Música de Chico Buarque e Gilberto Gil nos faz refletir sobre data.
por Paulo Totti em 15/04/22 10:04
Gilberto Gil e Chico Buarque de Holanda. Foto: Arquivo
Foi na tarde de sexta-feira da Paixão, 1973. Estão reunidos Chico Buarque e Gilberto Gil. Chico serve o Fernet, seu licor preferido na época. Gil trouxe para o apartamento de Chico, na Lagoa, o título e o refrão de Cálice. Juntos deram-nos para a eternidade uma canção triste, apropriada àquela santa semana, e talvez a mais linda e inconformada prece daqueles vinte e um anos de escuridão e de chumbo: “Pai, afasta de mim esse cálice de vinho tinto de sangue”.
Ouço-a na voz de Milton Nascimento. Encanta-me o simbolismo de toda a letra, mas o que comove e revolta é a atualidade noticiosa do 12º verso: “Tanta mentira, tanta força bruta”.
A fita acaba e parece que estou a revivê-la com o que ouço e leio na TV ou na internet nesta Quinta-Feira de Endoenças, 14 de abril de 2022. Os pastores que frequentavam o Alvorada e o Planalto (29 visitas em 19 dias) e também o ministério da Educação (incontáveis presenças, quase uma moradia), só iam para orar. A Bíblia agora é ilustrada e na falta da imagem do Cristo que expulsava vendilhões do templo, aparecem fotos do conspícuo ministro e sua digna senhora esposa.
Ante a vida eterna ao lado do Senhor, de que vale o ouro impuro extraído do garimpo na terra dos índios? O que farão os índios com tanto ouro? E o mais cristão dos sentimentos: você me ajuda e eu lhe ajudo, pois uma mão lava a outra e com ambas podem-se recolher os dízimos? Querem investigar isso, como se um crente já não prestasse contas diretamente ao Senhor Deus por intermédio do ministro do seu templo. Como aconteceu com as calúnias assacadas contra o impoluto ministro da Saúde, general Pazuello, silêncio de cem anos, se o Juízo final não chegar antes, Aleluia!
Na pandemia, os infiéis se queixavam do abandono da ciência e, se, num gesto de cristã caridade, mandamos hoje milhões de kits de robótica para escolas da catinga – oferta de empresário amigo do valoroso irmão presidente da Câmara – a Globo Lixo e, vai ver, até o comunista Datena, inventam a narrativa de que no Sertão há escolas sem luz, sem água, sem banheiro, sem computador, sem teto. Pois bem, por módica e pública quantia, vamos ensinar as crianças a operar robôs que dispararão milhões de mensagens com a verdade dos justos. Não importa que os descrentes e três ministros da Suprema Corte as chamem de feique-níus.
Se o futuro vice-presidente diz que a redentora de 64 salvou o Brasil do inferno anticristão, a terrorista Miriam Leitão comete a heresia de afirmar que o general faltou com a verdade. Nosso irmão Eduardo tem razão ao preocupar-se com a jibóia. Já dizia o senador José Agripino (PFL,RN) em 2008, Dilma Rousseff, como Miriam agora, conspirava contra Cristo desde criancinha.
O reconfortante é que a semana da Paixão um dia chega à Páscoa, o domingo da Ressurreição. Ao final da década de 80, Chico Buarque compôs, com Francis Hime, outra reza profética e eterna, “Vai passar”:
“Meu Deus, vem olhar vem ver de perto uma cidade a cantar a evolução da liberdade até o dia clarear”.
É nesse samba-enredo que Chico lembra “uma página infeliz de nossa história” em que dormia “a nossa pátria-mãe tão distraída, sem perceber que era subtraída em tenebrosas transações”.
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