Arquivos Aniello Olinto Guimarães Greco Junior - Canal MyNews – Jornalismo Independente https://canalmynews.com.br/post_autor/aniello-olinto-guimaraes-greco-junior/ Nosso papel como veículo de jornalismo é ampliar o debate, dar contexto e informação de qualidade para você tomar sempre a melhor decisão. MyNews, jornalismo independente. Wed, 07 Dec 2022 17:40:05 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 Como lidar com os golpistas na mesa de jantar https://canalmynews.com.br/voce-colunista/como-lidar-com-os-golpistas-na-mesa-de-jantar/ Wed, 07 Dec 2022 17:40:05 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=34824 Como lidar com aquele cunhado que não acusa você de ser contra Bolsonaro por querer uma parte na mamata?

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Todo final de ano temos alguns dramas inevitáveis. Como aguentar os intermináveis e constrangedores amigos ocultos? Que por terem se tornado óbvios e cansativos, inventaram variações engraçadinhas que conseguem piorar o que já era desagradável. Como aguentar o enorme debate sobre as uvas passas? A música da Simone? O especial de Roberto Carlos?

Mas cada vez mais um dilema vai ganhando dimensões de problemas reais, e não apenas problemas de classe média para alimentar memes. Como lidar com a assim chamada polarização política?

Uns 10 anos atrás era apenas lidar com aquilo que hoje chamamos de “tios do zap”, ou seja, as pessoas que na festa natalina insistiam em soltar pérolas como “bandido bom é bandido morto” ou construir frases como “eu não tenho preconceito mas…”. E a solução que tentávamos adotar era tomar um gole a mais de vinho e mudar de assunto. Tipo perguntar para a nossa prima sobre o novo namorado.

Dava certo? Claro que não. O mesmo reacionário de plantão provavelmente iria comentar algo como “espero que seja melhor que aquele tatuado esquisito da última vez”. Mas entre mortos e feridos, no final da noite tudo o que se tinha era duas ou três fatias de torta de climão para contribuir para a ressaca da manhã do dia 25 de dezembro.

Contudo os últimos anos transformaram este climão inevitável em possibilidade de dígitos na extremidade do aparelho digestivo e diálogos intensos com volume acima do confortável. Uma coisa é lidar com os preconceitos difusos e falas abstratas. Outra é lembrar daquela visita no meio da pandemia com a pessoa sabendo estar infectada com o vírus, ou com o fato de seu sobrinho de 14 anos não estar vacinado.

Então, como lidar com aquele cunhado que não vacina seu sobrinho e ainda acusa você de ser contra Bolsonaro por querer uma parte na mamata? Ou com gente gritando que deste jeito a próxima ceia de natal vai ter o Totó como prato principal e com o choro de um primo de sete anos que não quer que seu cachorro seja comido?

A solução que a maioria das famílias irá tentar adotar é a da neutralidade e tolerância. Assumir o acordo de evitar assuntos polêmicos e, no inevitável momento que o poder revelador do vinho se juntar a intolerância, aceitar de forma condescendente a presença de discurso odioso na mesa natalina. Afinal o importante é manter a aparência de harmonia na família.

Para mostrar como esta postura é perigosa, irei lembrar de um dos episódios lamentáveis deste ano. Desculpe por isto. Lembremos do Mamãe Falei indo para Ucrânia e do vazamento daquela gravação com frases como “elas são fáceis porque são pobres”. A sociedade brasileira se revoltou não apenas com o conteúdo das frases, como também com aqueles que tentavam normalizar as declarações por ter sido feita em um grupo sobre futebol. Coisa de homem, disseram alguns.

Agora pensem comigo: se este tipo de frase é inaceitável em um grupo privado sobre futebol, porque seria aceitável na mesa da ceia de natal? Se tentamos convencer as pessoas a não aceitarem frases preconceituosas em uma mesa de bar, e demostrar repúdio contra o machista, o racista, o homofóbico, iremos tolerar isto em nossos parentes?

E pior, não se trata mais de apenas valores, não é mais uma questão de ser “politicamente correto”. Estamos falando de posturas que colocaram nossas vidas em risco na pandemia. Que deixaram algumas cadeiras vazias em nossas mesas.

E que hoje leva a nossos parentes, sangue de nosso sangue, a desejar que alguns de nós sejamos torturados, expatriados ou reeducados. As minorias que se submetam. Mesmo minorias com o mesmo sobrenome.

Buscar uma solução tolerante, diplomática, não é apenas subestimar a violência crescente do cenário atual. É também de uma arrogância perigosa. Se silenciar diante do discurso fascista no nosso lar, no momento de festa, é tratar o intolerante como apenas um iludido, que esta sendo manipulado e não é responsável por seus atos.

No nosso seio familiar o mais importante é criar um ambiente de amor. Mas amor não é apenas carinho, amor não é apenas harmonia. É criar um ambiente onde todos colaborem para que cada um de nós descubramos o caminho para sermos as melhores versões de nós mesmos.

Tolerar o ódio na ceia de natal não é um gesto de tolerância, não é um gesto de amor. É um gesto de covardia. É deixar o amor de lado para evitar um clima ruim, uma discussão, um rompimento. A coragem de criticar, e quando necessário, de repudiar também é um gesto de amor.

Se aquele que amamos esta adotando um caminho destrutivo, e ainda pior, arrastando outros de nós com eles, tolerar esta jornada como apenas uma divergência é colaborar com a ruína. As vezes um pai precisa repreender uma criança para que ela aprenda que a vida tem limites. As vezes temos que repudiar aquele que amamos por estarem destruindo a si mesmos e aos que o rodeiam.

Infelizmente àqueles que hoje acampam em frente aos quartéis, não vacinam seus filhos e que ontem contaminaram vários de nós com um vírus potencialmente letal não estão apenas iludidos ou fanatizados. São pessoas que acreditam estar em guerra pelo seu país, e estão dispostos a matar e torturar quem for inimigo. E sim, as vezes o inimigo seremos nós.

Infelizmente é o momento de demonstrar que o amor nem sempre é cordial. Que virar as costas é uma forma de transmitir a mensagem necessária. A mensagem que não iremos acompanha-los nesta jornada destrutiva.

Não precisa ser um gesto definitivo. O perdão é necessário. Mas não faz sentido perdoar aquele que acredita estar certo.

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O efeito Mandela e o Bolsonarismo – ou porque precisamos checar até o que temos certeza https://canalmynews.com.br/voce-colunista/o-efeito-mandela-e-o-bolsonarismo-ou-porque-precisamos-checar-ate-o-que-temos-certeza/ Mon, 26 Sep 2022 12:24:57 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=33917 Isto se torna especialmente perverso em uma época de fake news. Tenho sido confrontado com vários exemplos de Efeito Mandela em relação aos últimos 4 anos de caos político.

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Segundo a história popular, há momentos que ficam marcados em nossa memória como sociedade, que mesmo décadas depois lembramos com precisão e detalhes o que aconteceu. Por exemplo, os americanos mais velhos costumam a falar que todos se lembram em detalhes como receberam a notícia do assassinato do Presidente Kennedy.

Eu tinha para mim que o 11 de setembro tinha um efeito parecido em minha geração, no mundo inteiro. Eu lembro em detalhes como fui acordado pela ligação de um amigo, que em um fluxo de palavras atropeladas me pedia para ligar a TV. Eu não conseguia entender metade do que ele falava, algo sobre os Estados Unidos estarem sendo atacados. Aí eu liguei a TV, e fiquei uns dois minutos sem fala… Lembro vários detalhes do que aconteceu naquele dia, como poucos dias de minha vida.

Mas o quanto disto é real? Existem uma legião de brasileiros que lembram estarem assistindo um episódio de Dragon Ball Z, no momento em que Goku conseguiria atingir o nível de Super Sayajin 3 no duelo contra Majin Boo, e o programa ter sido interrompido para noticiar o atentado terrorista. O detalhe: isto nunca aconteceu. Na época o anime entrava no ar as 11:15, e o atentando ocorreu as 9:45. Mesmo assim milhares juram se lembrar exatamente do desenho ser interrompido neste momento específico.

É um exemplo brasileiro do que se batizou por Efeito Mandela, um caso extremo de formação de memórias falsas. O nome dado ao fenômeno se deve ao fato de muitos ao redor do mundo terem se surpreendido quando Mandela morreu em 2013. Eles se lembravam nitidamente que Mandela já estava morto desde a década de 90. Alguns se lembravam inclusive de ter assistido o funeral pela televisão.

Muitos apelam para teorias místicas ou conspiratórias para explicar este estranho fenômeno, mas a causa é muito simples: uma história falsa, mas interessante, que ganha popularidade por qualquer razão, pode nos fazer mudar nossa própria memória do que aconteceu conosco. Por exemplo, se você se lembra sem muitos detalhes de estar assistindo um programa infantil que foi interrompido, e outro colega te conta que assistia um desenho específico, você pode ser induzido a acreditar que estava vendo aquele desenho.

Isto deve nos servir de alerta para sermos um tanto humildes quanto ao que acreditamos saber. Em alguns casos devemos ir além de São Tomé, e desconfiar até mesmo do que lembramos ter visto e sentido. A pessoa que enganamos de modo mais eficiente é a nós mesmos.

Isto se torna especialmente perverso em uma época de fake news. Tenho sido confrontado com vários exemplos de Efeito Mandela em relação aos últimos 4 anos de caos político. O mais extremo se refere as pesquisas eleitorais de 2018.

Foi uma campanha extremamente confusa. No início do ano o líder das pesquisas foi preso, e mesmo assim foi lançado como candidato a corrida presidencial. E teve sua candidatura cassada posteriormente. Além disto tivemos o atentado a faca contra seu principal concorrente. Foi portanto uma campanha com as pesquisas tendo de lidar com várias reviravoltas bem bruscas. Então é normal que alguma confusão em relação as memórias sobre quem estava na frente em qual pesquisa e qual momento é esperado.

O que não é esperado é a certeza de lembranças totalmente opostas por grupos diferentes. Muitos, entre eles este que vos escreve, lembram de ter escolhido votar em Ciro Gomes por este ser o único candidato que as pesquisas apontavam ter chances de vencer Bolsonaro em um segundo turno. Nós lembramos em detalhes que todas as pesquisas apontavam, após a saída de Lula, que Bolsonaro era o favorito em praticamente todos os cenários. Exceto no improvável segundo turno entre Bolsonaro e Ciro. O problema? Ciro era o terceiro colocado nas pesquisas.

Além disto lembro do medo que tinha de que Bolsonaro vencesse no primeiro turno, depois do tanto que ele subiu nas pesquisas após o atentado.

Outro grupo muito grande lembra em detalhes que todas as pesquisas indicavam durante toda a eleição que Bolsonaro seria derrotado. Mesmo após a vitória folgada no primeiro turno eles lembram que as pesquisas apontavam em Haddad como vencedor da eleição.

Este caso é fácil de verificar qual das memórias é falsa. Basta verificar os registros das pesquisas na internet. Mas a facilidade de verificar qual memória é real assusta ainda mais, pois mesmo assim a memória falsa persiste. Primeiro por não ser fácil admitir que você tem uma memória falsa, mas principalmente por que acreditamos não precisar conferir aquilo que lembramos como aconteceu. Pensar que eu estava lá, eu vi, eu me lembro pode ser uma armadilha.

Precisamos desconfiar de memórias que muitos questionam. E isto vale para todos. É fácil pensar que as fakes news não nos enganam, apenas os outros. É fácil achar que nossas memórias são confiáveis. Não são. Quando alguém confrontar  uma memória sua, escute. Peça fontes. Procure informações. Cheque. No mínimo você conseguirá mostrar de maneira mais convincente o engano do outro. E talvez até mesmo perceber que sua lembrança esta te enganando.

Isto vai além da política, além do debate eleitoral. É uma lição de humildade sobre o quanto podemos estar enganados. Mas em um cenário de uso em larga escala de fake news, a consequência política do Efeito Mandela pode ser extremamente perversa.

Pois é exatamente o Efeito Mandela que permite a que pessoas reescrevam a história, até mesmo a história recente. Como, por exemplo, um presidente que diz não ter errado nada sobre a pandemia. Ou dizer que o auxílio emergencial foi criado por ele. Aconteceu a menos de 2 anos. E já temos memórias falsas quanto a isto.

 

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

*As opiniões das colunas são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a visão do Canal MyNews

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Uma defesa desapaixonada do voto útil https://canalmynews.com.br/voce-colunista/uma-defesa-desapaixonada-do-voto-util/ Tue, 20 Sep 2022 13:00:46 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=33840 A escalada de violência já está produzindo vítimas, algumas fatais. Uma campanha de segundo turno pode vir a ser um espetáculo de horrores.

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O voto útil é o maior tema deste final de campanha eleitoral. Existe uma real possibilidade da candidatura de Luis Inácio Lula da Silva vencer no primeiro turno, mas esta longe de ser uma certeza. A medida que o dia 2 de outubro se aproxima isto gera uma pressão sobre os eleitores da Terceira Via.

A maior tensão que acabou se construindo foi entre a campanha de Ciro Gomes e a campanha de Lula. O que é no mínimo surpreendente, se lembrarmos a proximidade entre os dois candidatos que existia até 2018. Ciro e Lula não são apenas os candidatos mais similares em termos ideológicos, como foram por décadas aliados históricos. E mesmo assim hoje a rivalidade entre Ciro e Lula só não é maior que a rivalidade entre Lula e Bolsonaro.

Sem em 2018 alguém me contasse que Marina Silva apoiaria Lula, e Ciro seria um crítico ferrenho a candidatura petista, eu iria ficar tão ou mais surpreso do que com o Alckim ser o escolhido como candidato do PT a vice-presidência. Vamos relembrar como foram os conflitos entre Ciro e Lula em 2018 para ver se conseguirmos entender o cenário atual.

A campanha de 2022 é bastante atípica, entre outros motivos por que as principais candidaturas já estavam consolidadas no mínimo desde junho de 2021. Em 2018, assim como na maioria das corridas presidenciais, havia ainda muita incerteza nos primeiros meses do ano eleitoral. Por exemplo, no início de 2018 ainda havia dúvidas acerca de qual seria o tamanho da candidatura de Bolsonaro.

Na esquerda havia uma articulação entre o PT, o PDT e Ciro Gomes para lançarem uma candidatura conjunta. Apesar das pesquisas eleitorais apontarem Lula como favorito, o antipetismo era um fator inquestionável. E Lula estava preso. Haviam sérias dúvidas se uma candidatura de Lula seria aceita pela justiça eleitoral. Dúvidas que acabaram se justificando meses mais tarde.

Neste contexto a dúvida era se o PT deveria lançar um candidato próprio ou apoiar Ciro para presidente. E se o nome PTista deveria ser Lula ou Haddad. E o dilema não se resolveu, levando a uma ruptura entre Ciro e o PT. Ruptura que se mostrou insolúvel até hoje. Relembro deste detalhe para esclarecer que até 2018 Ciro era um apoiador dos governos PTistas, sendo inclusive um crítico da Lava-Jato e um crítico do impeachment da presidente Dilma.

Com Ciro se candidatando pelo PDT, sem apoio do PT, o candidato adota como estratégia uma postura crítica aos antigos aliados, mas nada tão feroz quanto o discurso atual. A medida que o favoritismo de Bolsonaro foi se estabelecendo, Ciro adiciona a esta estratégia uma defesa do voto útil. A maioria das pesquisas eleitorais apontavam que Ciro era o candidato com melhores chances de vencer Bolsonaro no segundo turno. Muitos se convenceram a votar no pedetista com este argumento, inclusive este que vos escreve. Infelizmente não foi o suficiente para levar Ciro ao segundo turno.

Por quatro anos o PT teve que escutar críticas quanto a decisão de rejeitar Ciro, e não poucos apontavam nesta decisão a culpa da vitória de Bolsonaro. Por outro lado, ciristas escutaram por quatro anos a crítica de Ciro ter “indo para Paris” ao invés de apoiar Haddad no segundo turno. Ao meu ver ambas as acusações estão corretas. Ambos os lados erraram. Se isto foi realmente decisivo para a vitória de Bolsonaro, jamais saberemos. Sabemos apenas que desde então os dois maiores líderes da centro-esquerda nacional se tornaram adversários políticos.

 Na campanha atual Ciro adota uma estratégia diferente. Apesar de forte crítico de Bolsonaro, endureceu as críticas contra o PT e subiu e muito o tom. Além das duas críticas já presentes em 2018, a saber a corrupção petista e a manutenção do sistema econômico herdado de FHC, Ciro incluiu duas novas acusações. Em 2022 Ciro passa a acusar o PT de ser o culpado pelo surgimento do bolsonarismo e também o culpado pela violência política cada vez mais crescente. O termo lulopetismo foi substituído pelo termo bolsolulismo, criando uma equivalência bastante injusta entre Lula e Bolsonaro.

 Esta estratégia eleitoral acabou por criar dois fenômenos. Primeiro alguns apoiadores históricos de Ciro abandonaram o candidato, sendo o maior exemplo Tico Santa Cruz. Além disto um número crescente de eleitores de Ciro passaram a defender o voto nulo em caso de um segundo turno entre Lula e Bolsonaro. E o que parecia impensável passou a acontecer. Algumas pesquisas sugerem que esta havendo uma migração de votos de Ciro Gomes para Bolsonaro.

Cito todo este cenário não apenas para criticar as escolhas da atual campanha cirista, mas principalmente para contextualizar os motivos do atual embate entre a Turma Boa e os petistas. Pessoalmente eu preferia ver no Ciro uma atitude similar a de Marina Silva, mas o mundo é o que é. Temos que lidar com esta realidade.

Considerando todo este contexto gostaria de convidar aos eleitores de Ciro que ainda preferem um governo de Lula ao de Bolsonaro, e também aos eleitores de Simone que pensam da mesma forma, a refletir comigo: qual será o preço de termos um segundo turno?

Antes de tudo, eu não acredito que haverá um golpe por parte de Bolsonaro. Pelo menos não um bem sucedido. E também acredito que em um segundo turno entre Lula e Bolsonaro a vitória de Lula é quase certa. QUASE. E este é o primeiro custo de um segundo turno. Por menores que sejam as chances de uma virada de Bolsonaro, elas existem. Vencer no primeiro turno garante que Bolsonaro não será reeleito. Não teremos esta garantia em um segundo turno.

