Compliance é muito mais que um conjunto de documentos com o objetivo de mitigar riscos anticorrupção
por Bernardo Viana em 11/01/21 12:14
A correlação entre programa de compliance e governança corporativa não é novidade: a maior parte dos índices de ESG [sigla usada para se referir às melhores práticas ambientais, sociais e de governança de um negócio], mesmo não adotando metodologias equivalentes, contabilizam compliance em suas métricas de governança. O primeiro e um dos mais importantes índices de ESG, o MSCI KLD 400, considera eventos de suborno e fraudes como controversies para fins de análise e rating. Como outro exemplo importante, companhias com pontuação baixa no Pacto Global das Nações Unidas, que inclui compromissos anticorrupção, não são elegíveis para o S&P 500 ESG.
Não à toa, 65,7% dos investidores institucionais consideram medidas anticorrupção como fator de análise e preocupação de ESG no momento de alocar recursos e gerir seus portfólios.
O valor agregado está evidente. Compliance está presente, de uma forma ou de outra, nas principais metodologias de análise de ESG e no sucesso de uma companhia.
Como advogados especialistas em compliance, não era frequente escutarmos as palavras “eficiência” e “governança” associadas à nossa prática e nosso dia-a-dia. Especialmente no Brasil, onde as sociedades empresárias tiveram um despertar recente para riscos anticorrupção, adotar e desenvolver um programa de compliance muitas vezes era entendido como sinônimo de custo e aumento na burocracia corporativa.
Contudo, o excesso de documentos não equivale a um programa de compliance efetivo. Comecemos pelo nosso Decreto Federal nº 8.420/2015, que regulamentou a Lei Anticorrupção: um programa de compliance será considerado para fins de redução de sanções na medida de sua efetividade. A necessidade de efetiva aplicação das políticas que compõem o programa transcende o exigido no Brasil, pois também está presente nas diretrizes do DOJ, da OFAC, do Ministério de Justiça britânico, AFA, e outros.
Compliance, portanto, é muito mais que um conjunto de documentos com o objetivo de mitigar riscos anticorrupção. Um programa de compliance eficiente deve se incorporar à governança da companhia e buscar agregar valor aos fluxos e processos de análise internos.
Isso se reflete especialmente (i) na adoção de critérios claros de definição de competência e alçada para análises e aprovações, bem como de prestação de contas; (ii) na existência de ferramentas disponíveis para execução das ações necessárias, com agilidade e registro; (iii) em protocolos e treinamentos para gerenciamento de crises; e (iv) e, ainda, de interlocução constante da área de compliance com o conselho de administração e diretoria.
Os pontos acima envolvem o diálogo com a área de compliance para preparação de regimentos internos, políticas de delegação de autoridade, fluxos financeiros, definição de instâncias internas, além de também na utilização de ferramentas para agilidade e registro.
Ocorre que a pandemia de Covid-19 não só trouxe dificuldades operacionais apenas para as atividades-fim das sociedades empresárias, mas também para a boa gestão de programas de compliance. Enquanto alguns grupos, infelizmente, deixaram de implementar parte de suas políticas, ou tiveram que retardar melhoramentos, outros conseguiram navegar pelos desafios externos com sucesso de maneira eficiente. Ou seja, a pandemia acabou sendo um perfeito exemplo aos (anteriormente) céticos de como uma visão integrada do programa de compliance com boas práticas de governança corporativa é positiva.
As áreas de compliance que se preocuparam em ter estruturas claras de aprovação e prestação de contas, e contaram com mecanismos ágeis e confiáveis, conseguiram passar de maneira mais suave pela pandemia e puderam contar com maior apoio das áreas operacionais. As que, ao contrário, tiveram um foco maior apenas na formalização dos componentes do programa, tiveram dificuldade em aplicá-lo devido ao seu isolamento.
Importante lembrar que os reguladores, apesar de não se fazerem surdos às limitações impostas pela pandemia, têm analisado as circunstâncias de cada caso para confirmar se o impacto poderia ter sido evitado.
Os bons exemplos recentes demonstraram que a gestão de crise começa, na verdade, em sua antecipação e na pré-existência de uma estrutura que permite o registro adequado e a tomada de decisões de maneira clara e rápida.
Muito além de mitigação de uma categoria de riscos (em especial anticorrupção), compliance deve aliar-se às boas práticas de governança corporativa implementadas nas companhias. É o momento de demonstrar que programas bem implementados geram valor à gestão, como mostramos acima de maneira breve, e também para avaliação de mercado e recepção de investimentos.
Bernardo Viana é sócio da área de Compliance e Governança Corporativa do Almeida Advogados. É professor na Fundação de Getúlio Vargas – FGV e na Legal, Ethics & Compliance – LEC
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