Como tarifaços de Trump ferem a economia dos EUA e de seus parceiros comerciais Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em encontro com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen | Foto: Daniel Torok/Casa Branca INSENSATEZ GENERALIZADA

Como tarifaços de Trump ferem a economia dos EUA e de seus parceiros comerciais

Guerra tarifária iniciada por Trump parece pautar-se antes por instintos nacionalistas e percepções equivocadas do que por diagnósticos técnicos

Os tarifaços de Donald Trump têm desafiado não apenas o consenso entre economistas, mas também a lógica mais elementar das relações comerciais internacionais. Longe de se apoiar em uma teoria econômica minimamente estruturada, a guerra tarifária iniciada por Trump parece pautar-se antes por instintos nacionalistas e percepções equivocadas do que por diagnósticos técnicos. A ausência de coerência nas diretrizes econômicas revelou-se um obstáculo prático: interlocutores de países parceiros relatam dificuldade em negociar com os Estados Unidos, justamente porque a administração Trump carece de objetivos claros ou de uma compreensão minimamente convencional sobre as dinâmicas do comércio global.

Ao interpretar os déficits comerciais como sinal de injustiça — como se o simples fato de os EUA importarem mais do que exportam fosse uma afronta —, Trump desconsiderou os determinantes estruturais dessas cifras. O déficit multilateral norte-americano é fruto de fatores como a disparidade entre poupança nacional e investimento agregado, não de algum complô global contra a indústria americana. Ao implementar cortes de impostos sem contrapartidas orçamentárias, o governo reduz a poupança pública e, por consequência, amplia o déficit comercial. Em outras palavras, suas próprias políticas contribuem para o desequilíbrio que ele diz combater.

É importante lembrar que estamos no século XXI, não mais em 1950. Serviços são a parte mais relevante da economia estadunidense. A produção de bens, a manufatura, representa apenas 9% ou 10%. Enquanto a retórica protecionista insiste em resgatar uma suposta era dourada da manufatura, setores como turismo, educação e saúde — verdadeiros motores das exportações americanas — foram diretamente atingidos. Barreiras migratórias e políticas xenófobas afastam estudantes estrangeiros e turistas, dois grupos que movimentam bilhões de dólares e sustentam milhares de empregos em território americano. Assim, em nome de proteger empregos industriais, prejudicou-se setores que, na prática, sustentam a competitividade global dos Estados Unidos.

O prejuízo não se limita ao mercado interno. A imposição de tarifas sobre parceiros tradicionais provoca retaliações comerciais, desestabiliza cadeias produtivas globais e gera incertezas que afetaram investimentos e preços em escala internacional. Economias interdependentes, como as da União Europeia, do Canadá e do México, foram forçadas a responder com medidas equivalentes, prejudicando consumidores e produtores de ambos os lados. No lugar da cooperação, fomentou-se a desconfiança. Em vez de corrigir desequilíbrios, ampliou-se a instabilidade.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, excluiu quase 700 produtos brasileiros do pacote tarifário oficializado nesta quarta-feira. No entanto, a decisão veio na esteira de um gesto que intensifica a tensão política com o Brasil: a nova sanção imposta pelo governo americano ao ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes. Em suma, para além da óbvia crise diplomática, os tarifaços de Trump não apenas têm fracassado em revitalizar a economia industrial americana, como também impõem custos duradouros à economia dos EUA e de seus parceiros. O que se vê é uma política econômica desprovida de racionalidade sistêmica, orientada por um voluntarismo perigoso e por concepções obsoletas de soberania econômica. O protecionismo mal calibrado, longe de fortalecer uma nação, tem o potencial de isolá-la e enfraquecê-la em um mundo onde a interdependência é cada vez mais uma realidade inescapável.

*Daniel Carvalho de Paula é Doutor em História e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie

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