Mas este não é o único risco. O risco mais preocupante de um segundo turno é sobre como será um governo Lula a partir de 2023. A ocorrência de um segundo turno é uma oportunidade de Bolsonaro e o PL buscarem mais alianças além das já constituídas. Não é improvável que partidos de peso como o União Brasil acabem por apoiar Bolsonaro contra Lula.

Isto terá um impacto sobre qual será o poder político do bolsonarismo enquanto oposição. Mesmo sem Bolsonaro ser reeleito, ou mesmo caso ele seja preso, seu forte apoio popular fará do bolsonarismo um dos agentes políticos mais importantes nos próximos 4 anos. Uma derrota no primeiro turno enfraqueceria o legado político de Bolsonaro de forma significativa.

O segundo impacto que vejo em um segundo turno é a questão fiscal. Todos estamos conscientes dos 40 bilhões do orçamento público gastos de forma irresponsável nas vésperas das eleições para tentar quase que literalmente comprar votos para Bolsonaro. Sem falar nas medidas anteriores, como a PEC dos precatórios e o empréstimos para as empresas de energia elétrica, medidas eleitoreiras com impacto similar. Pagaremos o preço por isto. Não é nada improvável que outras medidas sejam feitas no mesmo sentido, com mais dinheiro público desperdiçado em um esforço populista. Acredito que nada na mesmo proporção seja factível, mas mesmo o desperdício de alguns poucos bilhões a mais já seria bastante nocivo.

E por fim temos a questão da violência política. A escalada de violência já está produzindo vítimas, algumas fatais. E o cenário parece estar piorando, e muito. Uma campanha de segundo turno pode vir a ser um espetáculo de horrores. E talvez até mesmo algo em maior escala, similar a invasão do Capitólio nos Estados Unidos. A chance de termos vítimas de um segundo turno é bem real.

E os efeitos de uma violência política exacerbada durarão além da campanha. Ainda hoje sentimos o efeito da decisão de Aécio Neves questionar o resultado eleitoral de 2014. Um segundo turno entre Bolsonaro e Lula será muito mais virulento do que foram as eleições de 2014 e 2018. Ainda dá tempo de evitar.

Não é fácil, nem divertido, nem bonito votar no menos pior. Mas voto não é torcida, não é algo que devemos fazer como o coração, por paixões e simpatias. É um cálculo concreto e objetivo sobre que país queremos para os próximos anos. Se você, como eu, percebe que apenas Lula e Bolsonaro tem reais chances nestas eleições, reflita: vale a pena termos um segundo turno?

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

*As opiniões das colunas são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a visão do Canal MyNews

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A marmita e a Ku Klux Klan https://canalmynews.com.br/voce-colunista/a-marmita-e-a-ku-klux-klan/ Fri, 16 Sep 2022 17:45:57 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=33767 Considero que o Brasil não compreende corretamente a Ku Klux Klan, e pior, deixamos de entender o significado das manifestações de apoio ao atual presidente.

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Uma das declarações recentes de Lula foi mal recebida pela opinião pública. O ex-presidente comparou as manifestações em 7 de setembro com a Ku Klux Klan. Justificou a comparação com base no perfil étnico dos manifestantes, maioritariamente homens brancos de certo poder aquisitivo. E sim, de fato haviam poucos negros, pardos, mulheres e trabalhadores de baixa renda na manifestação.

Muitos consideraram uma acusação de racismo contra todo apoiador de Bolsonaro, e entenderam a comparação como um discurso de ódio. Seria um exemplo da suposta polarização odienta que estaria levando o Brasil a uma espiral de violência.

Contudo eu considero que o Brasil não compreende corretamente a Ku Klux Klan, e pior, deixamos de entender o significado das manifestações de apoio ao atual presidente. Apesar do  racismo não cumprir o mesmo papel nem se manifestar da mesma forma que nos movimentos supremacistas brancos, a comparação faz sentido,m visto que nem a KKK nem o bolsonarismo podem ser definidos apenas como movimentos racistas.

Como a KKK esta presente em nosso imaginário principalmente por causa do cinema hollywoodiano, imaginamos que este movimento se resume a reuniões de encapuzados ao redor de cruzes pegando fogo para linchar negros. Mas não, a KKK era um movimento aceito oficialmente nos EUA, com reuniões em locais públicos, jornais ligados ao movimento e políticos eleitos. Por décadas a KKK era um movimento considerado legítimo e parte do debate político oficial.

E a causa defendida pela KKK não é exclusivamente a perseguição e a dominação do negro. Não é somente o ódio ao negro. Para estes supremacistas brancos, o não-branco era uma ameaça ao sonho americano, ao modo de vida da sociedade, a família tradicional, os bons costumes, os valores cristãos. E como eles se intitulavam? Cidadãos de bem. Este inclusive era o nome do principal jornal de divulgação da KKK.

Para aqueles supremacistas perseguir o diferente, o negro, não é uma guerra fratricida, mas sim defender a nação de inimigos internos, de ameaças ao povo. O negro, representante máximo do não-branco, não é parte do povo, não é parte da nação. E para defender a nação americana das ameaças internas os supremacistas estão dispostos a cometer atos que vão além do ordenamento legal. Estão dispostos a agir no crime, na clandestinidade. Pois mesmo minoritários, eles se consideram o verdadeiro povo americano. E como representantes do verdadeiro povo, eles teriam legitimidade de usar da força para limpar o país.

O quanto isto é similar ao que testemunhamos em 7 de setembro, em nossas ruas? Ao meu ver, bastante. Depois de 4 anos de governo, e pelo menos mais 2 de movimentação bolsonarista nos acostumamos e nos anestesiamos com o lado perverso deste movimento. Neste 7 de setembro deixamos de ver o grotesco. O que ganhou espaço nas manchetes foram o momento imbroxável e a suposta suavização do discurso de Bolsonaro.

Mas devíamos parar de olhar para o palanque e voltar nossos olhos a platéia. O que vemos além das camisetas da seleção e das bandeiras verde-amarela? Quais foram os protestos dos manifestantes? Pois não foi apenas um manifesto de apoio a Bolsonaro. Eles são contra muitas coisas. São contra o Judiciário. São contra a hipótese de uma derrota eleitoral. Acreditam que em caso de derrota eleitoral seria justificável uma intervenção. Eles pediam a “intervenção militar”. Em resumo, uma movimentação anti-democrática e anti-republicana.

Mas vai além disto. A manifestação em 7 de setembro é uma tentativa de demonstração de força. Uma suposta demonstração que as Forças Armadas e o povo estariam ao lado do presidente, e portanto a eleição e as instituições republicanas seriam meros detalhes.

E quem é o povo brasileiro para os manifestantes? É o cristão, mas não qualquer cristão. O cristão que é contra os homossexuais, contra o feminismo, contra a “ideologia de gênero” e outras ameaças ao mito da família tradicional brasileira (que excluiu a maioria das famílias brasileiras). É o anticomunista fervoroso, que enxerga toda discordância política (até mesmo discordâncias sanitárias) como uma ameaça interna a nação. É o armamentista, que considera essencial a sua segurança ter armas para se “defender” de governantes que supostamente querem escravizá-lo. É o defensor do velho lema integralista. Deus, Pátria, Família.

E sim, é também o racista, que vê no negro e no pardo o marginal, o Zé Droguinha, o crackudo. Que acredita que o movimento de orgulho negro é mimimi, que não existe racismo no Brasil. É aquele que aplaude as ações de Sérgio Camargo. E que não vê problema que apesar da queda de homicídios contra a população em geral, o homicídio contra negros subiu.

Os esquerdistas, os vermelhos, os LGBTQIA+, as famílias não reconhecidas como famílias, os defensores dos direitos humanos, de mulheres, de negros, de índios, estes não são o povo brasileiro. Pois não são cidadãos de bem. No fundo eles acreditam que Bolsonaro tem apoio da maioria não por desacreditarem nas pesquisas, e sim por considerarem aqueles que discordam como não sendo brasileiros legítimos. O povo seria apenas o cristão conservador nos costumes e liberal na economia. Apenas o bolsonarista.

É por isto que eles acham normal e natural Bolsonaro ter convertido as paradas militares da independência em comícios. É por isto que eles não enxergam como problema vincular a distribuição de marmitas aos famintos (que segundo o presidente sequer existem) com a posição política. É por isto que eles consideram que patrões poderiam dar bônus para quem votasse em bolsonaro, ou até mesmo demitissem eleitores de Lula. Não é problema se aproveitar da fraqueza do inimigo e abusar do poder econômico. Afinal o povo de verdade já decidiu. Não existe crime eleitoral quando as eleições são uma etapa desnecessária.

Você pode estar pensando agora que o bolsonarismo não tem a mesma violência da KKK. São pacíficos, portando cartazes e palavras de ordem. Não são. Se é fato que ainda não agem de modo muito organizado, também é verdade que sim, a violência já esta presente.

Em 2018 tivemos o assassinato do Mestre Moa do Catendê. Ano passado, durante o 7 de setembro, tivemos 7 tentativas de invasão do STF. Tentativas de um ato terrorista contra um dos poderes constituídos. Este ano tivemos, entre outros eventos, o assassinato de Marcelo Arruda, o assassinato de Benedito dos Santos, e o tiro contra Davi Augusto de Souza durante um rito religioso.

Sim, aqueles que estavam nas ruas no dia 7 de setembro passado se consideram os representantes do verdadeiro povo. Os cidadãos de bem. Nós, que discordamos deles, somos inimigos da pátria. Traidores. Ameaças. Mais de uma vez demonstraram que leis não importam. Que estão dispostos a usar do poder que possuem. Para eles, a violência é um recurso aceitável, para defender a liberdade do povo contra nós. Só falta o capuz. Deus, Pátria, Família. ANAUÉ!

 

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

*As opiniões das colunas são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a visão do Canal MyNews

 

 

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Um novo discurso antipolítica https://canalmynews.com.br/voce-colunista/um-novo-discurso-antipolitica/ Tue, 13 Sep 2022 11:09:29 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=33676 Corrupção se resolve com o fortalecimento das instituições e a participação popular, e não com políticos honestos.

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Já faz mais ou menos uma década que a bandeira de combate a corrupção foi usurpado por algumas correntes políticas. A bandeira da honestidade foi usurpado para atacar a atividade política em si. Algumas lideranças políticas não tradicionais se aproveitaram da sensação de desilusão política e revolta popular para direcionar o ressentimento do eleitor contra toda a classe política.

Apesar de sempre haver um bom número de pessoas que pensam que “político é tudo igual”, o número destes desiludidos tem crescido nas últimas décadas no mundo inteiro. E junto a esta desilusão vem a sensação que a atividade política em si envolve alguma desonestidade, engano e manipulação.

Em parte isto ocorre com o fracasso das democracias ocidentais em entregar o que se esperava delas. Após o fim da Guerra Fria se esperava uma expansão da democracia ao redor do globo, e um período de paz, progresso, e felicidade humana. E se algum progresso nesta direção foi feito, não ocorreu de forma clara o suficiente para satisfazer a população. Por isto na última década uma sensação de que a política democrática fracassou se faz cada vez mais presente.

Aproveitando-se deste ressentimento um grande número de “salvadores da pátria” apareceram, se oferecendo para ser o homem certo na hora certa. Segundo estes supostos salvadores, o que a política precisa é de pessoas honestas, de caráter firme e sólido, dispostas a mudar o sistema. Homens fortes para enfrentar tempos difíceis.

Ou seja, o falso combate a corrupção se baseia em dois conceitos. A personalização da política, transferindo a solução das instituições para as pessoas, e a moralização do discurso. As visões ideológicas, os debates acerca da função do estado, de quais mudanças sociais desejamos, isto se torna pouco importante. O importante é apenas o caráter ilibado e a retidão moral dos líderes e governantes.

Esta é a principal causa do porque aqueles que erguem o combate a corrupção como a principal bandeira tendem a ser governantes autoritários, disruptivos e, curiosamente, corruptos. Ao transferir das instituições para as pessoas a responsabilidade de administrar a coisa pública já temos o ovo da serpente da corrupção. O que nos garante um governo honesto e republicano não é o caráter dos governantes, e sim a solidez e eficiência das instituições. O combate a corrupção é uma questão de estado, e não política de governo.

Enquanto nos ocuparmos em não votarmos em ladrões, e punirmos exemplarmente os corruptos, mas ao mesmo tempo não enxergarmos o Congresso, a Presidência, os Tribunais, os Partidos e entidades de fiscalização como aliados do povo, o processo de despolitização continuará, e a corrupção continuará a crescer. Corrupção se resolve com o fortalecimento das instituições e a participação popular, e não com políticos honestos.

Este discurso de redução da política à questão da corrupção já foi usado exaustivamente como um mecanismo de fortalecimento da mentalidade populista. O líder honesto junto com o povo contra os políticos. Mas com o fracasso da Lava Jato e a revelação dos seus bastidores o eleitor atual se tornou cínico. Percebeu que até os paladinos da justiça se envolviam em seus próprios esquemas escusos. Juntando isto a grave crise econômica vemos que a corrupção deixa de ser a principal preocupação do eleitor.

Então uma nova forma de ataque a política se faz necessária. Uma nova forma de tentar manter o povo com repulsa da política. Uma nova forma de vender que certos grupos são diferentes dos antigos políticos, responsáveis pelos problemas da nação.

E mais uma vez a estratégia é pegar um problema real e grave e aumentá-lo de tal forma a ocupar todo o imaginário. Algo similar a corrupção, que seja grave o bastante para causar uma repulsa moral. Algo que permita classificar quem se opõe a seu discurso como repugnante, perigoso. E o escolhido de hoje é a polarização.

De fato vivemos hoje um momento de muito ódio na política, em que a grande maioria se divide em dois grupos. Um acredita estar no lado do bem contra o mal. O outro define o conflito como a civilização contra a barbárie. Isto é um problema sério que merece nossa atenção e cuidado. Mas temos alguns líderes que usam deste conflito para mais uma vez tentar colocar o povo contra a política, e apresentar salvadores belos e morais, diferentes destes políticos de atualmente.

Para isto eles partem da teoria da ferradura, da ideia bem questionável que radicais de direita e de esquerda tem mais coisas similares que opostas. E também fazem uma falsa similaridade, colocando os radicais de direita como similares aos moderados de esquerda. Mas o pior é a demonização da política em si.

Não é incomum que os defensores de que o problema do Brasil é a polarização também discursem que direita e esquerda sejam conceitos antiquados e superados. Lemas como “nem a direita nem a esquerda, e sim para frente”. E com isto tentam colocar os temas polêmicos, com potencial de gerar divergências, como coisas perigosas de colocar em debate. Temas como aborto, direitos LGBTQIA+, racismo estrutural, etc, devem ser evitados. Não são importantes, não são prioritários, e só dividem a sociedade.

Por fim, é necessário evitar que qualquer análise seja feita fora da hipótese da ferradura. Não se analisa os atos mais extremados de tal ou qual grupo como um ato unilateral. Sempre é necessário culpar os dois polos. Isto em nome de uma tese sem sentido de que não existiria o radicalismo de um lado sem a oposição do outro.

O exemplo mais nítido disto é o uso do termo “bolsolulismo”. A ideia de que a essência dos dois grupos seria a mesma, e que um grupo só existe por que o outro alimenta o ódio. É graças a esta análise contraditória que vemos análises absurdas quanto aos atos de radicalismo atuais.

Exemplo disto foi a declaração de Ciro Gomes em resposta ao atentado contra Cristina Kirchner, vice-presidente da Argentina:

“O atentado frustrado a Cristina Kirchner por pouco não transforma em chuva de sangue a nuvem de ódio que se espalha pelo nosso continente. Nossa solidariedade a esta mulher guerreira que com certeza não se intimidará. Para nós, fica a lição de onde pode chegar o radicalismo cego, e como polarizações odientas podem armar braços de loucos radicais ou de radicais loucos. Ainda há tempo de salvar o Brasil de uma grande tragédia gerada pelo ódio. Paz!”

 Ou seja, em resposta a um ato de um louco radical ou radical louco Ciro opta por acusar os dois lados envolvidos no atentando. A saber, o terrorista e sua vítima. Os radicais loucos não precisam de nenhuma polarização para seu radicalismo e sua loucura. E não faz sentido, por exemplo, culpar Stalin pelos atos de Hitler, ou vice-versa.

E ainda resta uma questão ainda mais nítida. Se há uma verdadeira radicalização no Brasil de hoje, ela começa não em um radicalismo ou intolerância dos governos do PT, nem mesmo na revolta popular contra os erros e desmandos destes governos.

A radicalização começa exatamente no erro de demonizar a política. Não foi a polarização que radicalizou o país, e sim a tentativa bem sucedida de fazer o povo acreditar que toda a velha política era corrupta, imoral e repulsiva. É este sentimento, e não radicalismos ideológicos, que cria o clima de guerra cultural. Os radicais sempre existiram, mas só conseguem poder e alcance quando os moderados passam a odiar.

Por isto a solução para o ódio político jamais será repetir este discurso de repulsa, de apontar dedos, e transformar a política em um combate moral. Precisamos sim apontar os radicais e repudiá-los. Mas precisamos principalmente construir pontes entre os divergentes, e trazer de volta a política para o centro do debate. E não fulanizar a política para atacar a tudo e a todos.

 

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

*As opiniões das colunas são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a visão do Canal MyNews

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Pequeno Glossário Político: fascismo e os regimes de extrema direita https://canalmynews.com.br/voce-colunista/pequeno-glossario-politico-fascismo-e-os-regimes-de-extrema-direita/ Tue, 30 Aug 2022 15:19:07 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=33405 Mesmo após o fim da Segunda Guerra Mundial e a queda da Itália fascista e da Alemanha Nazista o impacto cultural destes movimentos políticos tem influência duradoura entre os movimentos de extrema direita contemporâneos.

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E finalmente encerramos nossa jornada pelos termos frequentes no atual debate político, porém pouco compreendidos. Já discutimos os conceitos de direita e esquerda, de conservadores, progressistas e seus extremos, capitalismo, liberalismo e democracia e socialismo, comunismo e demais ideologias de esquerda. Neste texto analisaremos o conceito de fascismo e ideologias relacionadas.

