Arquivos Cecília Leme - Canal MyNews – Jornalismo Independente https://canalmynews.com.br/post_autor/cecilia-leme/ Nosso papel como veículo de jornalismo é ampliar o debate, dar contexto e informação de qualidade para você tomar sempre a melhor decisão. MyNews, jornalismo independente. Tue, 08 Mar 2022 15:18:55 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 Educação pode assumir um papel protagonista para parir resistência e alimentar esperança https://canalmynews.com.br/cecilia-leme/educacao-pode-assumir-um-papel-protagonista-para-parir-resistencia-e-alimentar-esperanca/ Sat, 20 Feb 2021 14:09:23 +0000 http://localhost/wpcanal/sem-categoria/educacao-pode-assumir-um-papel-protagonista-para-parir-resistencia-e-alimentar-esperanca/ Que tipo de educação necessitamos para superar os muitos problemas que afligem nosso país?

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A partir da década de 1960, acentua-se um processo de institucionalização da violência liberal conservadora no continente latino-americano, o que provocou profundas e rápidas transformações, principalmente de caráter social, político e cultural. Esse contexto favoreceu o surgimento de práticas educativas críticas com metodologias alternativas às práticas tradicionais de educação.

Os fundamentos teóricos clássicos da pedagogia e as grandes linhas educativas existentes já não conseguiam explicar a educação latino-americana, e não ofereciam subsídios para sua transformação e adequação às novas necessidades contextuais. As múltiplas realidades e os contrastes socioeconômicos gerados por políticas autoritárias e elitistas criaram um ambiente favorável para o surgimento de um processo de reconstrução teórica e de revisão metodológica da educação. O que foi nascendo desse processo recebeu diferentes denominações, como educação popular, educação libertadora, educação inclusiva ou educação social. Sem desconsiderar a pertinência de cada termo, opto por utilizar a expressão educação social, porque considero que todo processo educativo pressupõe incidência social.

Uma constante inquietude nos debates sobre a educação social está relacionada com os lugares privilegiados para a intervenção socioeducativa.  O grande desafio é o plantio de resistência e esperança em comunidades e contextos em que as pessoas não têm acesso a condições mínimas para viver dignamente, ou que já não encontram motivos para acreditar em mudanças positivas. Falar de esperança na educação é algo muito sério. Implica construir junto com pessoas e comunidades uma ética de resistência incansável e uma desobediência civil legitimada pela possibilidade de (re)construção dos tecidos sociais rompidos. E é exatamente essa a urgência da educação social: atuar em diferentes espaços e realidades, nos quais urge reconstruir esperança e vislumbrar caminhos de resistência que conduzam às necessárias mudanças sociais, econômicas e políticas.

Por isso a educação social latino-americana tem privilegiado os locus marcados pelo abandono político, a exclusão cultural e o esquecimento social. Com relação a isso, lembro-me de uma caminhada pedagógica pelas ruas de São Paulo, quando eu trabalhava como educadora social junto a crianças em situação de rua. Naquela noite, surpreendeu-me a pergunta do Marcelo, um menino de 10 anos: “tia Cecilia, que tipo de educadora é você?” Essa pergunta me fez pensar. Claro, o Marcelo não se referia às teorias e metodologias pedagógicas que aprendemos na universidade.

Enquanto eu pensava sobre isso, o menino completou a pergunta. “Não é por nada, tia, é que aqui chegam muitos tipos de educadores. Uns querem saber tudo da nossa vida e eu não gosto disso. Eu só conto coisas da minha vida para meus amigos, as pessoas em quem confio. Chegam educadores para dar sopa quente e vão embora logo. Isso é bom, principalmente quando faz muito frio, porque a sopa nos esquenta e ajuda a dormir. Chegam educadores que querem nos obrigar a louvar a Deus, esses são muito chatos. Também chegam educadores que só querem conversar com a gente. Não dão nada, não convidam para rezar, não perguntam sobre nossa vida, só ficam com a gente e sabemos que são nossos amigos”.

As palavras daquele menino ativaram em mim um processo de busca profissional que ainda não terminou. Que tipo de educadora sou eu? Que tipo de educação necessitamos para superar os muitos problemas que afligem nosso país? Aprendi com o Marcelo que tanto a educação institucional, como a educação social, aquela que acontece fora dos espaços educativos convencionais, são práticas sociais críticas, pois levam a tomar uma posição pessoal e profissional, o que Paulo Freire denominou ato comprometido. Essa perspectiva freiriana recupera o aspecto intencionalmente político e reflexivo da educação, para que se converta em uma prática-compromisso que contribui, de fato, para uma melhor vida para a humanidade e o planeta. Com isso quero reforçar que a educação pode assumir um papel protagonista para parir resistência e alimentar esperança. Também pode ser partícipe na luta pelas tão necessárias mudanças políticas que garantam justiça social, ética administrativa e acesso equitativo aos direitos fundamentais. Isso só se alcança com acesso a uma educação de qualidade, que forme pessoas pensantes e críticas, que se neguem a eleger políticos populistas, ou a conviver com a incitação da violência e da barbárie, ou a acreditar em soluções mentirosas para problemáticas humanas e sociais complexas.

