invés de repensar naquilo que se acredita, os indivíduos e grupos ignoram a realidade desconfortável e, não raro, criam uma realidade paralela onde vivem confortavelmente na bolha e não sendo incomodados por fatos concretos, dados empíricos ou conhecimentos oriundos da ciência.
Mauro Cid, bem como muitos dos operadores do 8 de janeiro, agiam assentados na ética da convicção, dentro de suas bolhas, com viés de confirmação e entraram em dissonância cognitiva. Anos de retórica bolsonarista pauta em fake news, pós-verdade, negacionismo e teorias da conspiração criaram o ambiente cultural perfeito para a tentativa de golpe. Agora, todos que buscaram solapar a democracia têm seu encontro com a Justiça e as instituições vigentes na democracia.
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