A leitura dos textos anteriores, apesar de não ser essencial, pode contribuir bastante para o entendimento deste. Sugiro, caso não tenha lido, que retorne ao outros “verbetes” deste pequeno glossário antes de prosseguir neste.

Definir fascismo não é uma tarefa simples. Ao contrário dos demais termos, mesmo os especialistas no assunto divergem significativamente sobre o assunto. O único país que chegou a ter um governo que se definia como fascista foi a Itália de Mussolini, apesar de haver movimentos e partidos fascistas em outras nações no período entre guerras e durante a Segunda Guerra.

Contudo diversos outros governantes se inspiraram no regime de Mussolini e implantaram governos em moldes bem similares. O exemplo mais óbvios é o nazismo de Hitler.

Além disto mesmo após o fim da Segunda Guerra Mundial e a queda da Itália fascista e da Alemanha Nazista o impacto cultural destes movimentos políticos tem influência duradoura entre os movimentos de extrema direita contemporâneos.

Para dificultar ainda mais, em contraste com o liberalismo ou com o comunismo, o fascismo de Mussolini não é propriamente uma ideologia política ou uma filosofia estabelecida. Não é um pensamento sistematizado e organizado, mas sim um conjunto difuso de ideias, algumas contraditórias com outras, formando mais um sentimento do que um sistema de governo propriamente dito.

Por causa disto alguns estudiosos usam o termo fascismo apenas para o regime de Mussolini. Outros expandem o termo para os regimes ditatoriais de extrema direita contemporâneos ao Duce. Estas são visões que o fascismo foi um fenômeno histórico estabelecido, e já superado. Contudo outros acadêmicos defendem que existiria um fascismo perene, que sobreviveu ao fim da Segunda Guerra de forma similar ao neo-nazismo. Reformado, transformado, mas ainda fascista.

Por causa disto não apresentarei uma definição explícita de fascismo, mas tentarei contextualizar o termo com a sua história. Fracassarei quase com certeza e muitos conseguirão perceber o que eu penso quando falo fascismo.

Um dos principais ancestrais ao fascismo é o caudilhismo. O caudilhismo é um modo de governo bastante antigo, mas se estabelece como movimento político na América Latina do século XIX. Os movimentos de independência das colônias espanholas foram muitas vezes liderados por figuras carismáticas, normalmente de origem nas elites nacionais, quase sempre um militar. O caudilho é um líder que personaliza o estado ao redor de sua figura, e se utiliza de uma identificação do povo e do país ao redor de sua figura. O grande líder é a representação tanto do povo quanto do país.

Quando esta visão política atravessa o Atlântico e chega na Europa ganha as vestes de um ultraconservadorismo e de um forte anticomunismo. Se muitos caudilhos latino-americanos foram esquerdistas, na Europa o caudilhismo se torna claramente uma reação ao comunismo e a ameaça de expansão Soviética. Os maiores representantes deste caudilhismo europeu são Miklos Horty na Hungria e Francisco Franco na Espanha. Estes líderes ultranacionalistas viam na ideologia universalista do comunismo uma ameaça a soberania e autonomia das nações. Muito mais do que uma questão econômica, o que havia era um conflito entre duas visões históricas. Para os caudilhos a história seria um conflito entre os povos. Para o comunista, o motor da história é a luta de classes.

A ascensão de Mussolini na Itália ocorre na mesma época dos caudilhos húngaro e espanhol. Contudo a radicalização da retórica nacionalista e anticomunista atinge extremos com Mussolini. O fascismo italiano é uma declaração ao mundo de um Novo Império Romano, erguido pela força e pelo valor do povo italiano, sob o punho firme e decidido do Duce.

Além do nacionalismo exacerbado, do militarismo, do culto ao líder, e do anticomunismo o regime de Mussolini se baseia também no antiliberalismo, na negação dos direitos individuais, na criação de um estado de guerra constante contra inimigos externos e internos, e em um reacionarismo extremo. Tão extremo que chega a ser anticonservador. Para o fascista, os valores nacionais ancestrais foram tão corrompidos pelo liberalismo que seria necessária uma total ruptura com as tradições políticas e econômicas para que a nação italiana se reencontrasse com a sua essência.

Com isto temos uma ressignificação dos termos do que seria política, liberdade, partido, governo, povo, nação. O fascista vê a afirmação do indivíduo do liberalismo como uma forma de dividir a sociedade. As diferenças econômicas, entre patrão e trabalhador, não são importantes. As diferenças de etnia, de cultura, de grupos sociais são elementos nocivos a sociedade. As diferenças políticas precisam ser anuladas. As divergências de opinião, uma fraqueza a ser combatida. A economia deve se direcionar para a construção de uma nação forte, soberana, e unificada. A felicidade e a harmonia seria conquistada pelos fortes, pelos justos e pelos valorosos. Não existe igualdade, existe apenas a união pela supressão do diferente. Os fracos serão subjazes pelos fortes. E qualquer gesto de confraternização com os inimigos seria uma traição.

Apesar do forte caráter antiliberal e antidemocrático o fascismo mantém a posse dos meios de produção na mão da elite e não se preocupa com a questão de distribuição de renda ou de divisão de poder político com as massas populares. O que nos leva a uma curiosa contradição. Liberais e conservadores, assombrados com o fantasma soviético, acabam por tolerar ou até por simpatizar com os ideias fascistas. Em tal nível que grandes empresários ingleses e norte-americanos se unem aos movimentos fascistas durante a década de 1930.

Apesar de antiliberal, o fascismo era visto como uma forma de controlar ou impedir um movimento internacional de trabalhadores contra o capitalismo. O preço pago por esta tolerância inicial de burgueses conservadores com o fascismo não foi pequeno.

O nazismo é claramente um fascismo com esteróides. Mussolini é uma clara inspiração para Hitler. O culto ao líder como representação final do povo, a ideia de uma nação em estado constante de guerra, e a luta constante contra qualquer afirmação da diferença já é praticamente nazismo. Bastou a Hitler encontrar nos judeus o inimigo ao mesmo tempo interno e externo, e criar um mito pan-germânico para a criação de um nacional-socialismo.

Mas não um nacional-socialismo que buscasse a socialização dos meios de produção, e sim uma formação de uma identidade social alemã única, subtraindo todas as divergências. Ao ariano, plena liberdade. Mas não uma liberdade individual, e sim coletiva. Ao demais, o extermínio.

Atordoadas, as democracias ocidentais preferem tolerar os regimes nazi-fascistas e demoram anos para perceber que qualquer convivência pacífica com estados em guerra total era impossível. Apesar do discurso de ódio, de extermínio e de violência ser explícito, ainda não haviam os horrores do holocausto nem o imperialismo explícito para que as democracias percebessem que esta estranha ideologia era uma ameaça muito mais caótica e incontrolável que o comunismo soviético.

E não pense que isto não atingiu terras brasileiras. Aqui, como na Europa, tivemos os nossos fascistas. Até mesmo nazistas propriamente ditos. Mas principalmente os integralistas. Com discurso, estética e métodos muito similares aos dos fascistas italianos. Valorização da violência, do militarismo, do anticomunismo, e do reacionarismo de ruptura.

Somente na Segunda Guerra o jogo vira, e as democracias capitalistas e liberais se unem a ditadura stalinista contra o fascismo. A situação absurda criada por Hitler e Mussolini foi tamanha que esta aliança contraditória se forma. E felizmente vence, a custos humanos exorbitantes.

Se é verdade que após a Segunda Guerra nunca tivemos outros países com governos declaradamente fascistas, também é verdade que durante a Guerra Fria o bloco capitalista se utilizou de regimes militares ditatoriais e anticomunistas para combater a aliança vermelha. Mas estas ditaduras militares, tão comuns na América Latina na segunda metade do século passado, nunca se tornaram tão destrutivas e contraditórias quanto a Itália de Mussolini. Mesmo completamente antidemocráticas, faltavam as características de culto ao líder e da redução do indivíduo a um mártir do povo.

Com a queda do comunismo soviético tivemos um breve período de uma quase unanimidade liberal democrática. Mas as crises econômicas e os conflitos nacionais, junto com o fracasso do liberalismo em entregar uma sociedade menos desigual acaba por criar novamente uma massa de insatisfeitos. Novas crises econômicas e políticas geram novas correntes políticas.

Entre elas uma nova direita. Uma direita nacionalista, militarista, centrada em figuras carismáticas que desejam claramente se tornarem um símbolo não apenas do governo, mas do povo, da nação.

Uma nova direita que defende a necessidade de uma ruptura. Que acredita que tanto o comunismo quanto um liberalismo moral e de costumes corromperam a sociedade a tal ponto que uma reação violenta e revolucionária se faz necessária. É preciso que o cidadão de bem se torne forte e ativo, e combata as ideologias que dividem famílias, grupos e nações. Uma nova direita que acredita em inimigos que devem ser combatidos a qualquer custo. Uma nova direita disposta a morrer pela nação, pela liberdade, pelo bem estar do povo.

Mas também uma nova direita que se vê como democrata, mesmo que em um conceito um tanto distorcido de democracia. Que se vê como liberal, mesmo que conservadora. Revolucionária, mesmo que conservadora. Que acredita em um estado de direito, desde que não atrapalhe ao líder em missão de governar. Uma direita agora ultra-religiosa, mesmo que fazendo um malabarismo com os valores religiosos, transformando paz em guerra, solidariedade em medo.

Podemos chamar de fascismo, ou neo-fascismo. Podemos chamar de uma direita fascistóide. Podemos chamar de extrema-direita e recusar a rotulação de fascista. O que não podemos é ignorar. Ou repetir o erro dos liberais e conservadores de 90 anos atrás.

No mínimo os lemas são os mesmos. O uso de retórica integralista e neonazista se faz cada vez mais presente. Lá, na Europa, os tambores da Guerra começam a rufar. E de forma curiosa a extrema direita lá agora usa a bandeira russa. Aqui, falamos novamente em Deus, Pátria, Família.

Não nos esqueçamos de Roberto Alvin. Ou de como recebemos Beatrix von Storch. Dos 300 marchando na Praça dos Três Poderes. Ou ainda de como as células neo-nazistas estão saindo dos esgotos e ressurgindo como não acontecia por quase 100 anos.

Se não quiser usar o nome fascismo, nome tão desgastado, não use. Mas entenda que a ameaça aqui no Brasil não é nem nunca foi o comunismo. O Brasil sobreviveu ao integralismo e ao militarismo anticomunista, sem precisar de revoluções ou guerras. Superaremos agora com democracia. Pacificamente.

Este marca o fim do meu glossário. Não deixe que meu discurso final seja aquilo que determine como você lê estes textos. A minha análise foi no mínimo sincera. Mas creio que em especial nos conceitos mais simples, bem fundamentada. Agradeço quaisquer correções ou críticas, desde que desarmadas.

 

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

*As opiniões das colunas são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a visão do Canal MyNews

 

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A ponte entre o liberalismo e o fascismo https://canalmynews.com.br/voce-colunista/a-ponte-entre-o-liberalismo-e-o-fascismo/ Tue, 23 Aug 2022 13:16:13 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=33209 O fato é que o capital não tem nenhuma resistência com economias de países ditatoriais, desde que se mantenha uma economia nos moldes liberais.

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Em uma matéria recente do Guilherme Amado para o site Metrópoles, o Brasil descobriu que um grupo de empresários bolsonaristas conversam abertamente sobre como, segundo eles, um golpe de estado seria preferível a volta do Lula a Presidência da República.

O jornalista teve acesso a conversas de WhatsApp destes empresários. Entre vários absurdos, quero destacar a frase de Jose Koury. Segundo o proprietário do Barra World Shopping, “Prefiro um golpe que a volta do PT.  Um milhão de vezes. E com certeza ninguém vai deixar de fazer negócios com o Brasil. Como fazem com várias ditaduras no mundo.”

Esta frase é difícil de engolir em vários aspectos. Temos um empresário analisando o impacto de um golpe de estado nos Brasil sob o aspecto dos negócios. O que importa para ele é que os investidores estrangeiros não deixariam de investir no Brasil caso entremos em um regime de excessão.

Apesar da falta de compromisso com a democracia ser chocante, o mais assustador é que a frase é em sua essência verdadeira. Meio verdadeira. Se é verdade que a lógica do mercado não gosta de instabilidades e de incertezas, e portanto seria reticentes com reviravoltas ditatoriais, também é verdade que a história nos mostra que regimes ditatoriais não impedem uma economia de mercado.

Como exemplo histórico podemos citar a origem da marca Fanta, criada pela Coca-Cola para continuar a negociar com a Alemanha Nazista, contornando as dificuldades dos embargos econômicos em uma economia em guerra. Um exemplo inofensivo, se compararmos, por exemplo, com o uso de judeus em campos de concentração por empresas como a Bayer.

Mas nem de longe o exemplo se resume a Alemanha nazista. Podemos citar até exemplos domésticos como as empresas automobilísticas durante a Ditadura Militar. Exemplo ainda melhor foi o Chile de Pinochet, que adotava políticas econômicas liberais ortodoxas em um regime totalmente autoritário. Ou atuais, como a dificuldade de estrangular a economia e o comércio de petróleo e derivados russos, mesmo com embargos comerciais nunca antes visto.

O fato é que o capital não tem nenhuma resistência com economias de países ditatoriais, desde que se mantenha uma economia nos moldes liberais. Mesmo com estados interventores, mantendo-se o controle privado dos meios de produção, o dinheiro continua vindo. Até para a China do Partido Comunista.

Isto é em uma primeira vista contraditório. Afinal a ideologia liberal é a mãe do conceito de Estado Democrático de Direito. O liberalismo surge como uma crítica ao estado autoritário e como uma defesa das liberdades individuais. Algum malabarismo precisa ocorrer para que alguns liberais prefiram ditaduras a governos que defendam uma economia com perfil mais social. Importante destacar que no caso aula brasileiro são alguns empresários, uma parte minoritária, como as assinaturas da Carta às brasileiras e aos brasileiros demonstram.

Mas mesmo assim algumas figuras muito influentes e muito ricas dos “conservadores no costume, liberais na economia” escolhem, por motivos ideológicos, um regime autoritário, uma ditadura, o oposto do liberalismo em sua origem.

A ponte entre o liberalismo e o autoritarismo começa por um foco ilusório na economia. Primeiro se afirma que a essência do liberalismo seria apenas a defesa de um Estado  Mínimo e de uma economia de livre mercado, retirando da ideologia a parte de direitos fundamentais e liberdades individuais. E depois se faz uma separação impossível entre economia e relações sociais, pretendendo que uma pode ser independente de outra.

Com esta distorção se torna possível defender a aprovação de empréstimos consignados com o Auxílio Brasil. Afinal se podemos separar a economia do social, então o fato do Auxílio Brasil ser uma verba destinada a retirar uma camada social da miséria absoluta se torna irrelevante, e passa a ser aceitável aplicar a lógica do mercado financeiro para uma verba que deveria ser de caráter alimentício e de subsistência.

Esta mesma lógica de tratar toda relação econômica livre como justa, ignorando a parte social, pode levar liberais como Joel Pinheiro a defender que a autorização do comércio de orgãos não vitais seria uma forma aceitável de diminuir as filas de transplante e ajudar pessoas em necessidade econômica. Ou, em outros termos, não ver problemas éticos em pessoas se mutilarem para evitar a miséria vendendo seus órgãos para quem possa comprar.

Mas esta desconexão entre economia e sociedade não explica totalmente como liberais podem apoiar os regimes mais extremos, o fascismo, o nazismo e seus similares. Para tanto precisamos de um ingrediente a mais. Algo que justifique ideologicamente que alguns grupos sociais possam ser colocados a parte dos direitos humanos supostamente universais. No século XIX alguns liberais não viam problema na escravidão. No século XX, outros liberais acreditaram que o fascismo era uma ferramenta para se evitar o comunismo.  Hoje alguns liberais enxergam  nas causas identitárias e nas políticas afirmativas uma ameaça a liberdade econômica.

A justificativa moderna para se excluir grupos sociais inteiros daqueles que merecem ter direitos humanos plenos é a meritocracia. Sim, a aparentemente inofensiva meritocracia, que parece ser apenas uma bobagem usada por coachs para capturar o dinheiro de seus alunos. Esta é a ponte possível entre o liberalismo e o fascismo contemporâneos.

Para tal basta passar a entender as diferenças econômicas e sociais como resultado de uma mentalidade inadequada, de escolhas erradas ou de mera incompetência ou falta de vontade de vencer. Este é o momento que classificamos os marginalizados como pessoas que querem privilégios, que não se esforçam, ou que são incompetentes. Em resumo, são inferiores. São incapazes. São parasitas. São menos do que nós, os cidadãos de bem.

A meritocracia não é apenas uma ilusão para convencer a classe média que ela pode ser tornar rica se trabalhar mais. É na verdade um culto as elites, e uma desumanização dos miseráveis. Pois para quem acredita na meritocracia, basta se esforçar para sair da miséria.

Não é coincidência que estes empresários que preferem um golpe de estado a um governo de esquerda sejam também os que defendem que os movimentos sociais são uma ameaça a democracia. E que querem que os cidadãos de bem se armem e exterminem as ameaças sociais que o outro, o diferente e o excluído representam. E também não é coincidência que sejam os maiores defensores da meritocracia. Estes são a ponte entre os supostamente liberais e os fascistas. Em nome de Deus, da Pátria e da Família. ANAUÊ!

 

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

 

*As opiniões das colunas são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a visão do Canal MyNews

 

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O olho mais azul: o que escolhemos ver https://canalmynews.com.br/voce-colunista/o-olho-mais-azul-o-que-escolhemos-ver/ Sat, 20 Aug 2022 14:24:53 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=33137 O olho mais azul, livro tema do Clube do Livro do My News é um livro que você detesterá ler. Mas não conseguirá largar.

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O olho mais azul, livro tema do Clube do Livro do My News é um livro que você detesterá ler. Mas não conseguirá largar. Toni Morrison vai te maltratar. Sem rodeios, sem suavidade. Sem buscas estéticas, sem construção de rodeios, sem suavidade.

