"Esta eleição é o maior teste de resiliência para as nossas instituições"
por Rodrigo Augusto Prando em 29/10/22 16:48
Foto: Marcelo Casal Jr/Agência Brasil
O Brasil está, como diria o mestre Florestan Fernandes, em compasso de espera. A eleição de 2022 não é, apenas, a escolha de presidente, governadores, senadores, deputados federais e deputados estaduais. Não. Esta eleição é o maior teste de resiliência para as nossas instituições e, no limite, para a democracia brasileira.
Uma eleição que, em seu segundo turno, coloca Lula e Bolsonaro, dois líderes com carisma e que, aos seus nomes, foram acrescentados os sufixos “ismos”: lulismo e bolsonarismo. O “ismo”, em nossa cultura política, diz muito do cenário em tela. Pesquisas indicam que Bolsonaro é rejeitado por 50% e Lula por 45% dos respondentes. A musculatura política e eleitoral de ambos não permitiu que uma terceira via fosse possível, contudo, o vitorioso no próximo domingo não será o escolhido por conta de suas virtudes, de seus méritos, de suas propostas ou projeto de governo; o escolhido, no caso, será, para muitos, o “menos pior”, o menos rejeitado. A disputa está acirrada e será assim durante todo o domingo ao longo da apuração dos votos.
Lula quis resolver a eleição no primeiro turno e, para usar a metáfora esportiva da corrida eleitoral, desejava uma prova dos 100 metros rasos para chegar na frente e colocar um fim à disputa; Bolsonaro, por sua vez, desejou uma meia maratona, objetivando chegar mais forte no segundo turno, com uma economia turbinada pelo Auxílio Brasil e com a força política regada com o orçamento secreto para sua base de apoio por todo o país. Matematicamente, sabe-se que, na eleição presidencial, quem ganha o primeiro turno costuma ganhar no segundo. No que tange aos governos estudais, essa lógica também prepondera, contudo, já houve viradas tento o segundo colocado superando o primeiro no segundo turno.
As campanhas, nas últimas semanas, foram um festival de fake news, teorias da conspiração e pós-verdade. Se, em 2018, o bolsonarismo reinou sozinho nas redes sociais, agora, o PT, com Janones, usou da mesma estratégia e igualou a disputa, ou seja, ficamos num péssimo patamar de ausência de propostas e hipertrofia dos ataques e narrativas obscuras, fantasiosas e, não raro, de violência retórica. Muito se tratou do termo “polarização política”. O lulopetismo foi pródigo em dividir-nos entre “nós” x “eles” e, ainda, fez sucesso com sua narrativa de que os tucanos haviam deixado delegado uma “herança maldita”. Hoje, Alckmin é vice de Lula, Fernando Henrique Cardoso e os economistas do Plano Real e tucanos históricos estão apoiando Lula.
Bolsonaro governou o país, nestes anos, naquilo que chamei de “presidencialismo de confrontação”, dividindo a política entre “amigos” X “inimigos”, “nova” X “velha” política e, atualmente, entre o “bem” e o “mal”, numa alusão à uma guerra santa. Bolsonaro não criou a polarização, mas seu perfil lhe permitiu surfar a onda como poucos poderiam. Há, no entanto, uma diferença a ser considerada. O PT promovia uma polarização eleitoral e, depois, convivia dentro dos limites da normalidade com os seus adversários; o bolsonarismo, em sua essência, levou a polarização para além das eleições e conseguiu eletrizar o país, pautar a mídia tradicional e manter sua base coesa e aguerrida na defesa dos valores do “mito” e contra a esquerda no geral e Lula e o PT em particular.
Domingo terá, no seu bojo, a escolha do futuro presidente, seja a volta de Lula ou a continuidade de Bolsonaro. Há, essencialmente, que se pensar no dia seguinte e como seguiremos, já que nossa sociedade está fraturada. As relações sociais – na família, no trabalho e noutros espaços – foram cindidas, deterioradas e canceladas por conta da política. Agressões e mortes foram noticiadas. Isso tudo é o contrário da política, da democracia e de uma visão de futuro generosa. Urge retomar a civilidade e o respeito. Não será fácil, mas é possível e isso dependerá, em larga medida, da
sinalização do presidente eleito. Quererá um ambiente de tensionamento e esgarçamento do tecido democrático ou será um reconstrutor dos laços rompidos, individuais e coletivamente?
O futuro é projeto, é esperança de dias melhores. Somos responsáveis pelos resultados não das eleições, apenas, mas, essencialmente, somos eticamente responsáveis pelas ações que desencadeamos e pelas suas consequências, sejam positivas ou não. Que a soberania do povo, segundo nossa Constituição, seja respeitada e preservada.
*Professor e Pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Graduado em Ciências Sociais, Mestre e Doutor em Sociologia, pela Unesp.
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