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Economia

FUTURO DO TRABALHO

Retomada da economia no pós-pandemia pode favorecer troca de emprego

Brasil deve demorar a se recuperar e precisa investir em políticas econômicas para gerar empregos

por Juliana Cavalcanti em 14/08/21 08:04

Após um ano e meio de pandemia do novo coronavírus um fenômeno muito visto após crises financeiras está se repetindo, especialmente nos países mais avançados na vacinação da população: pedidos de demissão e mudança de emprego. O fenômeno tem sido registrado em países como os Estados Unidos – onde 7,5 milhões de pessoas saíram de seus trabalhos e buscaram outras oportunidades no mercado no período de dois meses. A explicação passa por uma leve recuperação da atividade econômica, com busca de profissionais qualificados por parte das empresas, e também por uma nova forma de vivenciar o tempo do trabalho após vários meses de quarentena, trabalho remoto e incertezas.

Fim da pandemia deve favorecer troca de emprego
Fim da pandemia deve favorecer troca de emprego e mudança no mercado de trabalho/Foto: Pixabay

A análise é do professor adjunto da Universidade de Nova York, especializado na área do trabalho, Cláudio Garcia. “É um padrão comum depois de crises. Um período de recuperação onde as pessoas que não foram demitidas tentam manter o emprego, num momento de recessão, e logo depois que o mercado retoma, aquece rápido, e as empresas vão atrás de quem tem as competências que o mercado precisa e isso propicia a mudança de emprego. Está acontecendo agora de novo na pandemia, mas com um volume muito maior”, explica.

Segundo Garcia, muitas pessoas têm reavaliado as formas de trabalhar e as horas trabalhadas. Especialmente as mulheres, entre elas, em especial, as que têm filhos, têm uma carga extra entre três a seis horas a mais de trabalho que os homens. “A pandemia estressou o que já existia. A Organização Mundial de Saúde já falava que existia a questão do stress nas empresas e as pessoas estão procurando opções que sejam mais saudáveis para elas”, considera o professor, para quem as organizações aprenderam a se adaptar ao trabalho remoto sob pressão da necessidade.

Não é possível dizer, entretanto, que essa adaptação vista durante a pandemia do covid-19 se manterá no futuro, pois algumas atividades demandam o trabalho presencial e muitas empresas que num primeiro momento anunciaram um esquema laboral totalmente remoto, agora já reavaliam a necessidade de os funcionários retornarem à rotina presencial.

Brasil deve demorar a se recuperar e precisa investir em políticas econômicas para gerar empregos

No caso do Brasil, onde o número de desempregados alcançou 15 milhões de pessoas, segundo o Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – a maior taxa desde o início da série histórica da pesquisa – a situação deve demorar a se recuperar. Pesam neste cenário o avanço lento da vacinação contra o covid-19 no país e a deficiência na qualificação profissional dos trabalhadores – que em tempos de crise, ficam ainda mais expostos à precarização do trabalho.

“O Brasil é muito vulnerável a essa realidade que está acontecendo. Se o Brasil conseguir vacinar, as empresas vão atrás de profissionais que estão capacitados. Como o Brasil tem problemas sérios sérios na educação, não consegue formar [profissionais] na velocidade que deveria. Tem um ‘gap’ muito grande de quem é capaz de assumir aquela função também”, considera o professor Cláudio Garcia.

Ele aponta ainda uma questão adicional do país – que precisa ser enfrentada para que haja a recuperação do emprego e da renda: são necessárias políticas econômicas que privilegiem uma visão social. “Infelizmente não é só um problema do Brasil, é uma situação global. O investimento na produção só tem decrescido e há uma financeirização das empresas produtivas, que usam esse dinheiro para especular e aumentar o valor de mercado delas. Esse processo tem provocado uma divisão enorme entre os poucos muito ricos e o restante da população”, aponta Garcia, lembrando que nos Estados Unidos tem acontecido um reajuste dos salários dos 10% mais ricos e nenhum reajuste para a maioria dos trabalhadores.

Essa tendência, que na prática aumenta a desigualdade social, tem inclusive um termo que não deveria ser motivo de orgulho para o Brasil: “brasilianization” – numa referência a uma divisão de classes muito evidente. “Uma classe rica que fica mais rica e quem paga o ônus é a classe mais pobre. É preciso criar políticas públicas que favoreçam o investimento privado, pois o investimento especulativo não vai gerar empregos”, sinaliza o professor da Universidade de Nova York.

Ele continua, abordando a opção que tem sido feita nos últimos anos de evitar os investimentos públicos em benefício de um superávit nas contas e explica que ter um déficit não é um problema se você pagar essa diferença com geração de empregos e arrecadação de impostos. “O país não aguenta seis ou oito anos sem geração de empregos. Os problemas relacionados ao desemprego vão além da questão das capacidades. São questões sociais muito graves, que afetam a produtividade e a competitividade dos países”, pontua.

“Tem que ter um projeto para o capital social do país. Empregos que possam melhorar a qualidade social do Brasil. Aumentar a base da pirâmide [social] mais rápido do que aumenta o PIB (Produto Interno Bruto). Envolve educação, segurança pública, trazer talentos de fora, capital humano e instituições. Não dá mais pra simplesmente aplicar essa fórmula liberal, ‘vamos cuidar das públicas’, enquanto você tem uma situação social enorme. A pandemia não era esperada, mas [a situação] ficou ainda mais grave”, acrescenta o professor Cláudio Garcia.

Empregos do futuro são relacionados com saúde e serviços

Sobre as áreas que vão gerar mais emprego no futuro, Cláudio Garcia lembra que não serão apenas os segmentos relacionados à tecnologia. Será preciso lidar com as novas tecnologias, mas essa área específica é responsável por algo entre 2% a 5% dos empregos no mundo. Setores relacionados à saúde e aos cuidados com o envelhecimento da população devem demandar muitos profissionais qualificados. Cuidadores, nutricionista, fisioterapeutas, terapeutas, treinadores de educação física, entre outras funções ligadas ao bem-estar e à saúde, e também atividades relacionadas ao setor de serviços e entretenimento, com turismo, bares e restaurantes devem ter uma demanda maior no futuro.

Cláudio Garcia foi entrevistado por Mara Luquet no MyNews Entrevista. Assista à integra do bate-papo no Canal MyNews

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