75 anos do Maracanã sob olhar de historiador: paixão, reformas e importância Estádio do Maracanã / Foto: Leandro Amorim/CRVG

75 anos do Maracanã sob olhar de historiador: paixão, reformas e importância

MyNews detalha história do maior palco do futebol no mundo e suas mudanças

O estádio do Maracanã completa, nesta segunda-feira (16), 75 anos de existência. Palco de duas finais de Copa do Mundo e inúmeros títulos de times cariocas e brasileiros em geral, o local é um orgulho dos brasileiros e uma referência no Rio de Janeiro em termos de importância e visitação turística na Cidade Maravilhosa.

Dessa forma, o MyNews conversou com o historiador Fernando Vale Castro. Ele falou sobre o aniversário do maior palco de futebol do mundo, mudança ao longo dos anos, importância e também a valorização dentro da cultura carioca e nacional.

Maior do mundo completa 75 anos

R: “Em julho de 1946, no Congresso de Luxemburgo, organizado pela FIFA para a escolha da sede para a IV Copa do Mundo, o Brasil foi escolhido como o país sede do maior evento futebolístico do mundo, fato que trouxe à cena política, tanto carioca quanto brasileira, a necessidade de se construir um estádio que se tornasse símbolo de um país moderno e próspero. Inaugurado em 16 de junho de 1950, o Estádio do Maracanã é um dos símbolos mais representativos do país. Completando 75 anos, sua relevância vai além do esporte, uma vez que se tornou uma referência cultural, social e histórica.

“A decisão de patrocinar a IV Copa do Mundo não se baseou somente em interesses ligados ao esporte. Diversos outros fatores foram considerados naquele momento, como a necessidade de projetar uma imagem moderna do Brasil, especialmente da então capital, o Rio de Janeiro, e a busca por uma identidade nacional por meio do futebol.
O Maracanã foi projetado para ser o maior estádio do mundo, com capacidade para aproximadamente 200 mil espectadores. Sua construção não foi apenas um marco para o esporte, mas também se tornou um símbolo da nação, um ponto de encontro para milhares de torcedores e um espaço síntese da brasilidade”.

Maracanã palco do Rock In Rio em 1991

Ao longo dos anos, o Maracanã não recebeu somente futebol. Teve também o Rock in Rio de 1991, entre outros eventos. Aqui, Fernando comenta sobre o que mais o estádio presenciou em sua história:

R: “Ao longo de suas mais de sete décadas, o Maracanã não serviu apenas como palco para jogos de futebol, mas também para eventos culturais e musicais. Concertos de grandes artistas, como Frank Sinatra, Paul McCartney, dentre outros, grandes festivais de música, as históricas chegadas de Papai Noel e a celebração litúrgica de João Paulo II estão entre os principais momentos do estádio”.

“Esses eventos consolidaram seu papel como um espaço que se caracteriza como um marco identitário muito maior do que apenas um local para a prática do futebol, tendo se tornado um símbolo nacional e uma referência internacional. Portanto, ao celebrar seus 75 anos, o Estádio do Maracanã é muito mais do que um local de competições esportivas. Ele é um patrimônio cultural que representa a alma do Rio de Janeiro e do Brasil. Sua importância transcende o futebol, tornando-se um espaço de união, celebração e identidade nacional e, independentemente das transformações sofridas, precisa continuar a ser um símbolo de integração e paixão para as futuras gerações”.

Mudanças em sua história

Construído para a Copa de 1950, o Maracanã, além de receber duas Copas, passou por inúmeras transformações e reformas — a última para os Jogos Olímpicos de 2016. O historiador Fernando fala dessas alterações e analisa o descontentamento de parte da população e dos torcedores em geral.

Hoje, administrado por Flamengo e Fluminense, o Maracanã deixou de receber o “povão” dos primórdios e se tornou um ambiente caro para quem deseja frequentar seus eventos.

R: Ao longo dos anos, o estádio passou por diversas modificações que transformaram sua estrutura, levando a uma série de controvérsias e descontentamentos entre os torcedores. As reformas mais significativas ocorreram em razão da Copa do Mundo de 2014. O Maracanã, que já havia passado por algumas mudanças nas décadas anteriores, foi completamente remodelado, aproximando-se do conceito de arena esportiva. Dentre as principais alterações, houve a redução da capacidade para pouco mais de 70 mil espectadores, o que gerou descontentamento entre os torcedores que sentiam falta da atmosfera do “maior do mundo”.

