Brasileiros que convivem com o vírus HIV relatam as adversidades que enfrentam no seu cotidiano por pura falta de informação alheia
por da Redação em 30/06/22 09:50
“Do jeito que as pessoas vinham falar comigo, eu me sentia com uma semana de vida.” Este foi o primeiro contato do jovem Victor Bebiano com a falta de informação e o preconceito sobre HIV/AIDS, depois de revelar à família o contágio. Convivendo com o vírus há sete anos, ele conta que a discriminação aparece muito por meio de gestos, “sempre muito ligada à ignorância das pessoas sobre o assunto”.
A experiência de Victor não é a exceção: dados confirmam que o estigma do contágio com HIV ainda é forte entre os brasileiros. O mais recente Índice de Estigma em relação às pessoas vivendo com HIV/AIDS BRASIL, divulgado em 2019, apontou que 46,3% dos entrevistados sabiam que outras pessoas estavam fazendo comentários discriminatórios ou especulativos, associados ao fato de ser alguém vivendo com HIV/AIDS. Além disso, são comuns as situações de assédio verbal (25,3%), agressão física (6%) e até mesmo perda de emprego (19%).
“Fazendo seu tratamento, você não apresenta risco a você mesmo ou a outras pessoas. E não é algo de que se deve ter vergonha”, argumenta Victor, desmistificando a ideia ultrapassada de que o HIV é uma “sentença de morte”. “Mesmo depois de esclarecer minha família a respeito dos avanços no tratamento, demorou bastante para que relaxassem. Durante um bom período, minha mãe viveu muito preocupada com minha saúde.”
Para trazer o tema de volta à discussão pública, o Fórum da ONG/Aids do Estado de São Paulo (FOAESP), em parceria com os diretores de criação Cassio Filho e André Vidigal, a diretora Lekka Glam, a produtora audiovisual Veludo e o estúdio criativo @faccion.cc, desenvolveram uma campanha que aborda o dia a dia de quem sofre discriminação por conta da soropositividade. Não à toa, o conceito escolhido foi “A cura da AIDS começa em um mundo sem preconceito”.
Os diretores contam que foram registradas histórias de quatro pessoas que convivem com HIV. Diferentes idades, raças e orientações sexuais marcam a escolha dos entrevistados, como forma de confirmar que não há grupos mais suscetíveis. “Nossa preocupação foi criar no set um ambiente de acolhimento e intimidade, o que deixou as pessoas à vontade para contar suas histórias”, relata Vidigal. Para Bebiano, que já participou de outras iniciativas sobre HIV/AIDS, não foi apenas o acolhimento que fez a diferença. “É visível que houve uma preparação para as entrevistas, um cuidado em acertar os termos e entender as situações, e em fazer perguntas pertinentes e bem construídas. Nem sempre é assim, infelizmente.”
A opção estética do uso de luz e sombras, aliada ao resultado do ambiente acolhedor, entrega vídeos emocionantes, contrastando o relato cru com visual poético e permitindo ao espectador entender a profundidade de cada fala. “Queríamos nos afastar da estética dos filmes sobre o assunto, que é a mesma desde os anos 1980 e tem um teor mais agressivo. Viver com HIV/AIDS não precisa ser assustador”, ressaltam os diretores. A partir disso, a diretora de fotografia, Lara Domingues optou por metaforizar sentimentos, com a escuridão representando a ignorância, o preconceito e estigma enquanto a iluminação entra como uma representação da quebra desse paradigma.
Segundo os diretores de criação Cassio Filho e André Vidigal, a expectativa da campanha é provocar o debate sobre o estigma que a sociedade ainda impõe sobre a doença, e comprovar quão prejudicial ele é. Suas falas são corroboradas pela infectologista Denize Lotufo, que atua no atendimento de pessoas com HIV há mais de 30 anos. “Hoje, esta é considerada uma infecção crônica que, com tratamento correto, fica totalmente estabilizada. Quem toma os medicamentos corretamente pode e deve fazer planos de vida.”
Para ela, o estigma é o fator que mais atrapalha não apenas o tratamento, como também a qualidade de vida de seus pacientes. “Tem gente que ainda precisa tomar os remédios escondido no trabalho, ou dizer que são vitaminas. Isso é lamentável. O preconceito também afasta as pessoas da informação: muitos não sabem, por exemplo, que não transmitem o vírus com ele indetectável no organismo.” O presidente do FOAESP, Rodrigo Pinheiro, concorda com a infectologista, lembrando que o enfrentamento do preconceito também auxilia no trabalho de prevenção. “Em mais de 40 anos de epidemia de HIV/AIDS, o maior desafio é o combate ao estigma e ao preconceito das pessoas com quem vive com o vírus. Pensando nisso, o FOAESP, junto com a GSK, lançou este projeto para conscientizar a população em geral. Esta luta se faz necessária para a garantia dos Direitos Humanos.”
A campanha do FOAESP, colegiado que reúne organizações com atuação no campo da Aids, direitos humanos e saúde pública, tem apoio da farmacêutica GSK. O lançamento para convidados ocorreu nesta segunda (27), às 10h, no auditório do Centro Formador de Pessoal para Saúde – CEFOR, em São Paulo.
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