Já estava na hora mesmo do Estado brasileiro reagir ao desmonte que suas instituições sofreram nos quatro anos do governo Bolsonaro
Em 02/11/23 14:44
por Balaio do Kotscho
Ricardo Kotscho, 75, paulistano e são-paulino, é jornalista desde 1964, tem duas filhas, 5 netos e 19 livros publicados. Já trabalhou em praticamente todos os principais veículos de mídia impressa e eletrônica. Foi Secretário de Imprensa e Divulgação da Presidência da República (2003-2004). Entre outras premiações, foi um dos cinco jornalistas brasileiros contemplados com o Troféu Especial de Direitos Humanos da ONU, em 2008, ano em que começou a publicar o blog Balaio do Kotscho, onde escreve sobre a cena política, esportes, cultura e histórias do cotidiano
Fotos: Ricardo Stuckert | Agência Brasil
Todos hoje sabem que, desde seu primeiro dia de governo, ou antes até, o capitão Jair Bolsonaro só pensou em dar um golpe contra a democracia que o elegeu.
Para isso, liberou geral a legislação para a compra e uso de armas e munições, com mais de 40 decretos, alegando que “povo armado jamais será escravizado”, como disse com todas as letras na célebre reunião ministerial de abril de 2020.
Outro dia, em entrevista ao nosso programa “Segunda Chamada”, aqui no MyNews, o meu amigo Nelson Jobim, ex-ministro da Justiça e da Defesa, defendeu a ideia de que precisamos parar de falar em Bolsonaro porque é isso que ele quer para não ser esquecido. Fiquei pensando se isso era possível e recomendável.
Hoje, lendo a coluna “Jamais esquecer Bolsonaro”, de outro velho amigo, o Rui Castro, na Folha, fui convencido de que ainda não podemos deixar de falar e escrever sobre os imensos estragos que esse cidadão causou ao país, e deixou sequelas por toda parte.
“É obrigatório lembrar como ele tentou armar a maior teia antidemocrática da história da República. (…) Quando as outras nove investigações a seu respeito (8 de Janeiro, jóias, etc) se completarem (e a delação de Mauro Cid não para de revelar crimes), então Bolsonaro poderá ser esquecido – num longínquo e acolhedor presídio federal”.
Em seu esforço para a reconstrução do país, o presidente Lula assinou esta semana dois decretos que visam exatamente desarmar o país, uma das prioridades do seu Ministério da Justiça, comandado por Flávio Dino.
Primeiro, Lula assinou um decreto nesta quarta-feira, dobrando a taxação para a compra de armas e munições, que agora será de 55%; em seguida, no mesmo dia, com o objetivo de reforçar o combate ao crime organizado, por meio de uma GLO (Garantia da Lei e da Ordem), convocou as Forças Armadas para atuar nos portos e aeroportos do Rio e de São Paulo.
Assim Lula justificou a medida:
“A violência a que nós temos assistido tem se agravado a cada dia que passa e nós resolvemos tomar uma decisão fazendo com que o Governo Federal participe ativamente, com todo o potencial que ele tem, para que a gente possa ajudar os governos dos estados e ajudar o próprio Brasil a se livrar do crime organizado”.
Já estava na hora mesmo do Estado brasileiro reagir ao desmonte que suas instituições sofreram nos quatro anos do governo Bolsonaro, em especial nos fundões da Amazônia, com as quadrilhas de contrabandistas, narcotraficantes, madeireiros e pecuaristas passando a boiada nas terras indígenas, como o ex-ministro Ricardo Salles preconizou na mesma reunião ministerial em que o seu chefe pregou o armamento da população.
No começo do governo, a região chegou a ser entregue aos cuidados de um vice-rei, o general Hamilton Mourão, que logo sumiria de cena e nunca se soube o que realmente suas tropas fizeram para preservar a floresta amazônica e as terras indígenas, atacadas como nunca antes.
Em reportagem no Uol desta quinta-feira, Leonardo Sakamoto publica matéria com relato de que esta guerra continua: “Áudios obtidos pela Repórter Brasil e atribuídos a um grupo de WhatsApp chamado “Máfia da Tora” revelam dois homens conversando sobre a compra de armas de fogo nos Estados Unidos contra agentes da Força Nacional e de outros órgãos federais envolvidos na desintrusão (retirada dos invasores) da Terra Indígena Apyterewa, no Sul do Pará”.
Invadida por madeireiros e pecuaristas, a Apyterewa foi o território indígena mais desmatado do país durante o governo anterior. Por isso, a expulsão dos ocupantes ilegais e as 60 mil cabeças de gado, desde 2 de utubro, vem gerando reações de lideranças políticas e econômicas locais, ligadas à bancada ruralista na Câmara, a mais poderosa do parlamento, que agora se mobiliza para derrubar a decisão do STF e do governo federal sobre o Marco Temporal.
Num dos áudios do grupo de 225 integrantes da “Máfia da Tora” dá para ouvir de um deles: “A vontade que dá é estar bem localizado com uma arma 357, entendeu?, catar um por um e dar na cabeça, um satanás desse aí”. Satanás no caso, são os agentes federais convocados pelo governo para proteger o que restou da floresta e das terras indígenas. Santos são os agrotrogloditas, na perfeita expressão de Elio Gaspari.
No Brasil destes dias, o passado, o presente e o futuro se cruzam a cada esquina e a luta contra o arbítrio e o atraso tem que ser permanente, sem tréguas, em todo o território nacional. Ainda são muitas as sequelas e as bombas de efeito retardado deixadas pelo governo golpista. A reconstrução vai demorar, mas já começou.
Vida que segue.
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