Acredito na capacidade educativa de descobrir ou inventar alternativas que silenciem o monólogo impositivo de uns poucos para que se escute a melodia de diferentes vozes que dialogam, que sorriem e que cantam. Uma educação que paralise definitivamente as mãos que golpeiam e os corpos que abusam. Uma educação que promova relações e ações para a paz, que reinvente o cotidiano, a vida, a história e a própria educação.

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Pandemia mostra que é imprescindível refletir sobre a reinvenção da educação https://canalmynews.com.br/cecilia-leme/pandemia-mostra-que-e-imprescindivel-refletir-sobre-a-reinvencao-da-educacao/ Wed, 17 Feb 2021 14:33:28 +0000 http://localhost/wpcanal/sem-categoria/pandemia-mostra-que-e-imprescindivel-refletir-sobre-a-reinvencao-da-educacao/ “A educação será portadora de esperança no crítico momento histórico em que vivemos, no Brasil e no mundo”

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A pandemia provocada pela rápida transmissão e contaminação do coronavírus SARS-Cov2 vem questionando profundamente diferentes setores sociais, políticos e econômicos. Na realidade, a pandemia está tornando mais visíveis algumas crises que, de certa forma, estavam escondidas, legitimadas e justificadas. Por outro lado, a emergência sanitária, no Brasil e em todo o planeta, também está abalando fortemente as bases educativas que até então sustentavam as práticas de diferentes instituições educacionais e culturais.

A educação, como prática social, mantém uma estreita relação com os contextos políticos, econômicos, culturais e, atualmente, sanitários. Por isso, algumas ideias ou categorias relacionadas com o campo educativo ganharam holofote na atual crise da Covid-19.  Uma delas se relaciona com as reiteradas campanhas sanitárias e educativas sobre o cuidado, em diversos países.

Pandemia tem acelerado uma série de transformações e debates em relação ao futuro da educação.
Pandemia tem acelerado uma série de transformações e debates em relação ao futuro da educação. Foto: Freepik (Reprodução).

Aprendemos que o cuidado pessoal, familiar e comunitário é o caminho para prevenção da enfermidade que invadiu nossos corpos e nossa vida. Haveria que agregar a importância do cuidado social, aquele que é responsabilidade dos governantes e se materializa em políticas públicas, imprescindíveis para poupar vidas e impedir o colapso das unidades de atendimento à população.

Tais políticas deveriam implementar campanhas de prevenção da doença, passando por investimentos extraordinários no setor da saúde pública, e culminando com uma campanha de vacinação rápida e abrangente. Outra categoria medular nesses tempos pandêmicos é a resistência, que se traduz na necessidade de incorporar e suportar mudanças significativas em nossa vida pessoal, familiar e laboral, sem descompensarmos emocionalmente. Pelo menos até que cheguem as vacinas que, apesar do descaso e descrença de alguns governantes irresponsáveis, representam nossa esperança de vitória sobre o vírus.

Reinvenção da educação

Por outro lado, a pandemia também veio questionar nossas experiências de convivência, pois nos levou a um distanciamento social obrigatório, como a mais importante forma de combater a propagação do vírus e, consequentemente, da doença.

O que tudo isso tem que ver com educação? A pandemia nos levou a realizar transformações significativas na forma de ensinar e aprender. Os sistemas educativos tiveram que se adaptar e reinventar diante das muitas reviravoltas forçosas em nossos ritmos de vida e de trabalho, e na forma como nos comunicamos, convivemos, consumimos, nos locomovemos ou ficamos em casa.

Quase de um dia para outro, os centros educativos foram obrigados a implementar modalidades não presenciais de mediação pedagógica, com maior uso da internet para comunicação entre estudantes e professores. Ou pelo menos para aqueles que têm condições de acesso ao mundo tecnológico e não integram o grupo de infoexcluídos, expressão usada por Hugo Assamnn em seu livro Redes digitais e metamorfose do aprender (2005).

A pandemia obrigou a realização de ajustes nos programas e calendários, exigindo uma formação, por vezes improvisada, de educadores e gestores educativos para utilização de entornos virtuais de aprendizagem. No entanto, além das mudanças com relação à modalidade de ensino-aprendizagem, a pandemia também nos está convidando a fazer indagações mais profundas com relação aos espaços, tempos e modelos educativos.

Há aspectos e pilares educativos que não queremos delegar à parceria com as tecnologias, apesar de reconhecer que já não se pode pensar a educação sem essa parceria. As projeções afirmam que a pandemia nos obrigará a reinventar a economia, a forma de convivência entre as pessoas e com o meio ambiente, as relações entre países e alguns acordos internacionais, os vínculos empregatícios e os hábitos de consumo.

Será imprescindível, portanto, refletir também sobre a reinvenção da educação. Há quem acredite que, no período pós-pandêmico, vamos recuperar a normalidade educativa anterior, ou buscar uma nova normalidade educativa.

