Autor da reforma psiquiátrica: “A medicina está adoecendo as pessoas”
Ex-deputado, Paulo Delgado diz que Brasil e o mundo vivem uma crise de saúde mental
“Tentei inscrever o doente mental no rol da política de direitos humanos.” A frase do ex-deputado federal Paulo Delgado resume o espírito da lei que mudou para sempre o tratamento da saúde mental no Brasil. Conhecido como o “deputado dos loucos”, foi ele o responsável por tirar do papel após doze anos de tramitação a chamada reforma psiquiátrica brasileira. Uma lei que, mais de duas décadas após aprovada, ele ainda considera “em movimento”.O projeto de Delgado nasceu do inconformismo com como as pessoas com doença mental eram tratados no país. Hospitais psiquiátricos funcionavam como depósitos de sofrimento, e o tratamento médico reduzia a dor emocional à contenção química e isolamento. “A história da loucura é a história da manipulação de sentimentos no pior momento da vida das pessoas”, afirma. “Você não pode julgar ninguém no momento em que ele está sofrendo.”Com base nessa convicção, Delgado propôs um modelo centrado em liberdade, cuidado em meio aberto e vínculos familiares e comunitários. A nova lógica substituiu o manicômio pela rede de atenção psicossocial. Ainda assim, ele reconhece: os desafios continuam. “Essa é uma lei em movimento. Precisamos enfrentar novas etapas.”Hoje, diante da explosão dos casos de depressão, ansiedade e suicídio, Delgado vê um cenário ainda mais complexo. “O Brasil e o mundo passam por uma epidemia de saúde mental”, diz. E critica o excesso de diagnósticos médicos: “A medicina está adoecendo as pessoas”.Para ele, o sofrimento foi patologizado em excesso, sem o devido acolhimento social e emocional. Delgado também faz um alerta mais amplo: “As cidades não são mais livres. É uma regressão que o Brasil está vivendo, o perigo de andar nas ruas”. O medo e a insegurança, afirma, agravam a angústia coletiva. Em tom quase poético, ele aconselha: “Se você está chateado, ande. Não deite.” Mais do que um legado jurídico, a trajetória de Paulo Delgado é um convite à escuta. Um chamado para que o Brasil compreenda o sofrimento mental não como um desvio a ser isolado, mas como parte da condição humana que precisa ser protegida por políticas públicas, respeito e dignidade.
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