Por isso, ser competente na comunicação é, em primeiro lugar, pautar o debate.
Em 24/04/24 14:10
por Conversas com Cid
Cid de Queiroz Benjamin é um jornalista e político brasileiro. Nos anos 1960 e 1970, militou na luta armada, tendo sido dirigente do movimento estudantil em 1968 e integrante da resistência à ditadura militar, responsável pelo setor armado do Movimento Revolucionário Oito de Outubro.
Certa vez, presenciei uma cena inusitada num debate político. Um dos participantes perguntou, de chofre: “Quem corre mais rápido, o jacaré ou o cavalo?” Diante da surpresa geral, ele próprio respondeu: “Depende. Se a corrida for na água, ganha o jacaré. Se for em terra, ganha o cavalo”. O caso mostra a importância de se pautar o debate e como está a um passo de vencê-lo quem estabelece o terreno da disputa e os termos em que ela se dá. Ao contrário do que se pode pensar num primeiro momento, basta a disputa ser na água que, sim, o jacaré pode ser mais veloz que o cavalo.
Ainda ligado à escolha do terreno da disputa, quem pode ser contrário à austeridade na administração pública, a não ser perdulários? Quem pode ser contrário à irresponsabilidade fiscal, se não irresponsáveis? Por isso a direita e o financismo fazem tanta questão de pautar os termos da discussão.
Mas as coisas são vistas de outra forma quando se é informado que as expressões “austeridade”, “responsabilidade fiscal” e outras do gênero pressupõem arrocho salarial para os servidores, cortes de verbas em áreas como saúde e educação e os juros reais mais altos do mundo. E aí, as coisas mudam.
Seria mesmo irresponsável quem se opõe a medidas como estas?
Por isso, diferentemente do que parece imaginar o ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom) de Lula, Paulo Pimenta, pautar os temas em discussão e os termos usados é fundamental, muito mais importante do que o que ele faz sempre: apresentar peças supostamente engraçadas de Tik Tok, tentando ser moderninho.
Vale lembrar que o presidente do México, Lopez Obrador, fala com a imprensa quase todas as manhãs. O que ele pretende com isso? Ora, influenciar a discussão política naquele dia. Dificilmente os assuntos trazidos por ele não darão a tônica do debate.
Por isso, ser competente na comunicação é, em primeiro lugar, pautar o debate.
No momento em que este artigo é escrito, crescem os rumores de que vão ser extintos os pisos constitucionais da Saúde e da Educação. Ora, são eles que garantem um mínimo de recursos para que esses serviços essenciais para o País se mantenham minimamente. Mas não se escuta uma palavra do presidente Lula, do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ou a Secom para estancar a boataria, reafirmando a permanência dos pisos e tranquilizando quem se preocupa com Saúde e Educação.
O simples fato de aparecer como possibilidade a extinção dos pisos — coisa que nem os governos de direita que antecederam Lula tiveram condições de fazer —é negativo para a imagem do governo. Preocupar-se com isso é tratar da comunicação.
Se, de fato, está a caminho a eliminação desses pisos, esta seria mais uma medida da equipe econômica norteada pelos interesses do mercado financeiro. Como muitas outras, deveria ser combatida duramente por quem quer manter serviços públicos essenciais com um mínimo de qualidade.
Neste caso já não seria um problema de comunicação, mas de política pública contrária aos interesses populares mesmo.
No entanto, se a informação não procede e tudo não passa pura e simplesmente de boato ou balão e ensaio, o que custa Lula, Haddad e a Secom esclarecerem as coisas?
Estar alerta para questões assim, mais do que tentar parecer espirituoso com postagens engraçadinhas no Tik Toks, é efetivamente fazer uma comunicação de governo, poupando-lhe desgastes desnecessários.
Até porque, diferentemente do que às vezes se pode pensar à primeira vista a um desavisado, dependendo da forma como as questões forem colocadas, as coisas são diferentes de que aparentam.
E o jacaré pode ser, sim, mais veloz do que o cavalo.
Por isso, um princípio deve estar sempre presente: a política tem que dar o norte para a comunicação. Quem não vê isso, não sabe nada de política, nem de comunicação.
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