Sobre a nova normalidade que se anuncia para quando tivermos superado o colapso sanitário, Boaventura de Sousa Santos (2020) adverte que a pandemia da Covid-19 não representa uma crise essencialmente oposta a uma situação de normalidade anterior. Isso porque já vivíamos em um estado de crise permanente, não apenas financeira e política, mas também de organização da vida, da convivência e da sobrevivência humana e planetária. Para Santos, aquele estado permanente de crise, anterior à pandemia, não pode ser entendido como normalidade. O dia D e a hora H da educação é hoje e agora.

Pandemia mostra que é imprescindível refletir sobre a reinvenção da educação
Pandemia mostra que é imprescindível refletir sobre a reinvenção da educação.
(Foto: Pixabay)

Olhando para o futuro

O momento atual representa uma oportunidade para revisões educativas profundas, com avaliações sérias e comprometidas, nos diversos níveis da administração política e educacional. Não para forjar normalidades ou novas normalidades. Pelo contrário, a educação que vai (re)nascendo neste tempo crítico deve recusar normalidades burocráticas e decisões políticas desastrosas de pessoas inconsequentes que nada entendem de educação.

O (re)nascimento da educação precisa romper com as práticas promotoras de uniformização da aprendizagem, aquelas que desconsideram as particularidades pessoais, familiares, afetivas, cognitivas, sociais, econômicas, culturais e territoriais das pessoas e instituições envolvidas no maravilhoso processo de aprender e ensinar. 

Alguns grupos econômicos e determinadas facções políticas utilizam a educação como moeda de troca para alcançar seus interesses corporativos. É necessário lutar contra isso, para fazer da educação um território de cuidado e resistência, e um tempo/espaço para geração de aprendizagens significativas e de alternativas políticas e sociais promissoras.

Assim, a educação será portadora de esperança no crítico momento histórico em que vivemos, no Brasil e no mundo. A aprendizagem do cuidado, da resistência e da convivência nunca foram tão imprescindíveis para gerar entornos economicamente viáveis, socialmente equitativos, ecologicamente sustentáveis e culturalmente justos. Esta pode ser uma meta educativa para 2021, quando urge buscar novas aprendizagens e novos horizontes para nos reconstruir como humanidade e como planeta.

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Educação e TICs: tecnologias da informação e comunicação https://canalmynews.com.br/cecilia-leme/educacao-e-tics/ Wed, 17 Feb 2021 14:29:03 +0000 http://localhost/wpcanal/sem-categoria/educacao-e-tics/ As tecnologias da informação e comunicação revolucionaram o processo educacional

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A educação tem sido interpelada, especialmente a partir da pandemia COVID-19, a incluir as tecnologias nos processos de ensino-aprendizagem em todos os níveis do sistema educativo.

A falta de acesso ao mundo tecnológico, que afeta estudantes e professores, se apresenta como uma dificuldade. Outro obstáculo é a carência de uma formação específica e continuada que ofereça aos educadores os conhecimentos necessários para utilizar as tecnologias, sem ser engolidos por elas.

Nas últimas décadas, as chamadas TICs, tecnologias da informação e comunicação – aquelas relacionadas com informática, telecomunicações e processamento de dados – provocaram uma revolução no processo de transferência de informações, levando a uma atuação ativa e participativa das pessoas em tempo real.

Pandemia tem acelerado uma série de transformações e debates em relação ao futuro da educação
Pandemia tem acelerado uma série de transformações e debates em relação ao futuro da educação.
(Foto: Unsplash)

Essas ferramentas de mediação digital transformaram tão profundamente as sociedades modernas, que se pode dizer que vivemos em sociedades de informação, sem fronteiras geográficas e temporais para nos comunicar. Com relação à educação, as tecnologias geraram novos espaços de aprendizagem, integrando a casa e o centro educativo.

Diante disso, muitos educadores têm sentido e expressado a necessidade de atualizar sua formação para assumir os novos desafios educativos na era digital. Mais ainda em tempos de pandemia. A pesquisa A situação dos professores no Brasil durante a pandemia, desenvolvida pelo portal Nova Escola apontou que menos de um terço dos professores (32%) avalia o ensino remoto como uma experiência positiva. Dados dessa pesquisa explicam a razão de a maioria dos professores não ter uma preparação prévia para enfrentar os desafios educativos que se apresentaram com a crise sanitária.

Dos professores entrevistados, mais da metade (51,1%) relataram não ter recebido formação de suas redes ou mantenedores para o ensino remoto. Ao avaliar a experiência do ensino remoto, 33% dos professores a classificou como razoável; 30% como ruim ou péssima, 27% como boa e apenas 5% dos professores lhe atribuem nota 9 ou 10.

Como educadores, temos direito a uma formação profissional continuada que nos prepare para os desafios atuais da educação. Algumas mudanças educativas derivadas da interconectividade são evidentes e vieram para ficar, apesar da exclusão de parte da população estudantil, e da comunidade educativa em geral, do mundo tecnológico. Segundo dados da pesquisa realizada pela TIC Kids Online Brasil, publicada em junho de 2020, o Brasil tem aproximadamente 4,8 milhões de crianças e adolescentes, entre 9 e 17 anos, sem acesso à internet nos seus domicílios. Esses dados corroboram o que a pandemia vem mostrando: a exclusão digital é uma nova forma de discriminação e desigualdade social.

