Tiago Leifert fez um alerta sobre a doença após sua filha de 1 ano ter sido diagnosticada. Apesar de silencioso, esse tipo de câncer é altamente curável; oncopediatra alerta para a falta de acompanhamento oftalmológico nos primeiros anos de vida
por Julia Melo em 31/01/22 10:20
“Uma coisa começou a nos incomodar […] que é saber tudo que a gente sabe hoje e não dividir com você que está nos assistindo”: foi com essa frase que o jornalista Tiago Leifert explicou o motivo de vir a público contar que a filha Lua, de um ano, está com um tumor. Neste sábado, ele e a esposa, a jornalista Daiana Garbin, contaram através de um vídeo no Instagram como diagnosticaram que Lua tem retinoblastoma. O câncer é bastante raro e acomete os olhos.
Tiago Leifert foi o primeiro a identificar que algo estava diferente na visão da criança: “o Tiago começou a perceber um movimento estranho no olhinho da Lua”, afirmou Daiana Garbin. Leifert descreve como “movimentos irregulares” e que a criança olhava “de lado” para conseguir enxergar. Em outubro de 2021 veio o diagnóstico do retinoblastoma nos dois olhos de Lua.
Diante da raridade desse tipo de câncer, o casal mudou a ideia inicial de manter o diagnóstico e o tratamento privados. “Se a gente conseguir que um casal leve uma criança [a um médico] antes do que a gente conseguiu, missão cumprida”, afirmou Leifert no vídeo.
Segundo o casal, Lua está bem e teve quatro sessões de quimioterapia até o momento. Após aparição da filha no vídeo, Tiago Leifert explicou que ela não apresenta fisicamente as consequências mais comuns do tratamento pelo tipo da quimioterapia que está sendo feita.
Para saber mais sobre a doença e aprofundar o alerta feito pelo casal, o MyNews conversou com a oncologista pediátrica Viviane Sonaglio, coordenadora do setor de Oncologia da Rede D’or São Luiz de São Paulo.
O que é retinoblastoma?
Retinoblastoma é um câncer que surge na retina, dentro do globo ocular. Segundo a médica Viviane Sonaglio, ele representa cerca de 2 a 3% de todos os cânceres infantis no mundo. “A idade média de acometimento é entre 18 meses e 2 anos, onde temos o maior número de diagnósticos. A grande maioria dos casos acontece até os 5 anos de idade, raramente após 6 anos”, afirma Sonaglio.
Apesar de não ser a maioria dos casos, o retinoblastoma também acontece por fator hereditário. A oncopediatra explica que a influência da questão genética é vista somente em 25% dos casos. “A criança herda uma alteração genética dos pais, nem sempre os pais têm a doença. Geralmente eles eram portadores da mutação e passam para a criança, que desenvolve o câncer. O retinoblastoma pode acometer um olho ou ser bilateral. Normalmente os casos esporádicos são unilaterais e os hereditários acometem os dois olhos”, explica a oncopediatra.
Quais os sinais?
O sinal mais evidente do retinoblastoma é a leucocoria, quando a pupila não tem a coloração natural e passa a refletir uma mancha branca. Esse foi um dos indícios que chamou a atenção de Tiago Leifert: ele e a esposa mencionam, no vídeo, um reflexo como “olho de gato”. Viviane Sonaglio explica o que causa a coloração incomum: “quando você tira uma foto da criança [com flash] ou a luz bate, você vê na pupila – aquela bolinha preta do olho – um reflexo mais avermelhado. A retina, que está atrás, é muito vascularizada, é cheia de veias. Então o reflexo é avermelhado. Quando você tem um tumor dentro do olho, ele desloca essa retina e o que você vê é o reflexo da presença do tumor, uma lesão branca”.
Estrabismo e desvio na direção em que a criança olha também são sinais, mas nenhum desses configura diagnóstico. É necessário procurar um médico – de preferência oftalmologista – para ter uma avaliação profissional.
Como é feito o diagnóstico?
O teste do olhinho que é feito nas maternidades, assim que a criança nasce, pode detectar o problema. Mas Viviane Sonaglio diz que, geralmente, a doença se desenvolve após o nascimento. O comum numa investigação para saber se há ou não retinoblastoma é realizar o exame de fundo de olho. A ressonância magnética também é feita para saber a extensão do câncer. A oncologista pediátrica afirma que também há casos em que o tumor chega ao cérebro.
É o momento do diagnóstico que vai influenciar não só na vida da criança, como também na manutenção da visão. Segundo Viviane Sonaglio, “tempo é igual vida”.
“Quanto mais precoce o diagnóstico, menor é a lesão. No retinoblastoma você tem o tempo contra, porque é uma lesão pequena e que cresce até acometer todo o globo ocular, muitas vezes se estende para fora do olho, nos tecidos adjacentes, dentro do cérebro”, alerta a oncopediatra.
Consultas ao oftalmologista não são parte da rotina pediátrica e isso é um fator que dificulta a detecção precoce do retinoblastoma. “Deveria estar, dentro da rotina da avaliação pediátrica, uma avaliação oftalmológica da criança entre seis meses e 1 ano”, defende Sonaglio.
A médica conta que um acompanhamento oftalmológico nos primeiros anos de vida acontece em casos em que se sabe de um histórico de retinoblastoma na família.
Como funciona o tratamento?
O tratamento pode ser feito através de radioterapia, laserterapia e quimioterapia. E existe a quimioterapia intra arterial, citada por Leifert como a que está sendo utilizada por Lua e que de acordo com Sonaglio, apresenta bons resultados. Neste tipo de quimio, um cateter vai até o olho e aplica as substâncias necessárias na região afetada pelo tumor, o que evita danos colaterais em outras partes do corpo. Essa forma menos agressiva é bastante benéfica para as crianças.
O retinoblastoma é um câncer altamente curável quando diagnosticado precocemente: chega a um índice de mais de 95% de cura com chances altíssimas de preservação da visão. A oncologista pediátrica Viviane Sonaglio ressalta que, no Brasil, há muitos centros de referência para o tratamento do tumor e que atendem pelo Sistema Único de Saúde. Entre eles, o Grupo de Apoio Ao Adolescente e à Criança com Câncer (Graacc), hospital paulista que foi citado por Tiago Leifert.
O acompanhamento da criança não acaba com a cura do câncer. Deve permanecer anos depois, para que, caso apareça qualquer efeito negativo do tratamento, seja rapidamente identificado.
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