Canal MyNews lembrou a data em debate com especialistas, que falaram da falha da concessão de anistia aos torturadores, do julgamento de Bolsonaro e outros e da “Semana do Nunca Mais”
Os 61 anos do golpe militar foi lembrado ontem, 31 de Março, numa roda de conversa no programa Segunda Chamada, do Canal MyNews. Os especialistas no tema convidados lembraram das atrocidades daquele período, da relevância histórica de hoje generais e um ex-presidente estarem no banco de réus acusados de um intentona golpista e também da atuação do Supremo Tribunal Federal (STF), que está conduzindo essas ações penais.
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A professora Eneá Stutz, da UnB e Coordenadora do Grupo de Pesquisa Justiça de Transição da instituição, organiza, desde ontem, a “Semana do Nunca Mais”, um evento inédito, com autoridades no assunto, para esmiuçar o que ocorreu no Brasil naquele período e os reflexos hoje. Ela participou do debate.
“É um 31 de Março histórico. A Semana do Nunca Mais, sempre no aniversário do golpe, será promovido todo ano. A ideia é discutir esses temas ligados ao período da ditadura e todos os efeitos nefastos que o pós-golpe gerou, os traumas, mas também a redemocratização. E mesmo como chegamos recentemente nesse ponto de nova tentativa de golpe do Estado, razão de militares processados no STF. Construir esse memória, esclarecer a verdade e promover a Justiça. A promoção da Justiça, na verdade, estamos começando a ver, mas em relação aos ataques do 8 de janeiro, não ainda ao outro período, de mortes e torturas e desaparecimentos”, disse Eneá Stutz.
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O procurador da República Marlon Weichert, atuante nessa área e autor de ação para punição a torturadores no Brasil, ressaltou o papel do STF de não ter sido severo há mais de dez anos, quando validou a Lei de Anistia, o que teve como consequência a manutenção da impunidade aos perpretadores das violações de direitos humanos nos 21 anos de ditadura.
“Tem esse peculiaridade, o STF passou pano para os crimes contra a humanidade praticados na ditadura. Houve uma ação em 2008, pela punição aos torturadores, e o Supremo afirmou a validade da Lei de Anistia. Em relação a crimes contra a humanidade, nenhuma Lei de Anistia e de prescrição é válida. É o que o MPF defende. Mas o STF passou por cima e garantiu a impunidade, inclusive para os militares, que são os responsáveis diretamente envolvidos na repressão. E é curioso que, quando o Supremo garante dessa impunidade, o que vai acontecer? Ele vai ser vítima da arrogância e da tentativa de golpe por exatamente por aqueles que eram ligados aos mais graves crimes da ditadura”, diz Marlon Weichert, que lembrou que um dos réus hoje, o general Augusto Heleno, trabalhou com o então ministro militar Silvio Frota, do governo Geisel.
“A anistia foi a maior falha da democracia”
O jornalista Matheus Leitão, colunista de ‘Veja’, não comunga do entendimento que o julgamento de hoje de um ex-presidente (Jair Bolsonaro) e de oficiais por tentativa de golpe contempla o que ocorreu no passado, na ditadura sanguinária do regime militar. Matheus reconhece sim a importância histórica do que está ocorrendo, mas a pergunte segue: onde está o corpo de Rubens Paiva? E de tantos outros.
“A anistia que veio em 1979, para mim, foi a maior falha da nossa democracia. Foi um acordão com a sociedade civil depois do fim da ditadura. Esses crimes que ficaram impunes são refletidos nos dias atuais. Não nos desfizemos do aparato da violência da ditadura porque não fizemos a justiça de transição. E hoje estão aí, junto com o crime organizado, casos das mortes de Marielle Franco e Bruno Pereira. Circula uma teoria, também na imprensa, de que vamos finalmente sepultar aquele corpo de 1964 com essa ação histórica, com os generais no banco dos réus. Não acho que isso resolve a questão de 64. Não condenamos os criminosos que torturam, mataram e ocultaram cadáveres”, afirmou Matheus Leitão.