 A perversidade da autora beira o sadismo ao escolher a figura de Pecola como centro do livro. Uma criança preta, pobre, feia e de lar insalubre nos Estados Unidos da década de 1940. Mas assim como as Pecolas da vida real, a protagonista de O olho mais azul não tem o direito sequer de narrar a própria história. Conhecemos Pecola por suas conterrâneas, outras crianças pretas e pobres do EUA segregacionista. Mas estas, por acasos frios e desumanos, ficam alguns milímetros acima do fundo desumano, e mesmo sendo na prática iguais a nossa protagonista, ao mesmo tempo não são.

 Não é um mundo de sutilezas. E somos jogados neste mundo também sem cerimônias. Na primeira frase já descobrimos, com aquela indiferença que só as crianças são capazes, que certas flores plantadas não cresceram pois Pecola engravidou de seu próprio pai.

 Os eventos se seguem em capítulos fragmentados, sem cronologia linear, e com uma série de lacunas. Como na vida real, conhecemos as pessoas por fragmentos, e tentamos reconstruir um todo por meio de um mosaico. Alguns cacos de ingenuidade infantil, outros de fantasia, que poderiam dar suavidade mas apenas humanizam os vários cacos das mais diferentes violências que Pecola e os demais sofrem.

 É uma história sem heróis, sem vilões, onde ninguém e todos são bondosos e malévolos. E colocou este leitor em um mundo tão distante e desconhecido do meu que poderia ser fantasia. Mas que sabemos que esta muitas vezes a poucos metros, mas nos recusamos a ver.

 O olho mais azul é a história de uma criança preta dos Estados Unidos da década de 1940 que tem por seu maior desejo ter olhos azuis. Um desejo tão absurdo quanto compreensível. Um exemplo de uma história que por seu regionalismo tão forte acaba se tornando universal. Uma história que você irá detestar. Mas que vai te transformar, e você vai agradecer.

 É diferente aprender sobre racismo estrutural, ditadura da beleza, machismo e misoginia, e ouvir a voz de uma personagem falando não de preconceitos, mas contando sua história. Poderes que muitas vezes a ficção consegue ter mais que a vida real.

 Espero que você aceite o convite de conhecer Pecola, e viver em seu mundo de horror por alguns dias. E depois espero que sejamos capazes de ver um pouco as Pecolas reais e seus olhos que querem ser azuis.

 

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

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Pequeno Glossário Político: Anarquismo, Socialismo, Comunismo e Social-Democracia https://canalmynews.com.br/voce-colunista/pequeno-glossario-politico-anarquismo-socialismo-comunismo-e-social-democracia/ Mon, 15 Aug 2022 14:55:30 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=32998 Conheça as ideologias políticas que surgiram em resposta as democracias liberais.

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Esta é a quarta parte do meu Pequeno Glossário Político. Apesar de não ser necessária a leitura das partes anteriores para entender esta parte, sem dúvida elas darão um contexto mais amplo. Então sugiro a leitura da primeira, segunda e terceira partes.

Aqui analisaremos as ideologias políticas que surgiram em resposta as democracias liberais. Após a Revolução Gloriosa, a Independência Americana e a Revolução Francesa tivemos a propagação dos ideias de República, Democracia, Direitos Humanos Universais e do liberalismo. Mas isto também se traduziu no colonialismo, no imperialismo, no tráfico internacional de escravos, e na criação de uma enorme desigualdade econômica e social entre trabalhadores e capitalistas. Estas incoerências e desigualdades acabaram por criar uma série de movimentos contestatórios.

Provavelmente o primeiro deles é uma espécie de irmão radical do liberalismo. O anarquismo pega como base a ideia liberal de que o Estado tem a tendência de controlar e reprimir as liberdades individuais e leva para o extremo. O anarquista defende que toda hierarquia é uma forma de dominação, e por isto defende o fim das relações hierárquicas, sejam elas econômicas, sociais, religiosas ou culturais. Em especial o anarquista vê o Estado como a dominação do homem pelo homem. Em lugar das organizações hierárquicas o anarquismo propõe a autogestão, a livre associação e o trabalho comunitário. O objetivo final do anarquismo é a construção de uma sociedade libertária,  sem estado, classes econômicas, castas sociais ou outras formas de dominação.

Junto ao anarquismo surge também o socialismo. Para o socialista as desigualdades e incoerências da sociedade capitalista se deve a propriedade privada dos meios de produção. A solução para as contradições capitalistas seria a socialização dos meios de produção, ou seja, o controle comunitário destes. Importante destacar que não se trata do fim de toda e qualquer propriedade individual, mas sim a propriedade privada dos meios de produção. Em uma sociedade socialista você pode, por exemplo, ter o seu apartamento e a sua televisão, mas ninguém seria dono das indústrias que produzem estes bens materiais.

Junto ao socialismo temos também o comunismo. Durante muito tempo os dois termos foram usados quase como sinônimos, mas há algumas diferenças. O comunismo, assim como o socialismo, considera que a exploração do trabalho pelo capital é a causa das desigualdades sociais atuais. E como solução para isto propõe o fim da propriedade privada, o fim do estado, e o fim das classes econômicas. No comunismo não há propriedade privada, apenas bens coletivos. E não há governo ou classes econômicas. A sociedade obteria de cada um o que eles podem produzir, e ofereceriam para cada um o que eles necessitassem.

Estes três movimentos trabalhistas se organizam de forma relativamente colaborativa, apesar das divergências, durante o século XIX. O auge desta movimentação anarquista, socialista e comunista aconteceu no ano de 1848, com uma série de revoluções ao redor da Europa. Podemos destacar ainda a Comuna de Paris, em 1871, tida por muitos como o primeiro governo popular da história.

Mas nenhuma destas revoluções durou o suficiente para criar uma nova forma de sociedade. Isto só vem a acontecer em 1917, com a Revolução Russa. Promovida pelo Partido Comunista Soviético, a Revolução Russa muda completamente o cenário destes movimentos de trabalhadores.

O modelo construído por Lênin e seus bolcheviques acabam por sedimentar uma série de conceitos pelos quais entendemos o que é socialismo e comunismo hoje. Em especial é somente em Lênin que temos a definição do socialismo como uma etapa para se atingir o comunismo.

Na visão de Lênin o comunismo só poderia ser implantado através de uma revolução armada do trabalhador, derrubando o governo burguês. Mas para se atingir o comunismo, era necessária uma etapa de adaptação social, onde o estado socializaria os meios de produção e anularia as diferenças econômicas e trabalhistas.

Infelizmente as experiências deste socialismo real como meio de atingir o comunismo se traduziram em regimes de partido único, censura, totalitarismo, fim das liberdades civis, etc. E não poucas vezes levou a tragédias humanas do pior tipo, com prisões políticas, extermínio da oposição, desestruturação econômica, fome, miséria, etc. E nenhum país atingiu o estágio do comunismo, mesmo após décadas governados por comunistas.

Do outro lado surgiram movimentos anticomunistas. Mesmo antes da Revolução Russa, antes dos governos socialistas do bloco soviético a resistência aos comunistas foi radical e violenta. E com os horrores vindos da época da Guerra Fria se tornou cada vez mais comum confundir as ideologias libertárias ou revolucionárias com os horrores realizados pelos países do bloco socialista. Contudo nem todo anarquista, nem todo socialista e nem todo comunista defendem a revolução armada, regimes de partido único e o combate violento a toda forma de oposição.

E cabe ainda lembrarmos que horrores similares acontecem também no lado capitalista da polêmica. Em especial temos o fascismo histórico, o nazismo, os regimes militares de direita. Assim como o passado escravocrata e o presente imperialista das nossas economias de mercado. Mas este é o assunto para meu último texto deste glossário.

Contudo antes de falar do fascismo e seus irmãos políticos, preciso ainda comentar da social-democracia. Especialmente após a Segunda Guerra Mundial começa a se formar uma tentativa de terceira via, um meio termo entre o Capitalismo Liberal e o Socialismo. A ideia central é a criação de um Estado de Bem Estar Social, onde a função do estado iria além da preservação das liberdades individuais. Caberia também ao estado criar uma estrutura de suporte social com a intenção de diminuir as desigualdades. A propriedade privada seria preservada, desde que atendesse a sua função social. O capitalismo seria o sistema econômico, mas com intervenção estatal nas relações econômicas.

A Social Democracia foi implantada com relativo sucesso na Europa, em especial nos países escandinavos, mas demandando alta carga tributária e com uma sustentabilidade econômica muitas vezes instável. E mesmo assim não atendeu aos anseios daqueles que consideram a relação entre capital e trabalho como uma forma de exploração. A Social Democracia acaba sendo vista como uma forma branda de comunismo para uns, e para outros como um capitalismo com caridade e hipocrisia.

E antes que me acusem de ter esquecido deles, temos ainda um quase movimento que vem crescendo na internet recentemente: o anarco-capitalismo. Apesar do nome, o anarco-capitalismo quase nada tem de anarquismo. Defende o fim do Estado, mas acredita que as relações econômicas e mercadológicas não precisam de controle ou gestão comunitária. Bastaria um acordo de não agressão entre os indivíduos, e deixar a sociedade ser regulado pela economia. As demais formas de hierarquia e dominação que os anarquistas combatem não são problemas para o anarcocapitalista.

Neste ponto os anarcocapitalistas se assemelham aos “liberais na economia, conservadores no costume”. Pegam a parte da ideologia que lhes convém, ignorando o princípio original do anarquismo para estes e do liberalismo para aqueles.

No próximo e último texto falarei dos movimentos de características ditatoriais que ocorreram e ocorrem dentro das economias capitalistas. O fascismo, o nazismo, os regimes militares. E um pouco dos instrumentos de construção destes, como o populismo e o caudilhismo.

E peço a gentileza dos comunistas e anticomunistas a não me fuzilarem por meus erros de análise. Estou aberto a críticas e correções. Tenho certeza que devo ter cometido alguma heresia.

 

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

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Perpétuos no streaming https://canalmynews.com.br/voce-colunista/sandman-perpetuos-no-streaming/ Mon, 08 Aug 2022 16:23:28 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=32640 Sandman fala de um mundo oculto onde além dos homens, da magia, das criaturas fantásticas e até dos deuses existe uma família de entidades representativas das grandes forças que regem não o mundo, mas os homens.

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Nesta sexta-feira, 5 de agosto, estreou a série Sandman na Netflix. Mas na verdade esta história começa em janeiro de 1989, com a publicação do primeiro fascículo da épica saga de Sandman, escrita por Neil Gaiman. Ou talvez a história tenha começado nas brumas do tempo, nos primeiros sonhos dos primeiros seres humanos, em um tempo ao mesmo tempo próximo e distante, com qual nos reconectamos todas as noites, mas esquecemos em parte cada vez que acordamos.

Mais importante que sabermos se esta nova versão de um dos quadrinhos mais marcantes da história é uma boa adaptação seria reconhecer o poder de uma boa história, de um bom sonho, de um bom mito. Quase certamente a série de TV não será um marco como foi o quadrinho no qual ela se baseia. Mas será uma nova forma de uma potente história em ressoar novamente em nossos inconscientes. E uma oportunidade para aqueles que não foram expostos a Sandman na década de 1990.

Para quem não faz a menor ideia do que eu estou falando, Sandman fala de um mundo oculto onde além dos homens, da magia, das criaturas fantásticas e até dos deuses existe uma família de entidades representativas das grandes forças que regem não o mundo, mas os homens. Os Perpétuos. Destino, Morte, Sonho, Desejo e Desespero, Delírio e um irmão pródigo (que não darei o nome aqui para preservar a surpresa), mais antigos e mais imortais que deuses e homens, mas ao mesmo tempo dependente deles.

É um tipo de fantasia bastante diferente de Harry Potter ou de Senhor dos Anéis, sendo mais similar de fenômenos culturais como Star Wars ou Matrix. Sandman é um mito moderno, uma metáfora que por meio de mentiras e delírios acaba por nos falar de verdades inabordáveis por meio de estudos acadêmicos, ritos religiosos ou discursos políticos.

Nesta primeira temporada somos levados a sonhar com coisas como quantas vezes nos tornamos prisioneiros daquilo que temos e que construímos, perdendo o contato com aquilo que somos. Ou nos desesperarmos com qual seria o resultado de um mundo sem mentiras, disfarces, sonhos e ilusões. Ou ainda sobre que poder o sonho e a esperança pode vir a ter quando nos percebemos em uma realidade inescapável e cruel.

Mas entre vários aspectos do Sonhar em Sandman quero destacar a Morte. Gaiman optou por retratar a Morte como uma jovem sorridente, cativante e empática. Uma figura vibrante, e calma, a irmã mais velha, mais madura e muito mais humana que seu sombrio irmão, o Sonho.

Em uma sociedade onde convivemos cada vez menos com a morte, que sai de nosso cotidiano para as UTIs distantes, desaprendemos a perceber o lado positivo, a benção que a morte pode representar. Não apenas o descanso, como principalmente a renovação. Sem o antigo sair de cena, sobra pouco espaço para o novo. Sem a morte não há o renascimento. Não são poucos os mitos antigos que mostram o quanto o túmulo pode ser semelhante ao ventre.

Mas não ache que estes temas maiores que a vida irão te sufocar. Se é verdade que há um tom épico e cósmico em Sandman, isto só ocorre por meio de seus personagens humanos, comuns e conhecidos. Contudo adormeça seu consciente antes de assistir. Esqueça as lutas cotidianas, se desligue. E mergulhe. Haverá momentos de terror, momentos de júbilo, de espanto e de epifanias. E no final da jornada (espero que daqui a 4 ou 5 temporadas, pois material original para isto não falta) com certeza você sairá diferente.

Por fim, um parênteses aos fãs apegados. Sim, há mudanças e diferenças. Em especial alguns personagens mudam de sexo, de cor de pele, de grupos culturais. Mas isto não importa. Nunca sonhamos duas vezes o mesmo sonho. Pois no final de cada um deixamos de ser quem éramos.

 

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

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Pequeno Glossário Político: Capitalismo, Liberalismo, Democracia e República https://canalmynews.com.br/voce-colunista/pequeno-glossario-politico-capitalismo-liberalismo-democracia-e-republica/ Tue, 02 Aug 2022 12:09:03 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=32421 Se tudo der certo, vou convencer alguns de vocês que o tão popular “liberal na economia, conservador nos costumes” é uma contradição em termos.

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E retomo a minha série de textos sobre termos políticos muito usados mas pouco compreendidos no debate político atual. Já analisamos qual o sentido de direita e esquerda, bem como as gradações entre conservadores e progressistas. Apesar de não ser essencial, a leitura daqueles textos podem contribuir para o entendimento deste.

Agora pretendo apresentar os conceitos de capitalismo, liberalismo, democracia e república. E, se tudo der certo, convencer alguns de vocês que o tão popular “liberal na economia, conservador nos costumes” é uma contradição em termos.

O conceito de capitalismo talvez seja o mais difícil de absorvemos, visto que naturalizamos tanto o sistema econômico que vivemos que passamos a acreditar que o capitalismo faz parte da natureza, ou de qualquer sociedade humana. Muitos cometem o erro de afirmar que o capitalismo é tão somente a livre troca de mercadorias, por exemplo.

LEIA TAMBÉM: Pequeno Glossário Político: Conservador, Progressista, Reacionário, Revolucionário

Se para entendermos o conceito de esquerda e direita nós temos que retroceder até a Revolução Francesa, para compreendermos o capitalismo temos que retroceder até a Idade Média. Durante a maior parte da Idade Média o sistema econômico vigente na Europa foi o feudalismo.

O feudalismo se consistia em uma organização econômica e social ruralista, com o uso da mão de obra servil trabalhando para grandes proprietários de terra em troca de usar parte de sua produção para sua subsistência. Os proprietários de terra ofereciam em troca a segurança militar. E todos se colocavam sob a orientação espiritual da Igreja Romana.

No final da Idade Média temos um aumento populacional, que gera uma maior produção agrícola. Combinado com as Cruzadas e a abertura de rotas comerciais com o Oriente, e também com o Iluminismo, uma mudança lenta mas contínua se estabelece.

Temos um fortalecimento do comércio, o que gera uma nova classe social, pessoas que tiram sustento do comércio e deixam o ambiente rural, passando a morar nas cidades, ou burgos. Temos o surgimento dos burgueses. E a medida que os burgueses vão acumulando mais poder econômico, uma nova forma de riqueza se estabelece. Uma riqueza baseada não na propriedade da terra, e sim no capital. Assim surge o capitalismo. E a medida que as relações comerciais vão se tornando mais complexas e mais importantes o trabalho servil vai caindo em desuso, e entra em ascensão o trabalho assalariado.

Podemos então entender a chegada do capitalismo, de forma simplificada, como a mudança do proprietário de terra para o comerciante e industrial, e do servo para o assalariado. E a riqueza, antes ligada a posse de terra, passa a ser a posse dos meios de produção.

Com esta mudança econômica novas estruturas políticas vão se tornando necessárias. As formas de governo medievais se transformaram nos Estados Nacionais, sob a coordenação da nobreza aristocrata, herdeira dos senhores feudais. Mas o poder econômico migra da nobreza para a burguesia. E com isto temos um conflito entre o sistema político das monarquias absolutistas e o sistema econômico do capitalismo mercantil.

É neste contexto que acontecem a Revolução Gloriosa, a Independência Americana e a Revolução Francesa. São três momentos históricos que marcam as origens do que chamamos de liberalismo, república e democracia.

Em um primeiro momento temos o surgimento do liberalismo, em especial na Inglaterra. Os governos das monarquias absolutistas representavam um obstáculo para a burguesia e suas atividades. Os monarcas detinham em suas mãos todo o aparato do estado, e com isto as atividades econômicas ficavam limitadas pela vontade do monarca. E com isto surge o desejo pela livre iniciativa, livre concorrência, autodeterminação.

É da vontade do burguês de conseguir agir de forma independente que surgem os conceitos de direitos humanos e liberdades individuais, base do liberalismo. Para os pensadores liberais o governante deve ter seus poderes de Estado limitados para garantir que cada cidadão tenha a autonomia para agir, dentro de suas competências, da forma como cada um desejar para ter liberdade, felicidade, realização pessoal. O Estado deveria ser impedido de obrigar como cada pessoa iria viver sua vida, que profissão seguir, como dispor de suas economias, que relações pessoais e profissionais construir, etc. O liberalismo é em essência o reconhecimento de que o poder do estado tem o potencial de reprimir e controlar a liberdade de escolha do indivíduo. E que, portanto, leis deveriam ser criadas para obrigar os governantes a não violar os direitos de todos.

