Dos onze ministros da Corte, apenas três mantêm uma presença ativa e estratégica no Instagram; Dino se destaca com ampla vantagem com 1,5 milhão de seguidores, aponta a Ativaweb
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em colocar limites para o funcionamento das redes sociais provocou reações previsíveis: gritos de censura, campanhas de desinformação e ameaças à Corte. Mas limitar o uso predatório das plataformas não significa calar a internet. O STF não quer menos redes, quer menos violência, menos manipulação e menos mentira. Tanto que a própria Corte e alguns de seus ministros não dispensam o uso das plataformas e estão sempre postando coisas.
Dos votos mais destacados no julgamento da semana passada no tribunal, o ministro Flávio Dino é o mais atuante no ambiente digital. Um conhecedor na prática do que circula por aquele meio. Um estudo da Ativaweb, empresa de ponta que se dedica aos números desse universo, revela um dado eloquente: entre os 11 ministros do Supremo, apenas três ocupam de fato as redes sociais como espaço estratégico de comunicação. O restante, ou está ausente, ou é quase irrelevante nesse ambiente que hoje molda a opinião pública.
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Antes de ocupar um assento no STF, Dino estava no governo e se destacava por sua eloquência. Se destacou, nas suas idas ao Congresso como ministro da Justiça, no confronto com os bolsonaristas extremados. Passagens que lhe renderam audiência. Hoje, o ex-governador do Maranhã soma mais de 1,5 milhão de seguidores no Instagram.
Em um país onde as decisões do Supremo Tribunal Federal moldam o destino institucional da democracia, é surpreendente constatar que boa parte dos seus ministros ainda não ocupa com firmeza o espaço das redes sociais. A maioria se mantém distante, como se o debate digital não fizesse parte do exercício da autoridade pública. Mas os dados mostram outra realidade. Essa conexão tem sua relevância.
“Quem não constrói sua imagem digital será definido pelos algoritmos dos outros”, diz o publicitário e analista digital Alek Maracajá, diretor da Ativaweb.
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Dos onze ministros da Corte, apenas três mantêm uma presença ativa e estratégica no Instagram. Dino se destaca com ampla vantagem com esses 1,5 milhão de seguidores, com publicações frequentes, linguagem acessível e um repertório visual que combina bastidores, posicionamentos e temas sociais. Dino construiu uma base digital sólida, e sua taxa de engajamento — superior a 1% — confirma que sua comunicação encontra eco direto na população, entende Maracajá.
Alexandre de Moraes desativou as suas redes. Em fevereiro deste ano, ele abandou o X, que era sua plataforma preferida. O relator dos atos golpistas esteve no Instagram também, mas hoje seu perfil nas redes virou assinatura fantasma a presença existe, mas a voz não.
No Instagram, Dino transita entre seu passado ideológico – posta foto ao lado de Leonardo Boff -, se dedica a agenda institucional, como palestras a estudantes, registra ida a livraria e também ao show de Gilberto Gil. Fez questão de rasgar elogios ao filme “Ainda estou aqui” – ele decidiu que a desaparecimento ocorrido na ditadura é crime continuado – e tem espaço também para as glórias de seu clube, o Botafogo.
A Ativaweb levantou que o segundo nome com relevância digital é o do ministro André Mendonça, indicado por Jair Bolsonaro. Embora tenha um número muito menor de postagens, apenas 19 até o momento, ele mantém uma audiência de 240 mil seguidores. Sua comunicação aposta em pautas como liberdade religiosa, constitucionalismo e fé, o que o conecta com um público específico e altamente engajado.
Já o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, adota uma linha mais didática. Com 272 mil seguidores e mais de 200 postagens, Barroso aposta em conteúdo educativo sobre cidadania, justiça social e o papel do Estado de Direito. Seu tom é sereno, técnico, mas ainda assim acessível — mesmo que sua taxa de engajamento seja inferior à dos colegas Dino e Mendonça.
Já o perfil do STF é bem ativo
Alek Maracajá conta que, no outro extremo, nomes como Cristiano Zanin, Kassio Nunes Marques e Gilmar Mendes demonstram um uso quase nulo das redes sociais. Zanin, por exemplo, não publica nada desde dezembro de 2022. Kassio sequer engajou sua conta com postagens reais. Gilmar, mesmo com um perfil ativo, mantém uma frequência irregular e conteúdo limitado.
“A ausência desses ministros no ambiente digital não é apenas uma escolha de estilo: é também um sinal de distanciamento diante das transformações no modo como a sociedade se informa e interage com o poder público”.
Enquanto isso, o perfil oficial do Supremo cumpre bem sua função institucional. Com mais de 557 mil seguidores e postagens diárias, a conta apresenta conteúdo acessível, com cards explicativos, vídeos com Libras, reels sobre decisões relevantes e campanhas contra desinformação. Os temas que mais geram engajamento são os que dialogam diretamente com o debate público, como a descriminalização do porte de maconha, o marco temporal indígena e campanhas institucionais ligadas à Constituição.
O pesquisador digital Alek Maracajá, da Ativaweb, fez o levantamento sobre os ministros do STF e é autor do livro “O Brasil Digital”
“É incoerente ministros fora das redes”
“Instituição que não se comunica, perde autoridade para quem grita mais alto. Essa é a chave da questão. Em tempos de polarização e ruído, quem não ocupa espaço nas redes acaba sendo engolido por narrativas de terceiros. Não se trata de vaidade digital, mas de responsabilidade pública. A linguagem das redes, quando bem usada, aproxima a Justiça do cidadão, esclarece decisões e reduz ruídos de interpretação”, diz o pesquisador.
Para Marakajá, o STF vive um momento em que suas decisões influenciam diretamente o cotidiano das pessoas. Nesse contexto, diz, é incoerente que boa parte dos seus integrantes não se faça presente nos canais onde a sociedade busca informação.
“A Justiça só se torna compreendida quando aprende a falar a linguagem do seu tempo, e hoje, essa linguagem se chama rede social. Não basta julgar com isenção, é preciso também comunicar com clareza. Estar nas redes, com responsabilidade e estratégia, é uma forma moderna de cumprir a função constitucional de dar transparência aos atos da Suprema Corte”.
Seguidores no Instagram dos ministros do STF, segundo a Ativaweb