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Diálogo – Estado e desigualdade

Tiago Mitraud aponta seis razões pelas quais o Estado aumenta a desigualdade

Deputado federal afirma que se o Estado quiser enfrentar a desigualdade no Brasil deve, em primeiro lugar, parar de promovê-la

por Tiago Mitraud em 20/01/21 18:10

O debate sobre as desigualdades é mais complicado do que parece à primeira vista.

Há uma parcela da desigualdade que se deve à contribuição de cada indivíduo para a sociedade. Se dois indivíduos tiveram as mesmas oportunidades e um deles gera mais valor para a sociedade, nada mais justo que seja premiado por isso. Essa “desigualdade” incentiva indivíduos a contribuírem mais para a sociedade e faz com que prosperemos.

Há outro tipo de desigualdade, porém, que não decorre do mérito de cada um, mas da sorte (ou azar) de se nascer em uma determinada família, região ou bairro, na “loteria da vida”. Uma criança que nasce em uma família pobre terá menos condições de contribuir com a sociedade do que a que nasce em uma família rica, e ela não tem culpa alguma disso. Essa desigualdade, extremamente presente no Brasil, não se deve às escolhas de cada um, não incentiva ninguém a se dedicar mais, só produz um sentimento de injustiça que corrói a coesão social e o senso de pertencimento.

Tiago Mitraud aponta seis razões pelas quais o Estado aumenta a desigualdade
O deputado federal Tiago Mitraud (Novo-MG) durante sessão na Câmara.
(Foto: Najara Araujo/Câmara dos Deputados)

Muitos entendem que a redução das desigualdades é umas das razões de existir do Estado, mas, muitas vezes, ao invés de fazê-lo, o Estado acaba por agravar o problema. Especialmente no Brasil, onde o governo é uma verdadeira máquina de tomar dinheiro de pobre e transferir para rico. Portanto, se o Estado quiser mesmo endereçar o problema da desigualdade no Brasil, a primeira coisa que ele deve fazer é parar de promovê-la. Abaixo, apresento algumas ideias para tal.

1. Acabar com os subsídios concedidos a grandes empresas: Subsídios sempre nascem com a melhor das intenções: viabilizar o investimento privado, aumentar a produtividade, proteger a indústria nascente, etc. Todos esses mecanismos, porém, além de distorcerem vários mercados, são inacessíveis para a parcela mais pobre da população, agravando as desigualdades.

2. Substituir as políticas públicas universais por políticas focalizadas nos mais pobres: Hoje temos um sistema de saúde universal. Como resultado, uma parcela crescente dos recursos do SUS é utilizada para adquirir remédios para famílias ricas que teriam condições de adquiri-los. Enquanto isso, faltam equipamentos e estrutura para a atenção básica de pessoas que não têm alternativa. Nossas Universidades Federais também oferecem educação “gratuita” a famílias de alta renda, financiada pela população mais pobre. Programas focalizados, como o Bolsa-Família, têm se mostrado muito mais eficazes em reduzir a desigualdade.

3. Respeitar a propriedade privada dos mais pobres: O respeito à propriedade privada sempre foi um problema no Brasil, especialmente para os mais pobres, que dispõem de menos mecanismos para se defenderem. Quase sempre, do próprio Estado, que frequentemente recorre a desapropriações arbitrárias, dificulta a regularização de imóveis precários e confisca a mercadoria de ambulantes nas ruas das grandes cidades.

4. Reduzir os supersalários do funcionalismo público: Muitas carreiras do serviço público têm salários modestos, mas outras ganham muito bem, especialmente diante da realidade do país. Isso contribui para agravar a concentração da renda. De acordo com artigo de Medeiros e Souza (2013), os salários no setor público são muito mais concentrados e têm uma contribuição maior para a desigualdade de renda que no setor privado. Embora represente apenas 19% da renda, a remuneração do funcionalismo representa 24% da desigualdade. A solução passa por combater supersalários e diminuir salários de entrada de carreiras  cujas  faixas salariais  estão distorcidas, bem como estabelecer regras para uma progressão salarial baseada em desempenho.

5. Reduzir a carga tributária indireta (sobre consumo): Para manter um Estado do tamanho do nosso, em um país de renda média, não há tributação direta que dê conta. A (péssima) solução encontrada foi avançar sobre a produção e o consumo com a tributação indireta. O problema é que esse modelo acaba por onerar mais intensamente justamente os mais pobres, que consomem uma parcela maior da sua renda.

6. Ter responsabilidade fiscal nas contas públicas: Não existe combate consistente à desigualdade social sem responsabilidade fiscal. Déficits fiscais consomem a poupança nacional, produzem aumento dos juros, queda do investimento, da atividade econômica, do emprego, da renda e do orçamento público para educação e assistência social. Não por acaso, o país alcançou seus principais resultados em termos de redução das desigualdades quando equilibrou suas contas no final da década de 1990 e na primeira década dos anos 2000, quando o superávit primário chegou a 4,25% do PIB. Este ano, teremos um déficit primário de 9% do PIB, e tem quem defenda o aumento da despesa pública.

Mas só deixar de atrapalhar não resolve, o Estado também pode e deve ajudar a promover a igualdade de oportunidades. Transferências diretas de renda para as famílias mais pobres ajudam a amenizar o problema, mas passam longe de resolvê-lo, porque não tiram essas famílias da situação de exclusão econômica, apenas aliviam sua condição.

A real solução do problema passa, necessariamente, pela melhoria da educação. A principal razão pela qual muitas crianças não têm as mesmas oportunidades que outras é porque não tiveram acesso a uma educação sequer razoável. Ao promover uma educação de qualidade para crianças que tiveram azar na loteria da vida, o Estado dá a elas condições de diminuírem o abismo de oportunidades que as separam dos sortudos, permite que sejam capazes de gerar mais valor à sociedade e que possam lutar por mais qualidade de vida para si e para os seus. Daí pra frente, a desigualdade que permanecer é parte do jogo. Mas é fundamental que o jogo seja justo. É tempo do Estado parar de ampliar desigualdades e começar a promover um ambiente em que todos possam competir em condições de igualdade.


Quem é Tiago Mitraud

Tiago Mitraud é administrador e deputado federal eleito por Minas Gerais. É filiado ao Partido Novo

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