Regime Militar: A visão de quem se dedica a contar a história da Ditadura Brasileira Nadeja calado e Carolina Brito / Fotos: Arquivos pessoais

Regime Militar: A visão de quem se dedica a contar a história da Ditadura Brasileira

Golpe de Estado em 1964 completa 61 anos e MyNews entrevista quem se dedicou a falar sobre o período sombrio do país.

Há 61 anos, o Brasil sofria um golpe militar que culminou em uma terrível ditadura, que durou até 1985. No entanto, é de conhecimento público que o golpe começou com a queda de João Goulart, em 31 de março de 1964, quando os militares colocaram na prática sua insatisfação com o presidente da época. Por sua vez, o MyNews fará diferente e, em vez de contar a história geral, vai valorizar quem produz conteúdo sobre o Regime Militar. Dessa forma, tivemos a oportunidade de conversar com Nadedja Calado, a voz do podcast Ditadura Recontada, da CBN, um dos melhores conteúdos sobre o tema no Brasil.

Responsabilidade em falar sobre o Regime Militar

R: Foi uma grande honra a responsabilidade de narrar acontecimentos históricos fundamentais para a compreensão do Brasil, com reflexos até hoje. Felizmente, temos uma grande equipe na realização de podcast, que orienta e moldou esse trabalho para que tivesse uma linguagem acessível, próxima e natural, sem perder a seriedade necessária para abordar esse assunto de extrema importância. O papel do podcast, e o meu, consequentemente, foi guiar o ouvinte por uma apuração extremamente densa e completa daquele período  um trabalho de décadas do jornalista Elio Gaspari, que se tornou a principal coleção de livros sobre o assunto.

Regime Militar: A visão de quem se dedica a contar a história da Ditadura: Parte 2

Muita gente conheceu, pela primeira vez, pontos cruciais desse trabalho por meio do podcast. E mesmo quem já leu os livros conseguiu extrair a história de outra forma, valorizando totalmente os arquivos de áudio, algo impossível em outros formatos. Além disso, utilizamos um recurso adicional nos casos em que a qualidade desses áudios se perdeu: o uso da inteligência artificial, proposta pela produtora Bárbara Falcão.

Nadedja revela detalhes sobre sua família

Contudo, no primeiro episódio da Ditadura Recontada, Nadedja relata como seu pai, Stenka do Amaral Calado, contava histórias sobre a Ditadura. No MyNews, ela também aprofundou relatos sobre seu avô, Jaime Calado. Confira como ficou.

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 “Esse era um dos temas mais recorrentes nas conversas da minha infância. Primeiro, porque meu avô, Jaime Calado, chegou ao Brasil fugindo da ditadura salazarista em Portugal. Ele foi jornalista partidário, sendo assassinado por integralistas em Fortaleza, durante um protesto, quando meu pai tinha somente oito anos, na década de 1940. A história da minha família é contada a partir dessas interações com regimes totalitários.

Meu pai, a jornalista Stenka do Amaral Calado, contou muito sobre o dia em que esteve interinamente como chefe no Correio da Manhã, no Rio, quando foi decretado o Ato Institucional nº 5. Ele chegou em casa, vindo da praia, ligou a televisão e viu os canais transmitindo o ministro da Justiça, Gama e Silva, usando óculos e com ar entediado, lendo aquele documento que dizia que tudo estava proibido. Então, ele voltou para a praia, avisou os colegas que poderiam e não foi trabalhar. Quem foi, passou várias noites preso no DOPS.

Depois de alguns dias, ele voltou para não ser demitido por abandono de emprego e encontrou a censura já instalada no jornal, na sala de alguns jornalistas simpáticos ao regime, que eles chamavam do Instituto Butantã, “porque só tinha cobra”. Ele foi colocado para editar a seção de culinária e colocou um título de duplo sentido em um artigo: O valor e a importância das massas . Perguntaram se ele queria ser demitido, ele confirmou e saiu do jornal. E isso foi só o começo, porque sua vida durante o regime foi muito difícil.

Quando eu disse no podcast que ele contava histórias “mais ou menos” adaptadas para uma criança entender, era ironia. Ele não adaptou nada. Essa época, com seus mistérios, violência, mas também resistência e boas histórias, está no meu imaginário desde sempre”

Reconhecimento do Ditadura Recontada

Por sua vez, como acontece com todo conteúdo brilhante, o reconhecimento chegou, e não foi diferente para o pessoal da Ditadura Recontada. Nadedja finaliza falando sobre isso.

“Para mim, não existe legado maior do que os comentários dos ouvintes. O choque com alguns detalhes, com os áudios inéditos, com a história completa… Porque isso precisa ser conhecido. É nosso direito e dever como cidadãos. Nesse sentido, a conquista de Ainda Estou Aqui se tornou emblemática. Além do orgulho por uma obra-prima cinematográfica realizada graças ao talento de brasileiros, é o mundo conhecendo nossa história. O filme, ao projetar tão longe a história da família Paiva, homenageia a memória das pessoas que mencionamos no podcast, como Vladimir Herzog e Edson Luís, e até do meu pai.

Por muito tempo, vi pessoas da minha idade ou mais jovens falando da ditadura a partir da perspectiva de avós simpáticos ao regime — alguns militares, saudosistas. Para mim, ouvir isso, sabendo o que foi para minha família, soava como uma violência. Com o filme, pela primeira vez, vi um grande movimento de pessoas da minha geração contando, nas redes sociais, as histórias de seus familiares que resistiram. Alguns foram torturados, presos, até mortos.

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Negar essa realidade é exatamente o que os conceitos antidemocráticos precisam para ganhar força. A história recente nos mostra que não estamos a salvo. Daí a importância do lema: “Para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça.” encerrou a jornalista.

Exposição do MyNews sobre o Regime em São Paulo

Em 2024, o MyNews fez uma exposição chamada Tempos de Chumbo , em São Paulo, com a participação de Carolina Brito, fotógrafa de debates trabalhos e filha de Orlando Brito, que atuou na mesma função durante a Ditadura Militar, registrando momentos importantes da história, como o fechamento do Congresso em 1977 e as Diretas Já.

“A exposição Tempos de Chumbo reúne imagens marcantes e impactantes do tenebroso período em que o Brasil mergulhou durante os anos de Ditadura. O relato fotográfico contido no acervo do meu pai tem um valor histórico e cultural fundamental para nosso país. O MyNews, canal altamente comprometido com a notícia de qualidade, verdadeira e essencial para a boa informação, abraçando o projeto por acreditar na importância do tema — sobretudo nos últimos tempos, em que a democracia foi vilipendiada”, disse Carolina Brito.

“Conversávamos sobre tudo. Meu pai era uma enciclopédia ambulante. Sabia de tudo, conhecia tudo. Tinha sentimento, uma capacidade enorme de prever o futuro, dada sua dedicação tão grande à observação cuidadosa e profunda dos fatos. Então, não falávamos somente sobre os tempos difíceis da ditadura. Mas, sim, ele sempre relembrava o dia em que fotografou o Congresso fechado, os comícios das Diretas Já e como a imprensa estava voltando a ser rechaçada ultimamente. Isso o aborrecia muito. Voltar a viver como no passado, sem poder fotografar ou publicar notícias”, concluiu ao MyNews.

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