21 anos sem Brizola: o político que desafiou elites, a mídia e o poder Foto: divulgação PDT

21 anos sem Brizola: o político que desafiou elites, a mídia e o poder

Na segunda parte da entrevista sobre um dos maiores nomes da política brasileira, MyNews relembra seus atritos com a Globo e oposição

Há 21 anos, Leonel Brizola deixava órfã uma geração de brasileiros e cariocas que passaram anos o acompanhando na política. Governador do Rio de Janeiro em duas ocasiões, o líder máximo do PDT governou o estado entre 1983 e 1987 e depois entre 1991 e 1994.

Na segunda parte da entrevista sobre Brizola, o historiador Guilherme Lopes Galvão detalha o que foi feito de melhor nos mandatos e no que o político deixou a desejar.

Guilherme analisa o que Leonel não conseguir exercer de forma positiva

R: “Brizola deixou a desejar principalmente na sua articulação política, na sua interlocução com a Assembleia Legislativa. O PDT teve suas portas escancaradas para muitas figuras, ao longo dos anos 80 e 90, que nada tinham a ver ideologicamente com o partido, mas que estavam ali aderindo ao fenômeno do brisolismo e tentavam tirar algum proveito governamental. Isso fez com que o PDT começasse a se envolver em escândalos. O Brizola começou a se tornar refém da Assembleia Legislativa — principalmente em seu segundo mandato, isso ficou muito claro. A relação ali com o antigo presidente José Nader era uma relação muito conflituosa. Então, acho que ali, na interlocução política com essas figuras mais populares, principalmente deputados estaduais, que são completamente diferentes dos federais, isso foi uma coisa muito ruim”

Minimizou a Segurança Pública no Rio de Janeiro

“Na década de 90, com a alta da criminalidade do Rio de Janeiro, tivemos ali a chacina de Vigário Geral, a chacina da Candelária, tivemos muitos problemas dos arrastões. Isso foi muito explorado pela mídia. Brizola buscou minimizar em alguns momentos até fingir que o problema não existia — quando, na verdade, ele deveria ter feito o contrário. Acho que o Brizola deveria ter admitido que o problema existia e destacar que aquilo, muito do que ocorria, era de responsabilidade, era de atribuição do governo federal, e que o mundo estava envolvido também naquele contexto: aumento das facções criminosas, a entrada do Rio de Janeiro na rota do tráfico de drogas para a Europa, a escalada de criminalidade e violência no Rio nos anos 80 e 90 vai coincidir com o crescimento nas principais cidades do mundo”.

Brizola x Rede Globo

Brizola teve muitos embates com a TV Globo durante todos os seus mandatos como governador, e até mesmo quando era somente candidato. Aqui o historiador conta detalhes desses atritos:

R: “Como ele falava, hoje é o Grupo Globo. Tiveram um papel de protagonismo tanto ali na crise que levou Vargas ao suicídio, em 54, quanto no golpe de 64. Na consolidação do golpe, do endurecimento do regime militar, teve o apoio de Roberto Marinho. Isso já foi reconhecido em editoriais do jornal O Globo. Todos os recursos que a Globo recebeu de fora, sendo acusada por receber recursos externos indevidamente — tudo isso está inserido nessa acusação que o Brizola fazia de que havia um beneficiamento governamental em relação à Globo, para a Globo poder criar o seu monopólio, esmagando a concorrência e manipulando, ou pelo menos tentando manipular, a opinião pública segundo os seus interesses”

“Então, o Brizola foi um grande crítico do Grupo Globo desde os tempos de Vargas, e durante o seu governo — seu primeiro governo, principalmente — o embate foi muito duro. Tivemos ali dois importantes episódios. Por exemplo, a própria apuração — que houve aquele escândalo do Proconsult, quando houve aquela manipulação no processo de apuração das eleições. O TRE contratou uma empresa desconhecida para fazer essa apuração, e descobriram que havia ali um esquema de desvio de votos naquela totalização. Uma das pessoas que descobriram isso, inclusive, foi o César Maia, isso consta no livro do Paulo Henrique Amorim e o Brizola foi prejudicado, mesmo assim conseguiu ser eleito”.

