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Política

ENTREVISTA

Bolsonaro fora do 2º turno em 2022 não é impossível, diz cientista político

Para Vítor Oliveira, diretor da consultoria Pulso Público, cenário dependeria, no entanto, da coordenação de forças políticas alternativas a Lula e Bolsonaro

por Ítalo Lo Re em 15/03/21 13:31

O discurso feito na última quarta-feira (10) pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, revirou as peças do jogo de xadrez que antecede as eleições presidenciais de 2022. 

Depois da decisão do ministro do STF Edson Fachin de anular as condenações do ex-presidente relacionadas à Operação Lava Jato, Lula voltou a ficar elegível na última segunda (8). Desse modo, mesmo que o nome do petista já fosse cotado para o pleito, esse cenário agora se faz ainda mais palpável — o que reverberou em ações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de outros presidenciáveis.

Bolsonaro fora do 2º turno em 2022 não é impossível, diz cientista político
Jair Bolsonaro em pronunciamento na última quarta-feira (10). Foto: Alan Santos/PR

Para o cientista político e diretor da consultoria Pulso Público, Vítor Oliveira, o retorno de Lula remexe as peças no tabuleiro, mas ainda mantém o futuro indefinido — não é descartado nem mesmo um cenário com Bolsonaro fora do 2º turno. Em entrevista ao MyNews, Oliveira falou sobre o discurso do ex-presidente petista e também sobre o chamado “efeito Lula”, que está movimentando o jogo político.

Pela sua análise, quais foram os pontos mais destacáveis no discurso de Lula em São Bernardo do Campo? O que eles revelam da postura do ex-presidente daqui em diante?

Certamente os pontos que mais chamaram a atenção no discurso dizem respeito às sinalizações para forças políticas fora da esquerda, com as menções à necessidade de dialogar com todas as forças políticas representadas no Congresso. Também foram destacados os posicionamentos de embate com a presidência de Bolsonaro, em especial a gestão da pandemia, o posicionamento sobre vacinas, bem como a crítica à política econômica, em especial à gestão dos preços que afetam mais às classes de baixa renda.

Ambas revelam a retomada da trajetória política de Lula em seus momentos mais relevantes como candidato e presidente, em oposição ao discurso radical da década de 1980 e durante os desdobramentos mais severos da Lava Jato. O Lula que chegou à presidência tinha seus esforços voltados a se comunicar de forma clara com a sociedade, mas também voltado a conciliar interesses e negociar não apenas com grupos políticos próximos ao PT, mas também conservadores.

Ao longo da semana, muito se falou sobre o “efeito Lula”, que seria justamente o impacto gerado pelo retorno do ex-presidente ao jogo político. Levando em conta a postura do presidente Jair Bolsonaro, utilizando máscara e defendendo a vacina em pronunciamento na quarta-feira (10), corroborada também pela tentativa de seus filhos emplacarem o slogan “Nossa arma é a vacina”, de que forma o chamado efeito Lula pode acarretar em reposicionamentos do atual presidente?

O posicionamento de Bolsonaro relativo ao uso de máscaras e das vacinas está longe de ser definitivo. Não obstante, reflete a pressão que o núcleo de seu governo tem sofrido de aliados no Congresso e no setor privado com relação a mudanças na gestão da pandemia, cujos resultados ruins podem gerar custos eleitorais e econômicos grandes a estes atores. Com Lula, cria-se de forma mais clara uma expectativa de poder alternativa a Bolsonaro, o que também aumenta o poder de barganha destes aliados sobre a presidência, ao passo em que aumenta a percepção de risco de derrota em 2022, gerando mudanças na forma com que os Bolsonaro atuam politicamente. Todavia, Bolsonaro costuma adotar estratégias mais arriscadas, quando está no campo das perdas. Não seria impossível vê-lo redobrar a aposta na narrativa negacionista e de que não possui responsabilidade sobre a pandemia.

A possível mudança na postura de Bolsonaro também pode gerar um distanciamento da base eleitoral do próprio Bolsonaro? Quais são os cenários possíveis daqui em diante?