No primeiro momento isto se cria com o conceito da Monarquia Constitucional, ou seja, de estabelecer uma carta de leis que até mesmo os reis e imperadores seriam obrigados a seguir. Mas esta solução pareceu ser insuficiente para os Estados Unidos no seu rompimento com a Coroa Britânica, bem como na França no final do século XVIII. Nestas nações o próprio conceito de deixar o governo no encargo de nobres e aristocratas passou a ser considerado uma espécie de imposição de uma casta sobre os demais. Ou, sob uma ótica mais cínica, os burgueses não ficaram felizes em ter apenas o poder econômico, e partiram para obter o poder político. E é neste conceito que surge o conceito de República.

A República é uma nova forma de governo, onde os governantes são escolhidos pelo povo, via eleições, com mandatos com tempo determinado. É o fim da aristocracia, da nobreza. O governante não tem poder por direito de nascença ou hereditariedade, e sim por voto popular.

Mais modernamente o uso do termo democracia, do governo pelo povo, foi se tornando mais frequente do que o uso do termo república. Em parte por que as monarquias constitucionais foram se modernizando a ponto de ter mecanismos de representatividade eleitoral similares aos da república, fazendo com que os monarcas modernos muitas vezes sejam mais uma figura representativa do que um governante efetivo.

Mas é importante destacar que nos primeiros governos republicanos o termo democracia não era muito utilizado, ou sequer desejado. O conceito de democracia veio da Grécia antiga, e é basicamente a ideia de que o povo é o governo. Portanto a República não é aquilo que os gregos clássicos chamavam de democracia, pois se fundamenta em governantes representantes do povo, e não do governo direto do povo.

O que podemos tirar disto tudo? Alguns pontos bem importantes. Primeiro que o capitalismo não é um sistema político nem uma forma de governo, e sim um sistema econômico. Capitalismo é o sistema de produção no qual os detentores dos meios de produção compram a mão de obra dos assalariados e com isto acumulam riqueza e capital.

O liberalismo é a ideologia política que tenta criar um sistema político e jurídico que garantam a liberdade necessária para que cada um possa estabelecer as suas relações pessoais, econômicas e sociais de forma que os governantes não abusem do poder de Estado para limitar os direitos e a capacidade de escolha de cada um. O foco do liberalismo é que o Estado é uma ameaça a liberdade do indivíduo, e que portanto deve ter sua ação limitada por leis que valham para todos. O liberalismo não é um sistema econômico, e sim uma visão política sobre o papel do estado. Para o liberal nossas escolhas pessoais, familiares e sociais não são assunto de análise de governantes, a menos que estas escolhas interfiram na liberdade dos outros. Se fosse para resumir o liberalismo em uma frase, seria a ideia que a liberdade de cada um termina onde começa a liberdade do outro.

É neste sentido que não faz o menor sentido ser liberal na economia e conservador nos costumes. Liberalismo não tem relação de oposição ao conservadorismo, ou com ser progressista. Ser liberal é acreditar que o Estado só deve limitar a liberdade de alguém se for no sentido de preservar a liberdade de outrem. Os costumes, a cultura e os valores morais devem ter o mesmo tipo de controle do Estado que as relações econômicas: o mínimo necessário. Se você acredita que o estado deve legislar sobre relações familiares, sobre que arte é adequada ao homem, sobre que produtos cada pode comprar, vender e usar, etc, você esta sendo antiliberal.

E é importante lembrar que apesar dos enormes avanços políticos, econômicos e sociais trazidos pelos conceitos de capitalismo, liberalismo, república e democracia, algumas contradições graves ainda perdurariam, gerando desigualdades e conflitos.

Em especial cabe destacar o papel do escravagismo, do colonialismo e do imperialismo para as economias liberais. Apesar de romper com o servilismo medieval, o liberalismo acabou por industrializar a escravidão em níveis nunca antes vistos na história humana. Além disto, temos a completa submissão pela força de países e povos. Para um sistema apoiado na liberdade, a existência de escravos e de colônias eram chagas evidentes que os princípios básicos estavam longe de realmente acontecer.

Junte isto a enorme desigualdade entre o assalariado e o burguês, e temos uma terrível panela de pressão de tensões sociais que iria por fim explodir em revoluções e guerras ao longo dos séculos XIX e XX.

E é neste contexto que os termos socialismo, comunismo, anarquismo e social-democracia ganham seu destaque. Mas isto é assunto para o próximo texto.

 

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

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Pequeno Glossário Político: Conservador, Progressista, Reacionário, Revolucionário https://canalmynews.com.br/voce-colunista/pequeno-glossario-politico-conservador-progressista-reacionario-revolucionario/ Tue, 19 Jul 2022 11:29:06 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=31746 Em resumo, conservadores e progressistas conseguem concordar que a atual estrutura social é eficiente o suficiente para que nos adaptemos aos tempos futuros.

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Este é o segundo texto de uma série na qual pretendo esclarecer o significado de termos que são muito usados no debate político atual e infelizmente pouco compreendidos. No primeiro texto eu apresentei o contexto histórico e o atual significado para os termos direita e esquerda.

Dois termos usados como quase sinônimos de direita e esquerda hoje são conservadores e progressistas, apesar de haver diferenças significativas entre o significado destes. Relembrando, a direita é o grupo que defende que a liberdade é o fator mais importante para uma sociedade justa. Já a esquerda defende que a igualdade deveria ser a maior preocupação.

Já na polarização entre conservadores e progressistas o tema é sobre a velocidade que a sociedade deve mudar. Os conservadores acreditam que os valores, as instituições e as soluções tradicionais funcionaram por séculos, e que, portanto, deveríamos ser muito cuidadosos ao decidir por novos valores e métodos. Mudanças feitas de forma impensada poderiam gerar desordem e conflitos desnecessários.

Já os progressistas acreditam que o progresso é o motor da história, e que as sociedades devem estar atentas as mudanças sociais e se adaptar a medida que elas acontecem. Eles acreditam que retardar as mudanças acabaria por manter estruturas antiquadas e gerando atraso, conflitos e  prejuízos.

Mas isto não encerra a questão, pois tanto conservadores quanto progressistas acreditam que as mudanças devem ocorrer sem rupturas, sem choques violentos. Ambos acreditam que o caminho para decidirmos quando mudar o que deve ser pelo diálogo, negociação e consenso. Há, no entanto, grupos que acreditam que rupturas são necessárias. Que sem destruir o presente não é possível construir uma nova sociedade. São os radicais.

O progressista radical é o revolucionário. Este acredita que o status quo não irá ceder a reformas, e que um progresso dialogado apenas serviria para enganar aqueles que se beneficiariam com a mudança que desejam. Para se construir a nova sociedade é necessário uma revolução, a destruição da ordem vigente para que não haja impedimentos de construir uma nova sociedade. O exemplo clássico de revolucionários seriam os marxistas. Cabe destacar que nem todo marxista defende uma revolução armada, mas sem a destruição do modo de produção capitalista não haveria como construir o socialismo marxista.

O conservador radical é o reacionário. O termo reacionário vem de reação, reacionário é aquele que reage. Para os reacionários as mudanças sociais dos dias atuais corromperam a sociedade, e a modernidade é um obstáculo ao progresso humano. Apesar de defenderem uma nova sociedade, os reacionários acreditam que a novidade necessária é o resgate de valores passados. Muitas vezes a visão do passado do reacionário é idealizada, ou até mitificada. E este resgate do passado deve ser feito pela demolição do modernismo decadente. Somente após uma ruptura que a sociedade poderá voltar a avançar. Não é propriamente uma reconstrução do passado, mas uma segunda versão, que teria aprendido os com os danos causados pelos modernistas. Este é o caminho típico dos fascistas.

Em resumo, conservadores e progressistas conseguem concordar que a atual estrutura social é eficiente o suficiente para que nos adaptemos aos tempos futuros. São defensores da democracia, dos valores republicanos, da divisão dos poderes, eleições, etc. Já os reacionários e revolucionários acreditam que é necessário abandonar os conceitos de democracia vigentes para construir uma outra estrutura social. Mas diferente dos conservadores e progressistas, quase nenhum diálogo é possível entre reacionários e revolucionários. Muitas vezes estes grupos radicais não conseguem dialogar com nada além deles mesmos.

Mas diante deste cenário, o que seria o “conservador nos costumes, liberal na economia”? Para entender este estranho conceito precisamos aprender um pouco mais sobre o que é liberalismo, capitalismo, democracia e república. Assunto para meu próximo texto.

 

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

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A resposta de Bolsonaro mostra o que está por vir https://canalmynews.com.br/voce-colunista/a-resposta-de-bolsonaro-mostra-o-que-esta-por-vir/ Thu, 14 Jul 2022 14:17:28 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=31527 Bolsonaro tenta retirar o corpo fora descrevendo os seus discursos como “frases descontextualizadas”. Mas acontece que o assassinato de Marcelo Arruda não acontece em um vácuo.

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A resposta de Jair Bolsonaro ao assassinato político de Marcelo Arruda foi o seguinte tweet:

Vamos analisar a resposta e confrontar ela com os fatos. O primeiro ponto é que o presidente escolhe ressuscitar uma mensagem de 2018, ao invés de escrever algo sobre o assassinato ocorrido. Ele não apenas não manifesta pesar ou solidariedade com a vítima, como sequer cita o nome de Marcelo Arruda ou descreve o ocorrido. O assassinato de um petista não merece sequer um texto próprio.

Além disto ele não perde a oportunidade para acusar os seus adversários políticos. Em resposta a uma violência cometida por um bolsonarista, ele acusa que a esquerda é que prega a violência. E ainda aproveita para se vitimizar de supostas calúnias.

A coisa mais próxima de um repúdio a violência foi um “Dispensamos qualquer tipo de apoio de quem pratica violência contra opositores.” Dispensamos o apoio, vá para esquerda, foi a crítica feita ao assassino. É um exemplo clássico da tática retórica da nova direita mundial, de nunca recuar, nunca assumir erros. E quando acuados, partir para o contra-ataque, atacando ainda mais os críticos.

Por fim, ele tenta retirar o corpo fora descrevendo os seus discursos como “frases descontextualizadas”. Mas acontece que o assassinato de Marcelo Arruda não acontece em um vácuo.  É preciso contextualizar o crime e a sua motivação com o momento atual no Brasil.

Vamos relembrar um pouco. Na época em que a polarização era entre PSDB e PT, o ato de maior violência em campanhas eleitorais foi um arremesso de uma bola de papel contra José Serra. Já em 2018 tivemos o atentando a faca contra Jair Bolsonaro, e o menos comentado e ainda não resolvido atentado a tiros contra a comitiva de ônibus do PT. Também tivemos o caso do assassinato do Mestre Moa do Katende, capoerista morto a facadas por falar que votou no PT. Isto tudo antes de Bolsonaro assumir o cargo de presidente.

O que deveria servir de alerta para que todos no país se esforçassem para amenizar o debate e repudiar a confusão entre debate e combate foi usado como munição para mais discursos de apoio a violência. Não que antes de ser presidente Bolsonaro fosse conhecido pelo pacifismo. Pelo contrário. Entre outras delcarações, já elogiou grupos de extermínio e deu declarações de apoio a tortura e a golpe de estado. Seu filho Flávio homenageou o assassino Adriano da Nóbrega com a medalha Tiradentes. Para entregar a medalha, teve que ir ao presídio onde o miliciano cumpria pena. Posteriormente o presidente chamou seu assassino de estimação de herói.

Quando presidente Bolsonaro usou do atentado do qual foi vítima para criar um discurso messiânico que Deus o teria salvado para que ele fosse eleito. E repetidas vezes tentou associar Adélio com a esquerda e sugerir que haveria mandantes esquerdistas para o ato. Além da tese ser totalmente descartada pela polícia, Ministério Público e judiciário, ela é até um desafio ao bom senso. Porque alguém contraria um assassino e daria a ele uma faca de cozinha, ao invés de uma arma de fogo?

Mas o pior foi o repetido discurso armamentista que defende que um povo armado jamais será escravizado. E que um povo armado pode se rebelar contra governantes ditatoriais, fazendo uma referência aos governadores e prefeitos que impuseram medidas de distanciamento social durante a pandemia. Ou seja, o presidente incentivando a rebelião armada contra agentes públicos.

Combine isto com a facilitação cada vez maior ao acesso a armas e munições, sem o rastreamento e monitoramento por parte da polícia ou das forças armadas. Por um misto de incompetência e desinteresse, sequer as forças armadas brasileiras sabem quantas pessoas tem quais armas hoje no Brasil. Mas o pouco que sabemos já mostra que existem mais civis armados que as forças de segurança pública dispõe.

O resultado disto se manifesta claramente. Tivemos os exemplos recentes do assassinato de Marielle Franco, do atentado contra o Porta dos Fundos, do atentado contra o Consulado Chinês do Rio de Janeiro, entre outros. É o Brasil entrando no mapa do terrorismo.

No último mês tivemos o drone jogando veneno em uma manifestação política. Na última semana tivemos tiros contra a sede da Folha de São Paulo, o carro do juiz que prendeu o ex-ministro Milton Ribeiro atacado com dejetos, ovos e terra, uma bomba de fezes arremessada em uma manifestação petista em São Paulo, e um bolsonarista atirando fogos de artifício em direção ao palco de uma manifestação petista no Rio de Janeiro.

É neste contexto que devemos analisar a execução de Marcelo Arruda. Não adianta tentar levantar teorias negadas pela justiça de assassinatos políticos que teriam sido cometidos pelo PT. Mesmo que tenham sido crimes políticos (e não é o que as investigações indicam), seriam casos de queima de arquivo, e não violência espontânea por parte de simpatizantes.

O que estamos vendo hoje são vários “cidadãos de bem” por conta do ódio disseminado contra a esquerda se sentindo no direito de usar da violência como meio de expressão política. Isto é inédito na democracia brasileira. E sem nenhum correspondente em outras correntes ideológicas brasileiras além do bolsonarismo. Apenas o bolsonarismo esta cometendo crimes motivados por ódio político, sem outros contextos.

Qual a resposta de Bolsonaro? Não debater o ato em si, se colocar de vítima de calúnia. E de forma irresponsável voltar a atacar a esquerda. Em um momento no qual um esquerdista foi fuzilado por ódio político nosso presidente opta por fingir que não quer violência mas ao mesmo tempo reforça o mesmo discurso de ódio que alimenta estes crimes.

Se nada for feito, este pode ser apenas o começo. E se a violência espontânea e popular vir a sair do controle, Bolsonaro pode vir a usar o caos que ajuda a criar para adiar ou anular as eleições. Os sinais de que há um esforço nesta direção, da anulação do pleito, são nítidos. É o que nos mostra a postura do governo e das forças armadas na Comissão de Transparência criada pelo TSE.

Tudo poderá acontecer em outubro, inclusive nada. Mas que há sinais que há algo de podre no reino do Planalto, há.

 

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

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Pequeno Glossário Político: direita e esquerda https://canalmynews.com.br/voce-colunista/pequeno-glossario-politico-direita-e-esquerda/ Tue, 12 Jul 2022 12:40:17 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=31390 Este é o primeiro texto do que eu pretendo ser uma série de textos nos quais tentarei esclarecer termos que são muito usados e pouco compreendidos no debate político brasileiro.

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Este é o primeiro texto do que eu pretendo ser uma série de textos nos quais tentarei esclarecer termos que são muito usados e pouco compreendidos no debate político brasileiro. E o começo óbvio é exatamente os termos que dividem famílias e terminam amizades. Todo mundo sabe dizer se é de direita ou de esquerda, mas poucos sabem explicar exatamente o que isto significa. Em especial é difícil definir o que seria o lado de lá, sem cair em acusações, exageros e rótulos odiosos. Vou tentar aqui propor uma definição dos termos sem cair em exageros. E com isto provavelmente atrair a fúria de direitistas e esquerdistas.

A primeira vez que se usou estes termos para se definir perfis políticos foi lá na Revolução Francesa. Após a promulgação da primeira Constituição Francesa, se criou a Assembléia Legislativa. Nela haviam três grupos políticos. O primeiro era os girondinos, que se sentavam a direita do Parlamento. Os girondinos defendiam o cumprimento da Constituição, mantendo-se a monarquia, o direito dos nobres e aristocratas. A esquerda do parlamento se sentavam os jacobinos e os cordeliers, que defendiam mudanças mais profundas, principalmente o fim da monarquia e a instalação da República. Cabe ainda lembrarmos dos sans-culottes, grupo mais popular que sequer conseguia participar do parlamento.

Mas graças a esta distribuição entre conservadores à direita e os que desejavam mais mudanças à esquerda que se criou a terminologia que usamos até hoje. Contudo o sentido de esquerda e direita vai se transformando ao longo do tempo.

Durante a Revolução Francesa o debate era a direita querendo preservar a aristocracia dos nobres como os governantes por direito de berço, e que o poder deles deveria ser justificado apenas por eles serem os aristocratas. Já a esquerda defendia que o poder dos governantes deveria ser limitado para garantir que os direitos humanos universais fossem respeitados. Era a revolucionária (literalmente) ideia de que um governante não pode exercer sua vontade irrestrita sobre o governado. Para tal era necessário limitar os poderes dos governantes e defender a liberdade, a igualdade e a fraternidade dos governados. O nome desta ideologia? Liberalismo.

Após a Revolução Francesa e Independência Americana se estabelecerem, e com a queda das monarquias absolutistas ao redor do mundo (queda feita não por ideias de liberdade, e sim por banhos de sangue e soldados bonapartistas), temos a primeira mudança significativa. O modelo político padrão no imaginário ocidental se tornou a democracia liberal.

Então o paradigma conservador deixou de ser a defesa de uma aristocracia de nobres e tornou-se a manutenção de um estado que proteja as liberdades individuais e se ausente de interferir na economia. Contudo isto acabou por se traduzir no controle econômico e político da sociedade por uma oligarquia de grandes industriais, e gerou uma enorme desigualdade econômica. Até mesmo na cidade mais rica do mundo, Londres, tínhamos milhões de trabalhadores em estado de penúria, trabalhando 12, 14, 16 horas por dia para não morrerem de fome.

