Com a imprensa em poucas mãos, a internet diminui a barreira de entrada e possibilita a participação de novas vozes no debate público
por Thales Schmidt em 15/03/21 14:51
O Brasil está longe de ser um exemplo mundial de liberdade de expressão. Na classificação da Repórter Sem Fronteiras, o país está na 107ª posição do ranking de liberdade de imprensa, em uma lista com 180 países. Para encarar esse cenário, surgem alternativas de comunicação que apresentam novos nomes e possibilidades.
A Repórter Sem Fronteiras destaca a violência contra jornalistas, os ataques do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o “horizonte midiático” concentrado “nas mãos de grandes famílias, com frequência, próximas da classe política” como obstáculos à imprensa no Brasil. Em relatório anterior, a organização também já destacou que o panorama dos donos de veículos de comunicação pouco mudou no Brasil desde o fim da ditadura militar.
O poder de escrever também está em poucas mãos. Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) publicada em 2010 mostrou que o percentual de negros entre os jornalistas era inferior à metade da presença de pretos e pardos no Brasil. De acordo com o levantamento, 72% dos jornalistas no Brasil são brancos.
A jornalista e professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Fabiana Moraes avalia que a imprensa brasileira “não conversa” com a maioria da população do Brasil e costuma ignorar os impactos sociais das discussões econômicas. Os jornais do país “enxergam primeiro o mercado e depois o público, depois as pessoas”, diz a pesquisadora.
“A imprensa brasileira contribui para um tipo de democracia que nunca deu conta das problemáticas de maneira expansiva, de maneira mais integral, brasileira. A imprensa brasileira faz parte de um modelo democrático que permitiu, por exemplo, o genocídio indígena, que permitiu genocídio de populações quilombolas em nome de uma ideia de progresso e de civilização”, diz Moraes em entrevista ao MyNews.
A professora da UFPE ainda destaca que a concentração da imprensa em poucas mãos contribui para a “pobreza” do conteúdo oferecido, mas destaca que existem novos canais surgidos com a internet que são um “respiro em relação a esses titãs da grande imprensa”.
Criada em 2011, a Agência Pública é uma premiada iniciativa de jornalismo investigativo. Vencedora do Prêmio Vladmir Herzog, Gabriel Garcia Marquez e outros, o projeto é republicado por 18 veículos em 12 países.
A co-fundadora e diretora da Agência Pública Natalia Viana afirma em entrevista ao MyNews que não fazer parte de um conglomerado de mídia “garante uma liberdade editorial completa, que é o fundamental, uma independência radical”.
Viana também destaca que a Constituição Federal de 1988 traz trechos que regulam o mercado da comunicação e buscam evitar a concentração excessiva de poder, embora estes trechos nunca tenham sido regulamentados. “Isso é um problema sério e que o Brasil nunca discutiu”, diz a jornalista.
Levantamento conjunto da Repórter Sem Fronteiras e do Intervozes afirma que a imprensa no Brasil é atravessada por uma “alta concentração de audiência e de propriedade, alta concentração geográfica, falta de transparência, além de interferências econômicas, políticas e religiosas”. A pesquisa destaca que o Grupo Globo “alcança sozinho uma audiência maior do que as audiências somadas do 2º, 3º, 4º e 5º maiores grupos [de comunicação] brasileiros”.
A co-diretora da Agência Pública destaca que a mesma internet que possibilitou a entrada de atores no campo da comunicação que não precisam mais gastar milhões em equipamentos também possibilitou a ação de grupos maliciosos que buscam “desinformar o debate público” com notícias falsas e distorcidas.
Viana destaca, ainda, um elemento essencial para a comunicação e a democracia: os jornalistas. “Não tem como o debate público estar bem informado sem profissionais que dedicam todos os dias da sua vida a separar o que é verdade do que é mentira”, diz.
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