Nos últimos dias, as tensões no Cazaquistão levaram o governo de Vladimir Putin a precipitar o envio de tropas para ajudar o governo local. Os atos de repressão foram denunciados por relatores da ONU, que pediram a abertura de uma investigação independente sobre a prisão de centenas de pessoas, além das ordens das autoridades de disparar contra os manifestantes.
Enquanto a crise iniciada por um protesto sobre o preço do gás se transformava em uma demonstração da influência russa na região, movimentações de tropas de Moscou na fronteira com a Ucrânia também elevavam a tensão entre o Kremlin e o Ocidente.
Em ambos os casos, o que estava em jogo não era apenas o destino das duas ex-repúblicas soviéticas. Mas a definição de onde está a fronteira de influência russa e até onde o Ocidente e a OTAN podem agir.
A tensão levou a aliança militar e os russos a proliferar reuniões de emergência. Na segunda-feira, após uma reunião de oito horas com a delegação russa em Genebra, foi perguntado à negociadora americana Wendy Sherman se ela confiava no governo de Vladimir Putin. Sua resposta foi categórica: “Eu geralmente não me aproximo deste tipo de situações com base na confiança”.
A declaração escancarou um mundo marcado pela profunda desconfiança mútua entre as grandes potências, além da diminuição dos espaços físicos e políticos para o diálogo.
Sherman ainda deixou claro que as oito horas de diálogo não significaram sequer o início de um processo formal. “Isto não foi uma negociação. Hoje estávamos colocando ideias em cima da mesa. E temos um longo caminho a percorrer”, explicou.
A cautela tem uma razão: não está claro nem para os americanos nem para os europeus a real intenção dos russos de negociar. Moscou afirma estar pronta para a diplomacia, está disposta a agendar novas rodadas de negociações e apresentou um pacote de medidas a fim de tranquilizar o Ocidente que está engajado no processo.
Mas, sobre a mesa, o que o Kremlin apresenta como um projeto de acordo é considerado “inaceitável”. A proposta inclui uma espécie de veto de Moscou sobre a adesão de certos países à OTAN. Para o governo de Vladimir Putin, esta expansão e uma eventual inclusão da Ucrânia abrem o risco de confrontação.
Mas o governo americano de Joe Biden mandou um recado claro à delegação russa: o presidente Vladimir Putin precisa retirar da fronteira ucraniana os 100 mil soldados que ele destacou para a região, gesto que abriria espaço para negociações diplomáticas e um eventual acordo para a região. Mas caso haja qualquer gesto de Moscou de ameaça contra o território da Ucrânia, sanções financeiras, comerciais e militares serão impostas.
Após o encontro em Genebra, Moscou insistiu que não existe motivo para uma preocupação por conta dos militares, que não haverá uma invasão da Ucrânia e que o deslocamento era apenas um exercício militar. Mas, para a vice-secretária de Estado norte-americana, Wendy Sherman, a explicação russa não convenceu.
Segundo ela, Moscou precisa ainda explicar o motivo pelo qual enviou 100 mil homens para a fronteira e esclarecer por qual motivo o suposto exercício militar não foi notificado aos demais parceiros internacionais. Segundo ela, tem sido tradicional que um governo informe aos demais sobre exercícios. “Nada disso foi notificado”, afirmou a negociadora americana, que não escondeu suas dúvidas sobre as intenções russas. “Ou essas tropas retornam para a caserna ou os russos precisam explicar que exercícios são esses”, cobrou.
Para ela, a opção pela desescalada é o único caminho a ser tomado se Moscou quer, de fato, apostar na diplomacia. A outra opção é o risco de um confronto militar de proporções imprevisíveis.