Esta concentração de capital em poucos capitalistas acaba por criar uma nova esquerda. Anarquistas, socialistas, trabalhistas e sindicalistas que defendiam que mais importante que a liberdade defendida pelo liberalismo era a igualdade tão ignorada pelas democracias liberais do século XIX. O debate entre direita e esquerda passou a se focar entre o que era mais importante para uma sociedade justa: a liberdade econômica ou a igualdade entre os cidadãos. Curiosamente a fraternidade saiu do centro do debate.

Este novo debate político se radicaliza no início do século XX, após a Primeira  Guerra Mundial, a Revolução de 1917 e a Crise de 1929. Surgem correntes extremas. De um lado o fascismo que basicamente defende que os cidadãos que formam a essência da nação tem total liberdade para subjugar ou até exterminar os indesejados. É a defesa extrema da liberdade de matar quem é considerado inimigo da nação. De outro temos o marxismo-leninismo que se transforma em uma autorização do governo impor a força uma igualdade extrema, sacrificando a liberdade daqueles que se opusessem ao governo revolucionário.

Os liberais, acuados, acabam por fazer um apoio amedrontado ao fascismo por medo do inimigo maior do marxismo. Afinal os facistas ao menos mantinham o direito a propriedade privada e a acumulação de capital.

E aí temos a Segunda Guerra e seus horrores. O fascismo é aparentemente exterminado. Parte do liberalismo se reforma, aceitando a necessidade de políticas governamentais para minimizar as desigualdades, a famosa social-democracia, uma espécie de centro. A ideia de social-democracia, uma tentativa de manter a liberdade econômica capitalista com políticas governamentais sociais que tentassem minimizar as desigualdades, via previdência social e a criação de um Estado de bem Estar Social.

Mas a ameaça comunista ainda se fazia presente com a superpotência soviética. E o bloco capitalista acaba por aceitar o sacrifício de qualquer liberalismo democrático criando ditaduras capitalistas, com o discurso que isto salvaria a democracia dos perigo vermelho. Em nome da liberdade de ter propriedade privada se sacrificou a liberdade política.

Com a queda do bloco soviético, a ideologia marxista que havia se tornado sinônimo de socialismo passa a sofrer repúdio mundial. Ao mesmo tempo, as ditaduras de direita se suavizaram, e por grande parte do Ocidente as democracias liberais retornam, mas agora com um mínimo de preocupação social. Chegou-se a falar no fim das ideologias, no fim da história. No fim da polaridade entre esquerda e direita.

Contudo a desigualdade social continuou, em especial a desigualdade entre nações. E depois de umas duas décadas de aparente unanimidade de qual era o ideal político para o mundo, a saber, a criação de um mercado global interdependente e livre, os nacionalismos retornam. O fracasso desta nova ordem de trazer liberdade e igualdade leva ao ressurgimento de uma espécie de fascismo, onde os reais cidadãos de bem deveriam ter a liberdade de defender seu modo de vida sufocando aqueles que discordam.

É a nova polarização. Não é mais entre comunismo e capitalismo, apesar dos extremistas de direita assim discursarem. O que temos agora são 3 grandes grupos.

Uma extrema direita ultranacionalista que faz um discurso de que a liberdade é mais importante que os direitos humanos, a diversidade de opiniões, e até mesmo a existência de outras formas de viver sem ser os valores tradicionais. É o discurso de que limitar as ações para preservar o modo de vida do grupo supostamente majoritário em nome do direito das minorias seria limitar a liberdade. E que vale a pena morrer por isto.

No meio temos a antiga direita liberal, que acredita ainda em um globalismo democrático organizada principalmente pela liberdade econômica como meio de criar uma sociedade mais justa.

E do outro lado uma esquerda que tendia para a social-democracia, mas cada vez mais, por reflexo da radicalização promovida pela nova direita neo-fascista e pela demonização de qualquer defesa de ações governamentais pela igualdade, vai se radicalizando mas ainda sem um centro único de ação. A nova esquerda deve se manter focada nas relações trabalhistas ou nas causas identitárias? Ou ainda alertar dos riscos ambientais do sistema produtivo atual?

A ascensão da direita radical deixou a antiga direita e a combalida esquerda atarantadas. Mas ainda é fácil entender que o debate entre direita e esquerda é, como sempre foi, um debate sobre o que é mais importante: liberdade ou igualdade. E também é fácil ver que quando radicalizamos, sacrificamos uma em nome da outra e esquecemos da fraternidade.

Como no século XIX, hoje a maioria dos conservadores consideram que a liberdade, mesmo que a liberdade só de alguns no caso dos extremistas, é o maior bem a ser preservado. E que a igualdade é desejável, mas inatingível em sua plenitude. Os progressistas acreditam que não existe real liberdade quando há desigualdade de condições. E os revolucionários acreditam que só se chega a liberdade após eliminar as desigualdades, e que quase ninguém é realmente livre hoje.

*As opiniões das colunas são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a visão do Canal MyNews

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

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Renato Freitas, cassado por ser negro https://canalmynews.com.br/voce-colunista/renato-freitas-cassado-por-ser-negro/ Sat, 02 Jul 2022 11:00:07 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=31013 Renato Freitas, vereador da cidade de Curitiba, teve seu mandato cassado por ser negro e ativista. O vereador foi um dos organizadores de um protesto pela morte do congolês Moïse Mungenyi Kabagambe.

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Renato Freitas, vereador da cidade de Curitiba, teve seu mandato cassado no dia 22 de junho de 2022, por ser negro e ativista.

O vereador foi um dos organizadores de um protesto pela morte do congolês Moïse Mungenyi Kabagambe. Moïse Mungenyi Kabagambe, foi amarrado e espancado até a morte em praça pública em janeiro deste ano. Um negro africano amarrado e espancado até a morte em praça pública do Rio de Janeiro em 2022.

Renato Freitas, entre outros, escolheu a Igreja do Rosário de Curitiba para a realização do protesto. O local foi escolhido devido a seu simbolismo histórico. Originalmente naquele local ficava a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de São Benedito, construída ainda na época da escravidão. Naquela época negros não podiam frequentar a mesma Igreja que os homens livres. Em 1931 a Igreja erguida por escravos para escravos foi demolida, e substituída pelo prédio atual. Mas ficou o símbolo histórico de como tentamos, sem sucesso, apagar o histórico escravagista brasileiro.

O protesto iniciou-se nas escadarias da Igreja, durante a celebração de uma missa. Após o fim da missa, os manifestantes entraram por uma porta lateral, fizeram seus gritos de protesto, e sairam ordenadamente. Nenhum rito religioso foi interrompido, nenhuma porta foi forçada, nada foi quebrado. Apesar do claro incômodo gerado pelo protesto, tudo se resumiu a isto, um incômodo.

Mas nada é simples no Brasil após 2018. Imagens sem contexto de manifestantes com bandeiras vermelhas e gritos de guerra dentro de uma Igreja foram compartilhadas em tom de denúncia. Era uma clara mostra da tão falada cristofobia dos comunistas vermelhos.

Seja por conveniência política, por racismo ou por fanatismo religioso a Câmara de Vereadores viu neste protesto motivo suficiente para a cassação do mandato de Renato Freitas. Durante a votação que determinou a perda do mandato o Padre Luis Hass, sacerdote que estava na Igreja durante o protesto, esteve junto com Renato Freitas manifestando sua solidariedade com o vereador. Ou seja, sequer o suposto invadido considerou o protesto uma invasão.

Mas o estrago da rede do ódio já estava feito. Eram manifestantes negros de bandeiras vermelhas trazendo para dentro do templo cristão a política que na verdade sempre fez parte da história daquele templo.

Os mesmos grupos cristãos que aceitam que o presidente discurse em meio a seus cultos, e fazem orações em eventos políticos se sentiram insultados por que outros cristãos usem um espaço repleto de história para manifestar uma visão política diferente.

Os mesmos cristãos que aceitam um ministro que imprime Bíblias com sua foto como meio de propaganda política, e que pede orações como reação a sua prisão preventiva. Os mesmos cristãos que aceitam e aplaudem um presidente que afirma que se Jesus pudesse compraria uma pistola. Ou que igrejas promovam uma rifa de um rifle.

A arma, o discurso da violência, o uso da fé como cortina de fumaça de desmandos políticos, isto é liberdade religiosa. Já negros soltarem seu grito de revolta em um templo que historicamente era deles, isto é cristofobia.

Negros entrarem em uma Igreja protestando contra um espancamento seguido de morte é cristofobia. Já políticos usarem da glossolalia para sugerir que o Espírito Santo esta interferindo na escolha dos Ministros do STF é tolerado e aplaudido.

Renato Freitas, vereador da cidade de Curitiba, teve seu mandato cassado no dia 22 de junho de 2022, por ser negro e ativista. E porque alguns abusadores da fé querem se colocar como vítima de uma cristofobia inexistente para impor seu ódio e preconceito.

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Quem é Aniello Olinto Guimarães Greco Junior?

Servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

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Devemos chorar a morte dos tucanos https://canalmynews.com.br/voce-colunista/devemos-chorar-a-morte-dos-tucanos/ Fri, 01 Jul 2022 12:58:43 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=31010 Os tucanos  morreram. Nunca simpatizei com eles. Mas estão fazendo falta. Nunca adivinharia que sem eles a própria democracia corre risco de morte.

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Infelizmente os tucanos morreram. Talvez o PSDB sobreviva enquanto sigla, talvez até volte a ter a importância que teve, mas os tucanos morreram. E mesmo nunca tendo simpatia por eles, só posso lamentar esta morte.

O PSDB começa como uma dissidência do PMDB. Ou talvez como um resgate ao verdadeiro PMDB. Herdeiro do MDB da época da ditadura, o PMDB deveria representar a linha de esquerda democrática que tentou, dentro dos seus limites, ser a oposição oficial ao ditatorial Arena. Naquela época ainda estávamos em plena Guerra Fria, e ser uma esquerda democrática significava defender um estado de bem estar social nos modelos europeus, a famosa Social Democracia que acabou dando nome ao PSDB.

Mas durante a Assembléia Constituinte de de 1987 o PMDB acabou por se aliar ao “Centro Democrático”, o germe do que hoje chamamos de Centrão. Era nada mais nada menos que a ala civil da direita conservadora da época, que tentava impedir que a nossa Constituição fosse moldada demais a esquerda. O PMDB, quem diria, tinha se juntado aos conservadores.

É neste momento que o PSDB surge. Tentando ocupar o espaço entre a direita civil democrática e a esquerda trabalhista e sindicalista representada por Brizola e Lula, que flertava com um misto de marxismo cubano, teologia da libertação e trabalhismo sindical.

Mas o destino reservava outro papel para os tucanos. Apesar da enfervescência política da redemocratização, havia um problema que praticamente sequestrava o debate político: a inflação. Vários planos econômicos bastante heterodoxos foram tentados, desde o congelamento de preços até o sequestro dos investimentos dos cidadãos. E a inflação continuava monstruosa.

Com o impedimento de Collor, seu vice, Itamar, une uma equipe de economistas liberais para tentar um choque mais ortodoxo, apesar de moderno. E assim nasce o Plano Real. Sob a coordenação do Ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso, um tucano, o PSDB recebe os louros de conseguir estabilizar a moeda brasileira.

E devido a característica liberal na economia do Plano Real, os tucanos acabaram por caminhar levemente a direita. E assim surge a primeira polarização da Nova República, com o PT ocupando o campo da esquerda e o PSDB o da direita. E este paradigma perdurou quase 30 anos. Tucanos viraram aves que defendiam um estado pequeno, eficiente, e austero na questão fiscal. Apesar de muito longe da perfeição, foi uma receita de tanto sucesso que Lula teve que se tucanizar com a Carta ao Povo Brasileiro para conseguir ser eleito e tirar o PSDB do poder.

Toda esta rememorização foi para lembrarmos como os tucanos foram importantes para se criar as bases da atual democracia brasileira, fortificando o discurso majoritário dos economistas, empresários e analistas da mídia brasileira, que perdura até hoje.

Mas eles morreram. Morreram principalmente porque apesar de terem conquistado o pensamento do mercado, não conseguiram manter contato com as bases populares. O liberalismo a moda tucana pode ter comovido o mercado, mas falhou em reduzir as desigualdades brasileiras e conquistar o coração do povo.

No momento em que seus rivais PTistas começaram a perder o controle de seu próprio governo, os tucanos eram  tidos comos seus sucessores naturais. Afinal desde 1994 o Brasil era governado por ou tucanos ou PTistas. Mas infelizmente não foi o que ocorreu. E a morte tucana começa com a disputadíssima eleição de 2014.

Até então o debate político brasileiro era entre uma direita que afirmava que o equilíbrio econômico deveria ser a questão prioritária, e uma esquerda que aceitava um pouco mais de gastos do governo em troca de programas sociais mais amplos. Ou, de outra forma, a direita dizia que a esquerda era composta de administradores irresponsáveis, e a esquerda acusava a direita de serem economistas que não se importavam com a pobreza.

Em 2014 o debate se tornou mais virulento. As acusações morais ganharam o centro do debate. E de repente os políticos deixaram de ser ver como rivais, e passaram a se ver como inimigos. Agora ambos acusavam o outro lado se serem canalhas, ladrões, traidores da pátria.

E após as urnas darem uma vitória apertadissíma para Dilma, o já não tão tucano Aécio Neves recusa a aceitar o resultado das urnas e pede recontagem. Era o início de um novo PSDB. Um PSDB raivoso, moralista, acusatório. Não que fosse unilateral. O PT também passou a rosnar até para o próprio rabo. Mas a decisão destacar as instituições eleitorais por raiva política abriu um triste precedente.

Tudo continua piorando até o impeachment de Dilma. Diferentemente do impeachment de Collor, que uniu a classe política brasileira, a saída de Dilma criou um fosso intransponível, e todos começaram a cavar trincheiras para uma luta de morte. Mas havia uma grande diferença entre o PT e o PSDB. O PT manteve suas bases com o sindicalismo, o movimento estudantil, o MST, etc. Já o PSDB estava presente apenas no mundo político.

Quando o ódio político se torna o centro do debate, os tucanos se viram alvo do ódio que esperavam que o apoiassem. Se por um momento Lula tinha se tucanizado, agora para a turba enfurecida o PSDB se tornou demasiadamente parecido com o PT.

A tentativa de renovação com nomes como Doria fracassou. Eram PSDBistas sem a cor e o tamanho dos bicos tucanos. Fenômenos como o olavismo e o bolsonarismo se tornaram enormes. E mesmo o liberalismo, carro chefe dos tucanos, acabou sequestrado por pseudo-liberais como o MBL.

Os tucanos morreram. E com eles, a direita democrática brasileira. O que sobrou foi a direita fisiológica, e a extrema direita. A direita que se alia a qualquer governo que não mude as estruturas econômicas brasileiras, e o protofascismo que acredita que a liberdade dos cidadãos de bem deve ser imposta as custas de piorar as desigualdades dos marginalizados e excluídos. Que qualquer luta de diminuir as desigualdades é na verdade pedido de privilégios. E que os conservadores precisam impedir isto a força.

Neste cenário sem uma direita moderada, tudo o que não é aliado da extrema direita parece comunismo. Num cenário desequilibrado como este, não existe debate político, apenas combate. E com isto o Brasil vai morrendo.

Os tucanos  morreram. Nunca simpatizei com eles. Mas estão fazendo falta. Nunca adivinharia que sem eles a própria democracia corre risco de morte.

*As opiniões das colunas são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a visão do Canal MyNews

Quem é Aniello Olinto Guimarães Greco Junior?

Servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

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Precisamos voltar para caverna https://canalmynews.com.br/voce-colunista/precisamos-voltar-para-caverna/ Tue, 07 Jun 2022 12:27:58 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=29353 A história é simples. Imaginem um grupo de pessoas que vivem acorrentadas no fundo de uma caverna, de tal forma que só consigam olhar para dentro da caverna, nunca para fora.

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Se você participar de um curso introdutório de filosofia, quase certamente a primeira aula falará do Mito da Caverna de Platão. Além de ser um dos textos filosóficos mais antigos e mais debatidos do mundo, também é uma metáfora acerca do papel da filosofia para o homem. Apesar disto é um texto que muitos analisam fora de seu contexto histórico, e acabam cometendo erros e simplificações.

A história é simples. Imaginem um grupo de pessoas que vivem acorrentadas no fundo de uma caverna, de tal forma que só consigam olhar para dentro da caverna, nunca para fora. Tudo o que eles conseguem ver do mundo são as sombras projetadas na parede do fundo da caverna pela luz vinda da entrada. Um teatro de sombras é tudo o que conhecem do mundo.

Então um destes aprisionados consegue se libertar das correntes, e sair da caverna para explorar o mundo. Lá descobre um mundo de luzes, cores, cheiros e sabores que nunca conheceu antes.

Este explorador volta para a caverna, e liberta os seus antigos companheiros. E conta sobre o mundo lá de fora. Os habitantes da caverna o tomam por louco, e o espancam até a morte, e voltam a observar as sombras na parede.

A metáfora é simples mas poderosa. É uma sugestão de buscarmos a verdade por detrás das aparências, de questionar o que acreditamos saber, e ver, e tentar ir além do que nos parece óbvio. A função do filósofo seria esta: explorar o mundo além da caverna, e tentar libertar os demais de suas correntes ideológicas. Mas temos também um alerta: aquele que traz a mensagem acerca do mundo exterior corre o risco de ser mal recebido, e tratado até com violência. Questionar pode ser um ato perigoso.

E normalmente a análise acaba aí. E com isto perdemos parte importante do que Platão propunha com esta história. Para Platão o mundo no interior da caverna seria o mundo sensível. Aquilo que percebemos por meio de nossos sentidos e por nossas experiências. Aquilo que tocamos, vemos, cheiramos. Já o mundo fora da caverna seria o mundo intelegível, o mundo que só conhecemos por meio da razão, da crítica, da filosofia. O que mais tarde Aristóteles iria definir como o conhecimento último, a metafísica. Ou seja, o que vai além do mundo físico.

