Praticamente parado em 2020, setor tenta se reerguer em meio a novas normas e costumes sanitários
por Vitor Hugo Gonçalves em 28/01/21 09:07
Além de representar um meio de entretenimento e até de conhecimento, o turismo também é necessário para a saúde econômica de um país, uma vez que afeta, pelo menos, outros 50 setores. E o setor está entre os mais afetados pela pandemia de Covid-19 mundo afora, inclusive no Brasil.
Em um mundo pré-Covid-19, especificamente em 2019, o turismo movimentou US$ 8,9 trilhões, contribuindo com 10,3% do PIB mundial e com a geração direta de 330 milhões de empregos. No Brasil, de acordo com dados do Ministério do Turismo (MTur) e do Departamento de Polícia Federal (DPF), cerca de 6,35 milhões de turistas internacionais vieram ao país, movimentando US$ 5,99 bilhões em receita cambial.
Os números brasileiros, no entanto, refletem a necessidade de investimentos mais agressivos no setor, considerando o dinamismo comercial da categoria e as relações de interdependência entre diversos ramos da economia nacional, geridas, por parte ou até mesmo integralmente, pelos serviços turísticos. A demanda por desenvolvimento se expõe em números: a cidade de Miami (EUA), sozinha, acolheu 16,5 milhões; o México, 50 milhões.
Apesar da baixa expressividade, o turismo brasileiro empregou 3,4 milhões de trabalhadores em 2019 e faturou R$ 270,8 bilhões, colaborando, assim, com grandiosos 3,7% do PIB.
Vinculado de maneira significativa à instância turística, os setores cultural e criativo do Brasil também fomentam a ala financeira: segundo estimativa da Secretaria da Economia Criativa e da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), a cultura equivale a 2,5% do PIB, ou R$ 170 bilhões, além de empregar, entre formais e informais, 5 milhões de pessoas (6% de toda a mão de obra nacional).
Entre março e agosto, meses mais rígidos da primeira onda de Covid-19, 49,9 mil empresas de serviços turísticos encerraram suas atividades no Brasil, sendo 96,7% pequenos e micronegócios. Um estudo conduzido pela Fundação Getulio Vargas (FGV) estimou um prejuízo de R$ 160 bilhões em 2020 e 2021, além do fechamento de até 1,1 milhão de postos de trabalho.
Segundo dados disponibilizados pela Secretaria de Receita Federal do Ministério da Economia, no acumulado do ano de 2020 até julho, o setor de turismo apresentou queda de 19,4% na arrecadação de impostos federais. A região Nordeste foi a mais afetada, concentrando uma variação negativa de 31,6%.
No decorrer do ano, conforme aumentava a compreensão científica acerca da Covid-19, os serviços voltaram gradativamente suas operações, sob uma série de normas sanitárias impostas por políticas estaduais de contenção da doença. Acompanhou-se, mesmo que timidamente, certa confluência entre a movimentação econômica e a sazonalidade turística.
A regulamentação de vacinas, bem como a implementação do Plano Nacional de Imunização (PNI), relutantes contra o negacionismo em voga, trouxe esperanças para o setor, que se movimentou para efetivar programas conscientes de retomada.
Ana Maria Costa, secretária de turismo do Rio Grande do Norte, estado no qual o turismo é uma das mais importantes fontes financeiras, esclarece que, após um ano dramático, “a retomada já é sentida, principalmente nos últimos 3 meses”. Em janeiro, 82% da malha aérea que cobre a região foi recuperada, “o que dá uma boa expectativa”.
No início da pandemia, em relação ao mesmo período de 2019, a demanda por voos nacionais caiu mais de 90%. Em agosto, apesar de menor, o tombo ainda era de 70%.
“Não podemos comparar essa temporada, é claro, com temporadas passadas, exatamente pela questão da pandemia, mas pode-se dizer que os números estão surpreendendo aqui no Rio Grande do Norte”, completou. Atualmente, 313 voos extras estão liberados para pousar no Aeroporto Internacional de Natal – para se ter uma ideia, na temporada passada, a quantidade era de 680; em relação a janeiro de 2020, a diferença gira em torno de 20%.
Referente ao selo de segurança, Costa afirmar que a rede hoteleira, os receptivos e os restaurantes estão preparados para atender o turista da melhor maneira.
“Foram realizadas, por meio do Senac e Sebrae, capacitações para todos os trabalhadores (fomos o único estado que fez esse tipo de trabalho), para que os funcionários do turismo saibam como aplicar os protocolos e, também, se proteger”, aponta a secretária.
Vinicius Brandão, sócio-proprietário da rede de hotéis Bem Bahia, em Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália, empenhou-se para conseguir a reabertura legal das estruturas turísticas com base em um planejamento estratégico de combate à pandemia, adotado posteriormente pelo governo municipal das duas cidades baianas.
Brandão conta que atuou reunindo empresários da região, buscando propostas de operação em ambas as cidades, junto com as prefeituras, que acataram com mais de 60% do conteúdo apresentado por ele nas reuniões deliberativas. Entretanto, a despeito da funcionalidade municipal, o empresário assegurou não haver um canal de comunicação direta entre os prestadores de serviço do setor e o governo federal.
