Sandman fala de um mundo oculto onde além dos homens, da magia, das criaturas fantásticas e até dos deuses existe uma família de entidades representativas das grandes forças que regem não o mundo, mas os homens.
por Aniello Olinto Guimarães Greco Junior em 08/08/22 13:28
Nesta sexta-feira, 5 de agosto, estreou a série Sandman na Netflix. Mas na verdade esta história começa em janeiro de 1989, com a publicação do primeiro fascículo da épica saga de Sandman, escrita por Neil Gaiman. Ou talvez a história tenha começado nas brumas do tempo, nos primeiros sonhos dos primeiros seres humanos, em um tempo ao mesmo tempo próximo e distante, com qual nos reconectamos todas as noites, mas esquecemos em parte cada vez que acordamos.
Mais importante que sabermos se esta nova versão de um dos quadrinhos mais marcantes da história é uma boa adaptação seria reconhecer o poder de uma boa história, de um bom sonho, de um bom mito. Quase certamente a série de TV não será um marco como foi o quadrinho no qual ela se baseia. Mas será uma nova forma de uma potente história em ressoar novamente em nossos inconscientes. E uma oportunidade para aqueles que não foram expostos a Sandman na década de 1990.
Para quem não faz a menor ideia do que eu estou falando, Sandman fala de um mundo oculto onde além dos homens, da magia, das criaturas fantásticas e até dos deuses existe uma família de entidades representativas das grandes forças que regem não o mundo, mas os homens. Os Perpétuos. Destino, Morte, Sonho, Desejo e Desespero, Delírio e um irmão pródigo (que não darei o nome aqui para preservar a surpresa), mais antigos e mais imortais que deuses e homens, mas ao mesmo tempo dependente deles.
É um tipo de fantasia bastante diferente de Harry Potter ou de Senhor dos Anéis, sendo mais similar de fenômenos culturais como Star Wars ou Matrix. Sandman é um mito moderno, uma metáfora que por meio de mentiras e delírios acaba por nos falar de verdades inabordáveis por meio de estudos acadêmicos, ritos religiosos ou discursos políticos.
Nesta primeira temporada somos levados a sonhar com coisas como quantas vezes nos tornamos prisioneiros daquilo que temos e que construímos, perdendo o contato com aquilo que somos. Ou nos desesperarmos com qual seria o resultado de um mundo sem mentiras, disfarces, sonhos e ilusões. Ou ainda sobre que poder o sonho e a esperança pode vir a ter quando nos percebemos em uma realidade inescapável e cruel.
Mas entre vários aspectos do Sonhar em Sandman quero destacar a Morte. Gaiman optou por retratar a Morte como uma jovem sorridente, cativante e empática. Uma figura vibrante, e calma, a irmã mais velha, mais madura e muito mais humana que seu sombrio irmão, o Sonho.
Em uma sociedade onde convivemos cada vez menos com a morte, que sai de nosso cotidiano para as UTIs distantes, desaprendemos a perceber o lado positivo, a benção que a morte pode representar. Não apenas o descanso, como principalmente a renovação. Sem o antigo sair de cena, sobra pouco espaço para o novo. Sem a morte não há o renascimento. Não são poucos os mitos antigos que mostram o quanto o túmulo pode ser semelhante ao ventre.
Mas não ache que estes temas maiores que a vida irão te sufocar. Se é verdade que há um tom épico e cósmico em Sandman, isto só ocorre por meio de seus personagens humanos, comuns e conhecidos. Contudo adormeça seu consciente antes de assistir. Esqueça as lutas cotidianas, se desligue. E mergulhe. Haverá momentos de terror, momentos de júbilo, de espanto e de epifanias. E no final da jornada (espero que daqui a 4 ou 5 temporadas, pois material original para isto não falta) com certeza você sairá diferente.
Por fim, um parênteses aos fãs apegados. Sim, há mudanças e diferenças. Em especial alguns personagens mudam de sexo, de cor de pele, de grupos culturais. Mas isto não importa. Nunca sonhamos duas vezes o mesmo sonho. Pois no final de cada um deixamos de ser quem éramos.
*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.
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