Esta poderosa visão filosófica foi o modelo de entendimento do mundo mais aceito por milênios, pelo menos na Europa. Mas no fim da Idade Média o cenário começa a mudar. A revolução científica coloca o teste experimental como algo capaz de ruir os sistemas racionais e metafísicos. A metafísica aristotélica ruiu diante da física galileana. A experiência direta deixa de ser um instrumento ilusório e assume o centro do palco.

Mas ainda permanece o fato de que nossas experiências são limitadas, e podemos nos enganar ao confiar nelas cegamente. É necessário o constante questionamento para entendermos aquilo que estamos vendo.

O debate continua entre as duas forças de conhecer o mundo, razão e experiência. E este questionamento acaba levando ao relativismo moderno, onde questionamos até mesmo se existe alguma verdade a ser descoberta.

Mas Aniello, o que isto tem a ver com a nossa vida, o que este debate acadêmico tem a ver com o mundo real? Na fila do pão, quem é este filósofo? Podemos buscar várias formas de usar o mito da caverna em nossa vida, mas eu irei comentar um único ponto que me parece central hoje.

Atualmente temos vários “filósofos”, líderes e gurus que afirmam ter saído da caverna. E estes trazem mensagens contraditórias. Parece que cada um que saiu da caverna afirma um mundo exterior diferente. O que é obviamente sem sentido. Todos, ou quase todos, devem estar enganados, ou mentido.

Mas mesmo assim a mensagem de ter o conhecimento verdadeiro que ninguém sabe hoje se tornou mais atrativa que repulsiva. É verdade que ainda espancamos os profetas do mundo exterior, mas normalmente espancamos o segundo guru que nos conta as maravilhas do mundo exterior. O primeiro é recebido com pompa e circunstância.

Cada vez mais temos grupos de pessoas que acreditam ter acesso a verdadeiras verdades, sempre muito diferentes daquilo que podemos ver diretamente. Teorias de conspiração, fake news, verdades alternativas. E é uma sensação poderosa acreditar que você e seus pares conseguem entender o mundo melhor que todo o resto da humanidade.

De uma forma perversa partimos do questionamento contra as aparências e contra as ideias dominantes para construirmos fábulas, fantasias. E varremos para debaixo do tapete o que acreditamos saber ser falso. Partimos de uma ideia de questionar a verdade dos outros para chegarmos a mecanismos de nunca questionar nossas verdades. Achamos que o lado de lá esta analisando as sombras, mas nós sabemos como é o mundo real. É o ceticismo e o questionamento usado para não questionarmos nossas crenças.

Nesta hora minha proposta é nos ver como os que estão na caverna pois o mais provável é que não sejamos o homem que viu o mundo. Somos aqueles que estão na caverna ouvindo dezenas de pessoas contando que saíram.

O que temos que fazer é nos voltar para as sombras. Analisar cada detalhe dos fatos concretos, para tentar ver qual análise é mais compatível. Nenhum fato é a verdade completa. São sombras. Mas é o único instrumento que temos para separar o mundo exterior do sonho de liberdade.

Quando há tantas verdades contraditórias se digladiando por nossos corações e mentes, precisamos entrar novamente na caverna de Platão, e voltar a estudar as sombras. Antes que voltemos para as cavernas literalmente.

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Quem é Aniello Olinto Guimarães Greco Junior?

Servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

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Para que serve uma CPI? https://canalmynews.com.br/voce-colunista/para-que-serve-uma-cpi/ Wed, 25 May 2022 13:30:28 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=28653 O fato de ser possível comparar uma CPI com uma série de TV mostra que a espetacularização dos escândalos, tão falada durante a Lava Jato, continua no nosso cenário político.

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Atualmente a Netflix do Senado está em fase de pré-produção da nova temporada da série de maior sucesso de 2021: a CPI. E mesmo sem a produção confirmada já temos um enorme hype no público, com fãs e haters se digladiando nas redes sociais.

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Mas apesar da última temporada ter sido um enorme sucesso de público, muitos dos fãs questionam que o desfecho deixou a desejar. Aparentemente o que o público queria eram apenas duas coisas: prisões e impeachments. E apesar de dezenas de personagens acusados de crimes, tivemos apenas uma prisão, que foi cancelada no mesmo episódio que foi declarada. E aí fica a dúvida no público: os vilões terminarão sempre impunes?

Infelizmente os haters da série tem uma certa razão ao chamarem a CPI de CPI do Circo. Não, não vou dizer que a CPI foi inútil e acabou em pizza. Mas o próprio fato de ser possível comparar uma CPI com uma série de TV mostra que a espetacularização dos escândalos, tão falada durante a Lava Jato, continua no nosso cenário político.

Apesar de ser ótimo que milhões de brasileiros tenham acompanhado o dia a dia do Senado de perto, a ponto de senadores se tornarem pop stars; transformar uma investigação de crimes tão sérios como os ocorridos durante a pandemia e criar narrativas (palavra tão desgastada pelo senador Marcos Rogério) maniqueístas acabam por simplificar e idiotizar o debate.

Uma CPI nunca serviu para prender políticos. Apenas o judiciário tem este poder. E na maioria dos casos, CPIs também não servem para gerar impedimentos e fins precoces de mandatos. Para entendermos para que serve uma CPI ajuda lembrarmos como uma CPI é criada.

A CPI é um instrumento da minoria. Basta juntar a assinatura de ⅓ dos membros de uma casa parlamentar para se criar uma. O que isto significa? Que as CPIs são instrumentos para minorias políticas trazer a tona e investigar temas que os interesses da maioria não desejam que venham a tona. Além disto, por ser uma forma de investigação originada no legislativo, serve como alternativa para quando as investigações policiais (ligadas ao executivo) e judiciais ignoram algum tema incômodo.

Portanto, se uma CPI consegue trazer a tona fatos que contrariam os interesses da maioria no Parlamento, e/ou superar a inércia dos meios investigativos dos outros poderes, já será uma CPI bem sucedida.

Não custa lembrar também que o tempo da imprensa, o tempo da política e o tempo do judiciário seguem ritmos diferentes. A imprensa tradicional segue um ritmo diário, o tempo que uma notícia leva para ser impressa em jornais de papel ou ser inclusa nos telejornais. Hoje, com a internet, o tempo da imprensa se mede em minutos. Isso gera a impressão de que se um crime é revelado na mídia, e nada acontece em uma semana, temos um caso de impunidade. A CPI da Covid terminou em novembro de 2021, e em abril de 2022 a maioria dos acusados de crimes sequer foram indiciados. Muito compreensível a frustração e a sensação de impunidade.

Mas o tempo da política é mais lento. Se move na velocidade de acordos, de decisões, de portarias e projetos de lei. E os movimentos mais significativos acontecem a cada biênio, com as eleições. E o tempo judiciário é ainda mais lento. No Brasil, lento demais. Contudo jamais um judiciário que se movesse em horas seria justo com a ampla defesa e o contraditório.

Além disto, mesmo sem ter acontecido muitas consequências judiciais ou legislativas da CPI, já tivemos um enorme número de efeitos políticos e sociais. O mais simples de tudo, ter tornado público diversos fatos que poderiam ter passados desapercebidos da maioria do Brasil. Destaco três: o escândalo da Covaxin, o aplicativo TrateCov e sua relação com a crise de oxigênio em Manaus, e o absurdo “estudo” realizado pela Prevent Senior. Três exemplos de dezenas de fatos que só vieram ao conhecimento público devido a CPI.

Temos a forte pressão política que a CPI gerou para a campanha de vacinação (inclusive com a desaceleração da vacinação após o fim da temporada). E o inegável impacto que a comissão gerou na popularidade e no discurso do Palácio do Planalto.

Por fim, a CPI escancarou a blindagem criada para proteger o Presidente e seus aliados, com o inegável apoio de Arthur Lira e Augusto Aras, que impedem o prosseguimento da investigação dos crimes de responsabilidade e crimes comuns.

Veremos ainda como as coisas irão ocorrer quando os investigados perderem seus foros privilegiados, ou quando ocorrerem trocas na Presidência da Câmara dos Deputados e na PGR. Mas mesmo que não ocorram impeachments e prisões, a CPI já teve grandes consequências.

A diferença entre uma CPI acabar em Pizza ou ter reais consequências não pode ser medida de modo tão simples. Posso inclusive comparar com as duas CPIs da Nova República com as maiores consequências. A CPI do PC Farias foi uma das principais causas do impeachment de Collor. Mas juridicamente o ex-presidente foi inocentado de todas as acusações. Foi inútil? E a CPI do Mensalão não afetou a popularidade ou o mandato do ex-presidente Lula.

Então não julguemos a CPI da Covid pelo fato de que as sugestões de indiciamento ainda não terem gerado os efeitos jurídicos desejados. Julguemos a postura da PGR e da Câmara dos Deputados por sua inércia. E reconheçamos: o Brasil pós CPI da Covid é um país diferente do país pré-CPI.

Ainda não sabemos se a CPI do MEC irá sair. Há muitos fatores a considerar. Mas não vamos nos desiludir e dar de ombros para as ações no Senado por causa daqueles que consideramos que deveriam ser punidos (ainda?) estão impunes. A CPI da Covid cumpriu seu papel. E mesmo que tivesse fracassado, isto não seria motivo para desistir de investigar.

Claro, devemos aprender com aquilo que fracassou. Talvez seja necessário debatermos uma mudança na lei do impeachment. Talvez seja necessário criarmos mecanismos de reação em casos de inércia do PGR. O que não pode acontecer é desistirmos de investigar.

Ainda bem que existe uma forma da minoria conseguir investigar aquilo que a maioria deseja ocultar. Que venham novas temporadas. Já vou renovar minha assinatura gratuita da TV Senado.

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Nem todo oligarca é russo https://canalmynews.com.br/voce-colunista/nem-todo-oligarca-e-russo/ Wed, 11 May 2022 13:12:00 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=28080 Por que chamamos os bilionários russos de oligarcas? Quantas vezes usamos o termo oligarca atualmente? Afinal de contas, o que é um oligarca?

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Estamos em meio a uma guerra de repercussões globais, onde os principais líderes do mundo estão diretamente ou indiretamente envolvidos. E uma coisa que sabemos desde que a guerra é guerra, e que se reforçou com as guerras televisionadas, desde a Guerra do Vietnã, é que o controle da narrativa é uma arma de guerra.

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Isso significa que devemos ser críticos às informações advindas de todos os lados da guerra. É fato que Putin se utiliza de métodos extremos de controle e censura da internet e da imprensa. Mas também é fato que já faz décadas que o ocidente domina modos de manipular as narrativas de guerra de modo muito mais sutil. Basta lembrarmos de como foi feita a cobertura midiática da invasão do Iraque e de como os EUA usou de desinformação para manipular a opinião pública mundial.

Se é fato que Putin é claramente do país beligerante, e também um ditador de posse do maior arsenal nuclear do mundo, isso não faz com que tudo o que se noticia contra a Rússia seja verídico e objetivo.

Um dos exemplos mais claro disso é a cobertura em referência aos oligarcas russos. Uma das melhores formas de se manipular uma notícia é falar uma verdade, ou várias, mas sutilmente transmitir uma distorção ao mesmo tempo. Por que chamamos os bilionários russos de oligarcas? Quantas vezes usamos o termo oligarca atualmente? Afinal de contas, o que é um oligarca?

Bandeira da Rússia no céu. Foto: Egor Filin (Unsplash)

Etimologicamente oligarquia é o governo de poucos. O termo oligarca então se refere originalmente a membros de uma pequena casta que domina o poder político de uma nação. Um exemplo seria as famílias reais e demais nobres em monarquias absolutistas. Ou os diretores de um partido em um regime de partido único.

Nesse sentido o termo não pode ser aplicado aos bilionários russos. O governo lá é exercido por políticos eleitos (em eleições nada confiáveis) e burocratas, e não pela elite econômica. Mas no século XIX e início do século XX era comum usar o termo oligarca para os magnatas que usavam seu poder econômico como meio de obter influência nos poderes políticos, e com isso aumentar ainda mais suas fortunas. E sim, os bilionários russos são um exemplo clássico.

A atual oligarquia econômica russa se forma na década de 1990, quando ocorreu a privatização das empresas estatais soviéticas, compradas a preço de banana para pessoas com bons contatos com os burocratas do governo Yeltsin e Putin. Ou seja, a amizade com os governistas transformaram em poucos anos algumas pessoas levemente abastadas em alguns dos homens mais ricos do mundo. E esse enriquecimento ilícito e súbito conquistado devido à proximidade com o poder político faz a elite russa merecer o título de oligarca.

Mas e os outros bilionários do mundo seriam realmente diferentes, ou podemos falar de oligarcas brasileiros, estado-unidenses, franceses, alemães, e, cometerei a heresia, ucranianos?

A Rússia sofre de um capitalismo tardio, iniciado há 40 anos, e por isso podemos traçar com clareza como se fez a acumulação do capital. Já nas democracias ocidentais, séculos separam a formação das fortunas das grandes famílias e o presente.

Mas se formos olhar, por exemplo, a realidade brasileira, a maioria das famílias realmente ricas tem sua origem na atividade mais lucrativa do Brasil colonial e imperial. E não, não foi a monocultura de açúcar ou do café. Foi o tráfico negreiro. As grandes fortunas ao redor do mundo, a maioria terá, assim como no Brasil, uma origem mais repugnante que a corrupção da Rússia de Yeltsin e Putin.

Claro, não podemos culpar os tataranetos pelos crimes de seus ancestrais, mas sua fortuna herdada foi cunhada em sangue. E os bilionários de hoje estão também usando de seu poder econômico para influenciar ou controlar o poder político. Às vezes sequer por meios indiretos, Trump que o diga.

Então, basicamente, quase todo bilionário no mundo merece o título de oligarca. E alguns merecem mais que os russos. Mas usamos o adjetivo atualmente apenas para russos, e talvez os detentores dos petrodólares árabes.

Isso é um exemplo menor de um mal grave, um erro ou estratégia nefasta que estamos cometendo na construção ocidental da narrativa ao redor da invasão da Ucrânia. Se Putin comete o grave insulto de perverter as nacionalidades russa e ucraniana para criar o mito da Grande Rússia e negar a existência do povo ucraniano, nós estamos alimentando de forma perigosa e irresponsável discurso de anti-rússia. Estamos transformando uma das nações mais influentes e poderosas do mundo não apenas em um pária, mas em vilões.

Estamos boicotando não apenas a economia russa, nem sequer os bilionários russos. Estamos boicotando atletas, e até mesmo símbolos culturais. Chegou-se ao extremo de retiramos filmes como Anastasia e debatermos sobre proibir cursos sobre Dostoevsky.

O ódio a um povo é uma ferramenta potente, mas perigosa. E isso se reflete em atos concretos. A Rússia foi expulsa do Parlamento Europeu e também da Comissão de Direitos Humanos da ONU. Em um momento onde todo esforço diplomático com a Rússia deveria ser bem vindo, para evitar que esse conflito escale de forma catastrófica, estamos apostando em subir a tensão e a pressão.

Vale a pena lembrar um pouco de história. Quando o mundo diplomático tenta encurralar o Japão com sua criminosa invasão da Manchúria, o resultado foi a saída daquela potência da Liga das Nações. E foi o princípio do fim do maior fórum diplomático do mundo à época. Uma das causas diretas da Segunda Guerra Mundial.

A Rússia, devido sua produção energética, seu poderio militar, e em especial, seu poderio nuclear, é inevitável. Não há como contorná-la ou ignorá-la. A piada já dizia que a bomba atômica é a arma do diálogo. Quando temos uma, todos querem conversar com você.

Estranhamente estamos optando pelo oposto. E Putin já mostrou claramente que pode ser um mentiroso costumaz, mas não costuma a blefar. Costuma cumprir suas ameaças. E não apenas rompendo o diálogo, mas chutando os russos para fora. Pagar para ver não me parece uma escolha saudável.

Falar mal de Putin é fácil. Ele é um governante repugnante em vários aspectos. Mas ao escolher transformar a Guerra da Ucrânia em uma luta do bem contra o mal (inclusive banalizando os diversos problemas internos que a sociedade ucraniana atravessa) estamos forçando a um ditador russo a cumprir um papel completamente demoníaco. A que preço?

Mesmo que isso não acabe em um desastre nuclear (algo que ainda parece improvável, mas já deixou de ser impensável), resta a pergunta: a quem interessa uma Ucrânia demolida? Certamente não a Rússia, que deseja uma Ucrânia como sua zona de influência. Mas as ações do ocidente não estão de forma alguma dando segurança a Ucrânia. Putin continua sendo o principal agressor, mas parece que nós estamos cada vez mais felizes em forçar a ele se manter neste papel.

Se é verdade que não podemos tolerar a agressão e invasão promovida pela Rússia, não podemos transformar a necessária resistência em atos de ódio e isolamento. Estamos apagando fogo com gasolina.

Se é difícil entender plenamente as intenções de Putin, me parece ainda mais difícil entender o tipo de propaganda que estamos contando para nós mesmos. Apenas o povo ucraniano parece interessado em encerrar o conflito. E enquanto transformamos Zelensky em Churchill e Putin em Hitler criando uma narrativa delirante, oligarcas de todas as nações dançam na beira do abismo.

E o povo ucraniano morre. E a economia global entra em caos. E o apocalipse nuclear volta a assombrar a geopolítica mundial.

*As opiniões das colunas são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a visão do Canal MyNews

Quem é Aniello Olinto Guimarães Greco Junior?

Servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.


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Como sobreviver a um cancelamento https://canalmynews.com.br/voce-colunista/como-sobreviver-a-um-cancelamento/ Fri, 29 Apr 2022 15:05:13 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=28036 Mais cedo ou mais tarde certas pessoas irão te acusar de algo que não apenas você discorde, mas provavelmente repudia.

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Esclarecimento: este texto não se dedica as pessoas que propositalmente defendem posições ofensivas para atacar grupos. Se você acredita estar em uma guerra cultural, o cancelamento não é um acidente lamentável, mas um efeito colateral das batalhas que escolheu travar.