Qual é o papel das instituições educativas na sociedade informacional, principalmente durante a pandemia? Quais são as mudanças que as tecnologias estão provocando na maravilhosa atividade humana de ensinar e aprender?

A evidente chegada do paradigma digital em nossas vidas traz, para algumas pessoas, o temor de que a virtualidade destrua a possibilidade de encontro e diálogo, fazendo desaparecer o encanto das relações presenciais. No caso da educação, a invasão tecnológica também tem provocado temores, especialmente devido à escassa formação dos educadores, que ainda sentem dificuldade para adaptar conteúdos e metodologias para os espaços educativos virtuais.

Não há dúvida de que as aulas tradicionais, aquelas em que o conhecimento é compartilhado quase exclusivamente através da oralidade, devem transformar-se em centros de aprendizagem mediados pelos avanços tecnológicos disponíveis. Nesse sentido, o advento das tecnologias convida a uma reflexão sobre a inutilidade da memorização de conteúdos curriculares durante a aprendizagem. Em lugar de exigir resultados memorísticos, a educação precisa promover um pensamento crítico e criativo, capaz de elaborar as informações para obtenção de aprendizagens relevantes.

É óbvio que a utilização das tecnologias na educação não garante a aprendizagem, pelo contrário, continua vigente e insubstituível o papel protagonista dos educadores para realizar a mediação pedagógica. Ensinar a aprender, ensinar a pensar, ensinar a buscar informações e ensinar a elaborá-las criticamente são os principais objetivos da mediação pedagógica.

Um novo paradigma educativo que se contraponha a uma visão de mundo determinada pelos princípios de linearidade, individualismo e competição, precisa contemplar a existência de interconexões entre pessoas, sociedades e culturas. Nesse sentido, é importante compreender o mundo como uma rede de relações e contribuir para que os educandos se sintam integrados e participantes no movimento relacional planetário. Para isso, a educação deve dominar mais metodologias e novas linguagens, inclusive a linguagem das tecnologias.

Sem um investimento consistente em educação e uma real valorização do trabalho que realizam os educadores será impossível alcançar uma educação de qualidade. Pensar a educação na era da tecnologia e da comunicação, principalmente durante uma pandemia, implica superar a ideia de que a interconectividade seja apenas um meio ou uma modalidade para ensinar e aprender. Imprescindíveis, além da modalidade que dá suporte à ação educativa, são os fundamentos pedagógicos intrínsecos a ela, que têm que ver com a relacionalidade humana e com o projeto de sociedade que, teimosamente, sonhamos construir e no qual desejamos viver e conviver.

Uma real integração das tecnologias à educação só será possível através de um compromisso político sério traduzido em políticas públicas. Esse é o caminho para sustentar uma formação continuada para educadores e o redesenho da prática educativa para um mundo crescentemente comunicativo e interconectado. O que pode (re)nascer desse compromisso são perspectivas educativas atualizadas e inovadoras para acompanhar a marcha da história. E os desafios de um mundo interconectado.

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A educação é um caminho privilegiado para a pacificação da sociedade https://canalmynews.com.br/cecilia-leme/educacao-e-um-caminho-privilegiado/ Wed, 17 Feb 2021 14:28:50 +0000 http://localhost/wpcanal/sem-categoria/educacao-e-um-caminho-privilegiado/ É importante promover habitualmente uma análise de conjuntura local e global, para buscar as raízes e as causas da violência, com o objetivo de erradicá-la

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Como a educação pode contribuir para a construção de uma cultura de paz? Qual tem sido o papel da educação para superar tantas manifestações de violência, em diversos âmbitos da convivência humana? Algumas atitudes e decisões políticas no cenário brasileiro atual ensinam e promovem agressão, o que pode levar à assimilação da violência como algo normal, natural e socialmente aceitável.

Diante disso, a educação tem sido interpelada a desconstruir a violência gerada e reproduzida em diferentes espaços da convivência, como a família, a comunidade, os grupos de amizade, as redes sociais e o cenário político. Isso significa que não apenas os educandos, mas também os educadores, em algumas ocasiões, se sentem arrebatados ou aprisionados por condutas e situações violentas, sem saber como proteger-se ou como reagir.

A educação é um caminho privilegiado para a pacificação da sociedade. Foto: Green Chameleon / Unsplash

Mais do que nunca, e urgentemente, a educação tem que se posicionar. Os centros educativos, por exemplo, devem se questionar sobre o crescimento da violência dentro e fora dos espaços onde acontece a educação, tanto físicos como virtuais. Igualmente, é importante promover habitualmente uma análise de conjuntura local e global, para buscar as raízes e as causas da violência, com o objetivo de erradicá-la. Nesse exercício, é necessário envolver também as famílias, para que assumam seu papel e seu compromisso educativo para construir ambientes e relações de paz.

