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Creomar de Souza

Qual o legado da CPI da Pandemia?

A CPI da Pandemia foi a novela de maior audiência da TV Brasileira em 2021. Porém, diferentemente de outros folhetins midiáticos, seu final abriu espaço para interpretações dúbias acerca de vencedores e perdedores do debate político em torno do fracasso coletivo que envolveu o enfretamento à Covid-19

por Creomar de Souza em 20/10/21 21:53

O Brasil é um país em plena erupção. A lógica de embate e rancor que marca o debate público, aliada à confluência de crises de todas as ordens, faz com que o ano de 2021 seja uma espécie de segunda temporada do ano de 2020. Diante deste cenário marcado pela dificuldade robusta da sociedade nacional em construir um processo de diálogo honesto consigo mesma acerca das aflições mais urgentes do tempo presente, não deixa de ser importante uma reflexão acerca dos impactos de curto, médio e longo prazos resultantes dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia sobre o horizonte político brasileiro.

É importante fazer uma reflexão sobre as expectativas construídas acerca do trabalho dos senadores desde o nascedouro da Comissão. O próprio movimento de ação do STF – via decisão do ministro Barroso – para que o presidente do Senado autorizasse o início dos trabalhos do colegiado – é revelador de algumas características do momento político atual. Em primeiro plano, destaca-se o fato de que tanto o governo quanto a oposição chegaram despreparados ao colegiado.

A articulação que resultou na criação do grupo oposicionista ao governo – chamado pela imprensa de “G7” – careceu de um caminho investigativo claro. Em paralelo, os apoiadores do Palácio do Planalto adotaram a estratégia simplista de tentar tumultuar as atividades, tendo em vista que seu número era insuficiente para a construção de uma estratégia legislativa mais eficaz.

Estes dois movimentos revelam um sintoma profundo do atual debate político nacional, que é a carência de nomes que efetivamente compreendam seus papéis institucionais e a importância do debate político como momento de construção de soluções para problemas coletivos.

De outro lado, parte considerável de senadores importantes no dia a dia dos trabalhos – tanto na oposição, quanto na situação – foram surpreendidos pela capilaridade e pelo sucesso midiático das sessões. E aqui há outro indicativo importante: pela primeira vez após a realização das primeiras eleições massivamente vencidas com uma estratégia formatada para redes sociais, um evento legislativo foi acompanhado por meses por uma grande quantidade de pessoas.

E ao se observar a construção de audiência sobre os trabalhos da CPI, tem-se o vislumbre de um problema fundamental da democracia brasileira em momento atual, que é o fato de que uma parte considerável das pessoas não conhece os atributos e as responsabilidades dos atores institucionais e das instituições que eles representam.

A identificação deste processo criou como consequência direta uma verdadeira montanha-russa de expectativas e frustrações acerca da CPI. A aderência e o eventual tédio de partes consideráveis da população com os trabalhos da Comissão estão diretamente vinculados às dificuldades dos parlamentares em entenderem o momento em que estavam inseridos.

E obviamente, ao serem homens – o colegiado perdeu a oportunidade histórica de fazer diferente neste aspecto – de seu próprio tempo, os parlamentares diminuíram o escopo e a profundidade dos debates em favor da escolha fácil pelo clique.

A CPI nasceu sob os auspícios de permitir o país passar a si mesmo a limpo no que diz respeito aos eventuais equívocos das autoridades nas ações de enfrentamento à pandemia do Covid-19. Mas, como resultado, surgiu um dilema político-narrativo.

Ao final do dia, como reflexo objetivo do monólogo que marca o atual debate público, se tem a percepção clara, por cada um dos lados em disputa, de que o produto do colegiado é pouco relevante para a compreensão de algo muito importante, que são as causas reais e as forças profundas que levaram a sociedade brasileira a fracassar peremptoriamente com mais de 600 mil famílias enlutadas pelo coronavírus. Provavelmente, a crise da pandemia será descartada no mesmo contêiner em que estão guardados cada um dos grandes dilemas históricos nacionais.

Que o tempo, senhor da razão, permita que a sociedade escape da esquizofrenia em que se encontra e construa uma lógica nova de ação. Baseada na percepção de que a vida é um valor inalienável e de que os representantes públicos são responsáveis diretos em construir políticas públicas que resolvam problemas coletivos e urgentes.


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