Bolsonaro dificilmente perderá seu núcleo mais fiel, a despeito do que faça publicamente. Isto ficou claro com a saída de Moro, as investigações de corrupção sobre sua família e o estreitamento das ligações com partidos e grupos políticos conhecidos por sua preferência pelo controle de cargos e recursos públicos, os quais têm sido chamados de Centrão. Ações concretas na direção oposta ao discurso de campanha e que não se sustentariam, caso a lógica do apoio a Bolsonaro fosse racional ou de fato orientada para a agenda anticorrupção. Conquanto mantiver as sinalizações aos grupos ultraconservadores evangélicos, o discurso reacionário e anti-sistema, manterá este eleitorado cativo – até pela ausência de outros representantes nessa área. A dificuldade ocorrerá quando precisar de um eleitorado mais amplo, em um eventual segundo turno ou até mesmo no primeiro, a depender da percepção do eleitorado. Nesse caso, estará em disputa a rejeição à política econômica e a fatores mais concretos, como a gestão da pandemia, junto a outros segmentos do eleitorado que o apoiaram na última campanha por terem rejeição maior ao PT.

Por outro lado, mesmo com a atuação de Bolsonaro diante da pandemia, o antipetismo pode insuflar o bolsonarismo para uma retomada mais acalorada nas eleições de 2022? Esse movimento independe da postura de Lula ou, caso o ex-presidente adote um discurso reconciliador, esse efeito pode ser minimizado?

Desde 1989, o apoio ao PT é parte estruturante do debate político nacional, bem como sua rejeição. Obviamente, a perspectiva de que o partido volte ao poder deve mobilizar parcela relevante da sociedade para votar contra seu candidato, não obstante, uma grande parte desses já constitui o núcleo de apoio a Bolsonaro. Sem o desgaste do Governo Dilma estar fresco na memória das pessoas e com outros fatores recentes mostrando que a alternativa escolhida em 2018 não necessariamente foi a melhor, abre-se espaço para que grupos menos intensos em seu antipetismo sejam pivôs de uma mudança política – mesmo que em direção a uma alternativa a Bolsonaro no 1º turno, que seja capaz de derrotar o PT no segundo turno. Isso não seria um 3ª via, mas apenas uma retomada na moderação no polo antipetista da política brasileira, anteriormente representada pelo PSDB.

O cientista político Vítor Oliveira, diretor da consultoria Pulso Público. Foto: Pulso Público/Divulgação

Pensando que a elegibilidade de Lula reavivou discussões sobre a polarização Lula e Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2022, de que forma outros presidenciáveis (como Doria, Ciro, Huck, Mandetta) podem, por consequência, repensar suas estratégias a partir de agora? Mais do que isso: algum desses nomes teria força para chegar ao segundo turno em uma disputa que tenha Lula e Bolsonaro?

O PT competitivo em 2022 pode despertar o antipetismo moderado como alternativa já no 1º turno, caso fique claro que esta candidatura possuiria mais chances de vencer Lula. Se houver um mínimo de coordenação, não seria impossível ver o voto estratégico tirar Bolsonaro do 2º turno. Uma candidatura minimamente competitiva, diferentemente do que foi Alckmin em 2018, pode ter esse efeito, num cenário em que a rejeição a Bolsonaro esteja alta. A questão é qual o nível de coordenação será possível para estas forças políticas alternativas. Alguns fatores podem pesar a favor da coordenação, como a escassez de recursos num cenário em que os partidos precisam superar a cláusula de desempenho na eleição para a Câmara dos Deputados.

Segundo pesquisa Exame/Ideia divulgada na sexta (12), mesmo com a popularidade de Bolsonaro em queda, o presidente venceria não só Lula, como outros candidatos, no segundo turno das eleições. O que de mais relevante pode reconfigurar esse cenário? 

A pesquisa em questão tem alguns problemas de metodologia, com um viés claramente desfavorável a Lula em algumas questões. Não obstante, é esperado que Bolsonaro seja competitivo. Incumbentes têm vantagens, em sistemas eleitorais majoritários uninominais, como o que utilizamos nas eleições presidenciais. Há pouco menos de dois anos das eleições, também pesa o forte recall de quem está na TV todos os dias, algo que só será equilibrado durante a campanha. Portanto, projeções como essa tendem a ser pouco ilustrativas do confronto real, inclusive das preferências e rejeições que de fato influenciarão a tomada de decisão do eleitor. É só lembrar a trajetória do próprio Bolsonaro. O caminho até 2022 é longo, há muito o que se considerar além do que já está em jogo, em especial fatores econômicos como desemprego, inflação.

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