“Foi criado o Fungetur, um programa de empréstimo emergencial, que, a meu ver, não funcionou. A maioria das empresas e pessoas que precisaram não conseguiram. Há um motivo: os critérios de aprovação das verbas estavam tão agressivos quanto a antes da pandemia. Então, apenas empresas que não sofreram crises conseguiram o auxílio”, explicou.
O ramo hoteleiro foi um dos mais impactados pela pandemia. Apesar da liberação de ocupação reduzida via protocolo, a movimentação média de turistas ainda não é suficiente para cobrir as despesas correntes.
“Em Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália, fechamos em março e só conseguimos reabrir em outubro, com percentuais reduzidos. Ainda assim, a permissão de reabertura, dentro de um grande protocolo de readaptações, não foi suficiente para cobrir os gastos – hotéis com 100 apartamentos conseguiam, por exemplo, ocupar apenas 4”, exemplifica Brandão.
O empresário relatou um dos diversos esforços para angariar turistas. Empregando-se das habilidades como compositor e produtor, Brandão lançou o videoclipe autoral “As belezas desse mundo em um só lugar – Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália”, com o intuito de promover as cidades por intermédio também de campanhas publicitárias, uma cooperação entre diversas redes hoteleiras e comerciais da região.
De acordo com a prefeitura de Porto Seguro, somente os estabelecimentos que possuem o “Selo Porto Mais Seguro” estão habilitados a operar. O certificado só é emitido depois que o proprietário assina um termo de responsabilidade. Em seguida uma equipe da Vigilância Sanitária realiza uma vistoria no estabelecimento para verificar se todos os protocolos sanitários foram implantados.
O alto investimento em proteção, no entanto, dilatado por uma tímida arrecadação, configura a pandemia como “um enorme prejuízo documentado”, na concepção de Brandão. Segundo o gestor, a retomada apresentou sinais de melhora na virada do ano, mas sentiu os efeitos dos novos fechamentos em janeiro diante do aumento de casos de Covid-19 em todo o país.
Brandão aponta que apesar do adiamento das festividades de Carnaval deste ano, o período do ano no qual ocorreria o feriado apresenta boa procura.
Para se preparar para essa temporada atípica, o empresário conta que as redes de hotéis adotaram protocolos sanitários rígidos: recepcionistas devem usar máscara e face shield; camareiras, além de máscara, luvas e óculos (ou shield), têm que usar um macacão especial para fazer a higienização dos apartamentos; já a parte de confeitaria deve usar máscara, mas não pode utilizar óculos e luvas por questões de segurança. O álcool em gel é encontrado em todos os ambientes do hotel; e no serviço de alimentação, todos os hospedes devem se servir utilizando máscaras e luvas, além do distanciamento já preparado entre as mesas.
A implementação dos tradicionais protocolos de higiene e segurança, como o uso obrigatório de máscaras para turistas e moradores e a aferição de temperatura corporal, foi acrescida por métodos de comunicação visual e auditiva – cartazes de aviso e alertas sonoros agora fazem parte dos cenários relaxantes dos hotéis.
“Então, houve um alto investimento em EPIs e um alto investimento na redução de pessoas”, complementou Brandão.
Segundo levantamento realizado pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP), o setor do turismo no Brasil perdeu R$ 51,5 bilhões em faturamento entre março e novembro de 2020 – um rombo de 33,4% a menos nas receitas da categoria, se comparado com o mesmo período de 2019.
06Ainda de acordo com a Fecomercio, o baixo percentual foi puxado, principalmente, pelo desempenho do setor aéreo, que perdeu 50,5% do faturamento anual em meio à crise sanitária.
Atividades culturais, criativas, recreativas e esportivas, registraram baixa de 28,4% no faturamento, e a rede hoteleira, entre março e novembro, teve prejuízo de 26,6% (R$ 3,17 bilhões). Agências de transporte ou de turismo, acumularam uma baixa de 12,2%.
O atual ministro do Turismo, Gilson Machado, afirma que a manutenção dos empregos é seu principal objetivo durante a pandemia: “Nós fomos o país que mais fez pela manutenção do emprego da América Latina. Enquanto outros destinos turísticos perderam até 60% dos empregos, alguns até mais, como o Caribe, que perdeu 70%, nós perdemos em torno de 25%, segundo a associação nacional da indústria de hotéis. Fizemos medidas duras, mas o maior capital de uma empresa de turismo é o capital humano. Eu sei, porque sou um pequeno operador turístico em São Miguel dos Milagres [município no litoral de Alagoas]”.
Comentários ( 0 )
ComentarMyNews é um canal de jornalismo independente. Nossa missão é levar informação bem apurada, análise de qualidade e diversidade de opiniões para você tomar a melhor decisão.
Copyright © 2022 – Canal MyNews – Todos os direitos reservados. Desenvolvido por Ideia74
Entre no grupo e fique por dentro das noticias!
Grupo do WhatsApp
Utilizamos cookies para oferecer melhor experiência, melhorar o desempenho, analisar como você interage em nosso site e personalizar conteúdo.
ACEITAR