Sabemos que os espaços convivenciais são ambientes privilegiados para a aprendizagem. As experiências de convivência familiar, comunitária, escolar e social vão conformando uma tela biográfica, e forjando descobertas cognitivas e experiências afetivas que acompanharão os educandos por toda a vida.

Qual ou quais pedagogias podem contribuir para a construção de uma cultura de paz? Como tecer uma educação sem violência e uma educação para a não-violência? A proposta conceitual de educação para a paz, de Francisco Barahona (2008), oferece uma reflexão relevante, pois vincula o processo educativo com um processo global e social de ensino-aprendizagem para a paz. “Educar para a paz significa fundamentalmente a tentativa da criação de uma cultura onde impere a cooperação e a harmonia, que venha substituir a cultura de choque e competição na qual vivemos atualmente”.

Esse autor adverte que a educação para a paz não significa uma matéria ou disciplina que deve ser incluída no plano de estudos. Ao contrário, deve ser um conteúdo e um processo global da sociedade, através do qual as pessoas e os grupos sociais aprendem a desenvolver a totalidade de suas capacidades, atitudes, aptidões e conhecimentos. Também o educador brasileiro Antônio Carlos Gomes da Costa desenvolveu uma teoria educativa para buscar possíveis caminhos para o trabalho com adolescentes e jovens em situação de violência e causadores de violência. Essa teoria se chama “pedagogia da presença” e parte de um esforço coletivo para a construção de práticas educativas que contribuam para a recuperação desses adolescentes e jovens. Segundo Gomes da Costa, a “presença” é uma exigência constante para o desenvolvimento da personalidade e inserção social de qualquer pessoa.

Durante todo o processo vital, o ser humano deseja e necessita a presença de outras pessoas. Quando isso não acontece, ou seja, quando não existem vínculos afetivos significativos, ou quando eles são muito frágeis ou foram rompidos, a vida vai se tornando vazia de sentido e a conduta se deteriora cada vez mais, levando a posturas violentas e destrutivas. Sem dúvida, uma educação para a paz mediada pela pedagogia da presença supõe uma boa dose de empatia e altruísmo, aquelas qualidades que fazem que os seres humanos se coloquem no lugar de seus semelhantes, cooperem e sejam solidários.

A maior dificuldade dos educadores tem sido a de ensinar e promover a paz em sociedades cada vez mais violentas e, muitas vezes, benevolente com os violentos. A aposta por uma educação para a paz não significa elaborar um documento que contenha unicidade de ideias e metodologias. Cada território educativo tem conflitos e necessidades pontuais, que devem ser considerados pelos educadores, com a convicção de que educar para a paz é um desafio permanente.

Não existe caminho para a paz, a paz é o caminho”. Com essa célebre frase, Mahatma Gandhi expressou um dos seus mais importantes valores: é possível alcançar ideais sem utilizar violência. Nesse sentido, a educação é um caminho privilegiado para a pacificação da sociedade. E para as transformações sociais, econômicas e políticas necessárias para que a paz não seja um sonho distante ou inalcançável para muitas pessoas, comunidades e nações.

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Sobre educação, educadores e história https://canalmynews.com.br/cecilia-leme/sobre-educacao-educadores-e-historia/ Wed, 17 Feb 2021 14:28:34 +0000 http://localhost/wpcanal/sem-categoria/sobre-educacao-educadores-e-historia/ Cada geração presencia momentos de desenvolvimento e de dificuldade. Educar para a paz continua sendo uma obrigação

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Sou descendente de educadores e considero enriquecedor revisitar a história da educação através da história dos educadores. Minha avó e meu avô foram professores, e eu tenho um enorme orgulho disso. Ainda jovens, eles começaram a dar aulas em uma escola rural de Charqueada, uma pequena cidade no interior de São Paulo. Com o passar do tempo, decidiram mudar-se para a capital, para que os filhos tivessem acesso a outros ambientes educativos. Mas eles continuaram lecionando, dando aulas e exemplos para muitas gerações de crianças.

Sempre me lembro deles com reverência e imagino como terá sido sua prática educativa de muitos anos atrás. Tenho irmãos e primos com uma memória aguçada. Eles se lembram, com precisão, dos nomes de nossos antepassados, sua posição na árvore genealógica, datas e acontecimentos, os mais marcantes e aqueles que poucos sabiam que tinham acontecido.

Minha contribuição para recuperação das histórias familiares é mais modesta. Através de um exercício imaginativo do trabalho de meus avós como professores, tento fazer uma adaptação no tempo, para ver se encontro algumas respostas para os muitos desafios educativos da atualidade. Uma leitura histórica simplista, saudosista e, talvez, um pouco pessimista, levaria à afirmação de que as décadas ou os séculos passados eram mais favoráveis para viver e educar.  Será mesmo? Meus avós passaram por períodos históricos muito conturbados, como as duas grandes guerras, nas décadas de 1910 e 1940, com graves consequências para a vida das pessoas e países ao redor do mundo. Eles também foram educadores no período da gripe espanhola, que surgiu em 1918. A estimativa é que essa pandemia matou entre 20 a 50 milhões de pessoas. Outra pandemia que eles assistiram e enfrentaram é a que começou em 1957, ocasionada pelo vírus da gripe A (H2N2), de procedência aviária, com um milhão de mortos em todo o mundo.

