Primeira escritora negra a receber o Nobel, Toni Morrison tem sua obra editada pela Companhia das Letras, que dá 30% de desconto para os membros do My News até o final de agosto.
por Myrian Clark em 04/08/22 20:33
“O Olho Mais Azul”, livro de 1970, é o primeiro romance de Toni Morrison, escritora norte-americana, e primeira mulher negra a receber o Nobel de literatura. O livro fala do racismo e de como aceitar a sua identidade num mundo que parece não ter sido feito para você. Ninguém vira a última página deste livro sendo a mesma pessoa antes da leitura. Morrison aborda, de forma bem clara e cirúrgica, como era ser negro nos Estados Unidos da década de 1940, época na qual as leis de segregação racial, conhecidas como leis Jim Crow, ainda eram vigentes e o país vivia o período após a Grande Depressão. O texto nos faz refletir sobre o racismo estrutural em diversos lugares e épocas. Inclusive a que estamos vivendo agora.
Todas as noites Pecola Breedlove, de 11 anos, reza e pede a Deus para ter olhos azuis. Na escola, ela sofre bulling dos colegas por ter a pele negra e cabelo crespo. Os professores e demais adultos com quem ela convive são negligentes e também a maltratam. Na história acompanhamos o crescimento de Pecola, a protagonista, e de Claudia Mac Teer, uma das narradoras. Enquanto Pecola quer ser branca e loira como a atriz mirim Shirley Temple, Claudi destroi a boneca branca que ganhou de Natal.
Pecola sofre todo tipo de violência e desperta a nossa compaixão. Sonha com o dia em que teria olhos claros e seria então considerada e amada. A história se passa na cidade natal de Toni Morrison, Lorain, no estado de Ohio. Três gerações de uma família negra norte-americana são retratadas, mas o foco é na infância, no racismo, na desigualdade social e nas marcas deixadas por estas chagas da sociedade. A linguagem e as cenas violentas da obra fizeram com que este livro sofresse ameaças de censura e fosse banido de algumas escolas dos Estados Unidos.
A narrativa é não-linear, desenvolvendo tanto a memória de Cláudia adulta, refletindo sobre o passado, como a crescente loucura de Pecola. Há ainda um narrador oculto que relata o passado de alguns personagens secundários. O livro é dividido em quatro partes, nomeadas de acordo com as estaçoes, cada uma com seus capítulos e cenas.
Apesar do texto primoroso, “O olho mais azul” não é um livro fácil. É triste. Toca nas nossas feridas enquanto sociedade. Mas é também inspirador e necessário. Uma ferramenta importante para escancarar as realidades racistas e, quem sabe, nos ajudar a alcançar uma convivência mais empática, consciente, justa e igualitária.
“É sempre preciso ler e reler os livros de Toni Morrison. Todos eles são transcendentais. Você vai me agradecer depois da leitura.” — Barack Obama
“Impossível terminar de ler este livro sem questionar os padrões de beleza e os riscos que a sociedade impõe às jovens.” — The Guardian”
A autora ganhou o Pulitzer em 1988 por sua obra “Amada” e recebeu o Prêmio Nobel de Literatura em 1993, sendo a primeira, e até o momento única, mulher negra laureada na categoria. Seu romance de estreia, O olho mais azul, foi publicado originalmente em 1970. Toni teria completado 89 anos em fevereiro de 2019. Por ocasião de seu falecimento, Fran Lebowitz, também escritora, a descreveu para a The Paris Review, proeminente revista americana no meio intelectual, como “um enorme ser humano. Conheci muitas pessoas inteligentes na minha vida, mas Toni era a mais sábia”. Em 2019, O olho mais azul ganhou uma nova edição da Companhia das Letras e foi também editado pela Tag Curadoria, por indicação de Djamila Ribeiro.
“Entraram devagar na vida pela porta dos fundos. Transformaram-se. Todo mundo podia lhes dar ordens. As mulheres brancas diziam ‘Faça isso’. As crianças brancas diziam ‘Me dá aquilo’. Os homens brancos diziam ‘Venha cá’. Os homens negros diziam ‘Deita’. As únicas pessoas de quem não precisavam receber ordens eram as crianças e as outras mulheres negras. Mas elas pegaram tudo isso e recriaram à sua própria imagem. Administravam a casa dos brancos, e sabiam disso. Quando os brancos espancavam os seus homens, elas limpavam o sangue e iam para casa receber os maus-tratos da vítima. Batiam nos filhos com uma mão e com a outra roubavam para eles. As mãos que cortavam árvores também cortavam cordões umbilicais; as mãos que torciam o pescoço de galinhas e abatiam porcos também cuidavam de violetas africanas até que florissem; os braços que carregavam feixes, fardos e sacos também embalavam bebês. Elas moldavam biscoitos farinhentos em ovais de inocência — e amortalhavam os mortos. Aravam o dia inteiro e iam para casa se aninhar sob os membros de seus homens. As pernas que cavalgavam o dorso de uma mula eram as mesmas que cavalgavam os quadris de seus homens. E a diferença era toda diferença do mundo.” (p. 145)
“O amor nunca é melhor que o amante. Quem é mau, ama com maldade, o violento ama com violência, o fraco ama com fraqueza, gente estúpida ama com estupidez, e o amor de um homem livre nunca é seguro. Não há dádiva para o ser amado. Só o amante possui a dádiva do amor. O ser amado é espoliado, neutralizado, congelado no fulgor do olho interior do amante.” (p. 212)
“Imaginou como seria o amor. Como é que os adultos agem quando se amam? Comem peixe juntos? Veio-lhe aos olhos a imagem de Cholly e da sra. Breedlove na cama. Ele fazendo ruídos como se sentisse dor, como se alguma coisa o segurasse pela garganta e não soltasse. Terríveis como eram, esses sons só não eram tão maus quanto a ausência de som da mãe. Era como se ela nem estivesse lá. Talvez o amor fosse aquilo. Sons estrangulados e silêncio.” (p. 67)
Dia 30/08, terça-feira
às 19h30 live no youtube para membros com a jornalista, curadora e pesquisadora de literatura de mulheres negras, Juliane Sousa. Formada em Letras pela Universidade Federal de São Paulo, trabalha com ações de incentivo à leitura de obras de autoras negras no projeto Mulheres Negras na Biblioteca.
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