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“Soma-se a isso que a transformação do Maracanã em uma arena moderna ter, no mínimo, limitado o estádio, que sempre foi um espaço de celebração popular, tornando-o um espaço bastante elitizado, no qual os preços dos ingressos foram majorados, limitando o acesso de grande parte da população. Isso gerou um sentimento de exclusão entre os torcedores, que se sentiram despojados de seu espaço histórico”

Políticos envolvidos nas alterações do Maracanã

“As reformas do Maracanã não ocorreram sem controvérsias. Muitos culpam figuras políticas, como o então governador Sérgio Cabral Filho, por priorizarem interesses empresariais em detrimento da tradição do estádio. As críticas também se baseiam na desfiguração do estádio e, principalmente, no superfaturamento da obra. As mudanças ocorridas ao longo dos anos representam um embate entre a tradição e a modernidade, entre o popular e o elitizado. Sua transformação em uma arena continua a provocar debates acalorados sobre sua identidade e seu papel na cultura do futebol brasileiro. A insatisfação de torcedores mais tradicionais serve como lembrança constante de que, por trás das reformas e modernizações, existia uma comunidade apaixonada que desejava — e continua desejando — preservar a essência do estádio como um verdadeiro templo do futebol”.

Paixão nacional

“Em suma, o Maracanã, que começou, sobretudo, como um símbolo da paixão pelo futebol brasileiro, passou por transformações significativas. Embora tenha recebido duas Copas do Mundo e se modernizado, a sensação de que o estádio perdeu sua essência e se tornou uma arena elitizada continua a gerar revolta.
As questões políticas em torno de sua gestão e as críticas à privatização ressaltam a importância de preservar sua história e cultura como um espaço de celebração popular, em que a paixão pelo futebol pode — e deve — ser vivida por todos”.

Maracanã antes da reforma para a Copa de 2014 – Foto: Wikimedia Commons

“Vale destacar que o evidente processo de elitização dos estádios, com o predomínio de um “torcedor gourmet”, expressa uma nova era nos esportes — e o futebol não é exceção — com o estabelecimento de uma espécie de segregação, por meio da qual resta às camadas populares acompanhar as partidas pela TV, em casa ou em locais públicos, dependendo do valor cobrado pelas assinaturas. Particularmente, acho isso lamentável. Penso que seria possível que as arenas buscassem um equilíbrio, para que os estádios de futebol, especialmente o Maracanã, por toda a sua simbologia, mantivessem sua tradição democrática”.

Valorização da cultura carioca e brasileira sobre o Maracanã

No Rio de Janeiro — e no Brasil em geral — não temos o hábito de preservar nossa história. Os lugares históricos são pouco citados e divulgados. Fernando finaliza falando sobre essa ausência de valorização da cultura e dos relatos brasileiros:

R: “O Estádio do Maracanã, um dos ícones do Rio de Janeiro e um dos maiores símbolos do futebol mundial, é também um importante ponto turístico que atrai visitantes de diversas partes do Brasil e do mundo. No entanto, apesar de sua relevância histórica e cultural, o Maracanã parece ser pouco divulgado pelas autoridades locais e nacionais. Essa situação levanta questões sobre a preservação e valorização do patrimônio turístico no Brasil, evidenciando uma falta de estratégia na promoção de seus locais mais emblemáticos”

“Ou seja, o cerne do problema não está no Maracanã em si, mas na falta de uma política de valorização do turismo na totalidade, potencializada por um certo desinteresse das autoridades em promover o estádio como um destino turístico. Embora o local tenha grande potencial para atrair visitantes, as campanhas de marketing e as iniciativas para promover o Maracanã como ponto de visitação são escassas. Isso pode ser atribuído a uma falta de visão estratégica em relação ao turismo cultural e esportivo”.

“Além da divulgação ineficaz, a preservação do Maracanã, bem como de outros locais históricos com enorme potencial para o turismo, sofre com a falta de investimentos. Muitas vezes, a manutenção e conservação são insuficientes, comprometendo a experiência dos visitantes. A falta de recursos e de planejamento adequado para a preservação do patrimônio cultural e a limitada quantidade de atrações resultam em uma experiência menos atraente para os turistas”.

“O Maracanã, como um dos principais pontos turísticos do Rio de Janeiro, merece uma divulgação mais efetiva e uma valorização condizente com sua importância histórica e cultural. A desinteresse das autoridades em promover o estádio e a insuficiência de recursos para sua preservação são questões que refletem um problema maior no Brasil: a dificuldade em reconhecer e valorizar seu próprio patrimônio”

“Para que o Maracanã — e outros locais históricos — se tornem verdadeiros destinos turísticos, é fundamental que haja um esforço conjunto para divulgar, preservar e celebrar a História nacional”, concluiu Fernando para o MyNews.

Sobre Fernando

Fernando Vale Castro. Professor da área de História das Américas do Instituto de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IH-UFRJ). Professor e orientador do Programa de Pós-Graduação em História Social (PPGHIS-UFRJ), do Programa de História Comparada (PPGHC- UFRJ) e do Programa de Pós-Graduação em Ensino de História (ProfHist – UFRJ). Pesquisa e orienta os seguintes temas: Intelectuais Americanos, Futebol e Questões Raciais nas Américas. Escreve, duas vezes por semana, em https://pensecomfernandao.com.br/

Fernando Vale Castro – foto: arquivo pessoal

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