Tema é fundamental dentro das empresas e requer atenção e planejamento estratégico das companhias para um cenário de igualdade no ambiente corporativo
por Ana Mocny, Juliana Gonçalves Arruda, Layane Layane Almeida de Matos, Priscilla Avila Anjos de Moraes, Vinícius Archanjo Ferraz em 20/02/24 15:27
A equidade de gênero no mercado de trabalho se coloca como um tema incontornável, demandando atenção e estratégias planejadas das organizações para que um cenário de igualdade seja construído. Longe de ser uma tendência, o tema é essencial por uma série de razões que reverberam tanto na esfera social, quanto nas dinâmicas organizacionais, e ganhou força com a sanção da Lei da Igualdade Salarial, em 2023. Por isso, as instituições estão cada vez mais empenhadas em ações que demonstrem impactos no desempenho corporativo.
De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a diferença de remuneração entre homens e mulheres chega a 22%. Ou seja, em média, uma trabalhadora brasileira recebe 78% do salário de um homem. A situação pode ficar ainda mais discrepante sob a lupa racial. Segundo uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), as mulheres negras ganham apenas 46% do salário de um homem branco no Brasil.
Os desafios, no entanto, ainda são muitos. Na recente pesquisa Women @ Work 2023 da Deloitte – organização com o portfólio de serviços profissionais mais diversificado do mundo-, 47% das entrevistadas brasileiras declararam ter vivenciado ao menos um comportamento não-inclusivo no último ano. Desse total, 63% das entrevistadas relataram para seus superiores as situações de assédio sofridas e 51% mencionaram ter vivenciado algum tipo de microagressão. A disparidade também alcança as vagas em cargos executivos. Dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) apontam que as mulheres ocupam apenas 38% dos cargos gerenciais de nível sênior e médio no país. Felizmente, a sociedade começa a reconhecer a existência desse desequilíbrio e já dá passos em direção a um ambiente igualitário.
As iniciativas para a redução das desigualdades estruturais de gênero no mercado de trabalho vêm aparecendo com estratégias de maior robustez e ganham maior notoriedade na legislação brasileira. Recentemente, duas leis federais foram implementadas no país, pensando nos desafios femininos no ambiente de trabalho. A lei 14.611/2023, que recebeu a alcunha de Lei da Igualdade Salarial, reforça a garantia de igualdade de salários entre homens e mulheres e o compromisso com um mercado de trabalho livre de discriminações de gênero e outros grupos minorizados. As medidas se aplicam às organizações com 100 ou mais empregados e que tenham sede, filial ou representação no Brasil.
De maneira geral, o texto determina a apresentação semestral de um relatório de transparência, com dados anonimizados, que possam servir de comparação sobre as posições e remunerações de mulheres e homens e seus critérios remuneratórios – tomando como base os cargos ou ocupações contidas na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) e considerando informações de valores ligadas à situação contratual (salário, décimo terceiro, comissões, gratificações, entre outros). Os relatórios deverão ser enviados por meio da ferramenta digital que será disponibilizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego nos meses de março e setembro e, além disso, as empresas deverão disponibilizar seus relatórios em sites e/ou redes sociais oficiais como forma de divulgação para as pessoas colaboradoras, stakeholders e público, em geral.
Entre as medidas determinadas pela lei, estão a implementação de um canal de denúncias estruturado para receber possíveis casos de discriminação salarial; o desenvolvimento de um programa de diversidade e inclusão substancial a ponto de capacitar toda a força de trabalho – especialmente a liderança – em temas que envolvam a desigualdade de gênero e os desafios encontrados por mulheres no mercado de trabalho; a criação de estratégias nítidas de contratação, retenção e desenvolvimento de mulheres ao longo de sua jornada como colaboradoras.
Quando analisadas práticas voltadas para o canal de denúncia, o cenário é positivo e apresenta constante evolução. De acordo com dados do Selo Pró-Ética, na edição de 2020-2021, 97% das empresas candidatas a adquirir o selo possuem canal de denúncias disponíveis aos empregados, ao passo que na edição de 2022-2023 esse percentual aumentou para 100%.
