Dentre os oito apontados, seis são militares. Grupo ligado ao Ministério da Saúde encaminhou as tratativas para a compra de imunizantes
por Vitor Hugo Gonçalves em 20/07/21 14:26
Cristiano Carvalho, representante comercial da Davati Medical Supply, expôs, em depoimento à CPI da Pandemia nesta quinta-feira (15), a participação de ao menos oito superiores do Ministério da Saúde que teriam agido para agilizar as tratativas de compra e venda de milhões vacinas da Astrazeneca e da Janssen com a Davati – entre os citados, seis são militares.
As negociações entre a empresa estadunidense e a pasta da Saúde foram firmadas sem que houvesse qualquer comprovação da existência dos lotes com os imunizantes. Os laboratórios produtores já haviam informado também que não trabalhavam com qualquer tipo de intermediação nos acordos com governos.
Em uma das reuniões de ajuste das transações, o policial militar Luiz Paulo Dominghetti (autodenominado representante da Davati) diz ter recebido uma demanda de propina no valor de US$ 1 por dose para, assim, viabilizar a compra de 400 milhões de vacinas da Astrazeneca.
Após ser diversas vezes questionado sobre esse episódio, Cristiano Carvalho confirmou os encontros e as cobranças de propina, coordenadas por oito autoridades da Saúde, incluindo o ex-número dois da pasta Élcio Franco.
Segundo o depoente, no dia 12 de março, ele e Dominguetti participaram de uma reunião no Ministério da Saúde intermediada pelo reverendo Amilton Gomes, da instituição privada denominada Secretaria de Assuntos Humanitários (Senah), e pelo coronel Helcio Bruno, do Instituto Força Brasil.
Já no ministério, o grupo se encontrou com o coronel Cleverson Boechat (então diretor de Planejamento da Saúde), com o coronel Marcelo Pires (então diretor de Programas da Saúde) e Élcio Franco (então secretário-executivo da Saúde).
Passados três dias, o dono da Davati, Herman Cárdenas, encaminhou a Élcio Franco um comunicado oficial oferecendo a troca do imunizante da AstraZeneca por doses da vacina produzida pela Jansen. A justificativa dada pelo empresário era de que o produto seria mais barato e poderia ser administrado em dose única.
Ainda segundo Carvalho, Blanco e Helcio Bruno eram os principais interessados no avanço dessas negociações.
Durante seu depoimento à CPI, Cristiano Carvalho citou o envolvimento de oito autoridades. São elas:
De acordo com o depoente, Élcio se encontrou com os representantes da Davati no dia 12 de março – nessa reunião não houve acordo de propinas. Dias depois, o coronel recebeu o comunicado enviado pela sede da empresa, que tratava a troca das vacinas AstraZeneca por doses da Jansen.
O e-mail sobre o imunizante da Janssen não foi respondido, e Élcio Franco foi exonerado do Ministério em 26 de março. Hoje, ocupa cargo no Palácio do Planalto.
“Eu acredito que, logo depois, ele foi exonerado do cargo – dez dias depois se eu não me engano –, e não teve nem tempo de ele retornar, nada mais, porque, dois dias depois dessa reunião, o próprio general Pazuello já tinha dado indícios de que ele sairia do cargo por questões médicas. Neste caso do Elcio Franco, eu acredito que não foi concluído porque realmente ele não fazia mais parte do ministério, dois ou três ou quatro dias depois”, afirmou Carvalho.
Dias foi acusado por Dominghetti de ter cobrado propina nas tratativas envolvendo a vacina da AstraZeneca. O sargento, durante depoimento à Comissão, negou a ocorrência e chamou o PM de “picareta”.
“Comprador do Ministério da Saúde do Brasil. Comigo, [a relação] foi estritamente comercial a respeito das vacinas. […] Conforme é documentado e periciado, várias vezes ele me ligou e mandou mensagens”, declarou Carvalho.
Carvalho confirmou que se referia diretamente a Blanco quando, em troca de mensagens com Dominghetti, interceptadas pela CPI, disse que só havia “FDP” no Ministério da Saúde.
“Peço até desculpas pelo termo, mas eram mensagens que a gente trocava. Sobre isso, acho que até me excedi. Na verdade, o que eu estava me referindo é como eu passei a negociar com o senhor [Marcelo] Blanco, aqui, eu me referia a esse tipo de negociação que tinha sido instaurada. Que aparentemente, o Roberto Dias havia indicado o Blanco para negociar comigo. Ele falava em nome do Roberto Dias o tempo todo”, disse.
Segundo o representante da Davati, Blanco avançou nas negociações com ele e com Dominghetti.
“Ele era responsável pelos pagamentos dos insumos no Ministério da Saúde”, alegou Carvalho. O representante comercial da Davati disse que o encontro de 12 de março aconteceu justamente no gabinete do coronel Boechat.
“Se eu não me engano é no segundo andar. Foi lá que ele nos recebeu. E o coronel Pires e o coronel Elcio Franco também nos receberam dentro do gabinete do coronel Boechat. Dentro dessas tratativas e conversas dentro do Ministério da Saúde, não houve nada que desabonasse nenhum desses coronéis servidores públicos que estavam na reunião”, afirmou.
Carvalho confirmou a manifestação de interessa na aquisição das vacinas por parte do coronel Pires: “Nas mensagens, ele diz que sim e faz bastante perguntas”.
“Acredito que ele era uma espécie de assistente de ordens do coronel Élcio Franco. Ele fez vários tipos de perguntas sobre a entrega, sobre o produto, não diretamente para mim. Diretamente para o coronel Hélcio Bruno, com H, que o coronel repassou para mim e eu disponibilizei”, complementou Carvalho.
Segundo informações do vice-presidente da CPI Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Guerra é também assessor do adido militar da embaixada do Brasil nos Estados Unidos.
Carvalho disse que “o coronel Guerra atuou somente como o porta-voz do Herman nos Estados Unidos, não teve influência alguma na negociação. Só transmitia as informações que a ele eram passadas”.
O depoente afirmou que uma pessoa identificada como “Odilon” seria um dos intermediadores da negociação. Randolfe disse que ele também é coronel, mas não declarou a qual das Forças Armadas ele possui ligação.
“O Odilon é coronel? Eu não tenho esse conhecimento. Ele aparece como um dos intermediadores da negociação”, rebateu Carvalho.
Posteriormente, o representante da Davati relacionou o nome “Odilon” ao suposto pedido de propina para negociar as doses da Astrazeneca – Carvalho, no entanto, utiliza a expressão “comissionamento”.
“A informação que veio a mim, vale ressaltar isso, não foi o nome propina. Ele usou comissionamento. Ele se referiu a esse comissionamento sendo do grupo do tenente-coronel Blanco e da pessoa que o tinha apresentado ao Blanco, que é de nome Odilon”, afirmou Cristiano.
As mensagens obtidas pela CPI no celular de Luiz Paulo Dominghetti mostram um contato identificado como Guilherme Filho Odilon. O PM enviou a ele a seguinte mensagem: “Estamos negociando algumas vacinas em números superiores a 3 milhões de doses. Neste caso a comissão fica em 0,25 centavos de dólar por dose”.
“O Laurício foi quem apoiou a compra, através da Senah. Agendou reuniões e, inclusive, indicou que fosse copiado o Élcio Franco nos e-mails. Deu todas as credenciais necessárias para que pudéssemos avalizar que a Senah poderia concluir o negócio”, confirmou Carvalho.
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