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Vacinas do futuro: o que podemos esperar?

Mudança na forma de desenvolver os imunizantes e melhoria na comunicação serão pontos-chave daqui para frente

por Alexandre Rodrigues Marra, Luis Fernando Aranha Camargo em 08/02/22 16:17

Pessoa recebe vacina no braço. Foto: Reprodução (Unsplash)

Todos os avanços tecnológicos que ocorreram na área médica e de saúde populacional — que em diferentes formas continuam mudando o mundo para melhor e salvando vidas — devem algo às vacinas. Sendo bastante claro e redundante. Isso é inquestionável e fora de discussão. 

Ao longo da história da humanidade, as doenças infecciosas acarretaram desastrosas perdas para as sociedades. Mas o desenvolvimento das vacinas possibilitou um melhor controle, protegendo as pessoas principalmente de infecções virais de rápida progressão e transmissão.

A ideia da vacinação (ou, atualmente, da imunização) foi concebida em 1796 por Edward Jenner, quando o médico franco-inglês conseguiu evitar que um menino adquirisse a varíola inoculando, nos braços da criança, o material contendo o vírus da doença. A prática da inoculação foi só o começo de uma nova era no campo de pesquisa das vacinas. Durante as duas grandes guerras mundiais, por exemplo, os soldados eram protegidos contra tétano e difteria desta forma. 

Mais recentemente, nas décadas de 1950 e 1960, o imunizante contra a poliomielite foi desenvolvido em uma corrida contra o tempo, visto que a paralisia infantil acometia o mundo inteiro com mortes e sequelas. Surge nesse cenário uma das primeiras vacinas orais, a Sabin — popularizando mais ainda a necessidade de vacinação, em um nível indiscriminado e seguro, de todas as crianças, em todos os países. 

Em 2020, tivemos outro exemplo de imunizantes desenvolvidos em um prazo, até então, considerado recorde. Antes de completar um ano da pandemia da Covid-19, as vacinas contra o Sars-CoV-2, vírus causador, começavam a serem aplicadas em alguns países, como a Inglaterra. 

Doses da vacina CoronaVac contra a Covid-19. Foto: Breno Esaki (Agência Saúde)

Etapas de desenvolvimento

Em geral, as vacinas requerem anos de testes e pesquisas antes de chegarem até o uso clínico, ou a aplicação em nível populacional. São várias as etapas que devem ser cumpridas para a nossa segurança, de acordo com a agência regulatória norte-americana Centers for Disease Control and Prevention (CDC, na sigla em inglês): 

  1. Fase exploratória: identificação das moléculas que vão compor o imunizante;
  2. Fase pré-clínica: testes da possível vacina em laboratório e em animais; 
  3. Desenvolvimento clínico: testes do imunizante em seres humanos; 
  4. Revisão regulatória e aprovação;
  5. Manufatura; 
  6. Controle de Qualidade. 

Dentro da etapa de “Desenvolvimento clínico”, se dividem outras três fases: 

  • Fase I: quando a vacina é administrada em um grupo pequeno de pessoas. Em relação aos imunizantes contra a Covid-19, existem novas vacinas em andamento ainda nessa fase. 
  • Fase II: o estudo clínico é expandido para pacientes com características semelhantes, como idade ou presença de comorbidades, para começar a avaliar como será a eficácia da vacina. 
  • Fase III: nesta última fase clínica, a vacina é oferecida para milhares de pessoas. A eficácia e segurança são avaliadas nessa etapa.

Todo esse processo demora, pelo menos, de 18 a 24 meses. 

Até meados de dezembro de 2021, cerca de 110 vacinas ainda estavam sendo testadas em ensaios clínicos randomizados — no qual os pesquisadores não sabem quais participantes receberam a vacina em teste e quais foram aplicados com uma substância placebo, justamente para ter clareza nos resultados. Destes, 43 já se encontravam na última fase, a terceira. Dezesseis imunizantes já receberam a autorização de uso clínico, sendo que nove têm a aprovação final. 

