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Teoria dos Jogos

O assessor de Trump e Bolsonaro e a matemática por trás dos conflitos globais dos nossos tempos

O que existiria em comum entre episódios de violência recentes como a invasão ao Capitólio nos EUA, a guerra na Ucrânia, a tragédia de Foz do Iguaçu, e essa espiral de agressividade e tensões que o planeta vem passando?

por Rodrigo Arantes em 26/07/22 08:22

Essa semana Steve Bannon, o famoso assessor de Trump e Bolsonaro, foi condenado por desacato ao congresso americano em suas investigações sobre a invasão ao Capitólio no dia 6 de janeiro de 2021.

Assim, aparentemente, se fecha um capítulo na história de um mago da gamificação do marketing político que foi responsável pelas principais vitórias de uma série de pautas e figuras conservadoras que modificaram o mundo na última década de conexão em vários fatos recentes da política nacional e internacional.

Mas o que estaria por trás do poder deste marqueteiro político que já foi produtor de séries de Hollywood como Seinfeld, foi fundador da empresa de big data Cambridge Analytica e depois se tornou o principal assessor de políticos de extrema-direita com tendências xenofóbicas e belicistas?

Para entender de onde vem o poder de Bannon você vai ter que compreender um pouco um campo da matemática chamado de Teoria dos Jogos e que já foi apropriado por muitas outras ciências, como a economia e a biologia, mas também, pelos estados maiores dos governos no período da guerra fria para a formulação de suas estratégias nucleares.

A Armadilha Hobbesiana, o jogo da destruição mútua:

Armadilha Hobbesiana, também chamada de Dilema de Schelling é o nome dado à análise de uma situação em que, dentro de um contexto, jogadores se envolvem em uma espiral de medo e armamentismo que realimenta o medo podendo assim gerar resultados negativos para todos os jogadores envolvidos.

Esta é uma situação estudada na Teoria dos Jogos, que foi um campo da economia e matemática que ganhou força após a segunda guerra, justamente num contexto em que tanto o governo americano como o soviético investiam pesadas somas em armas nucleares como escudos de contenção do avanço mútuo. Foi justamente neste período que intelectuais como Thomas Schelling e John Nash pensaram modelos matemáticos capazes de simular os possíveis cenários político-militares derivados de cada decisão de Estado feita naquele período da história.

Schelling foi um homem de confiança do presidente Kennedy e esteve ao seu lado manejando o histórico episódio da crise dos mísseis. E também cunhou conceitos como o famoso “Telefone Vermelho” entre a Casa Branca e o Kremlin (e que, na verdade, não era bem um telefone) e conceitos como massa crítica e a armadilha hobbesiana.

Na Armadilha Hobbesiana os jogadores são atraídos para um cenário final de destruição mútua quando entram num processo de se armar um contra o outro. Algo que pode acontecer tanto entre superpotências como entre marido e mulher quando gastam todas suas economias com advogados e usam filhos como armas em processos de separação.

Estamos hoje enfrentando uma nova crise dos mísseis, agora entre Estados Unidos, Reino Unido, Russia e China a respeito da Ucrânia e de Taiwan. Só que não somente de mísseis físicos, mas de dados, por fluxo de informações que tem poder de causar dano aos objetivos do inimigo. Como vírus de computador, espionagem de informações críticas inimigas, ou mesmo memes de internet desenhados para causar reações psico-emocionais em segmentos demográficos específicos.

O ponto é que na Era da Informação, naturalmente, a informação se transformou em arma. De modo que os centros de poder passaram a produzir dois tipos de informação a útil e a tóxica.

útil, é a informação que serve de subsídios para boas ações. A informação tóxica, é criada para confundir e produzir ações em próprio prejuízo no inimigo.

Deste modo, a guerra nuclear evoluiu da sub-atômica para a metafísica dos jogos virtuais, capazes de submeter os recursos do inimigo contra ele próprio, invadindo as redes de comunicação dos adversários e disseminando notícias falsas e controversas para dificultar a efetividade de suas ações, e potencialmente, controlando e dirigindo suas ações totalmente aos seus interesses.

Quem esclarece bem o princípio psicomecânico por trás disso é o pioneiro da gamificação Yu Kai-Chow, que identificou gatilhos psico-emocionais para ações de um usuário que nomeou de White Hat e Black Hat, ou chapéu branco e chapéu preto, como são também nomeados os hackers que usam suas habilidades para promover causas coletivas, como a transparência em governos e hackers que usam suas habilidades para benefício próprio como roubar dinheiro.

A Natureza dos Motivadores White Hat vs Black Hat na Gamificação

Motivadores White Hat são elementos centrais de motivação que nos fazem sentir poderosos, preenchidos e satisfeitos. Podemos sentir o controle de nossas vidas e ações. Em contraste, motivadores Black Hat, nos fazem sentir obcecados, ansiosos e adictos. Muitas vezes, deixa um mau gosto na boca porque sofremos o controle de nossos próprios comportamentos.

Como vantagens de White Hat Gamification são óbvias e uma maioria das empresas que aprendem minha estrutura pensa: “Ok, precisamos fazer o White Hat!” Eles estariam quase certos, exceto que há uma fraqueza crítica da Motivação do White Hat: não cria um senso de urgência.

Por exemplo: se eu me aproximasse de você com grande entusiasmo e exclamação: “Sair e mudar o mundo hoje!” Você pode ficar muito animado com este gatilho do Core Drive 1 e pode concordar, “Sim! Eu vou sair e mudar o mundo! Mas eu primeiro vou tomar um bom café da manhã, escovar meus dentes e me preparar para o dia!” Como  você Pode ver, não há urgência com este nível de estímulo White Hat.