Criação do Sambóbromo

“O outro episódio importante nesse primeiro governo do Brizola foi o Sambódromo. Porque a Globo se beneficiava com a transmissão do Carnaval, era um dos pontos altos do ano da Rede Globo em relação a receitas. Brizola resolveu construir o Sambódromo em tempo recorde. Acho que ele foi construído em 8, 9 meses. Teve uma campanha duríssima da Globo contra a construção do Sambódromo, tanto que a Globo não transmitiu o primeiro desfile. O primeiro desfile foi transmitido pela Rede Manchete, e a Manchete alcançou, no Rio de Janeiro, índices ali superiores a 70% de audiência”

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“Então são dois episódios muito importantes que exemplificam essa relação do Brizola com a Rede Globo. No segundo mandato, nós temos também dois episódios importantes, em relação à crise da segurança pública. Essa hiperexploração dessa imagem do Rio de Janeiro como um lugar que sofria uma escalada extrema de violência — principalmente na Baixada Fluminense — a transmissão ao vivo dos arrastões, praticamente”

Direito de resposta em 1994 da Globo para Brizola

“E na eleição de 94 — no ano de 94, na verdade — houve ali o famoso direito de resposta do Brizola, transmitido no Jornal Nacional, que foi um momento único da história da televisão brasileira. Então Brizola sempre desafiou esse poderio da Rede Globo. Sempre denunciou que, de fato, a Rede Globo era uma ferramenta que estava a serviço dos interesses das elites econômicas do Brasil, das antigas elites conservadoras, das pessoas que se beneficiaram com a ditadura militar, enfim”

“Todavia, o Brizola denunciava isso, essas tentativas de manipulação da opinião pública a favor de certa candidatura. Isso ficou muito claro, por exemplo, naquele resumo do debate do segundo turno da eleição de 89, quando, depois, a própria Globo — muitos anos depois — também admitiu que a edição daquele debate não foi um ato correto, que aquilo realmente teve impacto na opinião pública em relação ao segundo turno”

Guilherme é autor de um livro sobre Brizola, chamado Da Guanabara para o Brasil. Ele finaliza ao MyNews falando disso:

Brizola 62: da Guanabara para o Brasil

R: “Brizola 62: da Guanabara para o Brasil, eu falo sobre a primeira eleição do Brizola no Rio de Janeiro — no caso, da Guanabara — que foi naquele ano. Brizola era governador do Rio Grande do Sul ainda. A legislação permitia isso. Então Brizola concorreu sendo governador do Rio Grande do Sul, foi candidato a deputado federal pela Guanabara, que era governada pela UDN. Lacerda era o governador da Guanabara. Então foi uma eleição extremamente agitada, em alguns pontos até mesmo violenta, aqui no Rio de Janeiro. Brizola ganhou, teve quase 270 mil votos. Isso, no eleitorado, significou 27% dos votos. 27% dos votos nominais, porque antigamente contava voto em branco também. Então não dá para dizer serem votos válidos, mas eram 27% dos votos nominais naquela época”

“Brizola, com esse movimento, se consolidou como liderança política nacional. Mesmo tendo sido governador do Rio Grande do Sul, tendo liderado a legalidade — a rede da legalidade pela posse do Jango — ele já tinha se tornado uma figura conhecida. Mas só vindo para o Rio de Janeiro, recentemente ex-deputado federal, é que ele de fato conseguiu a notoriedade política, conseguiu se consolidar como liderança política — não uma liderança partidária — e ali se credenciando para a candidatura presidencial em 65 e liderando alguns movimentos importantes, como as reformas de base”

“Em primeiro lugar, o plebiscito pelo retorno do presidencialismo, em 63. E, posteriormente, as reformas de base, em 63 e 64. Essa eleição foi muito importante porque a gente teve a influência de agentes externos. Teve muito dinheiro do complexo IPES e IBAD aqui no Rio de Janeiro, arrendando jornais, comprando espaço em rádio, televisão — muito dinheiro vindo de fora. Isso depois foi denunciado no livro muito importante do Dreyfus, que é 1964: A Conquista do Estado. Então essa eleição foi muito marcante, ficou no imaginário carioca durante muitos anos. O Brizola, quando retoma sua carreira pelo Rio de Janeiro, faz justamente a partir dessa interrupção e buscando sua presença no imaginário coletivo, no imaginário eleitoral aqui do Rio de Janeiro, concluiu Guiherme ao MyNews

Sobre Guilherme

Guilherme é historiador e tem um livro sobre Brizola – Foto: arquivo pessoal

Guilherme Galvão Lopes é Professor, pesquisador, doutor em História, Política e Bens Culturais pela Fundação Getulio Vargas (FGV), Mestre em História Política (UERJ) e especialista em História do Brasil.

Seu livro: https://clubedeautores.com.br/livro/brizola-62-da-guanabara-para-o-brasil

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