Durante o período em que meus avós foram educadores, também houve acontecimentos marcantes no Brasil. De revoltas e golpes de Estado à regulamentação do voto feminino, da consolidação das leis do trabalho ao aparecimento da Bossa Nova, só para citar alguns exemplos. Por outro lado, a educação brasileira, nas primeiras décadas do século XX, esteve preocupada com a especialização da mão-de-obra. Na década de 1930, promoveram-se ações para intensificar a escolarização dos brasileiros, e foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública.

Na América Latina, algumas pedagogias que surgiram no século passado são herdeiras de um pensamento crítico anticolonial e reconhecem a função socialmente crucial da educação para os povos latino-americanos. Tais pedagogias não priorizam a especulação predominantemente teórica, são pedagogias práticas que buscam caminhos educativos facilitadores da relação entre educandos e seus contextos, e entre educandos e o conhecimento.

Cada período histórico registra dificuldades, superação e prosperidade. As principais mudanças durante as primeiras décadas do século XX ocorreram, em parte, como consequência da primeira grande guerra e da pandemia da gripe espanhola. Assim, meus avós, como educadores daquela época, presenciaram acontecimentos históricos que desencadearam um desenvolvimento nacional e mundial importante, mas também vivenciaram períodos de dificuldade. Isso me faz pensar que ensinar a enfrentar os desafios pessoais e históricos continua sendo uma exigência educativa. Por outro lado, sobram modelos políticos violentos, ditatoriais, cruéis e sanguinários ao longo da história.

No século XX, o nazismo, o fascismo, o salazarismo, a invasão de países, os golpes de Estado e a submissão de povos e culturas, por exemplo, nos envergonham como humanidade. Educar para a paz continua sendo uma obrigação. Ainda mais quando alguns governantes atuais, que deveriam dar exemplo de pacificação e unidade, promovem o armamento da população e apoiam a violência e a barbárie. A educação para a paz, nesses contextos, é uma rebeldia necessária, para que nossos meninos e meninas aprendam que existem formas pacíficas para resolver conflitos.

Meus avós também me deixaram o exemplo de que a educação não deve significar sacrifício, dor e sofrimento. Meu avô e minha avó trabalhavam em períodos alternados para dar conta de sua vida profissional e dos compromissos com a casa e os filhos. Eles deixaram um legado educativo importante, traduzido em amor ao ensino, respeito pelos estudantes, compromisso com as instituições educacionais, luta por melhor educação e profissionalismo feminino, já naquele tempo. É mais difícil educar hoje em dia? Será que nossas crianças e nossos jovens são mais rebeldes? Não creio. O que venho constatando é que as crianças e os jovens da atualidade nos estão indicando novas necessidades educativas, para responder aos desafios e exigências de um mundo em constante e rápida transformação.

Um lindo poema de Thomas Eliot diz: Não cessaremos a exploração. O fim de toda nossa busca será chegarmos aonde começamos e ver o lugar pela primeira vez. A exploração e a busca são características inerentes ao maravilhoso trabalho dos educadores. Podemos nos lembrar de uma infinidade deles, não apenas os que têm seu nome registrado na história oficial. É importante recordar, isto é, trazer ao coração a história e o exemplo de educadores e educadoras que nos marcaram e nos ajudaram a ser quem somos.

Em minha história familiar, o exemplo de meus avós me inspira a cada dia e me fortalece sempre. E me faz acreditar que as dificuldades da atualidade, grandes e desafiadoras, não têm o poder de paralisar os sonhos educativos, nem de destruir os caminhos que nos levam a buscar, a explorar e a forjar melhores tempos. Para nossa geração e para aquelas que estão chegando.

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É preciso reinstalar o caráter utópico da educação https://canalmynews.com.br/cecilia-leme/e-preciso-reinstalar-o-carater-utopico-da-educacao/ Wed, 17 Feb 2021 14:20:18 +0000 http://localhost/wpcanal/sem-categoria/e-preciso-reinstalar-o-carater-utopico-da-educacao/ Em um mundo tecnicamente fragmentado, a tarefa educativa de fomentar processos integradores e não aceitar reducionismos é essencial

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Educar não é uma tarefa simples, pelo contrário, exige constante preparação profissional e convicção de que as transformações pessoais e sociais, apesar de difíceis e desafiadoras, são possíveis. Essa convicção se alimenta de uma perspectiva da educação como processo, caminho, obra de arte que vai se construindo e aperfeiçoando pouco a pouco.

Como educadora, alguns questionamentos me acompanham sempre. O que me motiva a permanecer na educação? O que obstaculiza uma inserção educativa mais acertada? Qual modelo político-pedagógico nutre minhas reflexões e práticas? Como enfrento o descaso político que ameaça destruir pilares educativos essenciais?