No entanto, se eu pego uma arma e aponto para sua cabeça, enquanto sussurro silenciosamente, “saia e mude o mundo, ou eu vou matá-lo”, você ainda provavelmente “mudará o mundo”, mas você provavelmente não vai desfrutar do seu bom café da manhã ou escovar os dentes ao serem pressionados pela minha ameaça Core Drive 8: motivação de perda e evitação.

Claro, nesse ponto você também não se sente bem em mudar o mundo. Uma vez que você puder deixar meu alcance, você provavelmente vai parar de se importar e deixar a causa nobre completamente. Ou seja, a menos que o significado épico e o chamado se regenerem a partir de dentro.

Assim, a guerra cibernética moderna passou a empregar este princípio como arma e produzir e disseminar, em massa, informações tóxicas capazes de induzir populações inteiras a tomar decisões incorretas para seus interesses e objetivos, individuais e coletivos.

O sucesso dessas táticas já foi comprovado por plebiscitos importantes como o Brexit e a eleição de Donald Trump, Bolsonaro e Zelensky.

Seu uso foi denunciado por um ex-funcionário da empresa Cambridge Analytica, empresa fundada em 2013 por Steve Bannon e que desenvolveu um sofisticado sistema de identificação e segmentação de grupos de perfis demográficos obtidos através de dados hackeados de redes sociais como o Facebook, e assim, produzir fake news com táticas black hat especialmente desenhadas para os medos e paranóias específicas delas.

Como efeito da escalada da aplicação destas táticas de guerra cibernética, cada eleição que tem acontecido em países democráticos hoje está sob a ameaça de sofrer influências externas. E sua influência não é obviamente para a eleição dos melhores políticos que concorrem ao pleito. O objetivo tático é justamente influenciar a eleição do pior político possível para desestabilizar, por dentro, o bloco adversário com a eleição de uma liderança controversa.

E com a evolução deste jogo, o mundo corre o risco de ser totalmente pego por uma “armadilha hobbesiana” planetária que pode globalizar a política do medo e do ódio no mundo sob líderes mais incompetentes e autoritários possíveis, e um estado policial.

Os únicos países imunes à este jogo são justamente os países mais fechados, e onde a internet é mais controlada e a política monopolizada por um único grupo ou partido político, como China, Russia, Irã ou Arábia Saudita

Segundo Schelling, a única forma de evitar esta espiral de medo e agressividade é criando mecanismos que restabeleçam a confiança entre as partes do conflito, como o Telefone Vermelho entre a casa branca e o Kremlin foram no período da guerra fria. Mas o que seria o Telefone Vermelho hoje, se este processo é criado de cima para baixo, entre os centros de poder e as massas?

Essa é a questão que a humanidade precisa responder correndo contra o tempo antes que essas tensões se escalem ainda mais.

Mesmo sendo o Brasil um país que comparado com o resto da América Latina não se destaca entre os que mais tem histórico de violência por razões políticas, o caso de Foz do Iguaçu, o clima de futebolização e polarização política em que entramos desde a eleição de 2013 mas que se intensificou chegando em 2018 ao assassinato da vereadora Marielle Franco, representam que o Brasil caiu, e segue preso em uma Armadilha Hobbesiana, mas agora com milhões de armas a mais circulando nas ruas e novos clubes de tiros abrindo todos os dias. E parece que se nada acontecer, não sairemos desta armadilha tão cedo, ficando à mercê dos que se beneficiam desta polarização que são Bolsonaro, Lula e os países estrangeiros dependentes de recursos naturais que se beneficiam com a desvalorização da nossa moeda.

Entre abril de 2013 e dezembro de 2021, o dólar que valia R$1,99 subiu para a faixa de R$5,50, então essa polarização já nos custou mais que 60% do nosso poder de compra que vem numa espiral de queda ao longo de todo esse período de crise política e a indústria nacional até hoje não recuperou seus níveis de produção de 2011. A cada 5 famílias brasileiras, 4 estão endividadas e a taxa de inflação e o desemprego estão acima de dois dígitos.

Em outras palavras, a Armadilha Hobbesiana é um mal que acomete o Brasil nos fazendo mais fracos e dependentes de questões externas e estamos sentindo isso no preços de tudo, fazendo o nosso tempo individual de trabalho valer menos enquanto nossa vida política estiver presa em polarizações que não aprofundam o debate de problemas e questões caras e importantes para a vida do brasileiro.

É espantoso que com tantos jornalistas, tantos economistas e tantas universidades respeitáveis no nosso país não exista mais gente falando disso, mas isso também se explica pelas próprias bolhas que a Armadilha Hobbesiana produz e que impedem a visão do todo. Mas também pelo desconhecimento geral sobre o assunto Teoria dos Jogos que no Brasil só tem na Marinha um instituto de pesquisa inteiramente dedicado ao assunto.

Também por isso precisamos de mais espaços como o MyNews capazes de funcionar como o Telefone Vermelho e capaz de furar bolhas, reconstruir confiança e mostrar para os participantes da vida política nacional em que jogo entramos.

*Rodrigo Arantes é administrador, designer de jogos de escritório, empreendedor, entusiasta de movimentos de empreendedorismo startup e gamificação e fundador do Instituto #AJOGADA™ de Gameologia, que propõe o salto da burocracia para a ludocracia (administração baseada em jogos), pela substituição de documentos por tabuleiros colaborativos nos ambientes de trabalho e de educação.

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