Política

Opinião

A história ensina, mas a direita não aprende (Será?)

A história da política nacional passa por sucessões de desdobramentos eleitorais que se repetem, assim como os posicionamentos da direita brasileira

por Jorge Simino Junior em 06/09/21 22:06

A direita brasileira tem pavor das urnas eleitorais e a história dos últimos quarenta anos é uma prova disso. Recapitulemos, de forma sucinta, obviamente, as diversas demonstrações dessa paura.

Era o ano de 1982, num 25 de janeiro é convocada uma manifestação na Praça da Sé, em São Paulo, em favor das eleições diretas para Presidência da República. Nascia o movimento das DIRETAS JÁ. Para encurtar a história e diante do temor de uma vitória de um candidato da oposição, como Ulysses Guimarães ou Brizola, o governo se desdobrou e  derrotou no Congresso a emenda constitucional que propunha a volta da eleição direta (a emenda recebeu o apelido do deputado que apresentou a proposta: Dante de Oliveira).

Negociações intensas acabam por assegurar a eleição de Tancredo Neves, que derrotou o candidato da situação, Paulo Maluf, no colégio eleitoral do Congresso. O destino, por vezes, é cruel: Tancredo venceu, mas não governou. Adoeceu e morreu antes da posse e quem assumiu foi seu vice José Sarney, quadro político notoriamente ligado à ditadura. 

O mandato de Sarney seria de 4 anos, e tendo assumido em 1985, sua sucessão ocorreria em 1988, agora através de uma eleição direta. Mas o aumento da inflação para patamares de 10% ao mês, mais diversos planos de estabilização fracassados (Cruzado, em fevereiro de 1986; Cruzado II, em novembro de 1986 e Bresser, em março de 1987) levaram à iniciativa de aumentar o mandato em mais um ano e, assim, as eleições ocorreriam somente em 1989. O medo naquele momento era a possibilidade de vitória do Brizola, que havia vencido a eleição para governador do Rio de Janeiro em 1982. E como o Congresso aprovou a extensão do mandato? Notícias da época apontaram farta distribuição de concessões de rádio e televisão aos congressistas.

Todavia, a deterioração da economia, ao longo de 1989, piorou (mesmo com o Plano Verão implementado em janeiro) e com isso o “risco” Brizola crescia. Então, de repente, não mais que de repente, surge uma “terceira via” da época: Fernando Collor, governador de Alagoas, de família com longa tradição na política. O histórico de decisões à frente do governo de Alagoas não o recomendava, mas como aparecia à frente nas pesquisas eleitorais, a direita não titubeou: o “caçador de marajás” era o seu candidato para derrotar Brizola. 

Fechadas as urnas após o primeiro turno, em 1989, surpresa: o segundo colocado era Lula com 16% dos votos, meio ponto percentual à frente de Brizola. Pânico na geral, se Brizola era um perigo, imagine um metalúrgico! E a campanha eleitoral para o segundo turno atingiu um grau de sordidez de provocar asco em répteis. Collor venceu o segundo turno e sofreu impeachment dois anos depois.

Fernando Henrique venceu as eleições no primeiro turno em 1994, derrotando Lula, amparado no sucesso, inconteste, do plano Real. Debela a inflação crônica e, assim, redistribui a renda capturada pelo chamado imposto inflacionário. Ocorre que uma parte do sucesso era a taxa de câmbio fixa, que já em 1996 se mostrava insustentável (com déficit em transações correntes beirando os 4,0% do PIB). A crise asiática em 1997 complica ainda mais a situação e só resta uma manobra para não correr o risco de uma vitória do Lula nas eleições marcadas para 1998: aprovar a emenda constitucional da reeleição.

Aqui vale um breve parêntesis. O instituto da reeleição nunca fez parte da tradição republicana brasileira. Sequer os militares ousaram romper essa tradição. Diante de dificuldades, a solução era aumentar o tempo do mandato: Médici governou por 4 anos; o mandato de Geisel foi para 5 anos e o de Figueiredo atingiu 6 anos! Fecha o parêntesis.

Apesar de contrariar a tradição histórica, a PEC da reeleição foi aprovada em 1997 (de novo, vale consultar as notícias da época) e Fernando Henrique Cardoso foi reeleito, em 1998, mais uma vez no primeiro turno. Contudo, a vitória custou caro. Os ajustes necessários para corrigir os rumos da economia soterraram a percepção que o eleitorado tinha em relação ao PSDB, que foi derrotado nas quatro disputas presidenciais seguintes. 

E assim chegamos a 2018. Antes, é claro, temos que passar por 2016 com o impeachment da Dilma, que fez um primeiro ano de governo razoável (2011), mas perpetrou um verdadeiro desastre nos três anos seguintes (2012/2013/2014). A tentativa de correção em 2015 pecava por falta de convicção e habilidade política para enfrentar um ambiente muito adverso.

Diante dessa sucessão de eventos, ao longo de quase 40 anos, é fácil identificar um padrão de atuação da direita tupinambá: 1) qualquer coisa é melhor que algo diferente dela mesmo e 2) se ganhar eleições está difícil, ganhar tempo ou apelar, literalmente, para “qualquer solução” é preferível à derrota (não importa quão errada ou ruim essa “solução” se revele posteriormente). E autocrítica, nem pensar.

À primeira vista, pode parecer que a direita se recusa a aprender as lições que a história tenta lhe ensinar. Todavia, talvez seja simplesmente oposto, ou seja, a história apenas registra aquilo que a direita sabe fazer.

Jorge Simino Junior é economista formado pela USP.

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