Patrimônio em risco: entenda por que servidores da Biblioteca Nacional, no Rio, estão em greve Presidente Lula recebeu servidores e prometeu melhorias no ambiente de trabalho - foto: divulgação

Patrimônio em risco: entenda por que servidores da Biblioteca Nacional, no Rio, estão em greve

Um dos locais mais importantes do país está paralisado desde o final de abril e funcionários cobram melhorias do Governo, além de entregarem exigencias para Lula

Um dos espaços mais importantes do Rio de Janeiro na preservação da história do estado e do Brasil está em greve. A Biblioteca Nacional suspendeu suas atividades presenciais no dia 29 de abril, com outras instituições vinculadas ao Ministério da Cultura (MinC). E o MyNews foi entender os motivos.

Na Biblioteca Nacional, tem a Hemeroteca, que ganhou destaque com o projeto Hemeroteca Digital Brasileira, parte da Biblioteca Nacional Digital, de grande sucesso. A iniciativa digitalizou, a partir de microfilmes, milhões de páginas de jornais e revistas. O site da Biblioteca Nacional Digital tem sido apontado como o mais acessado entre os mantidos pelo Estado brasileiro, com média de 7 milhões de visitas anuais. Esse é um dos projetos de importância do local.

O motivo da greve na Biblioteca

Segundo Iuri, servidor da instituição desde 2006, além de Técnico em Pesquisa. Ele entrou no concurso do MinC e vinculadas, com lotação na Fundação Biblioteca Nacional. O profissional reforça que mesmo com o lugar em formato físico de greve, as atividades e suporte para quem precisa do ambiente digital em termos de estudos e trabalhos, seguem ativas.

R: “Estamos em greve, basicamente, por tentarmos estruturar nossa carreira. Hoje, não temos uma carreira definida. Existe um plano especial de cargos, mas ele virou um ‘saco de gatos’, com funções que não representam mais o que fazemos. Queremos a racionalização dos cargos, com atribuições que reflitam nossas atividades.

Nossa principal demanda é uma tabela salarial compatível com a importância das tarefas que desempenhamos. Somos um grupo de servidores altamente qualificados. Um exemplo é o IPHAN, que apresenta o que chamam de ‘super qualificação’. O termo é estranho, já que não recebemos um centavo a mais por isso.

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O IPHAN, por exemplo, rivaliza com o Itamaraty no nível de qualificação dos quadros — mas não somos valorizados. Com isso, muitos servidores deixam seus cargos em busca de valorização em outras áreas. O resultado é sobrecarga. O trabalho continua, e muitas vezes aumenta.

Cartaz em frente a Hemeroteca — foto: Leonardo Cardoso/MyNews

Cultura em outros ambientes

Essa demanda também passa por uma tabela salarial compatível com a importância das tarefas que desempenhamos. Somos um grupo de servidores altamente qualificados. Um exemplo é o Iphan, outras instituições vinculadas do MinC, que vive uma situação de ‘super qualificação’. Temos um contingente enorme de servidores qualificados e não recebemos um centavo a mais por isso.

Com isso, muitos servidores deixam seus cargos em busca de valorização em outras instituições. O resultado é sobrecarga. O trabalho continua, e muitas vezes aumenta. Em estados como o Rio de Janeiro ou a Bahia, há situações em que poucos engenheiros e arquitetos são responsáveis por fiscalizar centenas, mais de mil bens tombados. Na Bahia, por exemplo, o teto de uma das igrejas mais icônicas desabou e matou uma turista. Esse é o nível de complexidade que temos que lidar.”

Iuri reforça

“Essa é uma greve pela sobrevivência dos nossos órgãos. Lutamos pela preservação da cultura, da memória e do patrimônio nacional. Também defendemos a ampliação das políticas públicas de cultura, com profissionais experientes à frente delas. Pessoas que aprendem com os erros, aprimoram editais, fortalecem a estrutura das políticas culturais.

Nossos órgãos atuam em duas grandes frentes: patrimônio e memória. Isso envolve educação, pesquisa, turismo e fomento à cultura. São iniciativas que precisam alcançar todos os estados e municípios — seja por meio de bibliotecas públicas, pontos de cultura, artesanato ou o programa Cultura Viva.

Sem servidores públicos estáveis e qualificados, essas políticas não se sustentam. É impossível implementar com qualidade as ações de fomento à memória bibliográfica, museológica, histórica e artística.”

Ida ao Palácio Capanema e carta a Lula por Biblioteca Nacional

Os grevistas entregaram uma carta ao presidente Lula, durante um ato no Palácio Capanema, na quarta-feira (21) de maio. O técnico em pesquisa comenta:

R: “O Lula recebeu nossa carta, ouviu nosso relato e disse: ‘Agora ninguém pode dizer que eu não sei da situação de vocês’. Isso nos deixou esperançosos. Apesar das desconfianças geradas por acordos não cumpridos no passado, dessa vez temos uma esperança maior de que algo realmente avance.

No fim das contas, estamos falando da Biblioteca Nacional, mais antiga do que o próprio Brasil. Também lutamos pelo fortalecimento de instituições fundamentais, como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e a Fundação Cultural Palmares, que atua na certificação de comunidades quilombolas e na valorização do legado negro. Tudo isso é essencial para entendermos nossa identidade como brasileiros.”

Os principais jornais impressos do Rio de Janeiro e Brasil podem ser pesquisados na Hemeroteca presencialmente — foto: Leonardo Cardoso/MyNews

Greve por tempo indeterminado

R: “A princípio, a greve é por tempo indeterminado. Algumas partes da negociação já avançaram, e estamos otimistas que essa semana será decisiva. Talvez, na próxima semana, consigamos encerrar a paralisação. Na próxima quinta-feira, completamos um mês de greve. Talvez estejamos finalmente vendo uma luz no fim do túnel.

Mas a rotina tem sido exaustiva. Um mês parece três. Perdemos nossa rotina de trabalho. No caso da Biblioteca Nacional, os servidores não podem entrar no prédio. Ficamos sentados em cadeiras de plástico, no sol ou na chuva, na escadaria da frente, na Avenida Rio Branco. É desconfortável para nós, para a direção, para os visitantes e para os pesquisadores. Infelizmente, é assim que funciona uma greve: se não incomodasse ninguém, não teria sentido”, concluiu.

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