Educação é como uma obra de arte que vai se construindo e aperfeiçoando pouco a pouco.
Educação é como uma obra de arte que vai se construindo e aperfeiçoando pouco a pouco. Foto: Pixnio (Reprodução).

Por outro lado, também existem desafios educativos relacionados aos educandos, tanto no espaço escolar institucional, presencial ou virtual, como nos outros espaços onde acontece a educação. Como motivar e entusiasmar os educandos para a aventura da aprendizagem? Como educar no respeito às diversidades? Como fazer dos espaços educativos lugares de verdadeiro desenvolvimento cognitivo e ressignificação socioafetiva?

Para educar é fundamental colocar-se em uma atitude permanente de escuta e interrogação. As perguntas educativas não representam insegurança, pelo contrário, significam humildade pedagógica, postura imprescindível na tarefa de educar. O intercâmbio de saberes também se apresenta como uma característica educativa necessária, pois convida os educadores a se reconhecerem como aprendentes também. Isso faz da educação e do ato de educar um espaço/tempo de constante formação e qualificação.

Nunca estaremos suficientemente preparados enquanto educadores, sempre há algo que aprender e algo que desaprender. Uma ameaça atual para a educação tem sido a prevalência do funcionalismo nas instituições educativas, levando à supervalorização da técnica, da instrumentalização e das aprendizagens utilitaristas.

Muitas vezes, os centros educativos são obrigados a priorizar a preparação técnica para as exigências do mercado, deixando de estimular uma formação integral que eduque as pessoas para a vida e seus desafios. A instrumentalização educativa pode levar a uma inércia cultural e à negação da contribuição das humanidades e dos avanços da ciência para o desenvolvimento humano.

Na atual situação pandêmica, sobram vozes desatinadas e posturas políticas mal intencionadas que colocam em dúvida evidências científicas. Com isso, propostas sérias para o enfrentamento e a superação da crise sanitária são ridicularizadas e desprezadas. As desastrosas consequências desse negacionismo são evidentes e mancham de sangue nossa historia contemporânea.

Exemplo disso é o atraso para iniciar o processo de vacinação contra a Covid-19 no Brasil, o que tem provocado uma justificada indignação social. A negação dos avanços da ciência e o silenciamento das campanhas educativas para prevenção da contaminação viral são atos perversos. Outra ameaça à educação é o crescimento de uma perspectiva cultural que determina uma maneira de ser idolátrica e fragmentada. Essa perspectiva leva o ser humano a limitar-se ao seu próprio conceito e ao de seu grupo de pertencimento, o que pode desencadear um apego acrítico a instituições e modelos que oferecem uma ilusória estabilidade.

Tal postura gera e alimenta diferentes tipos de fundamentalismo, como religioso, político, cultural e de opinião. A hegemonia do pensamento único promove intolerância e discriminação contra as diversidades que nos conformam e nos enriquecem como coletividade. Igualmente, são vários os riscos pessoais que ameaçam a prática educativa e se convertem em desafios. Entre eles, podemos destacar a apatia, o desânimo, a prepotência, a impotência diante das dificuldades, o ativismo irreflexivo e o fatalismo que imobiliza e impede transformações.

Atualmente, a obrigatoriedade do distanciamento social, devido à pandemia, desencadeou um desafio educativo enorme em diversos países: descobrir quando e como iniciar o retorno às escolas, sem colocar em risco a saúde de estudantes, professores e equipes administrativas. Injusto seria responsabilizar os educadores pelos possíveis problemas, atrasos ou defasagens na aprendizagem durante a pandemia. Uma conversação aberta, séria e profissional, envolvendo educadores, gestores educativos, secretarias e ministério da educação é o caminho para buscar respostas para essa situação.

Os desafios não devem paralisar os educadores. Pelo contrário, muitas são as possibilidades que oferece a educação na atualidade. Em um mundo tecnicamente fragmentado, a tarefa educativa de fomentar processos integradores e não aceitar reducionismos é essencial. O desencanto e a insatisfação das pessoas, ou a descrença em transformações sociais e políticas positivas, podem se converter em oportunidade para novos pensamentos e renovadas metodologias educacionais.

É impostergável reinstalar o caráter utópico da educação, aquele que reconhece que a ação educativa, ainda que tenha limites, se alimenta de esperança e contribui para a formação e o crescimento das pessoas. Para que sejam o que ainda não são, mas que podem vir a ser. E para a geração de relacionalidades saudáveis, nos diversos espaços da convivência humana e planetária.

Todo país que almeje um verdadeiro desenvolvimento para seu povo e a superação das crises que impactam a atualidade precisa reconhecer a importância do trabalho dos educadores. Aqueles profissionais que, cotidianamente, assumem o maravilhoso desafio de motivar e acompanhar outras pessoas em suas aprendizagens.

