Política

Representatividade

Ser uma mulher trans na política é um afrontamento

O preconceito social enraizado é ainda mais latente dentro do sistema político brasileiro. Entretanto, as eleições de 2020 revelaram um passo a frente na luta pela igualdade

por Linda Brasil em 01/04/21 14:41

No Brasil, as corpas trans tem dificuldade de acessar e ocupar todos os lugares: emprego formal, escola, posto de saúde, a própria casa, até o banheiro. Com a política não é diferente. Temos um sistema político feito por e para homens, brancos, héteros e cisgêneros. Não são apenas quatro palavras, são marcadores sociais e históricos que determinam quem está dentro e quem está fora da norma, quem acessa direitos e a quem os direitos são negados e as violências legitimadas, justificadas.

Somos o país que mais mata pessoas trans no mundo. Nossa expectativa de vida é de 35 anos – não existe hoje outro grupo social com média de vida tão baixa. Nossas corpas são empurradas compulsoriamente para a prostituição, a esquina é o território que historicamente a sociedade reserva para nós como única alternativa de renda e independência financeira. Então, não tem como estar na política e nossas corpas não refletirem esses conflitos e desigualdades sociais. Por isso a nossa presença incomoda tanto. A nossa existência afronta as estruturas desse sistema.

Vereadora Linda Brasil, ao centro, comemora sua candidatura junto de membros do comitê.
Vereadora Linda Brasil, ao centro, comemora sua candidatura junto de membros do comitê. Foto: Reprodução (Redes Sociais).

Desde que entrei para a vida pública minha vida virou do avesso. A exposição que garante visibilidade às nossas lutas e nossas vivências também me tornou um alvo. São diversas as violências e ataques que já sofri e ainda sofro. No mesmo dia que foi confirmada a vitória eleitoral desse nosso projeto coletivo e fui eleita a vereadora mais votada de Aracaju, começou a circular, em grupos de WhatsApp, o áudio de um pastor deslegitimando a minha identidade, a minha vivência, me chamando de aberração e dizendo que eu não sou filha de Deus.

Respondi a esse episódio transfóbico e de disseminação de ódio com responsabilização jurídica, e presidindo a sessão de posse de todas as vereadoras e vereadores de Aracaju. Foi histórico! A mulher mais votada na história da cidade e mais votada em 2020 foi uma mulher trans. Isso não mudará, nenhum passo atrás será dado. O resultado eleitoral de 2020 mostrou isso em todo o país. 

Essa recente onda de violência política de gênero contra parlamentares trans, democraticamente eleitas, é um atentado contra a democracia. Forças obscuras querem nos calar na tentativa de frear o avanço civilizatório que as corpas trans representam na política. Mas, não seremos interrompidas! Por nós, por tantas outras que lutaram para permitir que estivéssemos aqui e pelas que virão, pelas que hoje se inspiram em projetos e experiências de resistência e de luta em todo o país.

Quando mulheres trans ocupam a política o espaço é ressiginificado, questiona o que culturalmente e historicamente é entendido como natural, move as estruturas desse sistema patriarcal e racista, e promove transformações.


Quem é Linda Brasil

Linda Brasil é mestra em Educação e vereadora de Aracaju pelo PSOL.

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