Aumento da pobreza e do desemprego, com alimentos mais caros, agravam a fome no país. Economista alerta para consequências mais graves entre as crianças
por Juliana Causin em 26/08/21 23:12
O ano de 2020 terminou com 19 milhões de brasileiros passando fome, enquanto mais da metade das casas do país vivia com algum grau de insegurança alimentar – situação que acontece quando não há possibilidade de alimentação em qualidade ou quantidade suficientes. O quadro, agravado pela pandemia do Covid-19, foi revelado por pesquisa nacional da Rede Penssan, a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar.
O fenômeno atinge fundamentalmente as crianças, alerta Nilson de Paula, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e pesquisador da Penssan. “O efeito da fome para uma criança é muito mais preocupante do que para um adulto. Porque a criança está em processo de formação. Então, as consequências disso vão se perpetuar, vão comprometer a própria estrutura física, a estrutura emocional e mental”, explica o economista.
No caso das crianças, o panorama da fome foi agravado no período em que as escolas permaneceram fechadas. Esse é o caso de Juliana Alves, mãe e dona de casa, de 32 anos. Em entrevista ao “Geração Covid – O impacto da pandemia na primeira infância”, ela contou que, sem as escolas, onde os filhos realizavam as principais refeições do dia, ela passou a ter dificuldades para alimentá-los.
“Quando eles estão em casa o dia inteiro, eu faço dois quilos de arroz por dia e um de feijão. A mistura, quando tem, é um pedaço para cada um. Não tem esse negócio de dizer ‘posso repetir a mistura?’ Porque quando eles passam o dia fora de casa, na escola, a gente consegue oferecer um pouco melhor na última refeição, que no caso vem pra casa. Mas quando eles estão em casa, eles comem o que a gente pode proporcionar”, explica.
Com seis filhos e desempregada, Juliana vive desde o início da pandemia com os recursos do auxílio emergencial e do Bolsa Família, que são insuficientes para todas as despesas. “Se não fosse as pessoas de bom coração a gente não tinha sobrevivido”, conta ela.
Ela conta que o preço inflacionado durante a pandemia também agravou a situação. “Sabe o que é você falar pro seu filho não sair de casa? Você pegar dez reais e escolher o pão ou o leite? Ou a mistura ou um álcool?”, diz. Em 12 meses, a inflação no país acumula alta de 8,99%, segundo o IPCA, medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Alguns alimentos, no entanto, encareceram bem mais. Esse é o caso do arroz (39%), do tomate (42%) e das carnes (34%).
Enquanto os preços sobem, os dados de desemprego permanecem altos. Segundo a última pesquisa Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) do IBGE, o país tinha 14,8 milhões de desempregados, patamar ligeiramente menor que o recorde de desemprego no país atingido nos trimestres encerrados em março e abril.
Nilson Maciel destaca que o fenômeno da fome anda de mãos dadas com a pobreza. “O empobrecimento da população tem como uma das suas consequências mais imediatas o agravamento insegurança alimentar”, afirma.
O documentário “Geração Covid – Impacto da pandemia na primeira infância”, obra dirigida pela jornalista Juliana Causin, está disponível no Canal MyNews. Em formato de reportagem especial, expõe os impactos da crise sanitária sobre a estrutura social brasileira, evidenciando as principais adversidades que influenciam no desenvolvimento das crianças. Com apoio do Dart Center for Journalism and Trauma, centro de estudos para jornalistas da Columbia University, Juliana Causin traçou um roteiro que demonstra como, em pouco mais de um ano, a pandemia afetou a primeira infância, investigando ainda as possíveis consequências socioeconômicas desse crítico cenário nacional.
Comentários ( 0 )
ComentarEntre no grupo e fique por dentro das noticias!
Grupo do WhatsApp
Utilizamos cookies para oferecer melhor experiência, melhorar o desempenho, analisar como você interage em nosso site e personalizar conteúdo.
ACEITAR