Um dia você irá falar ou fazer algo que ofenderá certos grupos. E estes grupos irão te cancelar. Somos humanos, conflitos são inevitáveis, bem como falhas. E mais cedo ou mais tarde certas pessoas irão te acusar de algo que não apenas você discorde, mas provavelmente repudia.

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Não é fácil ser chamado de racista, ou machista, ou homofóbico. Ou cristofóbico, comunista, pervertido, pedófilo. Mas acredite, um dia, mais cedo ou mais tarde, alguém irá te cancelar.

E nestes momentos nossos instintos jogam contra nós mesmos. As reações típicas as estes momentos costumam a piorar o debate, e aumentar o número de ofendidos. Então pretendo dar minha pequena sugestão de como reagir quando você for acusado daquilo que você odeia.

O primeiro passo é necessariamente para trás. É lamentar a situação. Não estou falando de desculpas, que poderão ser necessárias, mas de reconhecimento de que algo deu errado. Não analise o mérito da acusação, não explique sua declaração. Apenas lamente o conflito. Reconheça que uma ofensa aconteceu, e que o diálogo ficou envenenado.

Nossos instintos nos pede ou para nos desculpar para encerrar o conflito, ou responder como uma pessoa injustiçada, acusada erroneamente. Ambas reações podem sair pela culatra.

Se você sobe o tom e parte para o confronto, afirmando se sentir ofendido com a acusação, o resultado será óbvio. Trocas de acusações cada vez piores. Já um pedido de desculpas sem reflexão será visto como hipocrisia, fraqueza de caráter e covardia. Então deixe claro que lamenta que a situação tenha atingido este ponto, e ceda a palavra.

Foto: LoboStudioHamburg (Pixabay)

O segundo passo é dar voz ao ofendido. Lamente, e deixe o cancelador falar. Ele foi ofendido, e entender a razão da ofensa é essencial para tentar alguma forma de conciliação. Ceda o espaço. Escute com calma.

E escute os detalhes, além dos rótulos. Um erro comum nestas situações é pensar em absolutos. Aquele que esta te chamando de racista não está dizendo que você defende a escravidão. Aquele que esta te chamando de homofóbico não está dizendo que você espanca homossexuais. Aquele que te chama de comunista não está dizendo que você defende a execução de burgueses por fuzilamento. Pelo menos não na maioria das vezes .

Então reflita com calma. Algumas vezes sim, nós estamos defendendo uma posição sem entender todas as ramificações. As vezes temos preconceitos ou radicalismos irrefletidos, ou inconscientes. Reflita.

Somente depois desta reflexão que caberá o pedido de desculpas, caso você esteja convencido de haver cometido um erro. E se você percebeu o erro, e reconheceu ter cometido a ofensa, deixe claro isto nas desculpas. Não foi a pessoa que se sentiu ofendida. Foi você que ofendeu. Não foi erro de interpretação, no máximo erro de expressão de sua parte. E não, não use a moeda do “quem me conhece sabe”. Fale: eu errei. Se possível, proponha ou faça uma reparação. Um ato concreto fala mais alto que qualquer desculpa.

Se você não se convenceu de ter cometido um erro, não peça desculpas. E se prepare para a reação. Mas por favor, não ataque o cancelador. Lamente a situação, defenda seu ponto de vista com sinceridade e firmeza. Mas não ataque, não escale o conflito. Não se desculpar pode piorar a situação no curto prazo, mas manter a coerência e a consistência no mínimo auxiliará na confiabilidade das pessoas em você. E, quando alguma desculpa for necessária, ela terá peso dobrado.

Por fim, para evitar cancelamentos, aqui usei o termo comunista como uma acusação similar a racista ou machista, mas não por achar que seja similar, e, sim, por entender que alguns grupos usam o termo comunista como ofensa similar.

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Anitta recupera o verde e amarelo https://canalmynews.com.br/voce-colunista/anitta-recupera-o-verde-e-amarelo/ Mon, 25 Apr 2022 13:32:18 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=27866 Cantora carioca foi uma das atrações do festival norte-americano Coachella. Na apresentação, ela levou as cores da bandeira brasileira.

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Anitta não apenas chegou ao topo do mundo no Spotify, como muito mais importante que isto, conseguiu entrar na minha bolha. Eu sou um chato musical que congelou no tempo e só escuto as música jovens da minha época, também conhecidas como música medieval. E sim, sou daqueles que não consegue entender ou suportar o batidão do funk.

Até algumas semanas atrás, Anitta para mim era uma funkeira amiga da Gabriela Prioli, e que tinha participado de uma série de vídeos com a comentarista política, cumprindo de forma exemplar o papel de ignorante (não no sentido pejorativo, mas no sentido de quem não conhece) política, fazendo perguntas tão básicas que muitos não teriam coragem de fazer em público, mesmo não conhecendo os conceitos perguntados.

Claro, alguma noção eu tinha. Sabia da origem de moradora de comunidade, da hipersexualização de suas músicas e clips, e de como os “liberais na economia, conservadores nos costumes” a odiavam. E também sabia que ela tinha tatuado certas partes e divulgado o vídeo. Mas era isto. Talvez, não tenho certeza, sequer conhecesse a voz da cantora.

Aí veio a sequência avassaladora. Primeiro Anitta atinge o topo do Spotify, se tornando a cantora mais tocada no mundo. Logo após participa da tradicional campanha do TSE para incentivar os jovens de 16 e 17 anos a se cadastrarem e votarem. O que explica parte da revolta da milícia digital pró-governo contra uma campanha institucional que ocorre desde 1989. Em seguida, tivemos a lamentável decisão de um ministro do TSE de tentar proibir manifestações de apoio ou repúdio político no Lollapalooza. A resposta da nossa Rainha do Pop foi se oferecer a pagar a multa para os artistas que resolvessem desobedecer a decisão, afinal o valor era para ela menos que uma bolsa.

E tudo isto em poucos dias. Assim Anitta apareceu no meu radar como figura de interesse. E ao pesquisar os segredos que todos vocês já sabem a anos, passei a realmente admirar a figura. A tal ponto de me envolver em debates com desconhecidos em uma rede social por defender que Anitta incomoda muitos por ter glúteos e cérebro avantajados, combinação que seria proibida em nossos preconceitos.

Mas tudo isto fica eclipsado diante do que aconteceu na participação de Anitta no Coachella. A musa sobe no palco de verde e amarelo, e quase todos os dançarinos e figurantes usavam ou nossas cores nacionais, ou outros símbolos que pareciam ter sido sequestrados por seguidores de Sauron, como a amarelinha, o manto sagrado da seleção.

Anitta. Foto: Reprodução (Instagram)

Já havia um certo clamor de alguns para resgatarmos os símbolos nacionais. Nos últimos anos o verde e amarelo, a camisa da seleção, a bandeira, o hino nacional e mais alguns outros símbolos estavam ficando meio que parecidos com uma suástica. Tentaram transformar o patriotismo em reacionarismo, populismo e negação da política e da democracia.

Após o show Anitta tuíta um grito até então sussurrado, afirmando que os símbolos nacionais são de todo o povo brasileiro. E nada mais nada menos que Voldemort em pessoa entra na festa sem ser convidado, fingindo não entender o contexto. Visando criar uma treta com Anitta e seus milhões de seguidores, o elemento responde fingindo concordar, ver a revolta de todos e ainda sair como tiozão descolado.

E é neste ponto que a funkeira da periferia deu uma aula de marketing digital e política para este pobre fingidor de colunista. Ela bloqueia o elemento, explica a estratégia por detrás da intromissão e ainda pede que paremos de citar nominalmente quem não merece ser citado.

O clássico falem mal, mas falem de mim. A habilidade de usar as polêmicas criadas artificialmente, usando os absurdos impensáveis presentes nas declarações para boi mugir. Assim figuras odiadas e mentirosas conseguem pautar a mídia e as redes, e se manterem nos threads, ao mesmo tempo que relegam as notícias de verdade para a quarta página.

De que adiantaria tretar no seu próprio perfil e dar destaque para uma pessoa que jamais teria repercussão naquele espaço sem isto? Claro, em certas situações temos que dar nomes aos bois, ou ao rei do gado. Há momentos em que temos que apontar e esclarecer. Mas que tal parar de nos deixar guiar pela pauta dos outros?

A funkeira da periferia conseguiu resgatar o verde e amarelo, tão vilipendiado e maculado. E ainda mostra a este que vos fala, por detrás de todo seu estudo e cultura, que as vezes o ignorante é o cara com estudo acadêmico. Anitta, além de cantora, revelou-se professora de marketing digital. E eu aceito humildemente o papel de ignorante da vez.

Parece que nos tornamos o país do kit covid, do negacionismo, da devastação ecológica proposital, do elogio a tortura. Nesta bad trip que vivemos, o Brasil precisa de símbolos positivos. Símbolos modernos, brasileiros e conscientes. O símbolo atual é vulgar, baixo, depravado, balança a bunda maravilhosa e nos dá lições de como viver de forma livre e consciente, uma atrás da outra. O que para Voldemort é mais difícil de engolir que camarão mal mastigado. Mas para o Brasil é um mais que necessário momento de resgate. Somos mais e melhores que estes insanos tentaram fazer do nosso país.

Ainda não consigo gostar da música, mas cada vez mais admiro a cantora. Obrigado, professora Anitta.

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Corrupção não é um tema político https://canalmynews.com.br/voce-colunista/corrupcao-nao-e-um-tema-politico/ Wed, 13 Apr 2022 12:41:48 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=27524 Assunto virou tema central nas discussões políticas, mas é só isso que importa? A partir de quais discussões devemos pautar nosso debate público?

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Apesar de ser um assunto frequente, e atualmente quase dominante nas manchetes e nos debates políticos, é importante perceber que corrupção não é um tema político. A política é o processo de debate e tomada de decisões sobre os assuntos da Pólis. É a análise do que a sociedade deseja e como se atingir estes objetivos.

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Por isto quando falamos em política estamos falando de posições ideológicas diversas, muitas vezes conflitantes, do confronto de ideias e de acordos de como atender os diversos interesses e vontades.

Já a corrupção não tem ideologia, não tem conflito, não tem debate ou negociação. É simplesmente o aproveitamento do acesso temporário a recursos que não são particulares para se atingir interesses pessoais. Tipicamente, mas não exclusivamente, é se apropriar da coisa pública para si próprio. Mas cabe lembrar que corrupção também ocorre na esfera privada.

Não há um discurso, uma defesa ou uma tese da corrupção. É tão somente um desvio de conduta, indefensável e inadmissível. Mas não é um tema político, e sim administrativo. Não precisamos de análise social, de grandes filosofias ou de análise de direitos e deveres para perceber que a corrupção é um problema. Até mesmo os meios de evitar a corrupção também não são políticos. É preciso apenas transparência na gestão, fiscalização independente e punição célere e eficiente.

Então porque o assunto se torna cada vez mais fulcral no debate político? A quais interesses a monomania pelos escândalos de corrupção atende?

A bem da verdade o discurso moralista de combate a corrupção nunca foi novidade no debate político. De Lacerda a Jânio Quadros, dos marajás de Collor aos 300 picaretas com anel de doutor de Lula, o combate a corrupção sempre foi uma forma de demonizar os adversários e, muitas vezes, criar uma identificação populista de “povo honesto contra elite sem caráter”.

Mas após o Mensalão e Petrolão a dimensão do discurso vazio anticorrupção ganha outras proporções. Ao invés de ser tratada como um sintoma da falta de compromisso com a coisa pública, a corrupção se torna a explicação simples de como o Brasil seria rico, mas é pobre. Bastaria os políticos pararem de roubar, e todos os problemas brasileiros estariam resolvidos. Desigualdade social, baixa escolaridade, baixa industrialização, exclusão social dos centros de decisão, direitos humanos, etc, tudo isto seriam secundários diante da roubalheira.

Não adiantava apontar fatos simples como a sonegação de impostos gerar mais prejuízo aos cofres públicos que os desvios de verbas. O Brasil não vai para frente por causa da corrupção.

Qual foi o contexto que transformou a corrupção na Caixa de Pandora para a opinião pública? Foi o contexto em que multidões iam as ruas “contra tudo o que está aí”, e gritavam “sem partido” quando alguém levantava alguma bandeira que lembrasse a política. Era não um pedido de honestidade, mas sim um pedido pelo fim da política. Se todo político é ladrão e corrupto, então queremos não políticos gerenciando o país.

Palácio do Planalto.

E com isto tivemos uma ascensão de figuras “não políticas” eleitos, de pastores a policiais, delegados, juízes, procuradores, etc. E tudo o que importava é que fossem “cidadãos do bem”. Questões políticas ou econômicas perderam a importância diante de uma furiosa vociferação contra a política.

E, como esperado, a corrupção não diminui, e sim foi institucionalizada. Ao enfraquecer as estruturas políticas a base dos mecanismos de fiscalização da ética na administração ficou comprometida.

Mas o pior efeito foi o falecimento do debate político. Vemos coisas como o MBL defender a lamentável declaração de Arthur do Val com o brilhante argumento de “ele não estava roubando, p*”. A não corrupção justificando a crueldade ideológica e o preconceito criminoso.

Um desvio administrativo se tornou o único crime possível na política, e passou a ser aceitável todo os outros desvios e excessos. E curiosamente os símbolos anticorrupção acabaram por fracassar em conseguir efetivamente punir os seus acusados devido a seus inúmeros atropelos ao devido processo legal.

Agora, com a eleição se aproximando, com certeza teremos dúzias de escândalos de corrupção por semana. Agora é o Ministro da Educação que privilegiava os amigos pastores.

Isto é claro que precisa ser divulgado e investigado. Mas por favor, lembremos dos outros temas. Neste caso, por exemplo, mais grave que a propina e o quilo de ouro pedido está a violação do Estado Laico.

Por favor, não esqueçamos a corrupção. Mas basta de reduzir a política a um desvio administrativo.

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Homens fortes geram tempos difíceis https://canalmynews.com.br/voce-colunista/homens-fortes-geram-tempos-dificeis/ Mon, 04 Apr 2022 21:54:27 +0000 https://canalmynews.com.br/?p=27221 “Homens fortes geram tempos fáceis. Tempos fáceis geram homens fracos. Homens fracos geram tempos difíceis”. Será mesmo?

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Uma das reações comuns nos primeiros dias da invasão da Ucrânia por tropas russas, em especial entre apoiadores de Trump, foi a ideia de que a saída de Angela Merkel e a fraqueza de Biden teriam dado um sinal a Putin de que o Ocidente estaria fraco, incentivando o ataque. E que se os Estados Unidos e/ou a União Européia estivessem sob a tutela de líderes fortes, algo assim não teria acontecido.

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Há uma certa verdade nesta análise, mas apenas em um nível superficial e conjectural. Se olharmos com um distanciamento maior, o primeiro ponto a se questionar é que este confronto não começou em 2022, mas sim em 2014, com a tomada da Criméia, momento em que, em tese, o Ocidente tinha líderes “fortes”.

Sem dúvida as crises internas dos Estados Unidos, Inglaterra, França, Alemanha, etc , foram um incentivo a Putin a retomar a iniciativa. Mas estas crises internas se devem não a fraquezas de líderes, mas a uma pandemia, e também ao excesso de força no debate democrático.

Citando apenas um exemplo, o ponto extremo da crise americana foi a Invasão do Capitólio. Não foi a fraqueza de um líder que enfraqueceu a maior potência militar do mundo, e sim o oposto: forças internas que esqueceram como dialogar. A escolha de um líder conciliador e “fraco” para combater Trump foi exatamente devido aos problemas de confiar em homens fortes e abrutalhados como líderes políticos.

Um ditado cada vez mais popular afirma que “Homens fortes geram tempos fáceis. Tempos fáceis geram homens fracos. Homens fracos geram tempos difíceis”. E por detrás deste ditado esta a ideia de que os “tempos fáceis” são construídos com base nos valores morais, no caráter, na retidão, no pulso firme e viril de líderes capazes de carregar a sociedade para a direção certa.

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Presidente da Rússia Vladimir Putin. Foto: Dimitro Sevastopol (Pixabay)

E os homens fracos, por não lidarem com problemas reais, acabariam por criar processos de vitimização e falsos dilemas, falsos conflitos. Notamos portanto que esse discurso é na verdade uma tentativa de varrer os problemas identitários como fraqueza e decadência moral. Algo como “seus avós lutaram contra nazistas, e agora você reclama de micro-agressões”.

Mas essa ideia não resiste nem mesmo a uma análise histórica rasteira. De fato, quando todos estão ocupados com o que comer ou se minha cidade será demolida por invasores, não perdemos muito tempo pensando sobre respeito a diferenças, felicidade, dignidade, etc. Mas isto não acontece por força, e sim por necessidade.

E os tempos extremos não nos torna melhores ou mais capazes. Pelo oposto. O faminto acuado e desesperado é exatamente a massa de manobra para homens “fortes” cativarem homens bons para cometerem suas atrocidades.

Se é para compararmos com a “geração de ouro” que lutou na Segunda Guerra, então temos que lembrar que os horrores da guerra surgiram exatamente por que as dificuldades da Primeira Guerra Mundial, a Gripe Espanhola e o Crack de 1929 alimentaram “homens fortes” como Mussolini, Hitler e Stalin. A ideia de líderes fortes que trarão com a força de seu caráter as nações para tempos gloriosos foi a causa de problemas ainda maiores.

Edifícios e carros destruídos após bombardeio em cidade ucraniana. Foto: Vladimir Koval

Indo ainda para um caminho ainda mais básico, por detrás desta ideia de “homens fracos geram tempos difíceis” está a defesa de que o homem só manifesta o seu melhor quando é reduzido ao extremo. Que a luta pela sobrevivência é a atividade realmente digna do humano. E não a arte, a filosofia, a diplomacia, a colaboração.

A ideia de que homens fortes criam tempos fáceis esconde uma pulsão pela morte. A afirmação do sofrimento como positivo, e da paz e da tranquilidade como um problema. É mais um sinal da necropolítica que infelizmente toma cada vez mais nosso imaginário.

Não precisamos de homens fortes. Precisamos de regras claras e bons consensos. De menos força, de mais diálogo. De menos virilidade.

Não é a toa que Putin, Trump, Bolsonaro e companhia sejam tão obcecados com a masculinidade como instrumento político. E o resultado está ai. Tempos realmente difíceis.

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