O fato é que nos últimos 10 anos o país perdeu posição relativa no índice de inovação
por Francisco Saboya em 30/03/21 14:18
No dia em que o governo federal lança a medida provisória de ambiente de negócios, a Folha de São Paulo repercute o resultado do IGI – Índice Global de Inovação 2020, discutido em um de seus seminários regulares sobre o tema, com moderação de Vinícius Torres. Esta classificação é feita anualmente pelo Organização Mundial da Propriedade Intelectual (Ompi), em parceria com a Universidade de Cornell (Estados Unidos) e com o Instituto Europeu de Administração de Empresas (Insead). Coisa séria. O plano do Ministério da Economia mira em um outro ranking, o do Banco Mundial (Doing Business 2020), igualmente sério, porém restrito. Foca essencialmente numa visão microeconômica, associada a dez indicadores que vão da criação, funcionamento, financiamento, tributos até o encerramento de um negócio. No primeiro ranking, o Brasil está na 62ª posição, enquanto no segundo fica na 124ª.
O título da apresentação distribuída pelo ME fala em caminho para o top 50 países mais competitivos. Pelos caminhos traçados, não vamos chegar nunca no destino. O propósito do plano é essencialmente a melhoria do ambiente de negócios. Fundamental, pois estamos 50 anos atrasados nesse quesito. Mas é conveniente não confundir as coisas. Competitividade e ambiente de negócios são coisas relacionadas, mas distintas. Ficaram de fora temas críticos como a educação, pesquisa e desenvolvimento, qualidade do capital humano, inovação tecnológica, além de questões ambientais, identitárias e outras que o mundo fora da bolha, o mundo real, elegeu como prioridades para a atratividade dos negócios e competitividade dos países. É como se numa disputa de um campeonato de futebol, o presidente do clube priorizasse a melhoria do gramado achando que com isso o time iria pra série A. Tem mais coisas em jogo.
Existe uma indústria de rankings. Há ranking para tudo. Poucos merecem ser considerados, estudados e tomados como referência para um bom planejamento, o que não é o caso do Banco Mundial. Mas daí a torná-lo objetivo de uma política nacional parece um tremendo equívoco. Está lá escrito, melhorar a posição do Brasil no indicador doing business do WB. O propósito da boa política pública será sempre aumentar o bem estar social, a sustentabilidade sócio-ambiental e a prosperidade econômica da nação por meio da competitividade, principal resultante da inovação. É isso que realmente importa em uma economia de mercado em um mundo aberto.
É aí onde enxergamos a luz cada vez mais distante. A competitividade possui dezenas de atributos, e a qualidade do ambiente de negócios é apenas um deles. Isso quer dizer basicamente menos burocracia, menos impostos e menos governo asfixiando o empreendedor. Uma parte da equação, portanto. Se tomarmos como referência o IGI e seus sete pilares, estamos falando grosso modo de um sete avos do problema a ser resolvido. Carregando aqui nas tintas, a Alemanha, que é o 9º no IGI, é o 90º em termos de custos de mão de obra e 96º em facilidade de se abrir um negócio. Com esses números, seria um Brasil que deu certo. Resumo da ópera: um país sem infraestrutura logística, sem internet de qualidade, sem bons níveis educacionais, sem altos investimentos em ciência, tecnologia e inovação, sem universidades de alto padrão, sem instituições sólidas, sem estabilidade política dificilmente avançará. Talvez nem mesmo no ranking selecionado pelo governo.
O fato é que nos últimos 10 anos o país perdeu posição relativa no índice de inovação, sendo hoje o 62º (era o 47º em 2011). Pior, ficando cada vez mais distante do bloco de países competidores diretos. No antigo e já inútil BRICS, por exemplo, o Brasil já foi o segundo, agora é o último, atrás de Rússia, Índia e África do Sul. Na América Latina, perdemos para Chile, Costa Rica e México. Este último, aliás, progrediu no período da 81ª para a 55ª posição.
Lembrava há anos o ministro Luiz Roberto Barroso que não somos atrasados por acaso. O atraso é bem defendido entre nós. Pelas corporações, para manutenção de seus privilégios; por segmentos empresariais, para arrancar mais um naco de um estado secularmente privatizado; pelo clientelismo da classe política em sua infindável relação patrimonialista com a coisa pública. Os governos seguem dando a sua demão, enfrentando os complexos desafios do século 21 com um repertório do século passado.
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