Carlos Alberto dos Santos Cruz

Geopolítica

É fundamental que o princípio da PROTEÇÃO DE CIVIS seja seguido nos conflitos

Se não respeitarmos este princípio, validamos os casos de assassinato de inocentes, como os campos de concentração, câmaras de gás, paredões de fuzilamento, tribunais revolucionários, bombardeios de civis com produtos químicos, assassinatos chamados de “justiçamentos”, matança de civis em aldeias, genocídios, sequestros e estupros usados como armas de guerra e outras tantas barbaridades

por Carlos Alberto dos Santos Cruz em 28/09/24 18:39

Sem longas explicações. É fundamental que o princípio da PROTEÇÃO DE CIVIS seja seguido nos conflitos. Ou isso é feito, ou aceitamos as barbáries que aconteceram ao longo da história, as que assistimos ao longo de nossas vidas, as que ocorrem atualmente e as que ocorrerão no futuro.

Se não respeitarmos o princípio da proteção de civis, validamos os casos de assassinato de inocentes, como os campos de concentração, câmaras de gás, paredões de fuzilamento, tribunais revolucionários, bombardeios de civis com produtos químicos, assassinatos chamados de “justiçamentos”, matança de civis em aldeias, genocídios, sequestros e estupros usados como armas de guerra e outras tantas barbaridades. Isso, considerando só o que aflora com mais visibilidade na mídia. Existe a barbárie que acontece sem cobertura de mídia, aonde a matança de inocentes não se conta por dezenas, centenas ou milhares, mas, sim, em milhões. No coração da África, por exemplo, a escala de massacre de civis é marcada em milhões nos últimos 30 anos. Milhões de pessoas inocentes – homens, mulheres e crianças – são mortos em diversos conflitos, com armas de fogo e com o uso de machados e facões, decapitados, esquartejados e com uma infinidade de outras crueldades. Na origem, parte da herança da violência de cerca de 350 anos de escravidão e 80 anos de colonialismo. Existem alguns exemplos mais atuais, como as barbaridades cometidas pelo Estado Islâmico, Boko Haram, ADF, e um imenso número de outros grupos terroristas menores. E ainda tem os fatos mostrados ao vivo e a cores nos noticiários do momento na Europa e no Oriente Médio.

Qual a diferença da barbárie de matança de civis com facões e machados, por ordem de líderes criminosos, para aquela que é feita com equipamentos mais sofisticados, com tecnologia, com equipamentos militares básicos ou de última geração, também ordenada por líderes políticos com toda a estrutura de planejamento e de assessoria política e militar?

As Forças Armadas e alguns grupos armados existem para fazer a guerra, se preciso for, para defender seus países, sociedades e interesses. Os combatentes precisam ser excelentes guerreiros. Eles são pagos para isso e a sociedade espera deles a proteção e a vitória. Os combatentes, aí incluídos os militares de FA institucionais e os civis em estruturas militarizadas, são profissionais da guerra e não instrumento para decisões e ações absurdas, fora de escopo legal e moral. Qualquer autoridade com poder de fazer e conduzir a guerra tem que ter equilíbrio, fazer jus às suas prerrogativas, e também ser responsabilizada por suas ações. Um líder com poder do uso da força não pode tomar decisões comparáveis àquelas tomadas por assassinos, terroristas, criminosos de grupos rebeldes armados que não têm qualquer consideração pelo próximo.

Um governante, um chefe, tem que ter coragem para dar uma ordem e também coragem para determinar seu cancelamento se houver risco para os civis (todos!) na área de operações. O conflito empurra para o uso da violência sem limites, mas os comandantes, os chefes, os governantes têm a obrigação e a responsabilidade de manter as ações e as pessoas dentro dos limites legais.

Autoridades constituídas, estados, comandantes, chefes e líderes têm compromissos assumidos em tratados internacionais e leis dentro de seus próprios países. Essas entidades e pessoas não têm a liberdade criminosa que possuem alguns grupos rebeldes e terroristas que banalizam a violência.

A impunidade e a falta de responsabilização levam à perda de referências e às barbaridades que aconteceram e acontecem contra as populações civis.

O combatente tem que ser forte, corajoso, determinado, ter iniciativa, agilidade e habilidade em combate, inclusive para sobreviver ao conflito. Todos os combatentes são formados para ter esse comportamento. Mas também precisam saber quando apertar e quando não apertar o gatilho. Combater com determinação e motivação, não é combater com ódio. Ódio, poder pessoal e dinheiro não podem ser motivação de combate. Os militares e os governantes não podem perder a noção do que é certo ou errado, do que é dignidade humana, do que são pessoas inocentes, de quem é inimigo e quem não é.

O profissionalismo e o equilíbrio movem os bons combatentes e as autoridades decentes. O ódio, a vingança e a falta de escrúpulos movem os criminosos.
A coragem é para combater e não para trucidar inocentes sem proteção.

São indiscutíveis os direitos de defesa e de antecipação às agressões. Mas existem maneiras de exercer esses direitos respeitando a proteção de civis. Sempre haverá homens, mulheres e crianças nas áreas de conflito; sempre alguns combatentes inimigos estarão misturados na população, seja em ambiente de conflito urbano ou rural. Alguns danos colaterais poderão existir, mas também existem muitas maneiras de preservar os inocentes e mitigar os riscos de efeitos paralelos.

Os ambientes de combate são os mais variados: áreas densamente povoadas, áreas rurais, vegetação (selva, floresta), ambiente marítimo e ribeirinho, deserto, espaço aéreo, regiões montanhosas etc. Os componentes fundamentais para proteger os civis são a consciência dos governantes e dos chefes e a capacidade combativa de todos os militares. Uma especial atenção ao componente terrestre – Esse é que vai colocar os pés no terreno, entrar na selva, nos túneis, combater na área urbana, no combate casa-a-casa, separar quem é combatente e quem não é; vai trabalhar num conjunto harmônico com a inteligência e a contrainteligências. É o componente terrestre que vai olhar nos olhos do inimigo … e também nos olhos dos inocentes. O combatente bem treinado e capacitado vai fazer a guerra sem crimes, vão fazer a guerra passo a passo, lance por lance, sem a destruição das cidades junto com seus habitantes; sem dizimar as populações das vilas, não irão queimar as aldeias nem cometer absurdos contra os civis.

Tropas bem treinadas e especializadas fazem o vencedor respeitado. A matança indiscriminada, com qualquer desculpa que seja, cria ódio com consequências futuras muito piores do que os problemas atuais.

Os governantes e chefes precisam liderar em combate considerando o respeito à população, aos não-combatentes homens, mulheres e crianças.

O combate, a guerra, não podem ser atividades criminosas. A proteção de civis precisa ser uma das condicionantes nas decisões políticas, no planejamento militar e na execução das operações.

Atacar homens, mulheres e crianças inocentes não é combate; é massacre, é crime, é covardia.

Carlos Alberto dos Santos Cruz

Ex-Cmt tropas da ONU no Haiti e na República Democrática do Congo

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