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BALAIO DO KOTSCHO

Receita infalível para se tornar um colunista neocon de sucesso

Fundamental é ser contra o governo, principalmente se for de esquerda. Nem o Vaticano deve ser poupado

Em 18/01/24 14:41
por Balaio do Kotscho

Ricardo Kotscho, 75, paulistano e são-paulino, é jornalista desde 1964, tem duas filhas, 5 netos e 19 livros publicados. Já trabalhou em praticamente todos os principais veículos de mídia impressa e eletrônica. Foi Secretário de Imprensa e Divulgação da Presidência da República (2003-2004). Entre outras premiações, foi um dos cinco jornalistas brasileiros contemplados com o Troféu Especial de Direitos Humanos da ONU, em 2008, ano em que começou a publicar o blog Balaio do Kotscho, onde escreve sobre a cena política, esportes, cultura e histórias do cotidiano

Foto: Divulgação

Para começar, é preciso ter diploma, qualquer um, para se diferenciar dos simples mortais. Vivemos a época dos especialistas em qualquer assunto. Não há mais lugar para genéricos autodidatas como Cláudio Abramo e Mino Carta.

Você pode ser sociólogo, filósofo, geógrafo, diplomata, médico, advogado, mas tem que ser um “ista” em qualquer área do conhecimento humano. Importante é sempre deixar claro que você não é jornalista, um ofício menor, para não ser obrigado a se ater à verdade factual e poder viajar à vontade nas tuas verdades absolutas.

Fundamental é ser contra o governo, principalmente se for de esquerda. Nem o Vaticano deve ser poupado. É preciso sempre combater o perigo “comunista”. Fazer cara de mau também ajuda, mas se permite um sorriso irônico e um balançar de cabeça vez ou outra, quando você discorda dos menos dotados de saber e inteligência.

Em qualquer plataforma, recomenda-se ser sempre contra o senso comum, duvidar da ciência, colocar minhoca na cabeça da plateia, confundir para depois explicar, criar polêmica, causar. Cancelar e humilhar quem pensa diferente também é recomendável. Gera leitura, cliques e audiência, o combustível do sucesso. É só ver o exemplo do inacreditável Javier Milei, que começou falando abobrinhas como colunista neocon de economia na TV e virou presidente da República, repetindo as mesmas ideias, que agora está colocando em prática.

O primeiro case de sucesso desta fauna foi o “filósofo” Olavo de Carvalho, que hospedou suas colunas em grandes jornais, não esqueçamos, antes de se tornar guru do nascente bolsonarismo, escola que também chegou ao poder. A ele se seguiram várias contrafações, até de jornalistas, mas quem brilhou mais foram os novos filósofos, que fazem cara de inteligência superior até para dar boa noite.

Outra dica infalível é fazer citações eruditas de autores desconhecidos para mostrar como os mortais que debatem com eles são ignorantes. Seja num programa do “mainstream” dos canais de notícias, num podcast ou no Domingão do Huck, repita sempre os mesmos bordões, não importa o assunto.

Faz parte do receituário naturalizar os autocratas mais bizarros e  os crimes contra a humanidade, levantando questões de semântica e semiótica, que ninguém vai entender, mas a plateia do papel ou da telinha achará bonito.

Ser um colunista neocon de sucesso não é para qualquer um. Tem que ter “feeling” para o negócio, pois é disso que se trata, e uma tremenda cara de pau para agradecer os aplausos. O que era um nicho de mercado nos tempos de Paulo Francis, outro precursor, virou tendência no preenchimento de vagas de novos colunistas, com preferência para os neocon.

Rubem Braga, coitado, não teria a menor chance nesse nicho.

Vida que segue.

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