A valorização da educação, através do reconhecimento dos educadores e a implementação de políticas públicas condizentes, não pode ficar para amanhã. Esse é o caminho para que a educação responda satisfatoriamente à sua vocação ético-política, de vislumbrar novos horizontes pessoais, sociais, políticos e econômicos. Horizontes possíveis, necessários e alcançáveis.

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Crianças, olhares e educação: por que me tornei educadora https://canalmynews.com.br/cecilia-leme/criancas-olhares-e-educacao-por-que-me-tornei-educadora/ Sat, 09 Jan 2021 14:01:46 +0000 http://localhost/wpcanal/sem-categoria/criancas-olhares-e-educacao-por-que-me-tornei-educadora/ Acredito na educação porque acredito na capacidade humana de crescer e de se transformar

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Educação é um elemento fundamental para o pleno desenvolvimento do ser humano
Educação é um elemento fundamental para o pleno desenvolvimento do ser humano.
(Foto: Unsplash)

Minha decisão por ser educadora nasceu de uma indignação, misturada com certa dose de querer transformar o mundo. Essa foi a motivação primeira para iniciar o caminho educativo que é minha grande paixão. Acredito na educação porque acredito na capacidade humana de crescer e de se transformar.

Tive o privilégio de acompanhar pessoas e compartilhar seus processos de crescimento e de superação, quando ninguém acreditava que isso fosse possível. A indignação que me levou a ser educadora nasceu nas ruas do centro de São Paulo, faz alguns anos.

Nas minhas andanças por essa região me deparei com grupos de meninos e meninas que viviam na rua. O que mais me indignou, além de um cenário urbano que os incorporava e, de certa forma, os ignorava, foi o tamanho da tristeza que observei no olhar de cada uma daquelas crianças. Um olhar sem brilho, sem esperança, sem colorido. Um olhar sem direção.

Não tenho dúvida de que minha vocação educativa nasceu nesse encontro de olhares. Abandonei o curso de Direito pela metade e abracei a Pedagogia com um entusiasmo enorme, daqueles que alimentam o sonho dos jovens de transformar o mundo. Junto com outras pessoas igualmente indignadas, me aventurei no caminho da educação pelas ruas de São Paulo.

Vários acontecimentos, conversas e encontros com aquelas crianças me alimentam e me iluminam até hoje. Sempre me lembro com ternura da Sandrinha, e me pergunto por onde andará e se estará feliz. Numa noite fria, ela correu para sentar-se perto de mim na Praça da Sé. Abriu um pacote e me ofereceu um pedaço de pão, que era tudo o que tinha para jantar. Depois de um tempo, ela me deu outro pedaço e disse: “tia Cecília, leva para sua casa, para seu café da manhã”. Aquele pão era tudo o que a Sandrinha tinha para comer e por isso essa partilha me comoveu imensamente e me ensinou que a educação acontece no encontro, no olhar, na empatia.

A realidade que encontrei nas ruas e as experiências de educação social que vivenciei confirmam que as crises políticas e econômicas recaem sobre a infância de forma desastrosa. Os altos índices de violência doméstica e violência sexual contra crianças e adolescentes, a falta de políticas públicas que garantam suficientes investimentos em saúde, emprego, educação, moradia, lazer, cultura e outros setores, rouba o brilho do olhar das crianças e deveria causar vergonha social. Não só no Brasil, mas também em outros países da América Latina e de outros continentes.

O relatório do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF, 2017), Um rosto familiar: a violência na vida de crianças e adolescentes, apresenta uma análise detalhada das mais variadas formas de violência que sofrem meninas e meninos em todo o mundo. Destacam-se a violência disciplinar e a violência doméstica na primeira infância, a violência na escola, incluindo bullying, a violência sexual e mortes violentas.

O mesmo relatório também indica que, para alguns tipos de violência, a exposição e o risco têm um componente geográfico, ou seja, a violência tem relação com o território. Por exemplo, quase metade dos homicídios de adolescentes ocorre na América Latina e no Caribe, embora a região represente um pouco menos de 10% da população mundial de adolescentes.

Por outro lado, o Relatório de Status Global sobre Prevenção da Violência contra Crianças 2020, publicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), UNICEF e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), indica que metade das crianças do mundo, a cada ano, é vítima de violência física, sexual ou psicológica, sofrendo ferimentos, incapacidades e morte. O relatório adverte que isso acontece porque os países não seguem os protocolos necessários para proteger a infância.

Esses dados são, no mínimo, alarmantes para a educação, pois quando existe violência, inexistem processos educativos de qualidade. A indignação que me levou a ser educadora me deu de presente o encontro com crianças que sofrem. E elas me devolveram a certeza de que a contribuição educativa para superação das assustadoras crises que nos afetam como humanidade e como planeta é essencial, necessária e urgente.

Por isso continuo sendo educadora, já não pelas ruas de São Paulo, mas como professora na Universidade Nacional, na Costa Rica. Sou eternamente grata àqueles meninos e meninas que me questionaram e me desinstalaram. Eles ainda me ajudam a continuar indignada e a entender que nosso mundo se empobrece muito e se brutaliza cada vez que se ofusca o brilho no olhar de uma criança.

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