Implementar o Canal de Denúncias e Sistema de Apuração de relatos é uma importante ferramenta para detectar casos de disparidade salarial, proporcionar um ambiente mais ético e acolhedor às pessoas colaboradoras. A ação também traz segurança para os acionistas, a partir da identificação de desvios de conduta que podem trazer prejuízos financeiros e riscos de reputação e de imagem. A busca pela equiparação salarial entre homens e mulheres também possui sinergia com os objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU de “Redução da Desigualdade” e “Igualdade de Gênero”, que já estabelece metas e incentiva que as empresas signatárias do Pacto Global adotem práticas para alcançar estes objetivos.
Um ponto interessante – e que pode ser uma novidade para algumas organizações – é que, com a Lei de Igualdade Salarial, a necessidade de desenvolver um programa de diversidade e inclusão consistente deixa de ser uma sugestão de boa prática e passa a ser uma exigência. Parte das empresas, em especial as de maior porte, por vezes, já produzem e divulgam seus relatórios de sustentabilidade, que incluem dados demográficos de diversidade. Entretanto, com a nova lei, a divulgação passa a ser obrigatória e com uma maior frequência, o que pode mudar tanto o cenário das empresas que já realizam esses reports e, principalmente, daquelas que ainda não constroem essas informações de maneira estratégica.
A legislação é assertiva e nos leva à compreensão de que é preciso também construir um ambiente inclusivo para que mulheres e outros grupos minorizados possam trabalhar, se desenvolver e avançar em suas carreiras de maneira segura física e psicologicamente, como mostrou a pesquisa Tendências Globais do Capital Humano de 2023, da Deloitte. A partir disso, traçar e acompanhar metas é fundamental para o cenário de diversidade.
A lei ainda indica a realização de treinamentos para toda a força de trabalho, o que também é parte estruturante de um programa de diversidade e inclusão, considerando a conscientização e as práticas de comportamentos inclusivos.
É interessante observar que os esforços necessários para atender a essa legislação serão multidisciplinares e deverão envolver diferentes áreas da companhia. O papel das equipes de recursos humanos será crucial para o cumprimento dessa legislação, principalmente na criação ou revisão do plano de cargos e salários das organizações e na forma como se negocia durante o processo de recrutamento e seleção. Áreas, como jurídico e compliance, também precisarão estar atentas às demandas trazidas pela lei de Igualdade Salarial, principalmente, no que tange à preparação dos canais de denúncia.
As novas regras vêm de encontro com uma questão social persistente de desigualdade de gênero. Resta saber o que as organizações estão fazendo para, de fato, reverterem esse cenário de desequilíbrio. E, assim como a pesquisa de Tendências Globais do Capital Humano de 2023 da Deloitte ressalta, o momento é oportuno para realizar a real inclusão das mulheres e demais grupos minorizados, construindo oportunidades também reais de permanência e crescimento destes públicos. Fomentar uma cultura inclusiva é entender que, para além de cumprir o compliance regulatório e questões morais, as organizações podem esperar resultados imediatamente positivos, como aponta o estudo.
A Revolução da Diversidade e Inclusão, da Deloitte: probabilidade duas vezes maior de atingir metas financeiras, de ter equipes com performances três vezes melhores, de produzir com seis vezes mais inovação e agilidade e principalmente oito vezes mais probabilidade de alcançar melhores resultados nos negócios. Olhar para diversidade e inclusão é agir no presente planejando o futuro.
*Ana Mocny, sócia de Consultoria em Capital Humano da Deloitte; Priscilla Avila Anjos de Moraes, diretora de Risk Advisory da Deloitte; Juliana Gonçalves Arruda, gerente de Consultoria em Capital Humano; Layane Almeida Matos, gerente de Risk Advisory da Deloitte e Vinícius Archanjo Ferraz, consultor sênior de Consultoria em Capital Humano
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