Pesquisa feita por cientista em laboratório. Foto: Marcelo Seabra (Ag. Pará)

Mesmo na vigência de uma pandemia, com diferentes interesses acontecendo ao mesmo tempo, deve-se respeitar o princípio médico de “não causar mais danos que benefícios” ou, em inglês: “First, do no harm”. Em respeito a esse princípio, dez vacinas contra a Covid-19 foram abandonadas na etapa dos ensaios clínicos por não se apresentarem seguras. As razões são várias, entre elas os eventos adversos graves ou a falta de eficácia comprovada. 

Independentemente do momento, seja no presente ou no futuro, há a necessidade de existirem ensaios clínicos randomizados — nos quais não haja interferência do investigador da pesquisa — para qualquer vacina que aparecer no mercado. Afinal, é preciso entender como as vacinas se comportam no mundo real, e isso inclui saber:

Quais pessoas são mais expostas a essas doenças? Idosos ou crianças são capazes de desenvolver uma boa imunidade vacinal? Indivíduos com o sistema imunológico comprometido (imunocomprometidos) serão capazes de evitar a doença, ou de evitar uma gravidade maior? A vacina é segura para gestantes? Ou há poucas, pouquíssimas ou, ainda, nenhuma reação vacinal? E assim por diante. 

O comportamento dos imunizantes no mundo real, até o momento, não falhou quando todos esses passos fundamentais da segurança em pesquisa foram seguidos. Vale lembrar que nenhuma vacina foi idealizada para invadir e modificar nosso material genético.

Vacina de Oxford em preparação para ser aplicada. Foto: Tânia Rêgo (Agência Brasil)

Futuro das vacinas 

Como novidade e para o futuro, observamos nos estudos clínicos disponíveis que as vacinas confeccionadas com RNA mensageiro mostraram resultados superiores às demais, com bastante segurança. Esse é um método novo, e que não estava disponível anteriormente para uma vacinação em massa. 

É possível que esse tipo de imunizante esteja estabelecendo um precedente. Futuras vacinas, ou mesmo imunizantes já existentes (mas com resultados subótimos), poderão ser adequadas a essa nova maneira de formulação. 

O intuito é que as vacinas treinem o sistema imunológico para reconhecer um vírus a fim de combatê-lo. Usando tecnologias por imagem (cristalografia por Raios X, por exemplo), os pesquisadores conseguem predizer os contornos dos vírus, bem como de suas proteínas, e em seguida reproduzir essas estruturas para a criação de vacinas mais eficazes.

Ou seja, para a criação das vacinas do futuro, cada vez mais métodos de imagem serão empregados para recriar os vírus, ou as proteínas que fazem parte desses vírus, até chegar em partículas muito pequenas, em nível de átomos. 

Dessa forma, inúmeras técnicas promissoras de vacinas surgirão cada vez mais, ao melhorar a resolução de imagem das estruturas virais, como as vacinas de RNA mensageiro, ou da cápsula de um vírus com o material genético de outro vírus (por exemplo, o adenovírus contendo a proteína “spike” do Sars-CoV-2), ou partículas proteicas que adentram as células a partir de nanopartículas, que mimetizam o vírus que se pretende combater a infecção – já que são uma realidade atual. 

Outra mudança a ser vista daqui para frente é uma melhora na comunicação sobre as vacinas. Isso poderá levar algum tempo, mas estamos caminhando para um futuro no qual as informações sejam transmitidas de forma mais clara e compreendidas pela população. 

Enquanto isso, continuem vacinando a si e a seus filhos, e não apenas contra a Covid-19, mas para todas as vacinas recomendadas pelo calendário vacinal. De alguma forma ou de outra, continuaremos precisando dos imunizantes, seja agora ou no futuro. Vacinem-se!


Quem são Alexandre Rodrigues Marra e Luis Fernando Aranha Camargo?

Alexandre Rodrigues Marra, pesquisador do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein (IIEP) e docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert Einstein (FICSAE).

Luis Fernando Aranha Camargo, professor da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein.

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